quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A China ataca os EUA: como a ciberguerra está se expandindo

Para quem acha que ficção científica eram os filmes do Flash Gordon... vale a pena ler o que está acontecendo à nossa volta!

 

A China ataca os EUA: como a ciberguerra está se expandindo

Vasta operação, desencadeada em Xangai, teria recolhido de segredos industriais a informações sobre redes elétricas e gasodutos. Washington bebe seu próprio veneno
Por Antonio Martins (www.outraspalavras.net) 

“Sabemos que outros países e companhias roubam nossos segredos corporativos. Agora, nossos inimigos querem tornar-se capazes de sabotar nossas redes elétricas, instituições financeiras e sistemas de controle de tráfico aéreo”. Graves, as frases são do  último discurso “sobre o estado da União”, pronunciado por Barack Obama em 12/2. Por trás dele, está uma descoberta. Após anos de investigação, a Mandiant, uma companhia especializada em segurança de redes, teria identificado [relatório] uma sequência de ações de espionagem e captura de dados, desencadeadas, via internet, contra empresas e órgãos de governo norte-americanos. Teria concluído, também, que a base dos ataques é uma discreta unidade do Exército de Libertação Popular (ELP) nos subúrbios de Xangai. Por serem os pioneiros globais em ciberguerras e pela relação especial que mantêm com a China, os EUA evitam tratar o tema com alarde. Mas provavelmente já estão reagindo, o que amplia as ameaças de militarização do ciberespaço.As descobertas e suas repercussões estão sendo relatadas, desde segunda-feira passada, numa série de reportagens (1 2 3) do New York Times. Contratada por corporações norte-americanas, a Mandiant constatou ataques a 141 alvos, desde 2006. No início, foram espionadas pesquisas tecnológicas, processos de manufatura, estratégias de negociação. Em 2009, por exemplo, uma invasão dos computadores da Coca-Cola teria coincidido com o fracasso na tentativa de adquirir a Huiyuan, gigante chinesa na produção de sucos de frutas. Além disso, foram alvo, sempre segundo a Mandian empresas de terceirização de serviços militares e dos ramos químico, de mineração, satélites e telecomunicações. Mais recentemente, o chineses teriam se voltado para a busca de informações sobre sistema elétrico, gasodutos, abastecimento de água e de gás.

Os ataques são sutis e nunca diretos. Numa busca de dados que teve como alvo o próprio New York Times, os hackers teriam se servido das redes de universidades norte-americanas. As duas ferramentas principais usadas para iniciar a invasão são emails (“em inglês perfeito”, segundo o jornal) com links falsos e códigos maliciosos implantados, sob aparência de comentários, em páginas web. Após um longo trabalho de rastreamento, teria sido possível chegar ao foco de onde as ações foram desfechadas: um edifício de 12 andares, onde está instalada a Unidade 61.638 do ELP chinês.

A embaixada chinesa em Washington negou, como era de prever, as informações — lembrando que em seu país a ação de hackers é proibida por lei… Mas também os Estados Unidos parecem relutantes em adotar uma atitude de confronto (o próprio Obama evitou fazer qualquer referência à China), por dois motivos.

O primeiro é o pioneirismo dos Estados Unidos nas difusão da ciberguerra e em suas versões mais agressivas. Desde 2008, Washington colabora com Israel numa vasta operação contra o programa nuclear iraniano. Ela envolve ações de espionagem, que já resultaram no assassinato de pelo menos três cientistas e difusão de um cibervírus letal. Implantado por meio de um pen-drive nas unidades iranianas de ultracentrífugas, o Stuxnet identificou rapidamente seu alvo (os sensores que controlam a velocidade dos equipamentos). Iludiu os operadores, mantendo aparência de normalidade nos controles de segurança. Mas provocou a elevação absurda no ritmo de rotação das centrífugas, levando-as à auto-destruição.

Mais recentemente, segundo o próprio New York Times, Washington estaria desenvolvendo uma arma ainda mais poderosa: o vírus Flame. Quarenta vezes mais complexo que o Stuxnet, já estaria infectando computadores em diversos países do Oriente Médio — sendo o Irã, novamente, o mais infectado. Poderia ser também mais nocivo que o Sutxnet, pois teria a capacidade de ativar o microfone interno do computador atingido para gravar todas as conversas, ou o bluetooth para se ligar a todos os aparelhos ao seu redor e obter números de telefone e senhas. Segundo um especialista da empresa de segurança eletrônica russa Kaspersky, o Flame “reescreve a definição de ciberguerra e ciberespionagem”.

O segundo motivo para discreção de Washington são os laços com Beijing. Ao contrário da antiga União Soviética, a China não pode ser tratada por “inimiga”, lembra David Sanger, o jornalista que acompanha o caso no New York Times. Os países mantêm comércio de 425 bilhões de dólares por ano e os chineses são os principais financiadores da dívida dos EUA. A delicadeza da relação foi reconhecida, em 2009, pela então secretária de Estado Hillary Clinton, em diálogo com o primeiro-ministro australiano. “Como você fala duro com seu banqueiro?”, perguntou ela, constrangida.

As guerras cibernéticas podem ser muito menos românticas do que sugerem os relatos sobre estratégias surpreendentes de invasão e defesa de computadores. Num mundo em que a vida quotidiana depende crescentemente de sistemas comandados pela rede, ela poderia resultar no colapso de serviços vitais, em áreas densamente povoadas; caos destrutivo; desorganização social maciça.

A iniciativa chinesa revela: como no caso dos drones, os EUA podem aberto um precedente cujos desdobramentos são incontroláveis e podem ter consequências profundamente desumanizadoras. Mais um motivo para compreender a fundo a nova ameaça e pensar caminhos para enfrentá-la.

 

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Um comentário e dois comerciais

O comentário foi feito pelo jornalista Mello no Blog do Mello. Muito pertinentes as quatro últimas questões que ele apresenta! E os comerciais são de livros.



Posted: 26 Feb 2013 10:12 AM PST
Segundo a reportagem do Fantástico, o menor de 17 anos que está assumindo o rabo de foguete de ter disparado o sinalizador que matou o jovem de 14 anos na Bolívia, "é o terceiro dos seis filhos de uma família humilde"

Segundo o advogado da Gaviões da Fiel (torcida organizada do Corinthians, que tem o menor como sócio) Ricardo Cabral, todos os sinalizadores encontrados com os 12 torcedores presos na Bolívia, num total de seis, pertenceriam ao menor, que os teria levado para a Bolívia sem o conhecimento da torcida.

Falta só explicar as marcas de pólvora nas mãos de dois dos torcedores presos, e mais: como o jovem de família humilde, com cinco irmãos, desempregado, conseguiu comprar todos os sinalizadores, mais passagem de ida e volta à Bolívia e ingresso para o jogo.

Agora, o advogado da Gaviões e do menor, Cabral, afirma que ele será punido pela torcida, cujo estatuto proibiria que sinalizadores fossem levados aos jogos.

