domingo, 29 de maio de 2016

O que se pode esperar de Parente na Petrobrás


Texto escrito por José de Souza Castro:

Temer não conseguiu nessa segunda-feira, dia 23, emplacar o nome do ex-ministro de FHC, Pedro Parente, na presidência da Petrobras. O Conselho de Administração da estatal tremeu nas bases, após a queda do ministro do Planejamento, Romero Jucá, e adiou em uma semana a sessão para apreciar a indicação de um homem com processos na Justiça.

Segundo a Federação Única dos Petroleiros (FUP), “é inadmissível termos no comando da empresa um ex-ministro do governo Fernando Henrique Cardoso que chancelou processos de privatização e tem em seu currículo acusações de irregularidades e improbidade na administração pública”.
Prossegue a nota da FUP:
“Um dos maiores escândalos protagonizados por Pedro Parente no governo tucano foram os contratos para compra de energia emergencial e as ‘compensações’ feitas às concessionárias privadas e aos investidores atraídos pelo Programa Prioritário de Termeletricidade, que impôs prejuízos bilionários à Petrobrás. Professores do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP chegaram na época a denunciá-lo ao Ministério Público Federal por improbidade administrativa. Sob a chancela de Pedro Parente, a Petrobrás teve que assinar contratos de parceria com o setor privado para construção de usinas termoelétricas, entre 2000 e 2003, onde se comprometeu a garantir a remuneração dos investidores, mesmo que as empresas não dessem lucro, bem como cobrir os custos dos empreendimentos, caso a venda de energia não fosse suficiente para sustentar os investimentos.
A chamada “contribuição de contingência” gerou prejuízos de mais de US$ 1 bilhão à Petrobrás, que se viu obrigada a assumir integralmente as termoelétricas para evitar perdas maiores. O valor das usinas, avaliadas em US$ 800 milhões, equivalia a um terço dos US$ 2,1 bilhões que a estatal teria que desembolsar para honrar as compensações garantidas aos investidores até o final dos contratos, em 2008. Tudo autorizado por Pedro Parente.
Não é com gestores deste perfil que a Petrobrás vencerá a crise que atravessa.”
Vale lembrar que em março passado a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal aceitou recurso da Procuradoria-Geral da República e autorizou a retomada de duas ações de reparação de danos por improbidade administrativa contra os ex-ministros do governo de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB: Pedro Malan (Fazenda), José Serra (Planejamento, Orçamento e Gestão), Pedro Parente (Casa Civil), além de ex-presidentes e diretores do Banco Central.

O motivo das ações que serão retomadas pela Justiça foi a assistência financeira, no valor de R$ 2,97 bilhões, do Banco Central aos bancos Econômico e Bamerindus, em 1994. Em 2002, o ministro Gilmar Mendes (surpresa!), nomeado para o STF por indicação de FHC, concedeu liminar suspendendo as ações e, em 2008, mandou arquivar os processos que estavam na Justiça Federal do Distrito Federal. Em uma delas, os ex-ministros e ex-dirigentes do BC haviam sido condenados pela 20ª Vara Federal à devolução de quase R$ 3 bilhões. A outra ação, na 22ª Vara, ainda não havia sido julgada.
Temer deve estar apostando que Pedro Parente se livre dessas ações. Ele parece ter sorte. Comandou a equipe de transição para a gestão de Luís Inácio Lula da Silva – que fez questão de que os podres do antecessor não fossem apurados pelo governo – e em 2003 foi nomeado vice-presidente executivo do Grupo RBS, que retransmite a TV Globo no Rio Grande do Sul e Santa Catarina e possui uma extensa rede de jornais e rádios. Pedro Parente saiu do RBS em 2009, antes que a Polícia Federal desfechasse a Operação Zelotes, ainda não concluída.

A suspeita é que o Grupo RBS pagou R$ 11,7 milhões à SGR Consultoria para livrar-se de multa de R$ 113 milhões. O culpado seria o deputado federal Afonso Mota (PDT-RS) que era o vice-presidente jurídico e institucional da RBS na época em que a propina teria sido paga. Aparentemente, sem o conhecimento de Pedro Parente, o vice-presidente executivo. Afonso Mota votou contra o impeachment de Dilma Rousseff, coitado.

Se fosse corrupto, Pedro Parente teria boas oportunidades de ficar mais rico do que é. Além de ter sido ministro influente no governo FHC, foi presidente no Brasil da multinacional Bunge, grande exportadora do setor agrícola no país, entre 2010 e 2014. Presidiu o Conselho de Administração de várias empresas e, atualmente, estava à frente do conselho da BM&F Bovespa.
Espera-se que seja mesmo um homem honesto, pois à frente da Petrobras, da qual foi presidente do Conselho de Administração no governo FHC, quando se cogitava em privatizá-la, Pedro Parente terá como tarefa fazer uma espécie de desmonte da estatal, privatizando tudo o que for possível, inclusive o rico Pré-Sal.

Se tudo sair como Temer e seu ministro das Relações Exteriores, José Serra, dão mostras de desejar, o que já fez o atual presidente, Aldemir Bendine, na venda de pedaços da estatal para reduzir seu endividamento, ficará eclipsado. Bendine assumiu o comando da Petrobras no início de 2015, no lugar de Graça Foster. Foi nomeado por Dilma Rousseff para tentar conter a onda de denúncias contra a empresa. Em vão, pois o que se pretende mesmo é desvalorizar a Petrobras, para vendê-la o mais rápido possível. Aqui, quem desdenha quer vender…

E o que se quer vender é uma empresa que produziu diariamente, no primeiro trimestre deste ano, 2,61 milhões de barris de óleo e gás e refinou 1,96 milhão de barris de petróleo, o equivalente a 84% da capacidade instalada de suas refinarias. Em relação ao primeiro trimestre de 2015, houve redução de 7% da produção de petróleo e gás natural, no Brasil, e de 8% na venda de derivados no mercado doméstico.
Nossa mais importante estatal registrou prejuízo de R$ 1,2 bilhão no trimestre. A par da redução da produção e venda, em razão da recessão econômica do país, entre outros fatores, a Petrobras registrou no trimestre aumento das despesas com juros e variações monetárias e cambiais, que atingiram R$ 9,6 bilhões, e maiores gastos com ociosidade de equipamentos. Apesar disso, a empresa investiu nos três primeiros meses deste ano R$ 14,9 bilhões e conseguiu reduzir o endividamento líquido de um pico de R$ 402,3 bilhões no terceiro trimestre de 2015, para R$ 369,5 bilhões, quando a receita operacional líquida somou R$ 70,3 bilhões no primeiro trimestre deste ano.

Mesmo desdenhando para vender, não será fácil privatizar uma empresa desse porte, no momento em que todas as grandes petroleiras enfrentam dificuldades e registram prejuízos com a queda do preço do petróleo, que caiu em média 37%, em dólar, entre o primeiro trimestre de 2015 e igual período deste ano.
E tão importante quanto, no momento em que se prevê forte oposição da maioria dos brasileiros aos que querem negar, mais uma vez, que “O petróleo é nosso”.
(fonte: blog da KikaCastro)

Enquanto você lê este texto, 7 brasileiras são estupradas

por Cristina Castro

Depois que ganhou repercussão nacional o caso da menina de 16 anos que foi estuprada por 30 animais, no Rio de Janeiro, veio à tona, de novo, o resultado do levantamento anual feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que traz, entre vários outros dados interessantes sobre a violência no Brasil, a informação de que 47.646 casos de estupros foram notificados às polícias brasileiras no ano de 2014, que é o dado mais recente disponível.
Por isso, você tem lido nos jornais e portais de notícia, nos últimos dias, que uma pessoa é estuprada a cada 11 minutos no Brasil.
Acontece que o mesmo anuário traz uma informação importante, que está sendo ignorada pelos colegas jornalistas: que apenas 7,5% dos casos de estupro são registrados pela polícia (pág. 116). Seja por vergonha, por falta de acesso, ou por medo de retaliação, a maioria esmagadora das vítimas prefere “deixar pra lá”. Por isso, não tivemos apenas cerca de 48 mil casos de estupro no Brasil, em um ano, mas estima-se um número muito maior, de 635 mil casos em um ano.
Isso representa 1.740 casos por dia, 72 por hora, mais de 1 caso por minuto. E não um estupro a cada 11 minutos.
O anuário considera todas as vítimas de estupro, mulheres e homens. Sim, existem homens vítimas de estupro, principalmente vulneráveis. Mas 90% das vítimas são mulheres.
Refazendo a conta, chegamos à estimativa de cerca de 570 mil mulheres estupradas em um ano, no Brasil. O que também dá cerca de um caso de estupro por minuto.
Ou seja: no Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto.
Vou repetir algumas vezes para ver se, martelando a frase, a informação atinge os cérebros que cresceram nesta cultura do estupro que vigora no Brasil, os cérebros que acham que a vítima teve culpa (porque estava com a saia curta demais, porque pediu, porque é assanhada, porque é miniputa, porque qualquer-outra-coisa-idiota-dessas), e causa o devido choque e constrangimento:
No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto. No Brasil, uma mulher é estuprada a cada minuto.
Deu pra entender?
Isso significa que, enquanto você lia este post, no tempo médio de 130 palavras por minuto, sete mulheres foram estupradas no seu país. Pode ter sido no seu bairro, numa sala de aula vazia, num carro, pode ter sido por um desconhecido ou por um ex-namorado, a agressão pode ter sido acrescida de outras formas de violência, como uso de arma, de faca, de socos. Dessas sete mulheres que foram violentadas em tão curto espaço de tempo, é possível que nenhuma queira dar queixa do caso. Ou seja, a violência desferida contra elas por um criminoso pode simplesmente desaparecer no limbo das estatísticas jamais tornadas públicas.
É como se esses sete estupros jamais tivessem ocorrido.
Por isso, além de lutarmos contra a cultura do estupro no nosso país, também precisamos ensinar às vítimas que elas não precisam e nem devem se esconder. Que é importante registrarem queixa, para que os casos venham à tona, para que a polícia seja exigida, para que o judiciário seja exigido, para que as políticas públicas sejam traçadas, para que os criminosos sejam punidos e para que, com um pouco de esperança, o número de vítimas diminua com o tempo.
Quem está nessa luta comigo?

