por Eloesio Paulo
Ao mesmo tempo em que pululam queixas contra a desimportância
crescente da literatura frente à explosão quantitativa, nos últimos 20
anos, das opções anticulturais que lhe fazem concorrência – televisão e
Internet, especialmente –, qualquer observador atento notará que, ao
menos no Brasil, tem-se firmado o consenso de que as pessoas precisam,
com urgência, ler mais. Mas falamos de um consenso visivelmente
perplexo, pois traz embutida a desconfiança de que há qualquer coisa
muito mais complicada do que supõe a bem-intencionada promoção de feiras
do livro, concursos literários, festivais e eventos semelhantes, em
geral episódicos e de reduzida capilaridade. Longe de oferecer respostas
simples ao problema, este pequeno ensaio pretende expor, sobretudo para
escolas e pais empenhados em promover a leitura entre crianças e
jovens, uma compreensão organizada pela experiência no ensino de
literatura e pela reflexão incomodada com o fato de elementos
importantes para a discussão serem, usualmente, escamoteados por quem
pretende conduzi-la, sobretudo no âmbito das escolas e órgãos públicos
afetos ao problema.
Obras recentes como o livro
A literatura em perigo, de
Tvetan Todorov, são um ponto de partida viável para a reflexão teórica.
No mínimo, iluminam aspectos daquilo que poderíamos chamar
desletramento literário
ligados ao surgimento de sociedades cujo horizonte é pautado, de
maneira crescente e até assustadora, pelas chamadas “tecnologias de
informação e comunicação”, entre as quais, quando se fala de um país que
já tem muito mais de um celular por habitante, avultam em importância
as chamadas “redes sociais”. Mas tem faltado a muitas dessas discussões
uma visada histórica, começando pela consciência de que o ser humano e a
cultura ocidental existiram, respectivamente, milhões e milhares de
anos antes do surgimento da rede mundial de computadores. Não é só a
literatura que está em perigo, mas a própria noção de ser humano
construída à custa de uma dolorosa depuração das sociedades ocidentais,
as quais, goste-se delas ou não, têm mais qualidades do que as
oficialmente pautadas pela ignorância e pela superstição.
Um modo seguro de encarar com estreiteza mental o problema da leitura
é ignorar que existe uma opção entre o livro e as outras “diversões”. E
que, havendo opção, também existe oposição. Não é uma assertiva
dogmática; é que o dia tem apenas 24 horas, nas quais cada indivíduo
precisa fazer que caibam todas as suas atividades. Sendo assim, supondo
que algumas destas sejam irrecusáveis, como dormir, alimentar-se e
satisfazer as necessidades fisiológicas (para não falar da escola e do
trabalho, incluído o tempo gasto no transporte de ida e volta para
eles), resta impossível negar que o número de horas disponíveis é
restrito. Ora, se alguém reconhece a importância da leitura e ao mesmo
tempo se sente, pela força inercial do pertencimento a um grupo,
compelido a gastar diariamente algumas horas na Internet, provavelmente
terá que optar. Seria possível repartir o tempo, mas temos visto não ser
isso o que ocorre na maioria dos casos.
A explicação mais óbvia para a opção pela Internet, ainda mais depois
que ela migrou para o celular, é a lei do menor esforço. Isso já
ocorria e ainda ocorre grandemente na escolha entre leitura e televisão,
mas agora com os adultos menos escolarizados e de menor renda. O
problema tem aspectos muito mais complexos, mas começa pelo fato de que
não existe um verdadeiro interesse social pela leitura, conduzindo
facilmente ao consenso indicado pelos eventos literários, cujo
crescimento nos últimos anos vai na contramão do alarme contra a redução
da leitura.
A sociedade do espetáculo no pós-guerra e, mais recentemente, a
sociedade digital não percebem, exceto aqueles que realmente as
comandam, que pela sua lógica o tempo das pessoas precisa ser destinado
ao
trabalho indireto. Reciclando uma ideia de Robert Kurz já
não muito nova, vamos aqui definir como trabalho indireto aquelas
atividades em que, pensando desfrutar de momentos de lazer, as pessoas
de fato estão trabalhando para que grandes empresas faturem bilhões de
dólares. Assim é quando milhões e milhões de brasileiros gastam tardes
de domingo – que jamais terão a chance de recuperar – assistindo ao
Domingão do Faustão ou ao
Programa Sílvio Santos; assim é quando uma criança de dez anos passa horas vidrada na tela de um
smartphone, o que só traz proveito efetivo para as fábricas de celulares e operadoras de telefonia.