Ou seja, a bomba vai estourar inteiramente na cabeça do menor. Se for o culpado, tudo bem. Mas, e se estiver sendo usado, como o caminhão de estranhas coincidências indica que sim?

Além do mistério que cerca o caso, há um outro: por que o menor foi ao Fantástico, antes de comparecer à Justiça? Qual o objetivo? Quem negociou a reportagem? Partiu de quem a iniciativa?






Os brasileiros acham que conhecem bem os argentinos. Afinal, nós curtimos Buenos Aires, eles desfrutam de nossas praias e uns e outros praticam a língua comum, o portunhol. Desconfiamos de que ser argentino vai além de amar tango e churrasco, mas nem imaginamos que nossa rivalidade preferencial não é recíproca: eles detestam reconhecer, mas amam os brasileiros e preferem derrotar os ingleses à nossa seleção de futebol.
Os argentinos já ganharam prêmios Nobel (nós ainda não), e o metrô de Buenos Aires, centenário, é prova de que já viveram dias melhores. Agora eles estão sempre ocupando as ruas e protestando. Seu sistema educacional e sua concentração na capital mostram um povo urbano, culto e politizado, mas a instabilidade pode ser percebida pela sucessão de líderes populistas entremeada de golpes militares.
Para realmente desvendar esse povo que clama ter inventado o doce de leite e a caneta esferográfica e brilha no cinema e na literatura, o jornalista Ariel Palacios – brasileiro de ascendência argentina – elaborou este saboroso e imperdível Os argentinos





 Helena Campos foi minha aluna, formou-se, tornou-se Mestra, e agora escreve, muito! Inclusive comigo!
Olha a bela notícia que ela recebeu:

É com grande alegria que comunico que a obra Trem da Vida foi selecionada para o Catálogo de Bolonha 2013 (Bologna Children’s Book Fair 2013), na categoria Poetry:
 
 O catálogo pode ser acessado, na íntegra, por meio do endereço: http://www.fnlij.org.br/imagens/primeira%20pagina/bolonha/Bolonha%202013.pdf.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Jardins, parques e praças

Existe algo mais encantador e relaxante do que passear em belos jardins, grandes praças e parques? Não, não existe. Vejam só alguns exemplos:


Milton, Canadá

 Praça do Papa, Belo Horizonte

Niagara on the Lake - Canadá

Jardins de Luxemburgo - Paris

Londres

Place des Vosges - Paris

Jardins do Palacio Schonbrunn - Viena


domingo, 24 de fevereiro de 2013

Ainda a crise da Igreja

Mais um artigo relevante a respeito da crise que se abriu na Igreja, levando à renúncia do papa Bento XVI. Salta à vista que "problemas de saúde" não foram o motivo da renúncia. Ele está muito mais saudável do que o papa anterior em seus últimos anos de pontificado.
Este artigo de hoje foi extraído do site da Agência Carta Maior.




Sexo e dinheiro sacodem coração da Igreja Católica

Dia após dia, a caixa de Pandora deixa escapar suas piores sombras. Os demônios que a cúria escondeu durante tantas décadas passeiam à noite como espectros ressuscitados pela Praça São Pedro de Roma: corrupção, sexo e dinheiro, uma trilogia explosiva que ninguém poderia imaginar instalada na cúpula da Santa Sé. A Igreja vive, sem dúvida, seu pior momento. A reportagem é de Eduardo Febbro, de Roma

Roma - Sexo e dinheiro sacodem o coração da cidade santa. Uma lista de grandes pecados espreita a cúria do Vaticano no momento em que o papa Bento XVI se prepara para renunciar ao seu pontificado. A corrupção dentro do Vaticano e os casos de pedofilia voltaram ao primeiro plano com as revelações feitas nas últimas horas pela imprensa italiana. Segundo o diário La Repubblica, que cita uma fonte vaticana, os detalhes mais recentes “giram em torno do sétimo mandamento”. Esse mandamento diz “não roubarás” e é interpretado como uma disciplina de retidão para a gestão na atividade econômica e na vida social e política. Também se refere à proteção do próximo. Mas o diário italiano vai muito mais longe em suas revelações e afirma que o papa decidiu renunciar após ter tomado conhecimento de que uma rede de padres homossexuais circulava no Vaticano.

Estas revelações fariam parte do informe que o papa encomendou a três cardeais no ano passado. Julián Herranz, Jozef Tomko e Salvatore De Giorgi entregaram em meados do ano passado parte do resultado da investigação realizada tanto sobre o vazamento de documentos roubados do papa como sobre a corrupção. La Repubblica publica em sua última edição uma informação escabrosa: o jornal afirma que, em outubro passado, o cardeal Julian Herranz, presidente do Pontifício Conselho da Santa Sé para os Textos Legislativos, evocou ante o papa a existência de uma “chantagem” exercida desde fora do Vaticano contra padres homossexuais.

O Vaticano negou estas informações. No entanto, este prestigiado jornal italiano fornece detalhes abundantes assegurando que o informe – dois volumes de 300 páginas cada – dava perfeitamente conta de uma “rede transversal dentro do Vaticano unida pela orientação sexual”, ou seja, a homossexualidade. O jornal escreve textualmente: “pela primeira vez a palavra homossexualidade foi pronunciado no Pontificado”. Além disso, revela que o informe da comissão de cardeais aponta para um grupo de prelados que sofreram pressões por parte de pessoas laicas externas ao Vaticano. A revelação coincide com o que Ratzinger disse dois dias depois da entrevista com os cardeais que lhe entregaram o informe. De forma improvisada, Bento XVI falou dos “maus peixes” que caem na rede da igreja.

La Repubblica assegura de maneira convicta que foi essa revelação que levou o papa a renunciar. A mesma publicação conta que a comissão de cardeais entrevistou dezenas de bispos, cardeais e laicos, obtendo um relato apavorante sobre o interior do Vaticano: grupos de poder em disputa, articulados segundo as distintas congregações religiosas ou a região do mundo a qual pertencem ou as suas preferências sexuais. A investigação dos cardeais adianta que altas autoridades da Igreja poderia estar sendo vítimas de “influências externas” por conta de “suas relações de natureza mundana”. O padre Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, negou com veemência todas essas informações. Ele chamou essas revelações de “fantasiosas” e garantiu que muitas delas eram “simplesmente falsas”.

No entanto, quem conhece parte do que ocorre dentro da Santa Sé diz que a reportagem do La Repubblica contém dados exatos e verídicos. O jornal italiano indica que o informe em mãos do papa menciona um escândalo que remonta ao ano de 2010 e que tem como centro Angelo Balducci . Esse personagem era, na época, presidente do Conselho Nacional de Obras Públicas, no período em que Berlusconi estava no poder. Balducci era objeto de uma investigação judicial quando se descobriu que, para conseguir os serviços de jovens homossexuais, se relacionava com um nigeriano, Chinedu Thomas Ehiem, do coral da capela Júlia da Basílica de São Pedro.