(fonte: blog da Kika Castro)

Transgênicos: mais uma trapaça


Mídia deu, em todo o mundo, vasta repercussão a relatório norte-americano que atesta suposta “segurança” dos OGMs. Mas agora sabe-se quem financiou o estudo…
Por Nadia Prupis | Tradução: Gilberto Schittini

Cresce o ceticismo público sobre um novo relatório que afirma ser seguro o consumo dos organismos geneticamente modificados (OGMs). A desconfiança cresce à medida em que vêm à tona informações de que a organização que produziu o relatório tem relações com a indústria de biotecnologia.
O relatório Genetically Engineered Crops: Experiences and Prospects (pdf), lançado em 17 de maio pela Academia Nacional de Ciências, Engenharia e Medicina dos Estados Unidos, afirma que não apenas os OGMs são seguros para a alimentação, como também não têm impactos ambientais negativos e levaram à redução no uso de pesticidas. Essa publicação é lançada no momento em que o Congresso norte-americano – que fundou a instituição – estuda tornar obrigatória a rotulagem de transgênicos.
“Claramente existem fortes argumentos sobre os riscos e uma pressão considerável da opinião pública para a rotulagem obrigatória de produtos contendo material geneticamente modificado. Já o comitê não considera que a obrigatoriedade de rótulo seja justificável para proteger a saúde pública”, afirma o relatório.
Entretanto, um dia após a publicação o grupo de defesa ambiental Food & Water Watch (FWW) divulgou em nota (pdf) que o Conselho Nacional de Pesquisa (National Research Council, NRC) – braço da Academia Nacional de Ciências – tem relações fortes com as indústrias agrícolas e biotecnológicas, o que, diz o FWW, “criou conflitos de interesse em todos os níveis da organização”.
O NRC e a Academia Nacional de Ciências recebem milhões de dólares de financiamento de corporações como a Monsanto, a DuPont e a Dow Chemical, relatou o FWW em sua publicação Under the Influence: the National Research Council and GMOs (pdf).
Representantes dessas companhias – e também da Cargill, General Mills e Nestlé Purina, dentre outras empresas que apoiam os OGMs – também têm assento no conselho do NRC que supervisiona os projetos sobre OGMs. O NRC não revelou publicamente esses laços, disse o FWW. Na verdade, mais da metade dos autores convidados para o novo relatório tem relações com essa indústria.
De acordo com o FWW, não só o NRC tem um histórico de relações com a indústria, como também vem trabalhando para silenciar críticos dos OGMs e das companhias com assento no conselho.
“Enquanto companhias como a Monsanto e seus parceiros acadêmicos estão fortemente envolvidos no trabalho do NRC sobre OGMs, os críticos vêm sendo marginalizados há muito tempo”, disse Wenonah Hauter, diretora executiva do FWW. “Muitos grupos já solicitaram inúmeras vezes ao NRC que reduza sua influência da indústria, pois percebem que o conflito de interesses reduz, claramente, sua independência e integridade científica”.
A publicação do FFW afirma que:
Os resultados fracos, diluídos ou viciados do NRC terão um impacto bastante real no nosso sistema alimentar. Formuladores de políticas públicas desenvolvem regras e regulações com base em “conhecimento científico” sobre OGMs, no que a ciência diz – especialmente o que o NRC diz, porque ele é parte da Academia Nacional de Ciências, criada pelo Congresso para prover recomendações científicas para o governo federal.
E é aqui que a ciência se torna politizada. Companhias como a Monsanto precisam de aliados favoráveis na ciência e na academia para empurrar seus produtos controversos através da aprovação regulatória até as fazendas americanas. Corporações do agronegócio despejam milhões de dólares nas nossas universidades públicas, agem com mão pesada na revisão de artigos em revistas científicas e procuram influenciar entidades científicas de prestígio como o Conselho Nacional de Pesquisa – NRC.
Apesar dessas críticas, o NRC continuou a encobrir suas conexões com o agronegócio e a verdadeira influência que a indústria exerce sobre suas pesquisas.
“De acordo com a legislação específica, o NRC precisa formar comitês equilibrados de cientistas para conduzir suas pesquisas – e revelar quaisquer conflitos de interesses”, disse Hauter. “Ainda assim o NRC não revelou nenhum conflito de interesses dos membros desse comitê profundamente desequilibrado”.
Em sua publicação, o FWW propôs mudanças específicas para combater a influência da indústria:
> o Congresso norte-americano deveria expandir e fortalecer a legislação para garantir que as recomendações científicas produzidas pelo NRC para o governo sejam livres de conflitos de interesses e desvios;
> o Congresso deveria interromper todo o financiamento público de projetos do NRC em agricultura até que políticas significativas de redução de conflitos de interesses sejam postas em prática;
> o NRC não deveria mais acionar financiadores, diretores, autores ou revisores que tenham interesses financeiros nos resultados de qualquer trabalho do NRC; e
> o NRC deveria proibir a citação de referências científicas financiadas ou elaboradas pela indústria, devido à óbvia possibilidade de desvios.
“Empresas do agronegócio como a Monsanto têm um papel desproporcional nas nossas universidades públicas e revistas científicas, e no NRC”, concluiu Hauter. “Enquanto esses escandalosos conflitos de interesses não forem expostos, não teremos boas políticas públicas sobre novas tecnologias, tais como os OGMs”.
(fonte:  http://outraspalavras.net/destaques/transgenicos-mais-uma-trapaca/)

Golpe: a diplomacia cifrada de Washington

Por Mark Weisbrot, no HuffingtonPost | Tradução de Marina Lang 
 

No dia seguinte à votação de impeachment na Câmara dos Deputados do Congresso do Brasil, um dos líderes da iniciativa, senador Aloysio Nunes, viajou a Washington D.C. Ele tinha reuniões agendadas com diversas autoridades, incluindo Thomas Shannon, do Departamento de Estado.

Shannon tem um perfil relativamente discreto na mídia, mas ele é o número três no Departamento de Estado. Até mais significativo neste caso, trata-se da pessoa mais influente na política do Departamento de Estado dos EUA para a América Latina. Ele será o único a fazer recomendações ao secretário de Estado John Kerry sobre o que os EUA devem fazer caso os esforços em andamento para afastar a presidenta Dilma Rousseff prossigam.

A disposição de Shannon para se encontrar com Nunes, apenas dias depois da votação do impeachment, emite um sinal poderoso de que Washington está embarcando com a oposição neste empreendimento perigoso. Se ele quis demonstrar que Washington era neutra neste conflito político violento e profundamente polarizado, não deveria ter uma reunião com um protagonista de alto escalão do outro lado, especialmente neste momento em particular.

A reunião entre Shannon e Nunes é um exemplo do que pode ser chamado de “diplomacia cifrada” (“dog-whistle diplomacy”). Ela mal aparece no radar midiático que reporta o conflito e, portanto, é improvável que gere reação. Mas os protagonistas sabem exatamente o que isso significa. É por isso que o partido de Nunes, o PSDB, tornou público o encontro.

Para ilustrar com outro exemplo de diplomacia cifrada: em 28 de junho de 2009, militares hondurenhos sequestraram o presidente do país, Mel Zelaya, e colocaram-no num avião para fora do país. Em resposta, o comunicado da Casa Branca não condenou este golpe, mas preferivelmente invocou “todos os atores políticos e sociais em Honduras” a respeitar a democracia.

