sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Transgênicos não são alimentos, são mercadorias

Em entrevista ao Saúde Popular, médico argentino analisa os danos causados por alimentos geneticamente modificados e agrotóxicos para as pessoas e a sociedade.
Da Redação

O médico argentino e membro da Rede Popular de Médicos da Argentina, Javier Balbea, esteve no Brasil para participar do seminário “A realidade dos agrotóxicos e transgênicos no Brasil e seus impactos sobre a saúde humana e ambiente”, que ocorreu durante Feira Nacional da Reforma Agrária, em São Paulo, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Em entrevista ao Saúde Popular, Balbea critica o uso dos transgênicos e agrotóxicos, pois acredita que eles são uma tecnologia que serve ao propósito de dominar os territórios dos países produtores.
Para o médico, o ato de comer e produzir alimentos está ligado diretamente à cultura dos povos, e isso está sendo ameaçado. “A produção transgênica é de mercadoria, não de alimentos. Isso vai na contramão da cultura dos povos”.
Confira abaixo a entrevista de Javier Balbea ao Saúde Popular:

– Qual o propósito de uma tecnologia como os transgênicos?
As tecnologias não são neutras. Elas são instrumentos políticos e algumas servem a determinados poderes para implementar determinadas ações.
Se uma tecnologia tem apoio de toda a indústria, vai ser criado um processo de legitimação social para que as pessoas a aceitem.
No caso dos transgênicos, eles servem para a dominação de alguns territórios pela produção de commodities [produtos primários] a favor do capital.

– Você disse que comer é um ato cultural. Como os transgênicos mudam nossa forma de comer e produzir?
O alimento é muito mais que nutrientes. Às vezes, comemos sem ter fome, por uma relação social que se estabelece ao redor de produzir e preparar os alimentos.
Quando deixamos de produzir alimentos e passamos aos produtos transgênicos, que são mercadorias, não existe essa relação, porque é uma produção que vai na contramão da cultura dos povos.
Na Argentina, por exemplo, não temos a cultura de comer soja, mas temos uma expansão da fronteira agrícola baseada no cultivo de soja. No Brasil é o mesmo. É uma produção feita, especialmente, para a exportação, que atende ao interesse de outras nações.
Além disso, vários estudos mostraram que ingerir produtos transgênicos gera doenças, como mudanças no tubo digestivo, além da química associada ao produto geneticamente modificado: não há transgênico que não tenha em sua composição agrotóxicos.

– Por que países como Brasil e Argentina continuam a usar agrotóxicos comprovadamente perigosos, que foram banidos em outros países?
Esses países, principalmente na Europa, decidiram por pressões populares e outros motivos que esses venenos causam danos à saúde. Mas em países como Brasil e Argentina, onde é mais fácil manipular a política, o uso continua.
São países que não são verdadeiramente soberanos, não podem articular suas próprias políticas; eles respondem às políticas que se desenvolvem nos países capitalistas centrais. Dependem dessa economia que se decide em outro lugar e é aplicada nos seus territórios. Há uma liberdade e impunidade que permite atravessar o direito dos povos.

– Por que há um silêncio da comunidade científica sobre muitas denúncias e questionamentos em relação aos transgênicos?
Acredito que por é falta de conhecimento, pelo tipo de formação que existe, que naturaliza essas tecnologias como algo indispensável para a economia e a sociedade.
É o paradigma de que a economia pesa mais que a vida. Toda nossa vida passa pelo consumo. O econômico tem um valor que está acima de qualquer outro direito, é a forma de funcionar da sociedade.
E quando se pensa que não há alternativa, é uma vitória para essa forma de pensar dominante, que não nos deixa acreditar que há formas de produzir sustentáveis e que a saúde é algo utópico.
Mas, cada vez mais, o debate se vai dando de forma maior, em lugares mais importantes. O acúmulo de informação e o mal estar social que vai se gerando através desse tema já não permite que alguns olhem para o outro lado [e ignorem o assunto].

– E como a rede de médicos da Argentina contribui para esse debate?
Quando os cientistas vão contra os interesses da indústria, eles são perseguidos, deixados de lado de cargos e carreiras, apenas por publicar o que acreditam ser correto.
É preciso ter um espaço onde os médicos, os profissionais da saúde e outras disciplinas se sintam seguros de poder investigar e compartilhar a informação.
Já realizamos três congressos de saúde ambiental, com pessoas que participaram de discussões sobre transgênicos, agrotóxicos, de modelos produtivos diferentes.
Esse processo criou uma união de cientistas comprometidos com a saúde e a natureza da América Latina. A rede tem sido um espaço que permite criar e contestar, sem que essas pessoas se sintam perseguidas pela indústria, tenham apoio e espaço para pensar outra ciência que esteja a favor dos interesses do povo.



(fonte: https://saude-popular.org/?p=1708)

OMS classifica carne processada como alimento cancerígeno

A decisão foi tomada pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer e levou em consideração evidências de que o alto e frequente consumo de carne processada provoca câncer colorretal.
Por Paula Laboissière, da Agência Brasil

Carnes processadas – como salsicha, presunto, linguiça, hambúrguer e bacon – foram classificadas como alimentos cancerígenos para seres humanos, conforme divulgado hoje (26) pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Já a carne vermelha, incluindo partes do boi, porco, carneiro, bode e cavalo, foi classificada como alimento de provável risco cancerígeno.

A decisão foi tomada pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC, na sigla em inglês) e levou em consideração evidências de que o alto e frequente consumo de carne processada provoca câncer colorretal. “Especialistas concluíram que, para cada porção de 50 gramas desse tipo de carne consumida todos os dias, o risco de câncer colorretal aumenta em 18%”, alertou a agência.

As classificações foram definidas com base em mais de 800 estudos que tratam da associação de cerca de 12 tipos de câncer ao consumo de carne vermelha ou de carne processada em países e populações de dietas variadas. As evidências mais fortes, segundo a IARC, vieram de um grupo de estudo conduzido nos últimos 20 anos.