A existência de um lobby gay dentro da Santa Sé provocou um alvoroço gigantesco no país, aumentando a tormenta que, a medida que se aproxima a data da renúncia do papa – 28 de fevereiro – se forma sobre o conclave que deve designar o sucessor de Bento XVI. A polêmica se estabelece agora sobre uma disjuntiva muito polêmica em torno da presença ou não no conclave dos cardeais que esconderam os padres pederastas e até os protegeram. É o caso do cardel Roger Mahony, responsável pela diocese de Los Angeles e acusado de encobrir ao longo de um quarto de século 129 sacerdotes implicados em abusos de menores. Os outros cardeais comprometidos com a mesma sujeira são o cardeal primaz da Irlanda, Sean Brady, e o cardeal belga Godfried Danneels. Estes personagens são os maiores implicados na proteção que deram aos pederastas apesar de seus atos criminosos. A lista, porém, é muito mais ampla. Nela entram o norteamericano Justin Francis Rigali, o australiano George Pell, o mexicano Norberto Rivera Carrera, o polaco Stanislaw Dziwisz e o argentino Leonardo Sandri.

Dia após dia, a caixa de Pandora deixa escapar suas piores sombras. Os demônios que a cúria escondeu durante tantas décadas passeiam à noite como espectros ressuscitados pela Praça São Pedro de Roma: corrupção, sexo e dinheiro, uma trilogia explosiva que ninguém poderia imaginar instalada na cúpula da Santa Sé. A Igreja vive, sem dúvida, seu pior momento. As guerras entre a cúria, a disputa por dinheiro e poder, a pederastia tardiamente reconhecida e sancionada deixaram órfãos de autoridade moral e terrena a milhões e milhões de fiéis em todo o mundo. Em sua profunda fé eles são, também, vítimas da explosão da Igreja Católica.

Tradução: Katarina Peixoto

sábado, 23 de fevereiro de 2013

O mapa dos grupos que desestabilizaram Bento XVI

As notícias a respeito da renúncia do Papa Bento XVI são muitas, contraditórias, algumas meras especulações. Este artigo, que me chegou às mãos hoje, via o www.outraspalavras.net pareceu-me bem elucidativo dos grupos que, dentro do Estado do Vaticano, se digladiam pelo poder. Eu disse - do Estado do Vaticano - não da religião católica. Porque esta luta pelo poder não tem nada de católica!

O mapa dos grupos que desestabilizaram Bento XVI



Ao escancarar Vaticano para seitas ultraconservadoras, Papa suscitou avalanche de rivalidades, intrigas e disputas internas que acabaram minando seu próprio poder

Por Gilberto Nascimento, em Viomundo

O cardeal alemão Joseph Ratzinger chegou a ser chamado de “rotweiller do papa”, nos anos 1980 e 1990. Era, então, o todo poderoso prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, a antiga Santa Inquisição. Eminência parda de João Paulo II – a quem sucedeu, em abril de 2005 -, Ratzinger defendeu ferozmente a restauração do poder episcopal, a volta à ortodoxia.

Combateu a Teologia da Libertação e ajudou a dizimar a Igreja identificada com a opção preferencial pelos pobres, a partir do Concílio Vaticano II (1962-1965), principalmente na América Latina. Ratzinger foi o algoz do brasileiro Leonardo Boff, seu ex-aluno. Calou o teólogo franciscano com o “silêncio obsequioso”, em 1985.

No comando da Santa Sé, já como o papa Bento XVI, cercou-se de cardeais conservadores, fortalecendo uma linha de ação delineada no pontificado de João Paulo II. Deu poder a movimentos católicos de inspiração autoritária e ultraconservadora.

Incrustados na Cúria Romana, esses grupos iniciaram uma acirrada disputa pelo poder. Vários auxiliares foram acusados de desvios financeiros e envolvidos em outros escândalos, como os casos de pedofilia.
Sem controle da situação, Bento XVI –agora às vésperas de sua renúncia –, descobriu tardiamente que não governava sozinho. Em meio a uma rede de intrigas, vaidades e ambição, perdeu o comando. Se viu sem forças.

Nomeações feitas por ele sem seguir preceitos e hábitos comuns no Vaticano também geraram fortes reações. Ao recrutar antigos colaboradores, colocando-os  em postos-chave, contrariou interesses de esquemas enraizados na Santa Sé.

Até os anos 1990, só se falava na divisão interna na Igreja entre os chamados conservadores e progressistas. Hoje, são os integrantes dos grupos mais à direita, incensados por Bento XVI, que o sabotam.

O papa, após anunciar sua renúncia, criticou “a divisão no corpo eclesial” que deturpa “o rosto da Igreja”. Denunciou a “hipocrisia religiosa” e o comportamento daqueles que querem “aparecer”, que buscam o “aplauso e aprovação”. Bento XVI só não identificou quem seriam esses “hipócritas” que lutam desbragadamente em busca do poder na Santa Sé.

À frente, nessas disputas, estão fortes correntes conservadoras na Igreja Católica, como a Opus Dei, considerada um verdadeiro “exército do papa”. O outro grupo mais expressivo é a Fraternidade de Comunhão e Libertação, cujos membros, por causa da fervorosa devoção, chegaram a ser rotulados de “stalinistas de Deus” e “rambos do papa”. No pontificado de João Paulo II eram os “monges de Wojtyla”.
A Opus Dei e a Comunhão e Libertação são os dois grupos com mais força atualmente na Igreja Católica. Mas despontam ainda outros movimentos como os Focolares, o Neocatecumenal e os Legionários de Cristo.

A Opus Dei, fundada em 1928 na Espanha pelo sacerdote Josemaria Escrivá (canonizado em 2002), cresceu no país durante a ditadura de Francisco Franco, de 1936 a 1975. Hoje, está em 90 países, com 89 mil seguidores em todo o mundo.

Seu objetivo, segundo os líderes, é difundir a vida cristã. Certas práticas atribuídas aos seguidores são criticadas, como um suposto hábito de golpear costas e nádegas com chicote. Adeptos seriam obrigados ainda a relatar aos superiores até seus pensamentos.

Grande parte dos integrantes da Opus Dei ocupa cargos de liderança e destaque na sociedade. A organização conta em seus quadros com cardeais, bispos e, ao menos, dois mil sacerdotes. Mantém instituições de ensino como a Universidade de Navarra (Espanha), um seminário em Roma, 600 colégios e 17 escolas de administração e negócios.

Seu braço para a área empresarial é o IESE Business School (Instituto de Estudos Superiores de Empresa), instalado também no Brasil e com planos de oferecer cursos no País – entre eles um de gestão de mídia – a 500 alunos. No Brasil, são ligados à Opus Dei o jurista Ives Gandra Martins e o professor de Comunicação Carlos Alberto Di Franco, entre , entre outros.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, revelou em uma entrevista que seu livro de cabeceira é “Caminho”, de Josemaria Escrivá. Disse ser admirador das ideias do sacerdote espanhol, mas nega ser seguidor da Opus Dei.