O sinal cifrado funcionou perfeitamente; mais importante, os líderes do golpe e seus apoiadores em Honduras, assim como cada diplomata em Washington, sabiam exatamente o que isso significava, assim como os comunicados condenando o golpe e exigindo a restauração do governo democrático que se espalharam ao redor do globo. Todo o mundo sabia que aquilo era, em código diplomático, um claro comunicado de apoio ao golpe. Os eventos que seguiram ao longo dos seis meses seguintes, com Washington fazendo tudo o que pudesse para ajudar a consolidar e legitimar o governo golpista, foram muito previsíveis a partir desta declaração inicial. Hillary Clinton, posteriormente, admitiria em seu livro “Hard Choices”, de 2014, que trabalhou com sucesso a fim de prevenir o retorno do presidente democraticamente eleito.

Tom Shannon tem uma reputação de parceiro amigável entre os diplomatas latino-americanos, um oficial de carreira experiente no serviço diplomático que está disposto a sentar e conversar com governos em desacordo com a política dos EUA para a região. Mas ele também tem muita experiência com golpes.

Alguns dos e-mails vazados de Hillary Clinton lançam luz adicional sobre o papel dele no auxílio da consolidação do golpe hondurenho. Ele foi, também, um funcionário de alto escalão do Departamento de Estado durante o golpe na Venezuela, em abril de 2002, sobre o qual existem evidências documentais substanciais do envolvimento dos Estados Unidos. E quando o golpe parlamentar no Paraguai aconteceu em 2012 – algo similar ao que está acontecendo no Brasil, mas com um processo que impediu e removeu o presidente em apenas 24 horas – Washington também contribuiu com a legitimação do governo golpista na sequência. (Em contraste, governos sul-americanos suspenderam o governo golpista via Mercosul, o bloco comercial regional, e UNASUR – a União das Nações Sul-Americanas.) Shannon era embaixador no Brasil à época, mas ainda era uma das autoridades mais influentes na política hemisférica.

O Departamento de Estado dos EUA respondeu às questões sobre as reuniões de Nunes dizendo: “Este encontro foi planejado por meses e foi organizado a pedido da embaixada brasileira”. Isto, porém, é irrelevante. Significa, apenas, que a equipe da embaixada brasileira estava, como questão de protocolo diplomático, envolvida na realização das reuniões. Não implica em consentimento da administração de Dilma Rousseff, tampouco altera a mensagem política que o encontro com Shannon envia à oposição do Brasil.
Tudo isso é, claro, consistente com a estratégia de Washington em resposta a governos de esquerda que lideraram a maior parte da região no século 21. Raramente se perdeu uma oportunidade de quebrar ou de se livrar de qualquer um deles, e o desejo de substituir o governo do Partido dos Trabalhadores no Brasil – por um governo mais complacente, de direita – é bastante óbvio.

(fonte: http://outraspalavras.net/brasil/golpe-a-diplomacia-cifrada-de-washington/)

Internet das coisas ou das pessoas?

por Julia Powles e Jenny Judge, tradução de Rafael Zanatta

A “Internet das coisas” é uma visão de conectividade ubíqua impulsionada por uma ideia básica: as telas não são a única porta de entrada para a rede das redes.
O debate público sobre Internet das coisas é polarizado. Os comentadores tendem a expressar ou um otimismo excessivo ou um total ceticismo, com muito pouco no meio dessas duas visões.

Do encantamento à maldição

Os otimistas descrevem um campo mágico de “objetos encantados”, onde os objetos que possúímos gentilmente antecipam nossas necessidades diárias. O cabo do guarda-chuva fica azul quando há previsão de chuva; as geladeiras conectadas nos lembram quando estamos sem leite. Nossas casas se tornam máquinas bem azeitadas, eficientes como qualquer casa vitoriana – mas sem qualquer salário de servos para pagar (ou, ao menos, nenhum que possamos ver).
O outro lado pinta um cenário muito mais sombrio. Argumenta-se que, na melhor das hipóteses, a Internet das coisas é somente outra desculpa para o consumismo desenfreado, cuja única contribuição será lotar nossos porões com tranqueiras desnecessárias.
No pior cenário, objetos caseiros de uso diário serão transformados em espiões inimigos, nos colocando em constante vigilância. Nós seremos empurrados e manipulados a todo o momento. Nossas vidas e posses serão perpetuamente expostas aos hackers. A Internet das coisas irá encher nossas casas com objetos que parecem bons, mas esses objetos estão longe de serem encantados – eles são malditos.

Um terceiro caminho

Parece que estamos em uma encruzilhada onde há dois caminhos: ou uma Escola de Magia de Hogwarts digitalizada ou uma distopia de vigilância e exploração. Nenhum dos dois é atraente. Estamos então presos em uma Internet das coisas estúpidas ou más? Ou há uma outra opção?
A saída é contra intuitiva. Em resumo, nós precisamos esquecer das coisas. Nós precisamos parar com essa obsessão com “objetos inteligentes”, e precisamos começar a pensar de forma inteligente sobre pessoas.
Dificilmente podemos desviar nosso olhar das nossas portas de entrada à Internet. Os dispositivos amontoam-se em nosso caminho. Ficar acorrentado às nossas mesas significa perder parte de nosso tempo de vida. Olhar para nossos smartphones afeta nossa coluna. Estamos perdendo o sono. Nossa visão está falhando. Nossas próprias identidades estão ameaçadas pela opacidade da web.
Algo precisa mudar.
Wearables não bastam
Até hoje, as tentativas de mais alto nível para reimaginar nossas portas de entradaGoogle Glass e Apple Watch – têm sido decepcionantes. Elas ainda são telas, seja no seu rosto ou no seu pulso.
Mas nosso modo padrão de interagir com o mundo não é por meio de telas. Nós respondemos ao ambiente, ao que ele oferece, de um modo automático e intuitivo. Em quase todos os cenários cotidianos, não vemos nossas coisas como coisas em si. Nós simplesmente as usamos. Vemos um martelo e o pegamos. Vemos uma bola de borracha e a apertamos, ou a quicamos no chão.
Esse foi o insight de Heidegger, que também motiva a tese dos objetos encantados. O mundo se apresenta, em primeira instância, como pronto para o manuseio – como disponível para o uso. Manejamos as coisas com nossos corpos sem pensar, executando cálculos imensamente complicados sem mesmo estar cientes disso.

O mundo é cheio de informação que acessamos instintivamente. Mas, até o momento, esse conhecimento tem sido inútil no mundo digital, decididamente bidimensional. O desafio, e a oportunidade, é aproveitar nosso conhecimento de como as coisas reais, tocáveis e quicáveis funcionam, e usá-las para dar forma a experiências mais significativas, conectadas e gratificantes. Mas como?


Em busca de um “Bauhaus digital”
 

No início do século XX, o movimento Bauhaus definiu-se com dois slogans: primeiro, a forma deveria seguir a função; segundo, o design deveria ser verdadeiro com os materiais.
Os designs Bauhaus eram honestos. Não mais metais com tons de ouro, pedras esculpidas em pétalas de rosa, ou colunas gregas para tornar edifícios sérios. Devemos saber instintivamente o que um objeto faz assim que o encontramos.
Telas não comunicam o que fazem. Elas nos removem de nossos ambientes. E não apenas isso: na medida em que aceitamos despreocupadamente os termos de uso, nossa informação pessoal é desviada para terceiros, de invisível e incompreensivelmente, de modo que logo ignoramos o que está acontecendo.
Mas e se pudéssemos desenhar os objetos que se conectam à Internet de um modo verdadeiramente inteligente, de formas diferenciadas, capazes também de comunicar suas próprias funções? E se pudéssemos entender essas funções de modo intuitivo, sem muito esforço? E se esses objetos nos mostrassem – mostrassem mesmo, por meio de seus elementos de design, seus fluxos de dados e suas condições legais de uso: como nossa informação está sendo usada, quem pode acessá-la, para onde está indo e por quê?
E se, assim como o Centro Pompidou, os tubos fossem usados na parte externa, evidenciando, antes de mais nada – ao invés de assumir implicitamente – por que precisamos de redes? 