Ainda de acordo com a agência, braço da OMS, as descobertas reforçam a orientação do consumo limitado de carne entre humanos, sem deixar de levar em consideração que o alimento tem valores nutricionais.
(fonte: https://saude-popular.org/?p=1682)

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Para democratizar o acesso à comida boa


Por Julicristie M. Oliveira*
A Feira Nacional da Reforma Agrária, que começou quinta-feira e termina neste domingo (25/10), no Parque da Água Branca, em São Paulo, reúne vasta programação cultural, além da exposição e comercialização de alimentos frescos, pratos típicos de todas as regiões do país, produtos das agroindústrias, de higiene pessoal, plantas medicinais, livros/cartilhas de formação e artesanatos, dentre outros.

Cheguei no evento por volta das 14 horas. O sábado estava nublado. No caminho do metrô até o parque, imaginei que o tempo “ruim” afastaria o público. Engano meu. A Feira Nacional da Reforma Agrária estava apinhada de gente. Andei por todos os corredores. Nunca fiquei tão tranquila sendo tão empurrada. Estava contente demais de ver tanta gente, assentadas e assentados, de todos os cantos do país mostrado e comercializando os frutos de seus trabalhos.

A variedade de produtos me surpreendeu. De frutas e hortaliças sem agrotóxicos, passado por produtos das agroindústrias (farinha de mandioca, café em pó, açúcar, geleias, compotas…), artesanatos feitos de diversos materiais (palha, sementes…), produtos de higiene pessoal (sabonetes, xampus…), além das infusões (“chás”) e cremes medicinais. Uma banca vendia cerveja artesanal. Achei fantástico.

Surpresa com a riqueza de possibilidades, me lembrei muito do tema que a FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura – escolheu para o Dia Mundial da Alimentação deste ano, comemorado em 16 de outubro: “Agricultura e Proteção Social: quebrando o ciclo da pobreza rural”. Políticas públicas para agricultura não devem restringir-se às questões relacionadas à produção agrícola. É necessário também investir em proteção social para quebrar o ciclo da pobreza rural. A variedade de produtos ali vendidos deixa claro que a geração de renda pode ir além da oferta comida boa.

Mas, falando em comida boa, a riqueza de alimentos frescos exposta no evento – produtos de base agroecológica (sem agrotóxicos ou fertilizantes químicos), muitos já com certificação de orgânico – é um cutucão em nosso sistema alimentar. Em tempos em que alimentos sem agrotóxicos são considerados por muitos como “comida de rico”, a feira evidencia que a alternativa de produzir e vender alimentos de qualidade, orgânicos e com preços populares pode ser bem-sucedida. Ou seja, é possível democratizar o acesso à comida boa. Como disse um vendedor sobre o inhame que tentava me convencer a levar: “é saudável, gostoso e baratinho”. Como não sorrir?

Voltei para minha cidade (Limeira) com uma sacola cheia de alegrias: um panfleto da Escola Nacional Florestan Fernandes, duas cartilhas da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo, um Caderno de Educação em Agroecologia da Editora Expressão Popular, um pacote de açúcar mascavo, um de café, um de farinha de mandioca, um de castanha de baru, um de chá de hibisco, uma pulseirinha de palha, um sabonete de argila preta e uma camiseta estampada com o rosto da Rosa Luxemburgo. Ideológica, eu? Quem não precisa de uma ideologia para viver?

*Professora da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA/Unicamp)

Wikileaks revela insanidade da guerra americana


Surge novo dissidente anônimo. Seus vazamentos comprovam: drones de Washington matam sem qualquer chance de julgamento justo; atiram errado em nove em cada dez alvos; e acabam alimentando terror fundamentalista

Por Antonio Luiz M. C. Costa, na Carta Capital

Criado pelo empresário Pierre Omidyar e pelos jornalistas Glenn Greenwald e Laura Poitras, celebrizados pela cobertura do caso Edward Snoden, além de Jeremy Scahill, famoso pelas reportagens sobre a “Guerra ao Terror” e os mercenários norte-americanos no Oriente Medio, o site jornalístico The Intercept acaba de publicar uma reportagem devastadora intitulada The Drone Papers sobre o uso de drones pelo Pentágono. Baseia-se em documentos secretos fornecidos por uma fonte anônima — na maioria, slides de apresentações internas.

O material descreve como o governo dos Estados Unidos encobre a realidade sobre o número de civis vitimados por drones ao classificar mortos não identificados como “inimigos”, mesmo se não fossem os alvos pretendidos. Desde que sejam homens e não haja prova positiva de que eram inocentes, presume-se que eram terroristas.

Também mostra como a lista de suspeitos aparece nos terminais dos operadores de drones, ligando códigos associados com celulares para localizá-los por GPS. Revela ainda que os alvos estão longe de se limitar a membros identificados de organizações terroristas como a Al-Qaeda e do Taliban.
Qualquer um pode ser transformado em alvo se for considerado “ameaça aos interesses dos EUA ou a seu pessoal”, inclusive em países como o Iêmen e a Somália, onde Washington não tem tropas nem interesses declarados. Basta os militares selecionarem um alvo e Obama assinar uma autorização, processo que geralmente demora 60 dias.

Para identificar, caçar e matar pessoas, os militares dependem de sinais de inteligência, ou “SIGINT”, baseados em comunicações interceptadas e metadados sobre uso de computadores e celulares, de caráter reconhecidamente pouco confiável. “Isso exige uma fé cega na tecnologia”, diz a fonte anônima. “Há inúmeros casos em que eu me deparei com inteligência falha. É impressionante o número de casos em que identificadores são mal atribuídos a certas pessoas. Depois de seguir alguém por meses ou anos pensando estar perto de um alvo realmente quente, você descobre que era o tempo todo o telefone da mãe dele.”
É um retrato de uma campanha voltada para o assassinato sem riscos para estadunidenses, ao custo de violência e morte crescentes entre os afegãos. Nove em cada dez vítimas de ataques de drones não eram os alvos pretendidos. Ao matar inocentes, os bombardeios dos EUA enfurecem os sobreviventes civis e muitos deles passam a apoiar os fundamentalistas ou juntam-se às suas fileiras. Quando de fato se consegue eliminar algumas lideranças, o resultado também é contraproducente.