Presente em 80 países e com cerca de 200 mil simpatizantes, o movimento Fraternidade de Comunhão e Libertação tem como seu maior expoente o cardeal de Milão, Angelo Scola, ligado a Bento XVI. Foi fundado em 1954 na Itália pelo monsenhor Luigi Giussani e hoje é dirigido pelo espanhol Julián Carrón. Seus integrantes propõem a cultura como “chave de leitura da história”. Os conflitos na sociedade, na visão deles, devem ser analisados a partir da cultura e não da luta de classes ou de questões econômicas.

Fundado em 1943, na Itália, por Chiara Lubich, o movimento Focolares reúne hoje 100 mil membros. Tem como um de seus principais representantes em Roma o cardeal brasileiro João Braz de Avis, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica. É um nome bastante citado como papável. Ex-arcebispo de Brasília, Avis ainda integra o Pontifício Comitê para os Congressos Eucarísticos.

O movimento Focolares é considerado uma “associação de fiéis de caráter privado e universal de direito pontifício” e seus integrantes se dizem “consagrados na pobreza, castidade e obediência”.

Presente em 15 mil comunidades de 105 países e com um milhão de seguidores hoje, o movimento Neocatecumenal surgiu em Madri, nos anos 1960. Foi criado pelo pintor espanhol Francisco Argüello. Seu objetivo era ajudar paroquianos a buscar a evangelização numa época de sociedade “descristianizada”.

Outra corrente religiosa, a Congregação dos Legionários de Cristo, foi criada em 1941, na Cidade do México. Seu fundador, o padre mexicano Marcial Maciel, foi acusado de abusar sexualmente de seminaristas menores de idade. Após denúncias e visitas de uma comissão nomeada pelo papa Bento XVI, a organização sofreu uma intervenção da Santa Sé.

Em meio a esse emaranhado de grupos, visões e interesses distintos, os conflitos na Cúria Romana se avolumaram. Na busca pelo poder, cargos são disputados ferrenhamente.

Ao nomear representante de um grupo para um posto importante, o papa desagrada outros. Tensões ocorreram, por exemplo, a partir de indicações como a do italiano Ettore Gotti Tedeschi, ligado à Opus Dei, para o Instituto de Obras Religiosas (IOR), o banco do Vaticano. Tedeschi assumiu em 2009 e foi demitido no ano passado, por má gestão.

Amigo do papa, Tedeschi teria sido vítima de um complô armado por conselheiros da instituição financeira para desmoralizá-lo. Por trás, estaria o cardeal Tarcísio Bertone, secretário de Estado do Vaticano, segundo documentos vazados no chamado escândalo VatiLeaks. O banco, conforme denúncias, recebia dinheiro de origem duvidosa.

A nomeação do próprio Bertone para a Secretaria de Estado teria gerado insatisfações. O motivo seria o fato de Bertone não vir da área diplomática, o que seria uma tradição na Cúria Romana nas indicações para tal cargo. Ex-secretário de Ratzinger na Congregação para a Doutrina da Fé, Bertone é salesiano.

Bento XVI também removeu do cargo de porta-voz do Vaticano o espanhol Joaquim Navarro Valls, um quadro da Opus Dei bastante próximo de João Paulo II. Valls ocupava a função havia 22 anos e foi substituído pelo padre jesuíta Federico Lombardi.

Outra atitude considerada incomum foi a remoção, em 2011, do cardeal Angelo Scola, então primaz de Veneza e detentor de vários cargos na Cúria Romana, para o posto de arcebispo de Milão.
Scola, do movimento Comunhão e Libertação, é apontado como um dos favoritos para a sucessão de Bento XVI. Sua ida para Milão pode ter sido um indicador, segundo vaticanistas, de que seja o nome preferido pelo papa para sucedê-lo. O papa também transferiu um bispo brasileiro, Filipo Santoro, de Petrópolis para uma diocese da Itália, a fim de que ele pudesse servir mais de perto ao movimento Comunhão e Libertação.

Ex-assessor da CNBB e estudioso dos assuntos do Vaticano, o padre Manoel Godoy, diretor-executivo do Instituto Santo Tomás de Aquino (de Belo Horizonte), alerta que o próximo papa deverá fazer mudanças profundas na Cúria Romana para não virar refém das atuais estruturas de poder. Segundo Godoy, cardeais eméritos que continuam na Santa Sé acabam formando grupos de conspiradores capazes de desestabilizar o papado. “Os cardeais aposentados ficam lá. Têm muito tempo para arquitetar planos e propostas e não deixam o papa governar”, constata.

Alguns desses cardeais, como os italianos Angelo Sodano, decano do Colégio Cardinalício, e Giovanni Batista Ré, o eslovaco Josef Tomko e o colombiano Dario Castrillón Hoios, seriam simpáticos a interesses defendidos pela Opus Dei.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Aécio conhece pouco a Petrobrás

O autor do texto que reproduzo hoje é antigo colaborador dos meus blogs. E sempre que vejo um artigo dele, fico com ânsias de reproduzir, pois o considero uma pessoa muito sensata. Este artigo foi "chupado" do Blog da Kika Castro, filha do José de Castro:


Aécio conhece pouco a Petrobrás.