Em resumo, as crianças brasileiras, de classe média para cima, estão
trabalhando sem saber e sem que seus pais se deem conta disso. Elas são
proibidas, num país que dá como inquestionável o direito dos menores à
infância, de ajudar duas horas por dia na loja da família, mas podem
trabalhar indiretamente para a Nokia ou a TIM. Obviamente a condição das
crianças mais pobres, ou das que vivem na Índia ou na China, é muito
pior; mas isso não nos dá o direito de negar o óbvio: meninos e meninas
que não precisam de celular, porque este não é um brinquedo e eles nunca
atendem à ligação dos pais, estão trabalhando de sol a sol para
empresas transnacionais sem que nenhum conselho tutelar reclame disso.
Quando lemos a lei, percebemos claramente o que ela diz: a escola é o
único “trabalho” admitido para as crianças e os jovens. Mas aí entram
vários outros problemas anteriores ao surgimento do
smartphone,
a começar pela baixa qualidade da escola brasileira. Do ideal
civilizatório de cidadãos esclarecidos, pulamos direto para a produção
em série de candidatos a técnicos aos quais, muitas vezes, inteligência e
lucidez não fazem nenhuma falta. Do Ministério da Instrução Pública
para um MEC impregnado do democratismo ingênuo que considera Rubem
Alves densa referência filosófica, algo de muito importante se perdeu.
Da escola para poucos onde muitos tomavam bomba à “escola para todos”
onde poucos aprendem alguma coisa, o país trocou a possibilidade de ter
uma elite intelectual pela formação de “cidadãos” que só têm direitos e
nenhum dever, e por aí vamos. Signo infalível dessa mudança foi a
substituição do latim, língua “morta”, pelo inglês vivíssimo que não
passa nunca além do verbo
to be.
O resultado de tudo isso não foi um país mais inteligente. Basta ver o
que passa nas principais redes de TV, o que toca em quase 100% das
emissoras de rádio, para concluir que produzimos idiotas aos milhões –
pois é preciso formar um grande público que aceite consumir tanta
porcaria. E esse foi o “paladar” cultural transferido para a diversão
via Internet. O principal efeito da massificação do ensino foi a
liberação de um tempo cada vez mais longo para as crianças trabalharem
indiretamente.
Começaremos a entender o desprestígio da leitura quando entendermos
qual é o papel das famílias, da escola e do professor nesse processo.
Mas essa compreensão está, no máximo, difusa no desespero com que pais e
mestres tentam resgatar o hábito da leitura, muitas vezes misturando-o
com aquilo que é exatamente o seu contrário, como ao reconhecer “poesia”
em letras de
funk nas quais ressoa o coração das trevas da nossa mais abissal e generalizada ignorância.
A família e a escola não podem fazer muito a respeito, pelo menos até que compreendam: a indústria cultural, da qual o
WhatsApp e o
Facebook
são os sucedâneos mais poderosos, tem como único objetivo explorar o
trabalho indireto de seus usuários. Quem acha que está “se divertindo”
enquanto trabalha de graça é burro, simplesmente burro.
Surge, então, outro problema subsidiário, que é a redução veloz da importância da família e da escola como
aparelhos ideológicos.
Com essa expressão, Louis Althusser definia no final dos anos 1960 as
instituições capazes de influir mais ou menos poderosamente na formação
da identidade de alguém.
Quanto à família, em muitos casos simplesmente deixou de existir.
Alguns pensam que ela está sendo reconfigurada, mas se esquecem de que a
evolução das espécies é muito mais lenta que a corrida tecnológica.
Assim, a erosão da autoridade dos pais não é algo tão simples quanto
parece, e os consultórios de psicologia estão lotados exatamente porque
não é possível produzir saltos e lacunas na formação de uma
subjetividade sem, ao mesmo tempo, produzir desorientação. Se faltam
pontos de referência onde a psique em formação tende instintivamente a
procurá-los, é certo que surgirão substitutos (traficante ou
Malhação, a diferença não é tão grande quanto parece).