Como mostram estudos sérios, isso tende a tornar os grupos militantes menos seletivos e ainda mais violentos contra civis, talvez por promover membros de nível inferior com menos escrúpulos que os superiores assassinados.

Para evitar alimentar a oposição interna à guerra ao pôr em risco soldados e aviadores — alguns dos quais inevitavelmente acabariam mortos, capturados ou mutilados — Obama e o Pentágono optaram por uma tática indolor aos olhos da mídia e do público ocidental e capaz de obter êxitos imediatos de propaganda. Mas tal tática não é capaz de efetivamente frear os avanços das forças fundamentalistas. Pelo contrário, a longo prazo tende a favorecê-las e multiplicá-las, ampliando ainda mais o ódio e o rancor contra a intromissão de Washington e seus aliados.

Além disso, ao distanciar os comandantes e operadores do cenário da batalha real a ponto de reduzir os alvos inimigos a códigos impessoais, selecionados pela análise estatística de uso de comunicações, o programa cria no Pentágono uma ilusão de onipotência totalmente contraproducente. Ao mesmo tempo, perde-se a compreensão do que realmente se passa na frente de batalha, do modo de pensar do inimigo e da situação política, entendimento sem o qual é impossível vencer qualquer guerra. É abrir mão da sabedoria em nome da informação.

(fonte: http://outras-palavras.net/outrasmidias/?p=221903)

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Enem mostra que ódio ao feminismo é ódio à liberdade das mulheres

por Rogério Galindo

O ódio que o feminismo provoca em muitas pessoas é impressionante. E diz muito sobre a sociedade em que vivemos. Neste fim de semana, as provas do Enem voltaram a causar chiadeira de quem acha que o MEC usa a educação para doutrinar alunos. Tinha duplamente a ver com o feminismo.

Primeiro, uma das questões de Ciências Humanas usava um trecho de “O segundo sexo”, de Simone de Beauvoir. Citava-se o trecho inicial clássico em que a filósofa diz que ninguém “nasce mulher”. A discussão é fascinante: ela defende que as mulheres são o que são na sociedade não por questões biológicas inerentes, mas sim porque o mundo as trata de determinada maneira.

Já seria tolice infinita dizer que usar um clássico na prova era doutrinação. Mas é pior: a pergunta não pedia para que se concordasse sobre o texto, nem para que se discorresse sobre ele, nem nada. Queria apenas que o sujeito fosse capaz de identificar o texto com uma corrente de pensamento. Com o feminismo. A questão era só isso.

Era como colocar um texto de Adam Smith e pedir que se identificasse aquilo com o capitalismo. Ou de Marx e exigir que se soubesse que aquilo tem a ver com comunismo. Ou falar de Martin Luther King e perguntar se aquilo tinha ou não relação com os direitos dos negros. Não se pode fazer isso?

O tema da redação, que pedia um texto sobre “a persistência da violência contra a mulher” no Brasil fez de novo, no domingo, muita gente se exaltar. Como se a violência contra a mulher não fosse um fato, ou como se pedir que os alunos raciocinem sobre isso significasse que a prova é “de esquerda” (como alguém disse por aí, a direita deveria ficar envergonhada de se afastar de um tema como esse, entregando-o de bandeja para seus oponentes).

Mas por que o ódio contra o feminismo? Pode ser que muita gente considere algumas feministas estridentes e exageradas. Não se negue: todo movimento social pode ter exageros e estridências. Mas nesse caso podia haver um questionamento pontual contra certos argumentos, talvez. Não. Há ódio, inclusive de mulheres, às feministas em geral. Ao feminismo em si.

Tempos atrás entrevistei vereadoras e deputadas do Paraná. Só duas se disseram feministas. As outras queriam distância. Dia desses, li um comentário de uma senhora que se dizia revoltada com o feminismo porque, graças às feministas, ela era obrigada a trabalhar fora e não podia ficar em casa com os filhos. Um blogueiro chegou a escrever um texto dizendo que talvez não fosse interessante para as mulheres ganhar o mesmo que os homens no trabalho…

O ódio ao feminismo pode ter origem em certos exageros, mas parece mais que tem a ver com duas outras coisas. Um conservadorismo inerente à nossa sociedade e uma falta de compreensão do que é o feminismo.
O conservadorismo quer que as coisas mudem pouco não só em relação ao que são mas ao que eram. Isso se mudarem. Há conservadores sérios, que querem apenas evitar mudanças bruscas e revolucionárias, e há base para isso. Mas há os que usem isso como pretexto para imobilismo ou até para regressão social.

Um “conservador-fenômeno-de-Facebook” comemorava dez mil assinantes neste fim de semana dizendo que os neófitos não esperassem muito dele como conservador: ele até lavava a louça enquanto a mulher descansava. O que imagina alguém assim que é o conservadorismo? Uma regressão ao século dezoito? Isso, na verdade, já é outra coisa: reacionarismo.

Mas parece que o outro problema é igualmente grave: o desconhecimento do que é o feminismo. Pensam talvez que seja algo de outro mundo, que as mulheres querem odiar aos homens, que querem ser superiores, que querem mais direitos do que os outros. Pode até haver algum exagero do gênero, claro. Sempre há.
Mas feminismo, se for resumir em uma linha, poderia ser o seguinte. Que as mulheres não sejam obrigadas a ter limitações extras simplesmente por serem mulheres.

Quem odeia o feminismo normalmente odeia, de fato, é a liberdade das mulheres.
É pedir demais? É doutrinação falar disso?

(fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/caixa-zero/enem-mostra-que-odio-ao-feminismo-e-odio-a-liberdade-das-mulheres/)

Masterchef: Violência sexual é coisa séria

por Leonardo Sakamoto, em seu blog.

Depois da enxurrada de chorume que tomou conta das redes sociais, incitando violência sexual contra uma participante de 12 anos do programa “Masterchef Júnior'', da TV Bandeirantes, reações mostraram que o chorume é regra, não exceção.