Texto escrito por José de Souza Castro:
Oportuno e esclarecedor o artigo do ex-diretor geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP) Haroldo Lima, que ficou no cargo durante oito anos, até dezembro de 2011, sobre a redução, em 36%, do lucro líquido da Petrobras, em 2012. Oportuno, porque foi divulgado no mesmo dia em que a imprensa deu grande destaque ao discurso do senador Aécio Neves, do PSDB mineiro, da tribuna do Senado, apontando os “13 fracassos” do PT no governo, a quem acusou de colocar “em risco as principais empresas públicas nacionais, como a Petrobras e a Eletrobras”.
Antes de continuar, vamos ver quem é Haroldo Lima. Baiano, nasceu em Caetité em 1939, estudou engenharia elétrica na Universidade Federal da Bahia, ingressou no movimento estudantil e, a partir de 1972, até ser preso quatro anos depois, foi membro da Comissão Executiva do Comitê Central do PCdoB, responsável pela Guerrilha do Araguaia. Solto em 1979, com a anistia política, ajudou a fundar o PMDB baiano, elegendo-se deputado federal em 1982. Em 1985, com a legalização dos partidos de esquerda, voltou ao PCdoB, e reelegeu-se para a Câmara dos Deputados até 2002, quando foi derrotado como candidato ao Senado. No ano seguinte, Lula o nomeou diretor-geral da ANP.
Voltemos à Petrobras, empresa que, segundo a imprensa – e agora Aécio – vem sendo usada pelo governo para conter a inflação e, desse modo, está sendo posta em risco. Os acionistas que têm lucrado muito com a maior estatal brasileira não se conformam com um lucro de apenas R$ 21,18 bilhões em 2012.
Para dar clareza à situação atual, o ex-dirigente da ANP faz um histórico dos balanços da Petrobras. De 1995 a 1999 – portanto, no governo tucano –, o lucro foi em média de R$1,19 bilhão. Nos três anos seguintes, saltou para R$ 6,93 bilhões em média, por ano. A partir de 2003, nos oito anos do governo Lula, ficou em R$ 25,5 bilhões, na média, atingindo um recorde de R$ 35,19 bilhões em 2010. “Nenhuma empresa brasileira teve durante tanto tempo lucros tão excepcionais”, afirma Haroldo Lima. Nos dois primeiros anos do governo Dilma Rousseff, a média de lucros passou a ser de R$ 27,25 bilhões. “Vê-se assim que o lucro de R$ 21,18 bilhões de 2012 está longe de ser um desastre e nada tem a ver com risco de ‘desmonte’ da Petrobras”, completa.
Esclarece Haroldo Lima que o fundamental para os lucros de uma grande petroleira é o preço do petróleo. Só por isso, o lucro da Petrobrás multiplicou-se por seis, entre 2000 e 2002. E aumentou ainda mais nos anos seguintes, com o preço do barril do petróleo chegando a US$134 em meados de 2008. As maiores petroleiras do mundo lutam por garantir seus lucros nos postos de gasolina, “mas sabem que o maior lucro não vem do posto, mas do poço”. Alguns dos fatores que interferem na formação do lucro, como a produção, a demanda de óleo e seus derivados, a rede de distribuição, a exportação, a competência de seus dirigentes, atingem indistintamente as petroleiras.
Por isso, no início do segundo semestre de 2012, acrescenta Lima, “de 20 grandes petroleiras, 11 tiveram prejuízos, sendo que, das dez maiores, apenas uma cresceu, a Exxon. Todas as demais tiveram queda de lucro. E a Exxon cresceu porque vendeu ativos”. Desse modo, o recuo de 36% no lucro da Petrobras não é algo estranho ao mundo dos grandes negócios. Mas é um problema que precisa ser compreendido e corrigido, a começar pela identificação de suas causas.
Para o autor, a imprensa brasileira errou ao identificar, como causa, a decisão do governo de não permitir o aumento do preço da gasolina, já que parte dela era importada a preço maior. Se o motivo fosse esse, não teria ocorrido o salto do lucro da Petrobrás durante praticamente toda a década de 2000, quando o preço da gasolina para o consumidor brasileiro ficou estável. Além disso, não é verdade que os preços tenham ficado congelados nos dois anos seguintes. Em novembro de 2011, os preços da gasolina subiram cerca de 10% e os do diesel, 2%. Em junho de 2012, o governo deixou de cobrar a Cide, o que favoreceu a Petrobras. [Embora tenha prejudicado estados e municípios].
O prejuízo da Petrobras com a importação da gasolina, no segundo trimestre de 2012, foi de R$ 400 milhões e, com o diesel, de R$ 1,9 bilhão. Mas esses prejuízos são relativamente pequenos frente à receita das vendas totais: R$ 69 bilhões, com alta de 3%, comparada ao trimestre anterior.
A causa principal da redução do lucro, conclui Haroldo Lima, foi o prejuízo cambial. “Só no segundo trimestre do ano passado, o dólar saltou de R$ 1,80 para R$ 2,04, e a empresa teve que provisionar perdas de R$ 6,4 bilhões. Simulação de um especialista da ANP mostrou que, mantidas as importações da gasolina e do diesel, e sem aumentar seus preços internos, se não houvesse o prejuízo cambial, a Petrobras teria saído, no segundo trimestre de 2012, de um prejuízo de R$ 1,38 bilhão para um lucro de R$ 5 bilhões”.
Mais algumas causas da redução do lucro: queda da produção, desvalorização de estoques, aumento das importações de gás natural liquefeito (GNL), por causa da entrada em operação das usinas térmicas, entre outras.
O mais importante, nesse artigo de Haroldo Lima, é sua conclusão:
“Uma petroleira estatal como a Petrobras tem como objetivos: ajudar o Estado a desenvolver o país, alavancar a indústria e os serviços, propiciar o surgimento de pequenas e médias empresas setoriais; tem também o dever de se afirmar como grande empresa, aumentando sua produção e modernizando-se. Na convergência dessas finalidades deve garantir ao povo combustível bom e a preços módicos”.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Confundir para desinformar

Mais um artigo relevante do Observatório da Imprensa:


Confundir para desinformar
Luciano Martins Costa

Dez anos depois de inaugurada a política econômica que seus proponentes chamam de “desenvolvimentista”, a imprensa brasileira finalmente aceita, implicitamente, que a intervenção direta do Estado nas relações de negócio e principalmente a estratégia de criar renda artificialmente nas faixas mais pobres da população foi uma estratégia acertada.
Mas o mais importante, para uma parte da imprensa, é discutir a autoria do fenômeno que permitiu ao Brasil retirar da miséria 36 milhões de cidadãos e criar um mercado de renda média calculado em 60 milhões de pessoas. Foi Fernando Henrique ou Lula? Foi o PSDB ou o PT?
O fenômeno econômico e social fica em segundo plano, e os jornais dão grande peso a uma discussão meramente eleitoral, em detrimento dos fatos que ajudariam o leitor a formar sua opinião. Além de perder a oportunidade de rever os dogmas de mercado – já plenamente desmoralizados pela realidade no Brasil e em outros países emergentes – a imprensa se desvia do fato principal para alimentar picuinhas partidárias.
Os editores, assim como os dirigentes dos partidos, os governantes e os líderes da oposição sabem que o Partido dos Trabalhadores recebeu do PSDB uma economia organizada mas em dificuldades. O sistema bancário havia sido reestruturado pelo Proer, a privatização de alguns serviços públicos, apesar de controversa, estava produzindo melhorias em setores da infraestrutura.
Sabem também que a partir de 2003 entrou em vigor uma nova política econômica, baseada no conceito de renda mínima, obsessão do senador Eduardo Suplicy, como forma de resgatar da pobreza a parcela da população que sempre foi um peso para o desenvolvimento. A imprensa sabe também porque tentou desmoralizar tais programas sociais.
No mesmo dia em que a presidente Dilma Rousseff anuncia oficialmente um novo passo para vencer a miséria, seu partido divulga uma cartilha de propaganda na qual faz comparações com o governo anterior, de seus oponentes. Para o cidadão comum, tanto aquele que depende do bom planejamento para manter saudáveis suas contas domésticas, como o mais aquinhoado que procura assegurar seus investimentos, o importante na comemoração dos dez anos de governo da aliança comandada pelo PT é perscrutar o horizonte para desenhar cenários e cuidar de seus interesses.
Artimanhas de edição
Ninguém vai consumir ou poupar seu dinheiro com base numa cartilha de partido, mas a Folha de S.Paulo gasta o tempo de seus repórteres para contestar aquilo que é mera propaganda eleitoral.
Não se quer aqui dizer que os panfletos partidários devam mentir, exagerar ou distorcer indicadores e estatísticas, mas essa é a realidade do sistema político em quase todo o mundo. O problema é que o jornal confunde propositalmente propaganda partidária com informe oficial de governo.
O que está em discussão aqui é a confusão que se cria entre o panfleto partidário, essencialmente um ato de marqueteiros, e o anúncio oficial dos resultados da mais recente medida do governo contra a miséria. Como os jornais adotam critérios diferentes para tratar os dois assuntos, fica mais evidente a manobra editorial da Folha.
Observe-se, por exemplo, que o Estado de S. Paulo oferece a manchete para o anúncio do fim da miséria entre os cidadãos cadastrados pelos órgãos oficiais, e ignora a cartilha do PT. O Globo também destaca a cerimônia que marcou as medidas para acabar com a pobreza extrema, e noticia separadamente o lançamento do panfleto do partido, informando que se trata de uma peça criada pelo marqueteiro João Santana, que deverá marcar o tom da campanha eleitoral no ano que vem.
A Folha omite da primeira página o fato de que 22 milhões de brasileiros passam a contar com a renda mínima para sair da miséria e se dedica a analisar a peça de propaganda partidária, com direito a texto chamativo logo abaixo da manchete. No interior do jornal, vem primeiro a notícia sobre a ampliação do programa social e, na página seguinte, a crítica ao panfleto de campanha.
Trata-se de um artifício de edição primário e indecoroso, pelo qual se tenta desqualificar uma ação oficial de governo pela explicitação dos exageros e omissões que são comuns a peças de propaganda partidária.
Como a política condiciona decisões editoriais há muito tempo, e muitas peças jornalísticas podem ser confundidas com panfletos eleitorais, pode-se dizer que se trata de um embate de propaganda e contrapropaganda.
Felizmente, nem jornais nem panfletos partidários são fontes confiáveis para quem toma decisões financeiras importantes.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Cenas inéditas no Vaticano