O mundo digital está em disputa

Esse é o verdadeiro potencial da Internet das coisas. Ela pode fazer nossas vastas quantidades de conhecimento tácito e encarnado trabalhar online. Ela pode unir os mundos físicos e digitais. E ela pode nos colocar no controle de nossa própria informação e integridade contextual, em meio a um compromisso moral e político com os direitos humanos, o estado de direito e a coesão social. Ela pode se tornar uma Internet, não de coisas inteligentes, mas de pessoas inteligentes e empoderadas.
É difícil enxergar como isso pode ser, exatamente. Mas imaginar tal cenário não deveria ser uma tarefa de empresas de tecnologia e oportunistas que estão nesse “ciclo hype”. Artistas, designers, filósofos, advogados, psicólogos e trabalhadores sociais devem estar tão envolvidos quanto engenheiros e usuários de Internet na modelagem de nosso futuro digital coletivo.
A Internet tornou-se uma parte tão onipresente de nossas vidas que tendemos a esquecer que ela está em sua infância. É apenas um protótipo cru do que pode ser. A Internet do futuro não precisa ser como a Internet de hoje: plana, monopolizada e perigosamente opaca. Suas formas, contornos e sensações ainda estão em disputa.
(fonte: http://outraspalavras.net/capa/377086/)

domingo, 22 de maio de 2016

Racha no governo Temer-Cunha. Governador do PMDB torce para a democracia voltar:


Um governador do mesmo partido (PMDB) do golpista presidente interino do governo provisório que envergonha o Brasil e os brasileiros já deu a senha: um governo medíocre, ridículo e golpista também se combate com ironia, enquanto se luta pela volta da democracia e, com ela, Dilma.

Governador do menor estado do Brasil, Sergipe, com 0,26% do território brasileiro e pouco mais de 1% da população, Jackson Barreto vocalizou a opinião da maioria dos brasileiros sobre o ministério medíocre e recheado de fichas sujas escolhido pelo governo provisório Temer-Cunha:

"Não gostei. Tanta gente da Lava Jato?! Não era combate a corrupção?", questionou. "Temo [retrocessos] porque a cara do ministério não é cara de compromisso social."

Barreto é governador do mesmo estado do atual líder do governo na Câmara, deputado André Moura, que se orgulha de ser chamado de André Cunha (sic).

"Sabe quem foi condenado na família dele [Moura, ou Cunha - assim como o governo provisório é Temer-Cunha]? Ele, inelegível; a esposa dele, inelegível; o cunhado prefeito de Pirambu; a mãe dele e a irmã também. Todos condenados por improbidade e corrupção! Esse rapaz é o líder do governo. É demais pra mim", disse.

Jackson Barreto espera que esse pesadelo passe e o Senado acabe corrigindo a besteira que fez, ao ver o desastre a que a dupla Temer-Cunha, com o auxílio do vendilhão José Serra, está condenando o Brasil:

"Temos que discutir a quebra do processo democrático. Eu me sinto frustrado em ter sido um combatente contra a ditadura, ser um preso político, ser julgado na auditoria militar, sofrer todo tido de perseguição e, depois de tanta luta, ver a quebra desse processo democrático.Torço para que volte a democracia. Porque se a democracia voltar, Dilma volta". [Fonte: Uol]

(fonte: http://blogdomello.blogspot.com.br/2016/05/racha-no-governo-temer-cunha-governador-do-pmdb-torce-pra-democracia-voltar.html)

sábado, 21 de maio de 2016

Democracia e conquistas sociais

por Antônio de Paiva Moura

Na concepção iluminista de democracia, a liberdade e a cidadania só são possíveis se o indivíduo estiver no direito da posse de bens. Na concepção de Locke, todo indivíduo é potencialmente cidadão, porque potencialmente proprietário. Na teoria liberal a cidadania é inadmissível sem a propriedade privada. Portanto, a democracia política liberal identifica-se com a liberdade do proprietário. Há na atualidade, uma
herança ideológica do individualismo possessivo.

Lembre-se que nos séculos dezoito e dezenove, só podia votar e ser votado quem fosse grande proprietário. A maioria absoluta da população estava fora do processo político, inteiramente subalterna. No século vinte os despossuídos conquistaram o direito de votar, mas somente se fossem alfabetizados. Mulheres, também não podiam votar. Incluindo mulheres e analfabetos, nada mais que 5% da população eram eleitores.

Na Revolução Francesa, a Assembléia Legislativa foi eleita em 1791 com um sufrágio censitário de dois graus: voto masculino e eleitor só com renda fixa. A resistência contra o voto feminino era tão forte que Olimpe de Gauges (1748-1793) foi guilhotinada porque reivindicava igualdade de direitos com os homens. O patriarcalismo impedia que as mulheres tivessem rendas, exatamente para que elas não tivessem nenhum poder ou direito.

Os votos de não possuidores eram controlados coercitivamente pelos possuidores. A literatura fictícia ou historiográfica está repleta de exemplos de coronéis urbanos e rurais que obrigavam seus empregados a votarem em quem fosse determinado por eles. No final do século vinte os analfabetos conquistaram o direito a votar.

Com o aumento da população urbana e evolução do sistema de comunicação, houve uma substancial mudança no modo de controlar os votos populares. Antes o controle eleitoral era feito por meio de relações interpessoais e, na atualidade, através dos meios de comunicação. As grandes redes de televisão, rádio e jornal são de propriedades de poucas famílias, sendo estas as mais afortunadas do país.

O empresariado faz a clientela econômica dessas redes de comunicação e impõe controle ideológico sobre elas. É visível a influência da mídia sobre o eleitorado despolitizado. Janio Quadros, em 1960, contou com a colaboração da mídia para passar a falsa idéia de que era um homem pobre, capaz de varrer com vassoura toda a corrupção reinante em sua época. Fernando Collor de Mello, descendente de família governamental e abastada de Alagoas, obteve a colaboração da mídia para projetar sua imagem como o “caçador de marajás” e salvador dos “descamisados”.

A democracia é oriunda de mobilizações populares e nada deve ao liberalismo econômico. As grandes conquistas democráticas e sociais foram com lutas pacíficas e cruentas. Redução de jornada de trabalho custou inúmeras vidas de homens e mulheres; direito a férias anuais; descanso semanal remunerado; emancipação progressiva da mulher; proteção às crianças e outros benefícios. Nada disso foi uma concessão humanitária da burguesia, mas fruto de lutas, com a força das massas trabalhadoras. O
direito de greve não é uma dádiva do capitalismo, mas a força do trabalhador assalariado que o fez ser exarado em leis e constituições.

No presente, o foco da luta é para preservar as conquistas sociais e buscar a progressiva diminuição do abismo entre ricos e pobres; melhorar distribuição de renda e por meio de novo sistema tributário; aperfeiçoamento do sistema judiciário, que amparado por leis, privilegia a classe dos possuidores e age com rigor contra os despossuídos.

sexta-feira, 20 de maio de 2016

VII Encontro de pesquisadores do Caminho Novo

17 de junho de 2016 - sexta-feira

Local: Auditório da Fundação Educacional São José (antiga Escola Normal), Avenida Getúlio Vargas, 547, Centro 
08:00h – Inscrições gratuitas feitas na hora – vagas limitadas ao espaço físico do auditório – público alvo: pesquisadores e professores
08:30h – Abertura – organizadores - Apresentação dos participantes - Professores Luiz Mauro Andrade da Fonseca e Francisco Rodrigues de Oliveira (Centro de Memória Belisário Pena e Associação dos Amigos do Arquivo Público Altair Savassi – Barbacena)
09:00h – “Educação Patrimonial em Santos Dumont” – Professores Bruno Campos Guilarducci, Ana Maria Marques Dias e Marisa Fontes (Prefeitura Municipal de Santos Dumont)
09:30h - “Homens ‘civilizados’, homens de negócios: São João Del Rei e as elites oitocentistas (1822-1842) ” – Prof. Leonardo Bassoli Ângelo (Programa de Pós-Graduação em História – Universidade Federal de Juiz de Fora)
10:00h – intervalo – café
10:30h – “Abandono e esquecimento: o patrimônio histórico nos caminhos antigos na Baixada Fluminense” – Prof. Paulo Clarindo (Coordenador do Grupo Amigos do Patrimônio Cultural – Nova Iguaçu – RJ).
11:00h - “A história social através do método de pesquisa genealógica: a genealogia corrigindo lapsos da história. ” – Prof.ª Nilza Cantoni (Leopoldina)
11:30h - “Santeiro, além da matéria” – Escultor Luciomar Sebastião de Jesus (Congonhas)
12:00h – Almoço 
14:00h – “Vias de Minas: Caminho Novo e Ferrovias” – Prof.ª Helena Guimarães Campos (Belo Horizonte)
14:30h – "O traçado da E. F. Dom Pedro II e suas coincidências com o Caminho Novo". – Prof. Antonio Pastori (Rio de Janeiro).
15:00h – "Instituto Federal e a Preservação da Educação Ferroviária" – Prof. André Diniz de Oliveira (Diretor do IFET – Santos Dumont).
15:30h – “Os Caminhos de Ernst Hasenclever em Minas Gerais” – Edson Brandão (Secretário de Cultura de Barbacena). Lançamento de livro.
16:00h – intervalo – café
16:30h – Mesa-redonda “Arquivos Públicos Regionais” – Barbacena (Prof.ª Edna Resende), São João del Rei (Prof. Jairo Machado) e Juiz de Fora (Prof. Antônio Henrique Duarte Lacerda).
17:30h – “Santos Dumont nos mapas antigos” – Prof. Antônio Gilberto da Costa (Belo Horizonte – UFMG)
18:00h – - “Atuação do Ministério Público de Minas Gerais na defesa do patrimônio cultural da Estrada Real - Caminho Novo” - Dr. Marcos Paulo de Souza Miranda (Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Histórico e Cultural de Minas Gerais).
Durante todo o dia, exposição e venda de livros relacionados pela Livraria Quarup, de Juiz de Fora, de livros usados, a cargo de Cláudio Luiz da Silva. Livros sobre o Caminho Novo e cidades mineiras. Lançamentos.
Após o final das comunicações, jantar de confraternização (por adesão) entre os participantes do evento, com música de fundo (roda de choro).