A que teve mais impacto foi promovida pelo Olga – um think tank com o objetivo de empoderar mulheres por meio da informação, coordenada pela jornalista Juliana de Faria. Dezenas de milhares de mulheres foram provocadas para contar a história do #primeiroassedio que sofreram, compartilhando-as através dessa hashtag nas redes sociais.

E o resultado comprova não apenas que a violência a que menina foi vítima está presente em todo o país e continua sendo vista como “brincadeira'', “piada'' ou, pior, “elogio'' ou “carinho''. Mas também que é maior o número de mulheres que não mais ficam caladas diante disso.

Se o debate público fosse mais qualificado, um homem pensaria duas vezes antes de fazer comentários machistas e preconceituosos com medo de ser humilhado por outras pessoas no Facebook, no Twitter ou no WhatsApp. Ou de publicar, curtir e compartilhar vários tipos de violência sexual.

A sensação de anonimato e o sentimento de impunidade diante da tela do computador ou do smatphone contribuem para o cenário, mas há algo mais embaixo.

O discurso violento e opressor – mais palatável e que mexe com nossos sentimentos mais primitivos e simples – ecoa e repercute. Esse discurso basta em si mesmo. Não precisa de nada mais do que si próprio para ser ouvido, entendido e absorvido. Faz sucesso na rede. Cola rápido, cola fácil, tornando-se vetor para alcançar fama em um ambiente onde grassa a ignorância sobre o tema.

Prova disso é que houve figuras públicas que fizeram gracejo da iniciativa do Olga, difundindo postagens que apenas reforçaram a violência contra mulheres e provaram sua misoginia. Pois é fácil rir dos mais fracos e vulneráveis. Difícil é ver as mesmas pessoas fazendo gracejo contra ricos e poderosos que pagam seu salário.

“Qualificação'' não significa elitização, muito pelo contrário. Não é algo chato, hipercodificado, barroco ou acadêmico e sim que ajude o cidadão a perceber a complexidade do mundo em que vive e o ajude a construir o seu sentido das coisas.

Essa qualificação, é claro, vem de um processo que envolve escolas, famílias, sociedade civil e mídia. E pode ser lento porque passa pela formação de visão de mundo. Mas deve ser promovido sob o risco de estarmos gestando, com a ajuda da internet, mais uma geração de monstrinhos.

O Observatório Proxi (Projeto Online contra a Xenofobia e a Intolerância), impulsionado pelo Instituto de Direitos Humanos da Catalunha e pela organização espanhola United Explanations, realizou uma pesquisa sobre o ódio na rede, buscando formas de reduzir a aceitação do discurso intolerante. Já trouxe os seus resultados aqui.

Na avaliação dos pesquisadores, fomentar diálogos construtivos em debates violentos e estimular a participação de leitores tolerantes funciona.

Ou seja, é no momento em que pessoas conscientes se calam, cansadas da intolerância, da violência e da opressão, que a intolerância, a violência e a opressão encontram terreno sem resistência para avançar.
(fonte: http://altamiroborges.blogspot.com.br/2015/10/masterchef-violencia-sexual-e-coisa.html)