Quanto à escola, em primeiro lugar vem a proletarização do professor.
Se a falta de prestígio social de quem ensina chegou a torná-lo um
coitadinho, como esperar que ele seja respeitado por quem está em busca
de heróis? É claro, existem muitos profissionais do ensino que não se
rebaixam à condição simbólica de vítimas, mas exceções normalmente
confirmam a regra.
Imaginemos que o professor fosse bem remunerado e tivesse uma
carreira decente. Ainda assim, precisaria de um reforço em sua formação,
porque dar aulas hoje não é mais como antigamente; é necessário
aprender a usar os novos recursos, e poucos mestres estão aptos mesmo a
produzir boas apresentações em
Powerpoint – não por sua culpa,
mas porque esse tipo de instrumentação não recebe a devida ênfase nos
cursos de licenciatura. Contudo, fique a ressalva: usar o
Facebook
tem mais chance de ser uma rendição ao inimigo que de trazer reais
contribuições à qualidade de uma aula. Se continuar lidando de modo
passivo com a concorrência desses novos aparelhos ideológicos tão
sedutores, porque fundados na propaganda agressiva e na lei do menor
esforço, a escola se tornará cada dia mais obsoleta e desinteressante.
Mas, quaisquer que sejam as críticas que façamos aos pais e aos
professores, há uma diferença que não pode ser esquecida. É que, mesmo
errando tanto, eles costumam ter com as crianças e os jovens uma relação
profundamente afetiva e existencial: erram querendo acertar, desejam o
bem daqueles que estão sob seus cuidados. Isso não ocorre com os
aparelhos ideológicos regidos pela lógica industrial, cujo único
objetivo é transformar o indivíduo em traço a mais no gráfico dos lucros
planejados.
Considerando tais fatos, talvez seja menos difícil entender a
desorientação de pais e mestres quando se trata da tentativa de promover
a leitura. Eles sabem, muitas vezes por puro instinto, que ler ajudar a
formar pessoas mais preparadas para a vida. Só não sabem por onde
começar, porque todos os caminhos parecem já trilhados e comprovadamente
fadados ao fracasso.
Não existem respostas fáceis, mas talvez o problema fique mais claro
se as pessoas se empenharem de fato em compreendê-lo. Para os pais, isso
poderia começar com esta pergunta: eu coloquei filhos no mundo para que
sejam escravos de algo ou de alguém? Isso porque, sem exagero, a
escravidão ao
Facebook tem chegado em numerosos casos a lembrar uma daquelas possessões diabólicas dos filmes de terror.
Para os professores, a pergunta inicial poderia ser: eu quero ser um
frustrado como pessoa e como profissional, passando o resto da vida com a
certeza de que faço um trabalho inútil?
Só a partir de perguntas como essas parece ser possível, na
atualidade, discutir o problema da leitura. Como não cabe aqui a
abordagem de todos os aspectos do problema, listamos a seguir alguns
pontos que, a nosso ver, o professor e a escola precisam considerar.
-
A leitura de textos literários não interessa apenas aos
professores de Português. Todas as disciplinas têm a ganhar se os
sujeitos forem capazes de pensar e expressar-se com clareza, a começar
pela interpretação correta dos enunciados em provas e exercícios.
-
Aulas de gramática não podem ser uma forma de engabelar o
aluno só porque envolvem menos dificuldades, no espaço da sala de aula,
que atividades de leitura e produção de textos.
-
Aulas de gramática podem ser muito interessantes;
exercícios gramaticais são, quando bem elaborados e conduzidos, um
indispensável treinamento da capacidade lógica – ao contrário do que
parece pensar a maioria dos “educadores” responsáveis pela formulação de
políticas de ensino no Brasil.
-
A decoreba (acentuação, ortografia) é importante e pode
ser promovida por meio de bem-humorados exercícios de fixação, mas não
deveria nunca chegar ao ensino médio. Em nenhuma disciplina.