18 de junho de 2016 – sábado 

09:00h – Turismo cultural pela cidade de Santos Dumont, compreendendo Museu Casa Natal de Santos Dumont, primeiras fábricas de laticínios, Estrada União e Indústria, e Fazenda da Mantiqueira.

terça-feira, 17 de maio de 2016

Os ‘Documentos do Pentágono’ e as lições de quem os revelou ao mundo


Texto escrito por José de Souza Castro:

Quando, na boa companhia de Leonardo Boff e de muitos outros, chamo a atenção para o papel dos Estados Unidos no golpe parlamentar que derrubou a presidente Dilma Rousseff, não é porque somos inocenteis úteis pagos pelo ouro de Moscou, como se dizia na década de 1960 sobre os que defendiam o governo Jango Goulart.
Senadores dos EUA abrem caixa contendo os Documentos do Pentágono (jun/1971). Foto no site da Universidade do Missouri (EUA)
Senadores dos EUA abrem caixa contendo os Documentos do Pentágono (jun/1971). Foto no site da Universidade do Missouri (EUA)
É porque ainda acho que é preciso denunciar o imperialismo norte-americano, como pensava Daniel Ellsberg, o analista militar do Pentágono que, em março de 1971, entregou ao “The New York Times” os Documentos do Pentágno (7.000 páginas em 47 volumes) que, publicados a partir de junho, reforçaram a luta dos norte-americanos que se opunham à Guerra do Vietnã.
Tratado como um traidor pelo governo Nixon, Ellsberg foi inocentado pela Justiça e ainda vive, aos 85 anos. Tornou-se professor e ativista pela paz e contra as armas nucleares. Escreveu três livros – “Papers on the War” (1971); “Secrets: A Memoir of Vietnã and the Pentagon Papers” (2002); e “Risk, Ambiguity and Decision” (2001) – e incontáveis artigos sobre economia, política externa e desarmamento nuclear. Em 2006, ganhou o Right Livelihood Award, conhecido como o Prêmio Nobel Alternativo, “por pôr a paz e a verdade em primeiro lugar, sob considerável risco pessoal, e por dedicar sua vida a inspirar outros a seguir seu exemplo”.
Paulo Francis morava em Nova York e escrevia para a revista “Status” da Editora Três, quando, em plena ditadura militar, entrevistou Ellsberg. As verdades que ouviu podiam ser publicadas no Brasil, porque a revista, inspirada na norte-americana “Playboy”, tinha poucos milhares de leitores, a maioria mais interessada nas fotos de mulheres nuas do que nas revelações de Ellsberg.
A edição da "Status" com a entrevista de Ellsberg a Paulo Francis.
A edição da “Status” com a entrevista de Ellsberg a Paulo Francis.
Fundada em agosto de 1974, “Status” era vendida nas bancas encartada em envelope de plástico escuro para que a capa não ficasse exposta ao público, em obediência ao Decreto 1.077, que estabelecia censura prévia a qualquer revista ou livro que trouxesse fotos ou desenhos de mulheres nuas. A Portaria 209 determinava que a foto só podia ser liberada pelos censores caso não expusesse os dois seios da mulher (um era permitido) e as partes genitais.
Foi nesse ambiente de censura estúpida – aliás, bem ao agrado de muitos que saíram às ruas gritando “Fora Dilma!” – que Ellsberg admitiu a Francis que existia conexão entre os “Documentos do Pentágono” e o escândalo de Watergate, “mas nunca interessou aos liberais explorar a conexão”. Ele explicou:
“Porque isso seria admitir que somos governados dentro do mesmo espírito de violência e corrupção que preside as ações do país no exterior. O povo ficaria chocado. Qualquer povo. Daí a necessidade de apresentar Vietnã e Watergate como aberrações, fenômenos isolados de malaise num organismo sadio. Essa ladainha é partilhada por liberais e conservadores. E no entanto, é óbvio, me parece, que, se consentimos em que o governo decida secretamente invadir um país miserável e atrasado, com objetivo imperial, e pretendemos acreditar na desculpa de que Washington sempre defende a democracia e não interesses estratégicos fundados numa visão imoral do mundo, quem pode se surpreender se, internamente, o governo age na mesma linha?”
Mesmo após a derrota no Vietnã, Gerald Ford (que sucedeu a Nixon) e Henry Kissinger enviaram secretamente agentes da CIA a Angola, para combater os negros que combatiam o colonialismo português. Outro fracasso da política externa dos EUA.
Ellsberg depõe em comissão do Senado. (Maio/1973). Foto tirada do site da Universidade do Missouri (EUA)
Ellsberg depõe em comissão do Senado. (Maio/1973). Foto tirada do site da Universidade do Missouri (EUA)
Acredite, disse Ellsberg, que no Pentágono e em empresas contratadas, são estudados “planos de contingência” contra “as massas negras, marrons e amarelas do mundo que se multiplicam espantosamente e, na sua pobreza e desespero, um dia se revoltarão contra as sociedades industriais do Ocidente, que as exploram. É prevendo esse desfecho que nossos estrategistas estocam armas”.
Para Ellsberg, se ao contrário, tivessem facultado aos pobres a tecnologia e outros recursos indispensáveis à criação de uma sociedade moderna, “os EUA teriam literalmente conquistado o mundo”. E explica: “Temos um gênio criador incomparável em serviços de todo tipo, de que a humanidade precisa. Já a predatória rota imperial termina encontrando obstáculos intransponíveis. Nesse contexto a resistência dos vietnamitas é emblemática do que acontecerá, um dia, no mundo todo”.
Passadas três décadas, está longe da profecia se realizar, como ficou claro agora no Brasil.
Na minha modesta opinião, uma mudança no mundo só ocorrerá se houver revolução nos Estados Unidos. Mas Ellsberg acreditava que, em seu país, não havia necessidade de revolução. “Do que precisamos é tornar a Constituição um instrumento de poder popular”. Para ele, Karl Marx não acrescentou nada a Thomas Jefferson. E tornar a Constituição um instrumento de poder popular “é mais uma reforma em nível nacional e internacional, devolvendo o poder ao povo, do controle de armas nucleares à eliminação das gestapos da CIA e FBI”.
Precisaríamos, continuou Ellsberg, “revisar nossas relações com o Terceiro Mundo, entrar numa relação de cooperação internacional. Continuaríamos ricos, pois cobraríamos pelos nossos serviços, nada de caridade, mas deixaríamos de explorar o próximo”.
Ellsberg na Guerra do Vietnã. Foto tirada do site da Universidade do Missouri (EUA)
Ellsberg na Guerra do Vietnã. Foto tirada do site da Universidade do Missouri (EUA)
Realista, ele admite que essa alternativa enfrenta enormes obstáculos no meio empresarial, militar e político dos Estados Unidos. O Brasil e os demais países do Terceiro Mundo que o digam.
A íntegra da entrevista de Ellsberg não está disponível na internet, mas pode ser encontrada num livro publicado em 1978 pela Editora Três com uma coletânea dos artigos de Paulo Francis, em 138 páginas.
Talvez eu volte ao livro, pois ele muito nos interessa por sua atualidade.
(fonte: https://kikacastro.com.br/2016/05/17/documentos-pentagono-golpe-dilma/#more-12570)

segunda-feira, 16 de maio de 2016

Revista Espaço Acadêmico

Revista Espaço Acadêmico
v. 16, n. 180 (2016): Revista Espaço Acadêmico, n. 180, maio de 2016 (ano XVI)
Sumário
http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/issue/view/1107

ciência & tecnologia
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Hábitos – Ingrediente essencial na seleção de profissionais às organizações orientadas a inovação e produtividade (01-04)
        Antonio Mendes Silva Filho