sábado, 24 de outubro de 2015

A leitura por prazer, um programa para salvar a escola

por Eloesio Paulo

Ao mesmo tempo em que pululam queixas contra a desimportância crescente da literatura frente à explosão quantitativa, nos últimos 20 anos, das opções anticulturais que lhe fazem concorrência – televisão e Internet, especialmente –, qualquer observador atento notará que, ao menos no Brasil, tem-se firmado o consenso de que as pessoas precisam, com urgência, ler mais. Mas falamos de um consenso visivelmente perplexo, pois traz embutida a desconfiança de que há qualquer coisa muito mais complicada do que supõe a bem-intencionada promoção de feiras do livro, concursos literários, festivais e eventos semelhantes, em geral episódicos e de reduzida capilaridade. Longe de oferecer respostas simples ao problema, este pequeno ensaio pretende expor, sobretudo para escolas e pais empenhados em promover a leitura entre crianças e jovens, uma compreensão organizada pela experiência no ensino de literatura e pela reflexão incomodada com o fato de elementos importantes para a discussão serem, usualmente, escamoteados por quem pretende conduzi-la, sobretudo no âmbito das escolas e órgãos públicos afetos ao problema.
Obras recentes como o livro A literatura em perigo, de Tvetan Todorov, são um ponto de partida viável para a reflexão teórica. No mínimo, iluminam aspectos daquilo que poderíamos chamar desletramento literário ligados ao surgimento de sociedades cujo horizonte é pautado, de maneira crescente e até assustadora, pelas chamadas “tecnologias de informação e comunicação”, entre as quais, quando se fala de um país que já tem muito mais de um celular por habitante, avultam em importância as chamadas “redes sociais”. Mas tem faltado a muitas dessas discussões uma visada histórica, começando pela consciência de que o ser humano e a cultura ocidental existiram, respectivamente, milhões e milhares de anos antes do surgimento da rede mundial de computadores. Não é só a literatura que está em perigo, mas a própria noção de ser humano construída à custa de uma dolorosa depuração das sociedades ocidentais, as quais, goste-se delas ou não, têm mais qualidades do que as oficialmente pautadas pela ignorância e pela superstição.
Um modo seguro de encarar com estreiteza mental o problema da leitura é ignorar que existe uma opção entre o livro e as outras “diversões”. E que, havendo opção, também existe oposição. Não é uma assertiva dogmática; é que o dia tem apenas 24 horas, nas quais cada indivíduo precisa fazer que caibam todas as suas atividades. Sendo assim, supondo que algumas destas sejam irrecusáveis, como dormir, alimentar-se e satisfazer as necessidades fisiológicas (para não falar da escola e do trabalho, incluído o tempo gasto no transporte de ida e volta para eles), resta impossível negar que o número de horas disponíveis é restrito. Ora, se alguém reconhece a importância da leitura e ao mesmo tempo se sente, pela força inercial do pertencimento a um grupo, compelido a gastar diariamente algumas horas na Internet, provavelmente terá que optar. Seria possível repartir o tempo, mas temos visto não ser isso o que ocorre na maioria dos casos.
A explicação mais óbvia para a opção pela Internet, ainda mais depois que ela migrou para o celular, é a lei do menor esforço. Isso já ocorria e ainda ocorre grandemente na escolha entre leitura e televisão, mas agora com os adultos menos escolarizados e de menor renda. O problema tem aspectos muito mais complexos, mas começa pelo fato de que não existe um verdadeiro interesse social pela leitura, conduzindo facilmente ao consenso indicado pelos eventos literários, cujo crescimento nos últimos anos vai na contramão do alarme contra a redução da leitura.
A sociedade do espetáculo no pós-guerra e, mais recentemente, a sociedade digital não percebem, exceto aqueles que realmente as comandam, que pela sua lógica o tempo das pessoas precisa ser destinado ao trabalho indireto. Reciclando uma ideia de Robert Kurz já não muito nova, vamos aqui definir como trabalho indireto aquelas atividades em que, pensando desfrutar de momentos de lazer, as pessoas de fato estão trabalhando para que grandes empresas faturem bilhões de dólares. Assim é quando milhões e milhões de brasileiros gastam tardes de domingo – que jamais terão a chance de recuperar – assistindo ao Domingão do Faustão ou ao Programa Sílvio Santos; assim é quando uma criança de dez anos passa horas vidrada na tela de um smartphone, o que só traz proveito efetivo para as fábricas de celulares e operadoras de telefonia.
Em resumo, as crianças brasileiras, de classe média para cima, estão trabalhando sem saber e sem que seus pais se deem conta disso. Elas são proibidas, num país que dá como inquestionável o direito dos menores à infância, de ajudar duas horas por dia na loja da família, mas podem trabalhar indiretamente para a Nokia ou a TIM. Obviamente a condição das crianças mais pobres, ou das que vivem na Índia ou na China, é muito pior; mas isso não nos dá o direito de negar o óbvio: meninos e meninas que não precisam de celular, porque este não é um brinquedo e eles nunca atendem à ligação dos pais, estão trabalhando de sol a sol para empresas transnacionais sem que nenhum conselho tutelar reclame disso.
Quando lemos a lei, percebemos claramente o que ela diz: a escola é o único “trabalho” admitido para as crianças e os jovens. Mas aí entram vários outros problemas anteriores ao surgimento do smartphone, a começar pela baixa qualidade da escola brasileira. Do ideal civilizatório de cidadãos esclarecidos, pulamos direto para a produção em série de candidatos a técnicos aos quais, muitas vezes, inteligência e lucidez não fazem nenhuma falta. Do Ministério da Instrução Pública para um MEC  impregnado do democratismo ingênuo que considera Rubem Alves densa referência filosófica, algo de muito importante se perdeu. Da escola para poucos onde muitos tomavam bomba à “escola para todos” onde poucos aprendem alguma coisa, o país trocou a possibilidade de ter uma elite intelectual pela formação de “cidadãos” que só têm direitos e nenhum dever, e por aí vamos. Signo infalível dessa mudança foi a substituição do latim, língua “morta”, pelo inglês vivíssimo que não passa nunca além do verbo to be.
O resultado de tudo isso não foi um país mais inteligente. Basta ver o que passa nas principais redes de TV, o que toca em quase 100% das emissoras de rádio, para concluir que produzimos idiotas aos milhões – pois é preciso formar um grande público que aceite consumir tanta porcaria. E esse foi o “paladar” cultural transferido para a diversão via Internet. O principal efeito da massificação do ensino foi a liberação de um tempo cada vez mais longo para as crianças trabalharem indiretamente.