Muito interessantes as colocações do Alberto Dines, que li e reproduzo do Observatório da Imprensa.

Cenas Inéditas no Vaticano

Um jornalista que começou a trabalhar no início dos anos 1960 terá acompanhado pelo menos quatro sucessões na Santa Sé: a passagem de João XXIII para Paulo VI (1963), deste para João Paulo I (1978), deste para João Paulo II em 1978, deste para Bento XVI em 2005 e agora, em 2013, deste para o cardeal que o sucederá em meados de março.
Em 50 anos, duas sucessões surpreendentes: a de 1978, quando o 262º pontífice, João Paulo I, permaneceu apenas 33 dias no trono; e em 2013, quando o 264º papa renunciou por livre e espontânea vontade. O renunciante anterior, Gregório XII (em 1415, há cerca de 600 anos), foi forçado: se não desistisse criaria uma cisão irreparável no seio da igreja.

Os jornalistas que acompanharão a substituição de Joseph Ratzinger em Roma ou nas baias das redações do resto do mundo deverão deparar-se com situações insólitas, inéditas, contrastando vivamente com um papado de oito anos linear, lacônico, quase burocrático.
Esta primeira semana do intervalo pontifício exibiu claramente as dificuldades para conciliar os novos cânones do jornalismo com as sutilezas e os imponderáveis que impregnam cantos e recantos da Santa Sé.

No intrincado, atravancado e indevassável sistema de poder do Vaticano se justapõem rituais rígidos, antagonismos agudos, profundas preocupações teológicas, indeclináveis interesses pessoais, intensos anseios espirituais, pragmatismos prementes, tudo isso num cenário com dois mil anos de história.

Roteiro luterano

Embora não houvesse carência de espaço ou tempo, nem a mídia impressa nem a eletrônica conseguiram oferecer aos respectivos públicos as primeiras chaves para entender o drama – é um drama, doloroso como todos.

O pretexto da renúncia (ou abdicação?) era a fragilidade de um sacerdote de 85 anos que não aguentava as tremendas pressões da função e dos desafios proporcionados pela conjuntura. Para justificar a versão oficial, a máquina de informações do Vaticano rapidamente noticiou que Bento XVI implantara um marca-passo e, logo em seguida, que sofrera em seus aposentos uma contusão na cabeça quando visitava o México (fatos conservados a sete chaves até então).

A despeito da alegada debilidade, eis Joseph Ratzinger numa maratona de eventos e pronunciamentos nas quais exibe grande firmeza e coragem moral. Depois de anunciar seu afastamento, logo veio a denúncia contra a hipocrisia e o carreirismo religioso e, no último sermão para os sacerdotes da diocese romana, um apelo para a verdadeira renovação eclesial, o retorno ao espírito do Concílio Vaticano II (cujo sentido, segundo o papa, foi deformado pela mídia) e a advertência para que não se repitam os erros dos católicos alemães durante o Holocausto.

O sermão de 45 minutos foi ovacionado de pé pelos presentes, cena jamais vista no Vaticano.

Os porteiros das redações ficaram desnorteados: o último teólogo alemão que denunciou hipocrisias na Santa Sé foi Martinho Lutero, há meio milênio (1517), quando investiu contra a venda de indulgências e criou o maior cisma dentro cristianismo. Não ocorreu aos vaticanistas de plantão acionar o Google para saber o que aconteceu em 2008, quando Bento XVI, em visita oficial à Alemanha, fez um roteiro algo luterano seguido de um candente desmentido do cardeal Tarcisio Bertone, o camerlengo do papa, de que não se cogitava reabilitar o patriarca do protestantismo. Mas as críticas de Lutero dirigiam-se diretamente ao “sacerdotalismo” (o carreirismo religioso mencionado por Ratzinger), que barrava e distorcia o contato dos cristãos com o objeto de suas crenças.

Próximos capítulos

A crítica que Bento XVI fez à mídia foi praticamente omitida do noticiário no Brasil: quem costuma criticar a mídia é a esquerda bolivariana, impensável que um papa considerado “conservador” acuse frontalmente uma imprensa geralmente sensível aos interesses das cúrias e, em alguns casos na América Latina, tão submissa ao Opus Dei.
Bento XVI certamente não interferirá na escolha do sucessor e viverá rigorosamente recolhido. Mas Bento XVI é um intelectual, intelectual alemão, comprometido com suas convicções íntimas, atento às diferentes acepções da palavra Gheist – espírito, moral, alma, compreensão superior, transcendência.

Seu pontificado logo será encerrado. Nada impede que comece um apostolado. Convém preparar-se: muitas cenas inéditas ocorrerão no Vaticano.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Sociedade do espetáculo

Só uma imagem como esta para nos fazer refletir sobre o que está à nossa volta!






quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Desilusão do Tiririca

Olhando hoje o blog da amiga Kika Castro, me deparei com o que ela escreveu e resolvi ampliar o número de leitores indicando a todos vocês que me acompanham.