cinema
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O cineasta como intelectual militante político: uma análise da trajetória de produção de Jorge Bodanzky e Orlando Senna (05-17)
        Luis Alberto Gottwald Junior
A ação traz a esperança: se ela não volta, vá buscá-la. Análise do filme "Que horas ela volta?" e do clipe Boa Esperança (18-25)
        Murilo Leal Pereira Neto,       Silvia Beatriz Adoue

comunicação
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Igrejas eletrônicas: espetacularização e consumo de bens simbólicos no neopentecostalismoicos no neopentecostalismo (26-37)
        Roger Bressianini Almeida

convergências
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Golpismo, doença congênita do fascismo (38-50)
        Renato Nunes Bittencourt

cultura & sociedade
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Sociedade e cultura: do determinismo econômico ao desenvolvimento regional
(51-59)
        Daniel Claudy da Silveira

direito
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Entre o direito e a moralidade: o debate Hart-Devlin (60-69)
        Lucas Ferreira Cabreira

educação
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Bacharéis sem-terra! Uma análise da Ação Civil Pública contra a primeira turma de direito pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (70-81)
        Marcos Alfonso Spiess
A política educacional do governo Itamar Franco (1992-1995) e a questão da inclusão (82-97)
        Caio Augusto Toledo Padilha

política
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As transformações da democracia: de sua origem na Atenas clássica ao estágio da democracia fraternal (98-109)
        Giullianno Caçula Mendes
Perceber a política em tempos de Facebook: o caso das eleições presidenciais no Brasil em 2014 (110-121)
        Rodrigo Francisco Dias

sociologia da prática científica
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O paradigma científico: entre construções e rupturas (122-134)
        Taylon Felipe Silva

resenhas & livros
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Cadeias e prisões: o espaço prisional em evidência. (135-136)
        Danilo Henrique Martins
PEREIRA, Duarte. Repensando o marxismo. São Paulo: Editora Anita Garibaldi,
2016 (114p.) (137-142)
        REA Editor

Simpósio de Cartografia Histórica


domingo, 15 de maio de 2016

Com gabinete de homens brancos, Temer lança o Brasil nos braços dos EUA

Texto escrito por José de Souza Castro:

O novo ministério nomeado por Temer, com 23 homens, todos brancos, é um retorno à era de Ernesto Geisel (1974-1979), o último governante do país — um ditador — a escolher apenas ministros homens. Depois dele, até Figueiredo nomeou uma ministra, Esther de Figueiredo Ferraz, que ocupou a pasta da Educação.
Eu diria que a maior novidade na opção machista de gênero feita por Michel Temer é que ela ocorre quando, pela segunda vez, o embaixador dos Estados Unidos no Brasil é uma mulher, Liliana Ayalde, e outra, Hillary Clinton, pode vir a ser no ano que vem a presidente norte-americana. Hillary era secretária de Estado e veio à posse de Dilma Rousseff, em janeiro de 2010.
No entanto, o desprestígio das mulheres no Gabinete Temer não deverá ofuscar seu prestígio junto à Casa Branca. No mesmo dia em que o Senado afastou a primeira mulher na presidência da República, Dilma Rousseff, o presidente norte-americano, Barack Obama – o primeiro negro a assumir o cargo na história dos Estados Unidos – declarou que o processo de impeachment foi legal.
Obama foi tão ágil em reconhecer o belo trabalho feito por sua embaixadora no Brasil quanto o presidente Lyndon B. Johnson, em 1964, ao declarar a legitimidade do governo nascido do golpe militar que teve ajuda inestimável do então embaixador Lincoln Gordon.
É verdade que Ayalde, que antes havia preparado um golpe semelhante no Paraguai, ensinando como é possível afastar governos indesejáveis aos Estados Unidos sem recorrer às armas, agiu bem mais discretamente que Gordon (que havia solicitado a presença da 4ª Frota na costa brasileira para agir em caso de necessidade, antes de 31 de março de 1964, e era presença constante na imprensa, na época), mas tão ou mais eficiente que o embaixador.
Antes dela, a primeira embaixadora americana, Danna Hrinak, que ocupou o cargo em Brasília nos primeiros quatro anos deste século e hoje é presidente da Boeing no Brasil, também exerceu papel discreto, mas eficiente, durante a transição do governo de Fernando Henrique Cardoso para Lula.
Essas mulheres são excelentes diplomatas e leais ao seu país – o que não se pode dizer, infelizmente, de muitos brasileiros em altos postos. Por exemplo, Michel Temer e seu ministro das Relações Exteriores, José Serra. Ambos, atentos à Petrobras e ao pré-sal, para grande tranquilidade das grandes petroleiras norte-americanas.

MICHEL TEMER, INFORMANTE DOS EUA

A colaboração de Michel Temer com os Estados Unidos começou não sei quando. Mas, na última sexta-feira, soube – AQUI e, na íntegra, em inglês, AQUI – que o novo presidente (interino) brasileiro foi informante da embaixada dos Estados Unidos, conforme correspondência vazada pelo Wikileaks, em pelo menos duas ocasiões: janeiro e junho de 2006.
Na ocasião, ele era presidente nacional do PMDB, que desde janeiro de 2004 tinha um pé no governo Lula. Naquele distante janeiro, José Sarney emplacou um correligionário, Silas Rondeau, como presidente da Eletrobrás. Em julho de 2005, com a saída de José Dirceu da Casa Civil, por causa do Mensalão, Lula nomeou Dilma Rousseff para o lugar de Dirceu, e Rondeau, ainda por indicação de Sarney – a figura mais poderosa do PMDB na ocasião – foi promovido a ministro das Minas e Energia, no lugar de Dilma. E ali ficou até ser demitido por Lula após revelação de tráfico de influência e participação em esquema de fraudes em licitações, descobertos pela Operação Navalha da Polícia Federal.
Em 2006, Lula iria concorrer à reeleição. O principal adversário era Geraldo Alckmin, do PSDB. O primeiro telegrama da embaixada vazado pelo Wikileaks, de janeiro de 2006, diz o seguinte, em tradução livre:
“Michel Temer, Presidente do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), acredita que o Presidente Lula fez um trabalho de mestre para dissociar-se dos escândalos de corrupção política que esmagaram alguns de seus principais assessores. Ele também expandiu efetivamente programas sociais para ganhar a lealdade e o apoio das classes sociais inferiores. Ao mesmo tempo, o oponente de Lula, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, sofre de uma ausência de carisma e não conseguiu deixar uma marca visível nos cinco anos à frente do mais importante estado do Brasil. Não obstante, Temer recusa-se a prever o que acontecerá nessa corrida, exceto dizer que haverá segundo turno, no qual “tudo pode acontecer”. Ele confirmou que seu próprio partido não apresentará candidato a presidente e não se aliará nem com o Partido dos Trabalhadores (PT) de Lula, nem com o oposicionista Partido Social Democrático Brasileiro (PSDB), pelo menos, não antes do segundo turno. Porém, o PMDB vencerá as corridas em no mínimo dez e possivelmente até em 15 estados, e de novo terá o maior bloco tanto no Senado como na Câmara dos Deputados, portanto, “qualquer que vença a eleição presidencial terá que vir a nós para conseguir fazer qualquer coisa”.
Na realidade, o PMDB não lançou candidato e nem apoiou formalmente qualquer candidato no segundo turno, apesar dos esforços de Lula para cooptar o partido de Temer. Mas obteve apoio informal de setores do PMDB. Que só elegeu sete governadores, e não os mais de 10 previstos pelo informante da embaixada norte-americana.
Erros à parte, ninguém duvide que os Estados Unidos participaram da derrubada de Dilma Rousseff. Sua expertise vem de longa data, como se lê num artigo de Elio Gaspari, de julho de 2008: “Um levantamento do professor John Coatsworth, da Universidade Columbia, ensina que, entre 1898 e 1994, os Estados Unidos ajudaram a derrubar 41 governos latino-americanos. Um a cada 28 meses. As intervenções militares diretas foram 17 e nessa conta não entraram a fracassada invasão de Cuba, de 1961, e a deposição do presidente haitiano Jean-Bertrand Aristide, em 1984.”
O colunista da “Folha de S. Paulo” destaca, no mesmo artigo: “O poderio naval americano já se meteu quatro vezes na vida brasileira, em 1864, 1893, 1941 e 1964”.
Quanto à participação de Temer no golpe, muito já se escreveu, e não vou insistir no assunto. Mas não posso ignorar essa discretíssima notícia publicada pelo Portal do Planalto em 11 de junho de 2013, com uma modificação (por que será?) em 4 de julho de 2014:
“Vice-presidente Michel Temer recebe visita do Senador John Mccain (Arizona/EUA), Senador John Barrasso (Wyoming/EUA) e Embaixador Thomas A Shannon Jr.”
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Foto: Aluízio Gomes – Ascom/VPR

(fonte: https://kikacastro.com.br/2016/05/15/temer-informante-eua/#more-12566)

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sexta-feira, 13 de maio de 2016

O brasileiro saiu do armário no governo Dilma

Charge do grande Duke, publicada no jornal "O Tempo"
Charge do grande Duke, publicada no jornal “O Tempo”

Texto escrito por Beto Trajano:

Entramos em um novo governo. Um governo que não foi eleito. Mas foi colocado no maior cargo do país por deputados e senadores. Foram 13 anos de um governo popular — e seriam 16, no mínimo, se o voto fosse respeitado. Mas no Brasil nada é respeitado. Ô país avacalhado!