Começaremos a entender o desprestígio da leitura quando entendermos qual é o papel das famílias, da escola e do professor nesse processo. Mas essa compreensão está, no máximo, difusa no desespero com que pais e mestres tentam resgatar o hábito da leitura, muitas vezes misturando-o com aquilo que é exatamente o seu contrário, como ao reconhecer “poesia” em letras de funk nas quais ressoa o coração das trevas da nossa mais abissal e generalizada ignorância.
A família e a escola não podem fazer muito a respeito, pelo menos até que compreendam: a indústria cultural, da qual o WhatsApp e o Facebook são os sucedâneos mais poderosos, tem como único objetivo explorar o trabalho indireto de seus usuários. Quem acha que está “se divertindo” enquanto trabalha de graça é burro, simplesmente burro.
Surge, então, outro problema subsidiário, que é a redução veloz da importância da família e da escola como aparelhos ideológicos. Com essa expressão, Louis Althusser definia no final dos anos 1960 as instituições capazes de influir mais ou menos poderosamente na formação da identidade de alguém.
Quanto à família, em muitos casos simplesmente deixou de existir. Alguns pensam que ela está sendo reconfigurada, mas se esquecem de que a evolução das espécies é muito mais lenta que a corrida tecnológica. Assim, a erosão da autoridade dos pais não é algo tão simples quanto parece, e os consultórios de psicologia estão lotados exatamente porque não é possível produzir saltos e lacunas na formação de uma subjetividade sem, ao mesmo tempo, produzir desorientação. Se faltam pontos de referência onde a psique em formação tende instintivamente a procurá-los, é certo que surgirão substitutos (traficante ou Malhação, a diferença não é tão grande quanto parece).
Quanto à escola, em primeiro lugar vem a proletarização do professor. Se a falta de prestígio social de quem ensina chegou a torná-lo um coitadinho, como esperar que ele seja respeitado por quem está em busca de heróis? É claro, existem muitos profissionais do ensino que não se rebaixam à condição simbólica de vítimas, mas exceções normalmente confirmam a regra.
Imaginemos que o professor fosse bem remunerado e tivesse uma carreira decente. Ainda assim, precisaria de um reforço em sua formação, porque dar aulas hoje não é mais como antigamente; é necessário aprender a usar os novos recursos, e poucos mestres estão aptos mesmo a produzir boas apresentações em Powerpoint – não por sua culpa, mas porque esse tipo de instrumentação não recebe a devida ênfase nos cursos de licenciatura. Contudo, fique a ressalva: usar o Facebook tem mais chance de ser uma rendição ao inimigo que de trazer reais contribuições à qualidade de uma aula. Se continuar lidando de modo passivo com a concorrência desses novos aparelhos ideológicos tão sedutores, porque fundados na propaganda agressiva e na lei do menor esforço, a escola se tornará cada dia mais obsoleta e desinteressante.
Mas, quaisquer que sejam as críticas que façamos aos pais e aos professores, há uma diferença que não pode ser esquecida. É que, mesmo errando tanto, eles costumam ter com as crianças e os jovens uma relação profundamente afetiva e existencial: erram querendo acertar, desejam o bem daqueles que estão sob seus cuidados. Isso não ocorre com os aparelhos ideológicos regidos pela lógica industrial, cujo único objetivo é transformar o indivíduo em traço a mais no gráfico dos lucros planejados.
Considerando tais fatos, talvez seja menos difícil entender a desorientação de pais e mestres quando se trata da tentativa de promover a leitura. Eles sabem, muitas vezes por puro instinto, que ler ajudar a formar pessoas mais preparadas para a vida. Só não sabem por onde começar, porque todos os caminhos parecem já trilhados e comprovadamente fadados ao fracasso.
Não existem respostas fáceis, mas talvez o problema fique mais claro se as pessoas se empenharem de fato em compreendê-lo. Para os pais, isso poderia começar com esta pergunta: eu coloquei filhos no mundo para que sejam escravos de algo ou de alguém? Isso porque, sem exagero, a escravidão ao Facebook tem chegado em numerosos casos a lembrar uma daquelas possessões diabólicas dos filmes de terror.
Para os professores, a pergunta inicial poderia ser: eu quero ser um frustrado como pessoa e como profissional, passando o resto da vida com a certeza de que faço um trabalho inútil?
Só a partir de perguntas como essas parece ser possível, na atualidade, discutir o problema da leitura. Como não cabe aqui a abordagem de todos os aspectos do problema, listamos a seguir alguns pontos que, a nosso ver, o professor e a escola precisam considerar.
  1. A leitura de textos literários não interessa apenas aos professores de Português. Todas as disciplinas têm a ganhar se os sujeitos forem capazes de pensar e expressar-se com clareza, a começar pela interpretação correta dos enunciados em provas e exercícios.
  2. Aulas de gramática não podem ser uma forma de engabelar o aluno só porque envolvem menos dificuldades, no espaço da sala de aula, que atividades de leitura e produção de textos.
  3. Aulas de gramática podem ser muito interessantes; exercícios gramaticais são, quando bem elaborados e conduzidos, um indispensável treinamento da capacidade lógica – ao contrário do que parece pensar a maioria dos “educadores” responsáveis pela formulação de políticas de ensino no Brasil.
  4. A decoreba (acentuação, ortografia) é importante e pode ser promovida por meio de bem-humorados exercícios de fixação, mas não deveria nunca chegar ao ensino médio. Em nenhuma disciplina.
  5. O tempo “inútil” dispendido em memorizar regras, como aquele gasto para aprender tabuada, é muito mais útil do que a maioria absoluta das atividades hoje exercidas pelas crianças e pelos jovens fora do horário escolar.
  6. Redações não corrigidas nem anotadas são trabalho perdido, para o aluno e para o professor.
  7. É ridículo ser luddita, mas igualmente ridículo fazer coro à ideologia tecnicista. O computador não liberta ninguém, é uma ferramenta que exige habilidades adquiridas com antecedência, especialmente a capacidade de ler textos de maneira crítica e seletiva. Computador na mão de analfabeto é, guardadas as proporções, como fuzil automático na mão de psicopata.
  8. A leitura de textos literários é uma atividade civilizatória sem possibilidade de substituição. Nem por filmes nem por coisa nenhuma. Conversar com Dante Alighieri ou Clarice Lispector, em vez de bater papo com o coleguinha da mesma idade e, portanto, portador das mesmas limitações de conhecimento de si e do mundo, é ter acesso ao que produziram algumas das mentes (e sensibilidades) mais privilegiadas que já passaram por este mundo.
  9. “Conversar” com pessoas tão brilhantes, por meio da leitura de suas obras, ajuda alguém a ser mais lúcido e a pensar de maneira autônoma, tendo com isso muito mais chance de encontrar soluções para os problemas da vida.