Eleito deputado federal, ao estrear na política em 2010, com a maior votação do país, Tiririca acaba de externar, conforme o ex-presidente da OAB-MG, Aristóteles Atheniense – que teve papel importante na resistência à ditadura militar em Minas –, o seu desalento com o comportamento de seus pares e a impossibilidade de realizar o que seria realmente do interesse da comunidade. Ele não pensa em reeleição. Quer voltar ao picadeiro, para ser apenas palhaço.

Essa desilusão de Tiririca com o Poder Legislativo acaba sendo a de todos nós, e isso é péssimo para o sistema político que desejamos, porque não há outro melhor – a democracia. E ela se constrói com um Legislativo, um Judiciário e um Executivo respeitados pela população e atuando em equilíbrio de poder. A imprensa pode dar uma contribuição importante para o aperfeiçoamento de nosso sistema político.
 

É o que procura, ao noticiar com destaque a investigação em curso pela Polícia Federal contra o presidente da Assembleia Legislativa de Minas, deputado Dinis Pinheiro, do PSDB. Ele é suspeito de uso de caixa 2 para a compra de votos durante a campanha para sua reeleição, em 2010. Dinis Pinheiro foi o candidato mais votado, recebendo 159.422 votos. Ele está no quinto mandato e já havia sido campeão de votos nas duas eleições anteriores. Em 2011, foi reeleito presidente da Assembleia Legislativa.

Ao contrário de Tiririca, o deputado mineiro não demonstra qualquer desalento com a atividade política, e não esconde o desejo de ser governador de Minas. Também não é palhaço, mas empresário bem-sucedido do setor de transportes. Com sua longa convivência política, não pode desconhecer a importância da transparência na gestão pública, para que o país tenha a democracia que merece e deseja.


Por isso, é lamentável que a Assembleia Legislativa, que deve custar neste ano quase R$ 1 bilhão aos contribuintes mineiros, tenha resistido tanto, sob sua gestão, ao cumprimento da Lei de Acesso à Informação. Foi a última instituição mineira a informar, conforme a lei, sobre sua folha de pagamentos – que deve consumir neste ano R$ 791 milhões – e quando o fez, foi de forma incompleta. Ao revelar o valor de cada salário pago em janeiro, a Assembleia Legislativa omitiu os nomes dos servidores, alguns deles com salários líquidos mensais superiores aos da presidente da República.


Desde que a imprensa descobriu, há mais de oito anos, salários de até R$ 50 mil pagos a funcionários da Assembleia mineira, muitos erros já foram corrigidos, mas o contribuinte espera mais, para que haja um mínimo de isonomia com os salários que recebem a imensa maioria dos trabalhadores brasileiros.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Lispector & Nogueira - duas crônicas imperdíveis!

Corria o ano de 1968. Leitor assíduo do Jornal do Brasil, me deparei com uma crônica de Clarice Lispector sobre... futebol! Incrível! Ela estava respondendo a um desafio de Armando Nogueira, que escrevia todos os dias a coluna Na grande área, no mesmo JB.
Armando dissera que trocaria tudo por uma crônica sobre futebol escrita pela Clarice. Ela escreveu e lançou um novo repto: queria ver Armando escrever sobre a vida.
Guardei as duas crônicas por anos a fio. Numa das últimas mudanças, elas acabaram desaparecendo. Talvez ainda estejam aqui em casa, solertes, à espreita. Não faz mal. Graças à internet, acessei o acervo do JB e as recuperei. Aqui estão elas. Não deixem de ler!





ARMANDO NOGUEIRA, O FUTEBOL E EU, COITADA
Clarice Lispector

E o título sairia muito maior, só que não caberia numa única linha. Não leio todos os dias Armando Nogueira – embora todos os dias dê pelo menos uma espiada rápida – porque “meu futebol” não dá pra entender tudo. Se bem que Armando escreve tão bonito (não digo apenas “bem”), que às vezes, atrapalhada com a parte técnica de sua crônica, leio só pelo bonito. E deve ser numa das crônicas que me escaparam que saiu uma frase citada pelo Correio da Manhã, entre frases de Robert Kennedy, Fernandel, Arthur Schlesinger, Geraldine Chaplin, Tristão de Athayde e vários outros, e que me leram, por telefone. Armando dizia: “De bom grado eu trocaria a vitória de meu time num grande jogo por uma crônica…” e aí vem o surpreendente: continua dizendo que trocaria tudo isso por uma crônica minha sobre futebol.

Meu primeiro impulso foi o de uma vingança carinhosa: dizer aqui que trocaria muita coisa que me vale muito por uma crônica de Armando Nogueira sobre digamos a vida. Aliás, meu primeiro impulso, já sem vingança, continua: desafio você, Armando Nogueira, a perder o pudor e escrever sobre a vida e você mesmo, não posso perdoar que você trocasse, o que significaria a mesma coisa.

Mas, se seu time é Botafogo, não posso perdoar que você trocasse, mesmo por brincadeira, uma vitória dele nem por um meu romance inteiro sobre futebol.

Deixe eu lhe contar minhas relações com futebol, que justificam o coitada do título. Sou Botafogo, o que já começa por ser um pequeno drama que não torno maior porque sempre procuro reter, como as rédeas de um cavalo, minha tendência ao excessivo. É o seguinte: não me é fácil tomar partido em futebol – mas como poderia eu me isentar a tal ponto da vida do Brasil? – porque tenho um filho Botafogo e outro Flamengo. E sinto que estou traindo o filho Flamengo. Embora a culpa não seja toda minha, e aí vem uma queixa contra meu filho: ele também era Botafogo, e sem mais nem menos, talvez só para agradar o pai, resolveu um dia passar para o Flamengo. Já então era tarde demais para eu resolver, mesmo com esforço, não ser de nenhum partido: eu tinha me dado toda ao Botafogo, inclusive dado a ele minha ignorância apaixonada por futebol. Digo “ignorância apaixonada” porque sinto que eu poderia vir um dia apaixonadamente a entender de futebol.
E agora vou contar o pior: fora as vezes que vi por televisão, só assisti a um jogo de futebol na vida, quero dizer, de corpo presente. Sinto que isso é tão errado como se eu fosse uma brasileira errada.

O jogo qual era? Sei que era Botafogo, mas não me lembro contra quem. Quem estava comigo não despregava os olhos do campo, como eu, mas entendia tudo. E eu de vez em quando, mesmo sentindo que estava incomodando, não me continha e fazia perguntas. As quais eram respondidas com a maior pressa e resumo para eu não continuar a interromper.