A presidente, execrada e difamada de todas as formas indignas, vai saindo. Uma pessoa guerreira, que errou muito, mas abriu as saias para mostrar a suruba que é a política nacional e toda a nossa sociedade.

Dilma, obrigado por deixar o país viver a queda da grande máscara das pessoas. Muitas características obscuras foram expostas desde 2013, quando começaram as manifestações, e os brasileiros foram às ruas.

Tudo que estava guardado dentro de cada um apareceu, as pessoas mostraram suas caras boas e ruins: falsas, libertárias, ignorantes, inteligentes, progressistas, reacionárias, retrógradas, racistas, de esquerda, elitizadas, de direita, pobres, tristes, depressivas, felizes, sãs, drogadas, alegres, democratas, golpistas e muitas outras características do brasileiro, que o seu governo, democrático, extremamente democrático, deixou transparecer.

O seu maior legado será este. A máscara do brasileiro caiu.
Charge do Duke, publicada no jornal "O Tempo"
Charge do Duke, publicada no jornal “O Tempo”

(fonte: https://kikacastro.com.br/2016/05/13/brasileiro-sai-armario/#more-12527)

segunda-feira, 9 de maio de 2016

400 anos da morte de Shakespeare, democracia e golpe

GILBERTO PUCCA*

Creio que não devemos relativizar a situação política que o Brasil atravessa. Em poucos momentos da história do país enfrentamos situação similar. Os governos Vargas e Goulart são os que mais se aproximam. Subscrito pelo jornalista Paulo Henrique Amorim: “No Brasil há pouca disposição de absorver governos trabalhistas”. Coisa que parecia superada, a ruptura institucional volta à pauta em roupagem moderna. Este clima fabricado produziu o pano de fundo da polarização de posições. Tudo virou binário, ou se está desse lado ou se está do outro, contra ou a favor, ladrão ou honesto, mocinho ou bandido.
A corrupção está no outro e, de preferência, no inimigo. Mediação, inferência e análise, saíram de moda. Talvez por isso, literatura de autoajuda esteja entre as mais consumidas. Não sei o que é causa ou efeito. É a projeção do mundo ideal, produzido à luz das nossas verdades e interesses individuais. Talvez Polônio, em Hamlet no século XVI tenha sido o precursor da autoajuda do século XX: “Ser fiel a ti próprio e seja feliz”. Porém Hamlet também explicita: “Há algo de podre no reino da Dinamarca”, ou seja, a corrupção não está apenas nos outros, ela é estrutural e pode estar também em nós, na educação que damos a nossos filhos, na ultrapassagem pelo acostamento, em pagar uma conta a menos sabendo que alguém errou, em comprar atestado de dentista para lançar no Imposto de Renda. Ser binário é quase como escolher Paulo Coelho a Shakespeare. O problema disso tudo é que a polarização interdita o debate. As opiniões pré-fabricadas já estão prontas para ser atiradas contra o inimigo, a racionalidade se assemelha ao Homem de Neandertal. A polarização é terreno fértil para a intolerância, que, por sua vez, é a mãe da violência. Nesse terreno, racismo, xenofobia, homofobia, machismo são postos em prática, sem constrangimentos, e por muitas vezes, em plataformas políticas encontrando ressonância. É por isso que nesta conjuntura há grupos que chegam a defender o fim da democracia.
Viver em sociedade é um exercício de construção de mediações, e o limite da defesa de posições deve ser a fronteira das liberdades democráticas, individuais e coletivas e não podemos negociar com quem tenta ultrapassá-las, seja quem for. Mas as forças vivas e democráticas da sociedade precisam ter espaço para se expressar; se não há esse espaço essas forças eclodem por outros meios. Um exemplo: as manifestações de rua de 2013. Os estádios da Copa funcionaram como estopim, tanto é que a primeira manifestação ocorreu horas antes do jogo inaugural da Copa das Confederações, aqui em Brasília, no Mané Garrincha. Menos do que a corrupção, as construções simbolizaram o distanciamento entre obras esportivas e a necessidade de ampliação de políticas públicas.
Diferente de agora, lá em 2013 não foi apenas a oposição que ocupou as ruas. A sociedade pedia, em síntese, mais políticas públicas. No meu modo de entender, belíssima bandeira. Não se contentavam mais com um SUS meia boca, com a ampliação da educação que ainda não tinha chegado a todos, com a grande inclusão no mercado formal de trabalho, mas também, com a qualidade desse trabalho. A grande inclusão que houve de jovens nas universidades qualificou inclusive as demandas, não bastava mais estar na universidade, se exigia oportunidades iguais para todos. Isso mobilizou todos os setores, das mais variadas matrizes ideológicas, da esquerda à direita democrática. Sem dúvida, fundamentalistas, alimentados e financiados até possivelmente pelo exterior, se infiltraram, mas eram minoria. Mas o fato é que as forças de uma sociedade, considerada até então pacata, eclodiu. O brasileiro não aceitava tudo? Não éramos cordiais? Naquelas manifestações um dos grandes rejeitados eram os partidos políticos, todos. Não era só o PT, ou somente bandeiras vermelhas que eram reprimidas, eram também, as azuis, pretas e amarelas. Proclamava-se que era a sociedade se manifestando sem tutela.
O grito era claro, ninguém nos representa, nem os partidos. O problema, é que, fora das premissas de Bakunin, quando construiu algumas dos princípios do anarquismo ou do comunismo na sua utopia, representações institucionais são necessárias, porque são elas, que devem catalisar se não o consenso, mas as aspirações da maioria. Se não existir esse canal de representação, os desejos, a vontade da sociedade que se expressa em reivindicações, simplesmente se dispersam.
Lembro de uma conversa que tive com o vice-presidente da Câmara dos Deputados, dias depois daquela noite de 21 de junho de 2013, quando mais de 50 mil pessoas se concentraram em frente ao Congresso Nacional, inclusive, depredando o Palácio do Itamaraty. Dizia o Deputado a época: “Fui um dos parlamentares que ficou dentro do prédio aguardando para tentar mediar o dialogo com os manifestantes que, inclusive, queriam invadir. Convidamos uma comissão que os representasse, para recebermos, tentar encaminhar as reivindicações, mas não conseguimos, pois não tinham líderes”. Isso pode parecer alvissareiro, mas não acredito que seja. Não podemos confundir líderes com ditadores ou usurpadores do poder. Líderes congregam o desejo da maioria.
Sem representações como se materializam as reivindicações? Em uma sociedade moderna, com quase 200 milhões de pessoas, como a brasileira, democracia direta não é viável, logo se constrói a democracia representativa. Mas este é o ponto, por mais óbvio que seja, a democracia representativa tem que representar. E nós, cada um de nós, as forças sociais no Brasil, sejam quais forem, se sentem representadas pelos políticos atuais? Nosso sistema político, que é a estrutura que alicerça nossa representação, está adequado? A sociedade se enxerga no conjunto dos parlamentos?
O problema não está apenas no Congresso Nacional, este é somente o que mais aparece. Está também nos grotões, naquela Câmara Municipal daquele pequeno e longínquo município, onde alguns vereadores e prefeitos se elegem prometendo empregos e distribuindo benefícios e, depois de eleitos, recebem emendas e favores dos candidatos a deputados estaduais e federais, e assim sucessivamente. Está também no nosso voto que, por vezes, optamos menos por suas posições e sua plataforma ideológica e mais pelo candidato que é nosso vizinho. Muitas vezes pensamos: se é meu vizinho certamente terei facilidade. O resultado para estes casos é bastante conhecido: depois que se elegem nos dão uma banana.
É Claro, da mesma forma que ingenuamente tentamos usar aquele voto para eleger alguém que dê um jeitinho para nós, estamos sendo usados. Esse parlamentar eleito tem vínculo com quem? Quem ele representa de fato? Você que votou esperando uma ajudazinha, na maioria das vezes está fora do jogo.
Tem um (infeliz) ditado popular que diz: “Cada povo tem o governo que merece”. É mais ou menos dizer o seguinte: olha povo, olha eleitor, você não serve para nada, contente-se com isso, as coisas nunca melhorarão. Isto se presta apenas para quem quer se perpetuar no poder e exercê-lo sem participação. O que faz o nosso voto e, por conseqüência, a nossa representação não servir para nada, ou melhor, servir aos usurpadores é o nosso sistema político. Por isso que a Reforma Política nunca sai.
Venhamos e convenhamos, reforma política é um papo chato. Tenho mais o que fazer. Tenho que trabalhar, inclusive. O que tenho a ver com isso? A raiz da questão está diretamente relacionada ao nosso ultrapassado sistema político. Temos um país do século XXI com uma estrutura política do século XIX.