  10. Em oposição, a TV promove dia e noite a estupidez e a futilidade como se fossem as únicas opções de divertimento. A indústria cultural é, entre todas as indústrias, a que tem menor compromisso com a qualidade do que produz. Isso está comprovado por um século de História, basta verificar para comprová-lo.
  11. A tecnologia pode ser muito útil para quem tem consciência de que o mundo existia antes dela. Para os ignorantes, tende a ser uma perigosa armadilha.
  12. O professor pode ser, em larga medida, vítima de um consenso social que apenas simula ter interesse na promoção da inteligência. Porém as maiores vítimas são as crianças e os jovens, pois eles sempre acharão que não existe outro mundo possível, exceto se alguém lhes falar sobre essa possibilidade.
  13. O professor precisa dar o exemplo, sendo um leitor empolgado e qualificado. Ninguém é convencido a ler se não percebe que pessoas admiráveis realmente têm prazer com a leitura.
  14. Professores precisam inteirar-se, filosoficamente, de sua função como produtores de inteligência, e não conformar-se ao papel de tocadores burocráticos do cotidiano escolar.
  15. Uma escola e um professor que confirmam aquilo que diz o senso comum criado pela indústria cultural são inúteis e merecem o desapreço que lhes dedicarem seus alunos.
  16. A estratégia número um de promoção da leitura é não transformá-la em obrigação: a criança e o jovem precisam ser levados a perceber que, se tantas pessoas têm prazer na leitura, não deve ser tão difícil descobri-lo pessoalmente. Ficha de leitura, nem pensar; existem muitos modos mais inteligentes de checar se alguém leu um livro.
  17. É uma ingenuidade panglossiana pensar que qualquer leitura tem valor. Best sellers fabricados para lisonjear a ignorância das crianças, blogs de “funfic” nos quais Justin Bieber é mitificado como herói devasso e drogado não passam de derivações acanalhadas do que o cinema e a TV já produziram de pior.
  18. Escolas precisam ter bibliotecas diversificadas, as quais, por sinal, custam muito menos que um laboratório de informática e demoram muito mais para se tornar desatualizadas. Pais e professores têm o dever de exigi-lo dos diretores e proprietários de escola que não cumprem espontaneamente um dever tão elementar.
  19. A oferta de textos literários deve ser progressiva e começar por textos curtos, lúdicos e engraçados. É indesejável impor tarefas enfadonhas e desestimulantes associadas à leitura; a sensibilidade do professor deve permitir-lhe avaliar os alunos individualmente, não pela discutível média definida nos programas de ensino.
  20. A oferta também deve ser, na medida do possível, individualizada. É urgente superar a fragmentação da vivência escolar, reflexo de uma divisão de tarefas de inspiração fordista que nada tem a ver com o indivíduo humano, por natureza irredutível a médias abstratamente definidas.
  21. Os alunos devem ter uma quota mínima de leitura por mês, em casa e na escola. É totalmente indesejável haver descontinuidade nesse processo, e aqui entra o papel de diretores, supervisores e coordenadores: na escola, a eficácia do ensino da leitura implica um planejamento inteligente.
  22. Uma criança que leu oito ou dez livros por ano terá aprendido muito mais que a maioria dos “bons” alunos bem adaptados a um conceito behaviorista de aprendizagem.
  23. O professor precisa convencer-se e, na medida do possível, convencer a comunidade escolar de que a literatura, representando pelos ângulos mais variados a condição humana, aparelha o leitor para tornar-se capaz de imaginar soluções. Um bom leitor é muito menos passível de ver-se encurralado pelos problemas que surgirão ao longo de sua vida.
  24. Esse ser humano versátil e aberto ao conhecimento interessa a todos, não apenas ao professor de literatura: tem maior prazer no aprendizado, disposição para as relações humanas, capacidade de interpretar situações e, portanto, de produzir conhecimento em vez de simples e passivamente absorvê-lo.
  25. A capacitação dos professores deve ser continuada, pois as licenciaturas ainda os preparam muito mal para o ensino. Há por aí muita teoria furada, muito idealismo e pouco pé no chão.
  26. O texto literário deve ser contextualizado, referido ao mundo atual, e não apresentado como coisa antiga que perdeu a validade por tratar de outras épocas e numa linguagem obsoleta. José de Alencar? Só depois que o aluno se tenha tornado um leitor crítico, autônomo e espontâneo.
  27. O estudo da literatura está condenado ao fracasso quando insiste – e é isso que ocorre na maioria dos livros didáticos – em subordinar-se a uma perspectiva historicista. A periodização literária deve resultar da leitura de textos que sejam interessantes para o estudante, e fazê-los interessantes depende muito de o professor ter conhecimento e estratégica didática.
  28. Talvez fosse o caso de rebatizar a disciplina Literatura, pois esse nome já se tornou por demais associado à enfiada de datas e autores antigos apresentados ao estudante sem qualquer mediação com o mundo contemporâneo.
Ao contrário do que pode sugerir o título, este ensaio não é uma receita pronta e acabada. É apenas a síntese provisória de bons anos de experiência e reflexão. Na melhor das hipóteses, tem a pretensão de fazer alguns colegas atentarem para a grande lacuna filosófica e metodológica das tentativas de oferecer soluções para a falência da escola brasileira. Vamos concluí-lo, portanto, com duas citações que apontam para um futuro desenvolvimento do raciocínio aqui esboçado. A primeira, de Marisa Lajolo, que intitulou assim um artigo já clássico: “O texto não é pretexto”. Quer dizer, nada vai dar certo se as pessoas responsáveis pela promoção da inteligência não se convencerem de que a literatura é um discurso radicalmente autônomo, talvez o último reduto da efetiva liberdade de pensar e sentir: não deve ser usada para finalidades ideológicas nem reduzida a instrumento ou caminho para validar qualquer outro discurso. Muito menos como subsidiária do ensino de gramática.
A segunda citação é do poeta norte-americano Ezra Pound, que definiu a poesia como “conversa entre homens inteligentes”. O conceito vale para todos os bons textos literários: do outro lado está uma pessoa que tem ou teve grande capacidade de iluminar nossa compreensão do mundo, de nós mesmos e do papel da linguagem nisso tudo. É uma grande burrice perder a oportunidade de conversar com um sujeito que, nos dias de hoje, a produção industrial de consciências teleguiáveis tem tornado cada vez mais raro.
* ELOÉSIO PAULO é professor da Universidade Federal de Alfenas (MG). Publicou diversos livros de poesia e crítica literária, entre eles: Os 10 pecados de Paulo Coelho, Jornal para eremitas e Parque de impressões (poemas para crianças, selecionado para edição pelo PNBE/MEC).