Não, não imagine que vou dizer que futebol é um verdadeiro balé. Lembrou-me foi uma luta entre vida e morte, como de gladiadores. E eu – provavelmente coitada de novo – tinha a impressão de que a luta só não saía das regras do jogo e se tornava sangrenta porque um juiz vigiava, não deixava, e mandaria para fora de campo quem como eu faria, se jogasse (!). Bem, por mais amor que eu tivesse por futebol, jamais me ocorreria jogar… Ia preferir balé mesmo. Mas futebol parecer-se com balé? O futebol tem uma beleza própria de movimentos que não precisa de comparações.

Quanto a assistir por televisão, meu filho botafoguense assiste comigo. E quando faço perguntas, provavelmente bem tolas como leiga que sou, ele responde com uma mistura de impaciência piedosa que se transforma depois em paciência quase mal controlada, e alguma ternura pela mãe que, se sabe outras coisas, é obrigada a valer-se do filho para essas lições. Também ele responde bem rápido, para não perder os lances do jogo. E se continuo de vez em quando a perguntar, termina dizendo embora sem cólera: ah, mamãe, você não entende mesmo disso, não adianta.

O que me humilha. Então, na minha avidez por participar de tudo, logo de futebol que é Brasil, eu não vou entender jamais? E quando penso em tudo no que não participo, Brasil ou não, fico desanimada com minha pequenez. Sou muito ambiciosa e voraz para admitir com tranquilidade uma não participação do que representa vida. Mas sinto que não desisti. Quanto a futebol, um dia entenderei mais. Nem que seja, se eu viver até lá, quando eu for velhinha e já andando devagar. Ou você acha que não vale a pena ser uma velhinha dessas modernas que tantas vezes, por puro preconceito imperdoável nosso, chega à beira do ridículo por se interessar pelo que já devia ser um passado? É que, e não só em futebol, porém em muitas coisas mais, eu não queria só ter um passado: queria sempre estar tendo um presente, e alguma partezinha de futuro.

E agora repito meu desafio amigável: escreva sobre a vida, o que significaria você na vida. (Se não fosse cronista de futebol, você de qualquer modo seria escritor). Não importa que, nessa coluna que peço, você inicie pela porta do futebol: facilitaria você quebrar o pudor de falar diretamente. E mais, para facilitar: deixo você escrever uma crônica inteira sobre o que futebol significa para você, pessoalmente, e não só como esporte, o que terminaria revelando o que você sente em relação à vida. O tema é geral demais, para quem está habituado a uma especialização? Mas é que me parece que você não conhece suas próprias possibilidades: seu modo de escrever me garante que você poderia escrever sobre inúmeras coisas. Avise-me quando você resolver responder a meu desafio, pois, como lhe disse, não é todos os dias que leio você, apesar de ter um verdadeiro gosto em ser sua colega no mesmo jornal. Estou esperando.
(Jornal do Brasil, 30.3.1968)



Na Grande área
Armando Nogueira

Clarice Lispector: Há uma semana, não encontro no Rio uma pessoa amiga que não me pergunte: “Então, quando é que você vai aceitar o desafio da Clarice Lispector”?
(Permita, leitor, explicar que eu tinha pedido, daqui, uma crônica de Clarice Lispector sobre futebol. Ela escreveu, escreveu uma crônica admirável; mas, num impulso de terna vingança, Clarice me multou: desafiou-me a perder o pudor e escrever sobre a vida).

Agora, os cobradores de Clarice estão à minha porta, carinhosamente, exigindo a resposta, mas com uma impaciência que me angustia como a véspera de um grande jogo.
Que dizer de um jogo que ainda não terminou?

E mesmo quando termine, Clarice, o match de minha vida não justificará sequer resenha: é match-treino, sem placar, sem juiz, nem multidão. Por tudo! Que está bom assim, embora melhor se fosse uma pelada – mil meninos jogando a minha vida, alheios ao vento que às vezes persegue tanto o time da gente.

Jamais seria um bom depoimento de minha própria vida: jogo muito mal, sofro a imprecisão de meus chutes. Tenho medo e respeito muito o julgamento da plateia. Embora também já tenha tido vergonha da multidão. Eu te conto, Clarice: era um jogo de grande importância, no Maracanã. O ídolo errou o primeiro passe, errou o segundo, o terceiro. Deram-lhe uma vaia. O ídolo lutava, dignamente, mas seu esforço era vão, a bola de ferro não lhe saía dos pés. A multidão já passava da reprovação ao deboche; e o ídolo, ali, firme, correndo entre dois abismos – humilhação e fadiga. Chamaram-no de venal; ele chorou em campo.

Depois do jogo, a um canto do vestiário, ele me confessava, ainda em lágrimas:
- Armando, eu sei que joguei muito mal. Mas eu não tinha cabeça para pensar. Essa gente não sabe, mas eu vim jogar, deixando minha filha, de cinco anos em casa, com minha mulher doente e uma irmã de minha mulher, louca, trancada no quarto. Mas, louca de hospício. Louca de passar o dia jurando que ainda vai estrangular a minha filha. E eu no campo, só pensava nisso: meu Deus, será que ela não está estrangulando a minha filha?

Nesse dia, eu descobri que nem sempre a voz do povo é a voz de Deus e que às vezes a multidão é capaz até de torcer pelo estrangulamento de uma criança.

O match de minha vida, querida Clarice, tem sido um sofrido aprendizado de todos os sentimentos que murcham e florescem num jogo de futebol: o amor, o medo, o ódio, a inveja, a coragem ali estão, revestindo ou informando cada gesto da bola, cuja meta é sempre o coração – para viver uma grande alegria ou para morrer de infarto.

Infelizmente, jamais conquistei um lugar de jogador nesse misterioso torneio que acompanho, há quarenta anos, como simples espectador. Tentei ser goleiro. Queria sentir o único pedaço de campo em que a grama verde não vinga jamais. Cheguei a mentir, enfiando joelheiras, um boné na cabeça e dizendo aos outros meninos que era o Batatais. Deve ter me ficado da experiência uma visão pessimista do campo. Mas, pelo menos duas lições aprendi com dois goleiros: com Evutchenko, “que a vida não é só atacar, é também vigiar os menores movimentos do adversário e conhecer suas artimanhas”; e com Albert Camus que o futebol ensina tudo sobre a moral dos homens.

Por fim, Clarice, o match de minha vida não registra um instante sequer de plena felicidade, embora alguns espectadores o vejam como um alegre amistoso de portões abertos. Marca-me, cerrado, um sentimento de culpa, a dividir comigo as bolas de sabão de cada gol perdido.

Se não deploro, também não tenho o que festejar no match da minha vida: o grito que glorifica o goleador é o mesmo que mortifica o goleiro.
Por isso, não vejo na vitória mais verdade que na derrota.

O match de minha vida, Clarice, está por ai, rolando numa bola que já não é de meia, nem de gude: bola de tantos sonhos perdidos pela linha de fundo – círculo, inspiração do sol, forma perfeita, esfera de fogo queimando, às vezes, a grama dos meus campos.

Que o match da minha vida possa ao menos terminar em paz – empate.
(Jornal do Brasil, 8.4.1968)