Mesmo com direito ao voto universal, a nossa representatividade beira a monarquia, algo como abolicionistas contra escravocratas. Você acha que em eleições proporcionais os candidatos mais votados se elegem e os menos votados ficam de fora? Para quem não sabe, prepare o estômago. Dos 513 deputados federais eleitos em 2014, apenas 35 chegaram lá exclusivamente pelo desejo dos eleitores. Olhando-se o copo, pela parte meio vazia, 93% da Câmara Federal é composta por parlamentares que precisaram de votos alheios para se eleger.
No caso específico de São Paulo apenas dois deputados federais, Tiririca e Gabriel Chalita, ultrapassaram o quociente eleitoral de 304 mil votos e de quebra, ajudaram outros 68 candidatos paulistas a se elegerem com suas sobras. Uma pergunta não quer calar: é o povo que vota errado, como querem nos convencer, ou existe um sistema claramente distorcido de representação? Além disso, até as ultimas eleições havia outra variável; o financiamento de campanha.
Neste sistema eleitoral bastavam ter propostas boas e convincentes para se eleger? A resposta é não. Quem não teve dinheiro para fazer campanha não se elegeu. Na média, cada congressista que tomou posse em 2015 gastou R$ 1,6 milhão em sua campanha eleitoral. Quem não tinha, conseguiu quem financiasse.
Este é outro ponto determinante: financiamento privado de campanhas. No Brasil, até este ano era legal empresas financiarem campanhas. Pergunta, quando votamos somos movidos pelo quê? Resumidamente vejo duas motivações, uma nobre e outra nem tanto: a primeira, porque quero algo melhor para todos; a segunda, por algum interesse próprio. Empresa tem ideologia? Então o que motiva uma empresa privada a colocar dinheiro na campanha de alguém? Seja de que partido for. Seria prejulgar admitir que se uma empresa coloca seu dinheiro em alguma campanha ela quer algo em troca? Parece-me que não. Lewis Carroll, no século XIX quando escreveu Alice nos País das Maravilhas, poderia até admitir que pudesse existir país imune à corrupção, mas diga-se de passagem que nem ele ousou tanto. Não existe. O que temos que fazer é coibi-la ao máximo que as instituições forem capazes. Com instrumentos transparentes de acompanhamento, Corregedorias, Ministério Público, entidades civis atuantes, arcabouço jurídico adequado.
Aqui cabe uma ressalva: uma das bases da democracia é o Estado Democrático de Direito, e um dos seus pilares de sustentação é o acesso de qualquer cidadão à Justiça. Um levantamento produzido pela Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), comprova a falta de defensores públicos em 72% das comarcas brasileiras. Nessas localidades não existe serviço de assistência jurídica gratuita para quem não tem condições de pagar um advogado. Na justiça estamos ainda no período pré SUS.
Uma das grandes virtudes do sistema democrático é que as coisas aparecem, só assim para corrigi-las. Quem quer acabar com a democracia é quem quer se aproveitar do obscurantismo. Nestes tempos de polarização, a pergunta que temos que responder é o que fazer para sermos melhor representados e para que as mais diferentes matizes políticas e ideológicas consigam se expressar e canalizar as forças da sociedade para um parlamento de fato à altura das tarefas.
Tenho defendido veementemente que não podemos perder o foco na Reforma Política e mesmo ciente que o fim do financiamento privado de campanhas não resolve tudo, acredito que ajudará para que sejamos melhor representados num futuro próximo. Sem dúvida, boa parte do foco de falcatruas e coisas erradas, quando aparece na mídia, recai sobre os políticos, mas talvez, se todas as categorias profissionais fossem acompanhadas e monitoradas da mesma forma que são os políticos, temo que fosse possível atingir o mesmo nível de corrupção.
A corrupção não é um fenômeno recente, muito menos brasileiro, pelo contrario, temos assistido instituições autônomas que funcionam e assim deve ser. Mas isso não basta. Se não reformularmos nosso sistema político e representativo isso tudo se repetirá, como vem se repetindo ao longo dos anos. Temos que aprender com as experiências de outros países, as exitosas e as que não lograram êxito.
Em 2010 o mundo foi chacoalhado com a Primavera Árabe, uma onda de manifestações e protestos no Oriente Médio e no norte da África reivindicando liberdade e o fim da corrupção. Mas os países árabes não enfrentaram suas reformas democráticas e o resultado foi que em muitos países, partidos e lideres fundamentalistas que pregavam soluções fáceis para problemas complexos venceram as eleições.
Há também o caso da Itália com a Operação “Mãos limpas”, que se iniciou em Milão e levou ao fim a chamada Primeira República Italiana e ao desaparecimento de muitos partidos políticos, mas, também, sem enfrentarem as grandes reformas políticas. Qual foi resultado? Silvio Berlusconi, um excêntrico magnata italiano que lidera o Partido Conservador e foi condenado por corrupção e libidinagem.
Política não é futebol, não é São Paulo contra Corinthians. É com a política que conseguimos mudar a condição de vida das pessoas. É da prática política que se formam os governos que irão interferir diretamente nas nossas vidas. E são aqueles grupos sociais excluídos que mais precisam de governos que produzam políticas públicas distributivas equânimes, a saúde é uma entre tantas outras.
Temos que cuidar para que oportunistas e diversionistas não criem um cenário para que o foco principal do que tem que ser corrigido passe despercebido. Estamos em uma bifurcação histórica. Ou radicalizamos os fundamentos democráticos, na defesa intransigente do Estado Democrático de Direito, ou regredimos. Respeito, mas não me somo àqueles que vociferam que aqui em nosso país nada dá certo, que o Brasil não presta.
Pelo contrário, acho que se não somos os melhores, também não devemos ser tido como exemplo de país totalitário e medíocre. Somos exemplo para o mundo com um conjunto de políticas publicas que retirou da miséria absoluta milhares pessoas em tão pouco tempo. Isso pode não falar aos corações de alguns que foram privilegiados pela loteria biológica. O espermatozoide de nosso pai e o óvulo de nossa mãe nos colocou em famílias que nos proveram de casa, comida e acesso à educação. Além de sortudos somos privilegiados. Mas isso não nos faz melhor que ninguém. Nos Estados Unidos as coisas são melhores? Muita coisa é, mas nem tudo. A defesa do Senhor José Maria Marin, ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol, por exemplo, tencionou para que o extraditassem da prisão da Suíça para os Estados Unidos, e lá está em prisão domiciliar, no Trump Tower, um dos prédios mais luxuosos de Manhattan, avaliado em US$ 2,6 milhões. Imóvel comprado com recursos desviados da entidade. O lamentável acontecimento faz a justiça norte-americana ser pior ou mais injusta que a nossa? Não creio. Mas também não devemos nada a ninguém no quesito julgamento/pena. Às vezes me pergunto por que os brasileiros falam tão mal de nós mesmos. No fundo acho que não gostam do Brasil. E aqui não vai nenhuma dose de patriotada, até porque questiono a razão de existirem fronteiras. Mas então o que fazer? Voltando a Hamlet no seu mais famoso monologo “…a consciência nos torna covardes”, porque quanto mais envelhecemos mais temos medo, e quanto mais temos medo, mais tomamos consciência. O que significa que aprendemos que a vida têm riscos e que a ignorância, em sentido inverso, pode ser uma benção. Isso pode explicar porque as ditaduras são beatificadas por alguns e porque, se quisermos de fato mudar e transformar as coisas, nem sempre as soluções fáceis são as mais adequadas. Aqueles que sempre apostaram nas soluções fáceis, geralmente sectárias e intolerantes, também diziam que a juventude, por via de regra, é alienada. Estavam mais uma vez errados. Que bom. Os estudantes secundaristas de São Paulo estão mostrando àqueles que estão envelhecendo sem perder a vontade de lutar que o caminho é segui-los. Porque um Brasil radicalmente democrático e melhor para todos é possível, principalmente para quem mais precisa do Estado e de políticas públicas equânimes.
* GILBERTO PUCCA é Diretor de Saúde do Trabalhador e Saúde Ambiental do Ministério da Saúde Sanitarista; Mestre em Epidemiologia (Escola Paulista de Medicina) e Doutor em Ciências da Saúde (UnB).
(fonte: https://espacoacademico.wordpress.com/2016/05/07/400-anos-da-morte-de-shakespeare-democracia-e-golpe/)