(fonte: https://espacoacademico.wordpress.com/2015/10/24/a-leitura-por-prazer-um-programa-para-salvar-a-escola/)

Saúde: a Folha esconde o que o Datafolha revela


Pesquisa demonstra: Medicina Privada é pior avaliada pela população que atendimento do SUS. Mas jornal — repleto de publicidade dos planos de saúde — procura disfarçar os dados…

Por Ricardo Rodrigues Teixeira*, na Carta Maior

Nova pesquisa DataFolha indica (publicada na Folha de São Paulo do dia 13 deste mês), mais uma vez, a péssima avaliação da saúde no país. Mas há aspectos importantes dessa pesquisa que, ao apresentar e analisar os dados, o jornal Folha de São Paulo faz contorcionismos para ocultar. Por exemplo, que a saúde privada é pior avaliada que o SUS. Vejamos.

Lendo os dados divulgados notamos que seis em cada dez brasileiros (ou seja, 60%), acham a saúde péssima. Quando só se avalia apenas o SUS, o numero cai para 54% de péssimo.

Quando se avalia a “saúde em geral”, 24% dá nota zero; quando se avalia apenas o SUS, 18% dá nota zero.

A matéria evita comentar (mas pode ser lido nos dados que disponibiliza) que 2% dá nota 10 para a “saúde em geral” e 3% dá nota 10 quando se avalia só o SUS.

E a diferença mais notável: 11% dá nota maior que 7 para a “saúde em geral” e 18% dá nota maior que 7 para o SUS.

Conclusão óbvia, cuidadosamente evitada pela Folha na análise dos resultados: a saúde privada puxa significativamente a avaliação da “saúde em geral” para baixo!

Mas, excetuando o esclarecimento no primeiro parágrafo de que o levantamento envolve a rede pública e privada, no resto da matéria a expressão “saúde privada” nem é mencionada. A comparação é sempre entre a “saúde em geral” e o SUS. Afinal, o objetivo é sempre o mesmo: associar a “péssima avaliação da saúde” ao nome SUS e evitar, a todo custo, de associá-la ao setor privado, mesmo quando é ele que mais contribui para a má avaliação da saúde no país.

Se fosse um jornalismo sério e honesto, lembraria ainda o quanto o setor privado gasta para prestar um mal atendimento a 25% da população (parcela aproximada da população brasileira que tem plano de saúde privado e que gasta 52,5% de todos os recursos gastos com saúde no país, segundo dados recentes da Organização Mundial de Saúde; ou ainda, cerca de R$ 2.200 per capita) e o quanto o setor público tem de recursos para dar atendimento a 83% da população (percentual que referiu ter utilizado o SUS segundo dados deste levantamento do DataFolha) e garantir a saúde coletiva através de medidas que beneficiam indistintamente toda a população (vacinas, vigilância epidemiológica etc.) e, mesmo assim, conseguir ser melhor avaliado (47,5% do total de recursos gastos com saúde no país ou aproximadamente R$ 1.000 per capita).

Outro fato que se pode deduzir dos dados, e que também não é destacado pela Folha, é que se 25% têm plano de saúde e 83% utilizaram o SUS, então o SUS acaba sendo utilizado por muita gente que tem plano de saúde. E aí, se fosse um jornalismo sério e honesto, ela também faria questão de destacar o conhecido calote que os planos de saúde aplicam no SUS, referente aos atendimentos de urgência e emergência, ao tratamento de câncer, transplantes, hemodiálise, entre outros, que os planos negam cobertura e o SUS acaba assumindo (apenas 25% dos valores devidos são ressarcidos ao Sistema Único de Saúde, dessa parte 20% se perde com recursos da justiça, tramitação, prescrição etc.).

Explicitar esses dados reais daria ainda maior dramaticidade à melhor avaliação do SUS comparada à avaliação geral da saúde no país. E nesse caso, a chamada mais justa para matéria seria: “SUS faz mais e melhor com menos recursos que a saúde privada”.

Mas, aparentemente, este jornalismo não é sério nem honesto. Ele não pode ser quando tem compromissos claros com os setores que fazem da saúde um lucrativo ramo de negócios e não um bem público e um direito universal.

*Ricardo Rodrigues Teixeira é médico e professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP

Novos livros

A Editora Contexto apresenta mais um lançamento da coleção História na Universidade, este escrito pelo professor Carlos Fico e fundamental para compreendermos melhor o Brasil das últimas décadas.
O livro já está disponível, aproveite!
  História do Brasil Contemporâneo
da morte de Vargas aos dias atuais
  Carlos Fico
 
É impossível entender o Brasil sem conhecer sua história. Do suicídio de Vargas, em 1954, ao governo Lula, o historiador Carlos Fico, da UFRJ, relata os acontecimentos mais importantes da segunda metade do século XX até este início do XXI.
O livro, com texto direto e claro, proporciona uma visão panorâmica social, econômica e, principalmente, política do nosso país. A era JK, a renúncia de Jânio Quadros e a ditadura militar, assim como a redemocratização e os governos pós-ditadura ganham especial destaque.
Os episódios-chave para o nosso país no período, seus antecedentes e suas consequências são, enfim, examinados por um olhar analítico que só a História pode oferecer.


preço: 35,00
Pode-se comprar pelo site da editora: http://editoracontexto.com.br/historia-do-brasil-contemporaneo.html?historia-br-contemp

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A Editora Contexto apresenta a primeira reconstituição detalhada das operações militares de Stalingrado – das grandes manobras do cerco preparadas pelo Estado-Maior do Exército Vermelho, a partir de outubro de 1942, até os combates de rua, travados prédio por prédio no coração de uma das maiores cidades industriais soviéticas.
O livro já está disponível, aproveite!

  Stalingrado
1942 - o início do fim da Alemanha nazista
  Alexander Werth
 
Era a batalha do tudo ou nada: se os nazistas conquistassem Stalingrado, provavelmente venceriam a Segunda Guerra Mundial. Acuados, os soviéticos pagaram caro pela resistência encarniçada. Milhares de vidas foram ceifadas no trágico embate. De julho de 1942 até fevereiro do ano seguinte, o mundo acompanhou como pôde o encontro dos dois grandes exércitos. O autor Alexander Werth, um dos pouquíssimos jornalistas estrangeiros a cobrir a frente oriental, teve um olhar privilegiado. Assim que os alemães capitularam, Werth chega a uma Stalingrado ainda traumatizada e nos relata com vivacidade tudo o que observa. Além de ser testemunha ocular, entrevistou oficiais, especialistas militares e teve acesso a documentos originais. Stalingrado continua sendo o livro mais importante publicado sobre uma das mais sangrentas e decisivas batalhas da Segunda Guerra Mundial.

preço: 49,90
pode-se comprar pelo site da editora:
http://editoracontexto.com.br/stalingrado.html?stalingrado-HI 

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Janelas italianas - Veneza

Encerrando a série de fotos, as janelas de Veneza, quase sempre muito floridas.























Todas as fotos: RMF e MISF

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Rodando pela Itália – As janelas italianas




Sem texto: só para admirar! Janelas de Siena, Sirmione, Padova, Ferrara, Perugia, Assis (todas as fotos: RMF)

Siena> 





Sirmione>

















Padova>



Ferrara>



















Perugia >

















Assis >