-
O tempo “inútil” dispendido em memorizar regras, como
aquele gasto para aprender tabuada, é muito mais útil do que a maioria
absoluta das atividades hoje exercidas pelas crianças e pelos jovens
fora do horário escolar.
-
Redações não corrigidas nem anotadas são trabalho perdido, para o aluno e para o professor.
-
É ridículo ser luddita, mas igualmente ridículo
fazer coro à ideologia tecnicista. O computador não liberta ninguém, é
uma ferramenta que exige habilidades adquiridas com antecedência,
especialmente a capacidade de ler textos de maneira crítica e seletiva.
Computador na mão de analfabeto é, guardadas as proporções, como fuzil
automático na mão de psicopata.
-
A leitura de textos literários é uma atividade
civilizatória sem possibilidade de substituição. Nem por filmes nem por
coisa nenhuma. Conversar com Dante Alighieri ou Clarice Lispector, em
vez de bater papo com o coleguinha da mesma idade e, portanto, portador
das mesmas limitações de conhecimento de si e do mundo, é ter acesso ao
que produziram algumas das mentes (e sensibilidades) mais privilegiadas
que já passaram por este mundo.
-
“Conversar” com pessoas tão brilhantes, por meio da
leitura de suas obras, ajuda alguém a ser mais lúcido e a pensar de
maneira autônoma, tendo com isso muito mais chance de encontrar soluções
para os problemas da vida.
-
Em oposição, a TV promove dia e noite a estupidez e a
futilidade como se fossem as únicas opções de divertimento. A indústria
cultural é, entre todas as indústrias, a que tem menor compromisso com a
qualidade do que produz. Isso está comprovado por um século de
História, basta verificar para comprová-lo.
-
A tecnologia pode ser muito útil para quem tem
consciência de que o mundo existia antes dela. Para os ignorantes, tende
a ser uma perigosa armadilha.
-
O professor pode ser, em larga medida, vítima de um
consenso social que apenas simula ter interesse na promoção da
inteligência. Porém as maiores vítimas são as crianças e os jovens, pois
eles sempre acharão que não existe outro mundo possível, exceto se
alguém lhes falar sobre essa possibilidade.
-
O professor precisa dar o exemplo, sendo um leitor
empolgado e qualificado. Ninguém é convencido a ler se não percebe que
pessoas admiráveis realmente têm prazer com a leitura.
-
Professores precisam inteirar-se, filosoficamente, de sua
função como produtores de inteligência, e não conformar-se ao papel de
tocadores burocráticos do cotidiano escolar.
-
Uma escola e um professor que confirmam aquilo que diz o
senso comum criado pela indústria cultural são inúteis e merecem o
desapreço que lhes dedicarem seus alunos.
-
A estratégia número um de promoção da leitura é não
transformá-la em obrigação: a criança e o jovem precisam ser levados a
perceber que, se tantas pessoas têm prazer na leitura, não deve ser tão
difícil descobri-lo pessoalmente. Ficha de leitura, nem pensar; existem
muitos modos mais inteligentes de checar se alguém leu um livro.
-
É uma ingenuidade panglossiana pensar que qualquer leitura tem valor. Best sellers fabricados
para lisonjear a ignorância das crianças, blogs de “funfic” nos quais
Justin Bieber é mitificado como herói devasso e drogado não passam de
derivações acanalhadas do que o cinema e a TV já produziram de pior.
-
Escolas precisam ter bibliotecas diversificadas, as
quais, por sinal, custam muito menos que um laboratório de informática e
demoram muito mais para se tornar desatualizadas. Pais e professores
têm o dever de exigi-lo dos diretores e proprietários de escola que não
cumprem espontaneamente um dever tão elementar.
-
A oferta de textos literários deve ser progressiva e
começar por textos curtos, lúdicos e engraçados. É indesejável impor
tarefas enfadonhas e desestimulantes associadas à leitura; a
sensibilidade do professor deve permitir-lhe avaliar os alunos
individualmente, não pela discutível média definida nos programas de
ensino.
-
A oferta também deve ser, na medida do possível,
individualizada. É urgente superar a fragmentação da vivência escolar,
reflexo de uma divisão de tarefas de inspiração fordista que nada tem a
ver com o indivíduo humano, por natureza irredutível a médias
abstratamente definidas.
-
Os alunos devem ter uma quota mínima de leitura por mês,
em casa e na escola. É totalmente indesejável haver descontinuidade
nesse processo, e aqui entra o papel de diretores, supervisores e
coordenadores: na escola, a eficácia do ensino da leitura implica um
planejamento inteligente.
-
Uma criança que leu oito ou dez livros por ano terá
aprendido muito mais que a maioria dos “bons” alunos bem adaptados a um
conceito behaviorista de aprendizagem.
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O professor precisa convencer-se e, na medida do
possível, convencer a comunidade escolar de que a literatura,
representando pelos ângulos mais variados a condição humana, aparelha o
leitor para tornar-se capaz de imaginar soluções. Um bom leitor é muito
menos passível de ver-se encurralado pelos problemas que surgirão ao
longo de sua vida.
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Esse ser humano versátil e aberto ao conhecimento
interessa a todos, não apenas ao professor de literatura: tem maior
prazer no aprendizado, disposição para as relações humanas, capacidade
de interpretar situações e, portanto, de produzir conhecimento em vez de
simples e passivamente absorvê-lo.
-
A capacitação dos professores deve ser continuada, pois
as licenciaturas ainda os preparam muito mal para o ensino. Há por aí
muita teoria furada, muito idealismo e pouco pé no chão.
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O texto literário deve ser contextualizado, referido ao
mundo atual, e não apresentado como coisa antiga que perdeu a validade
por tratar de outras épocas e numa linguagem obsoleta. José de Alencar?
Só depois que o aluno se tenha tornado um leitor crítico, autônomo e
espontâneo.
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O estudo da literatura está condenado ao fracasso quando
insiste – e é isso que ocorre na maioria dos livros didáticos – em
subordinar-se a uma perspectiva historicista. A periodização literária
deve resultar da leitura de textos que sejam interessantes para o
estudante, e fazê-los interessantes depende muito de o professor ter
conhecimento e estratégica didática.
-
Talvez fosse o caso de rebatizar a disciplina Literatura,
pois esse nome já se tornou por demais associado à enfiada de datas e
autores antigos apresentados ao estudante sem qualquer mediação com o
mundo contemporâneo.
Ao contrário do que pode sugerir o título, este ensaio não é uma
receita pronta e acabada. É apenas a síntese provisória de bons anos de
experiência e reflexão. Na melhor das hipóteses, tem a pretensão de
fazer alguns colegas atentarem para a grande lacuna filosófica e
metodológica das tentativas de oferecer soluções para a falência da
escola brasileira. Vamos concluí-lo, portanto, com duas citações que
apontam para um futuro desenvolvimento do raciocínio aqui esboçado. A
primeira, de Marisa Lajolo, que intitulou assim um artigo já clássico:
“O texto não é pretexto”. Quer dizer, nada vai dar certo se as pessoas
responsáveis pela promoção da inteligência não se convencerem de que a
literatura é um discurso radicalmente autônomo, talvez o último reduto
da efetiva liberdade de pensar e sentir: não deve ser usada para
finalidades ideológicas nem reduzida a instrumento ou caminho para
validar qualquer outro discurso. Muito menos como subsidiária do ensino
de gramática.
A segunda citação é do poeta norte-americano Ezra Pound, que definiu a
poesia como “conversa entre homens inteligentes”. O conceito vale para
todos os bons textos literários: do outro lado está uma pessoa que tem
ou teve grande capacidade de iluminar nossa compreensão do mundo, de nós
mesmos e do papel da linguagem nisso tudo. É uma grande burrice perder a
oportunidade de conversar com um sujeito que, nos dias de hoje, a
produção industrial de consciências teleguiáveis tem tornado cada vez
mais raro.
* ELOÉSIO PAULO é professor da Universidade Federal de Alfenas (MG). Publicou diversos livros de poesia e crítica literária, entre eles: Os 10 pecados de Paulo Coelho, Jornal para eremitas e Parque de impressões (poemas para crianças, selecionado para edição pelo PNBE/MEC).
(fonte: https://espacoacademico.wordpress.com/2015/10/24/a-leitura-por-prazer-um-programa-para-salvar-a-escola/)