sábado, 27 de maio de 2017

Congresso abre portas para ampliar desmatamento na Amazônia


O Senado aprovou nesta terça-feira uma Medida Provisória que diminui a proteção ambiental em uma região onde as áreas de conservação federais já são as mais desmatadas. A Floresta Nacional do Jamanxim, em Novo Progresso (Pará), perdeu 480.000 dos seus 1,3 milhão de hectares, que foram incorporados à Área de Preservação Ambiental (APA) do Jamanxim, um tipo de proteção de menor rigor. Isso facilitará a legalização fundiária de latifúndios irregulares e possibilitará a ocupação de novas terras, hoje intactas, dentro da floresta amazônica, segundo ambientalistas.
O texto ainda terá que passar por sanção do presidente Michel Temer. A área ambiental do Governo já sinalizou que pedirá para que o presidente vete a medida que, pelas previsões do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, pode causar a degradação de 320.000 hectares de floresta, ou pouco mais do que duas vezes o tamanho da capital paulista.
A reportagem é de Talita Bedinelli, publicada por El País, 23-05-2017.

O projeto havia sido aprovado na terça passada na Câmara. Ele era uma versão modificada de uma Medida Provisória enviada ao Congresso pelo Governo federal. A medida original pretendia reduzir uma área de 304.000 hectares de Floresta Nacional (Flona), onde a ocupação privada é proibida, para APA, onde ela é permitida obedecendo regras ambientais. Segundo o diretor de criação e manejo de unidades de conservação do ICMBio, Paulo Carneiro, o objetivo era tentar solucionar um conflito fundiário existente na área, permitindo a regularização de propriedades que já estão dentro da floresta. Algumas delas já estavam no local antes da criação da Flona, há 11 anos. A retirada desses ocupantes exigia medidas judiciais. Regularizando estas áreas, seria possível fazer exigências ambientais aos proprietários, afirma Carneiro.
Para compensar o rebaixamento, o Governo propunha ainda que 437.000 hectares dos 1,3 milhão da floresta nacional fossem incorporados ao Parque Nacional do Rio Novo, uma área de proteção integral, ou seja, de conservação ainda mais rígida que as Florestas Nacionais. "Era uma medida compensatória, lastreada no Plano de Manejo da unidade e que abrangia a área mais relevante para a biodiversidade", explica o diretor do ICMbio.
A proposta, entretanto, sofreu mudanças no Congresso, durante uma comissão mista (da Câmara e do Senado), criada para analisar a Medida Provisória do Governo. A Câmara acabou aprovando o relatório do deputado federal José Priante (PMDB/PA). O texto desconsiderou a possibilidade de transformar parte da área em parque e aumentou em 176.000 hectares a área destinada à APA. Em seu Facebook, o deputado postou um vídeo em que comemorou a aprovação. "Dizia aos colegas, hoje [terça passada] estamos discutindo e votando a vida dos brasileiros que moram em Novo Progresso, um município onde as pessoas foram chamadas para habitar e lá produzem (...) Nós nada mais fizemos do que regular uma relação entre o homem que habita e produz nesta região com a preservação ambiental", afirmou ele.
A área destinada à APA pelo Congresso, entretanto, corresponde a uma quantidade maior do que a necessária para regularizar as propriedades já existentes lá, segundo cálculos do ICMbio. Existem no local, segundo Carneiro, 250 fazendas, a maioria latifúndios onde é feita a criação de gado. Também há uma forte presença de retirada seletiva de árvores nobres no local. "O Congresso exagerou a área da APA e, com isso, pode abrir uma nova frente de ocupação, já que na APA há a possibilidade de se regularizar a propriedade, o que não existia antes com a Flona", explica ele. Segundo ele, 320.000 hectares dentre o total rebaixado ainda são de floresta não ocupada.
A região onde está localizada a Jamanxim concentra as 12 unidades de conservação federal com maior quantidade de desmatamento ilegal. Segundo o ICMbio, 67% de toda a destruição em áreas preservadas federais do país ocorrem nestas unidades. O desmatamento na Amazônia cresceu 30% em 2016, últimos dados disponibilizados pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. Pará, Rondônia e Mato Grosso são os Estados que mais desmataram naquele ano.

(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/567980-congresso-abre-portas-para-ampliar-desmatamento-na-amazonia)

O "saudita" Trump não agrada o Papa Francisco


O Papa Francisco, fino analista da guerra mundial travada em pedaços, não deixou escapar o próximo problema que está sendo preparado por Trump e pelos estadunidenses no Oriente Médio. De fato, ele liquidou o presidente estadunidense em 40 minutos, o mesmo tempo do encontro entre Abbas e Trump. O resto, provavelmente, foi dito pelo secretário de Estado, Parolin, e Gallagher.
A reportagem é de Alberto Negri, publicada por Il Sole 24 Ore, 24-05-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

As relações com o Oriente Médio, há semanas, estão bastante claras, e a visita à Arábia Saudita deve ter fortalecido as convicções da Santa Sé: mais do que a luta contra o ISIS e os foreign fighters do Califado, os Estados Unidos estão se preparando para abrir um fronte contra o Irã e o Hezbollah, que obviamente envolve a Síria de Assad.

A euforia dos sauditas

Muito entusiasmo por parte dos sauditas pela visita de Trump: uma euforia justificada pela postura anti-iraniana assumida pelo presidente estadunidense em Riad e profundamente paga com encomendas de 110 bilhões de dólares em armas. Estas são as coisas que enfurecem o papa, que disse várias vezes que os problemas do Oriente Médio dependem da proliferação dos armamentos.

Certamente, esta não é a primeira vez que o Vaticano e os Estados Unidos se encontram em posições opostas, especialmente no Oriente Médio. Em 1991, João Paulo II tinha se oposto ao ataque ao Iraque depois da ocupação do Kuwait, porque Saddam era o protetor dos cristãos. Ainda mais forte foi a oposição do papa em 2003, convencido de que os regimes autoritários, mas laicos, eram a única barreira contra o Islã político.

As tensões entre a Casa Branca e o Vaticano continuaram com o Papa Ratzinger. A secretária de Estado, Hillary Clinton, teve uma boa atuação, na época, ao convencer Barack Obama de investir na Irmandade Muçulmana e de aplicar com as primaveras árabes de 2011 o “leading from behind”, ou seja, liderar nos bastidores.

Aqui começou o desastre em que ainda estamos imersos hoje. A questão da Líbia está diante dos olhos de todos: franceses, ingleses e estadunidenses, que não têm, como de costume, uma alternativa a Gaddafi, assim como não tinham para Saddam em 2003, fizeram afundar um país inteiro e até mesmo as fronteiras da Itália.

Pior ainda aconteceu com a Síria, onde Hillary Clinton, para obter o apoio financeiro das monarquias do Golfo, deu luz verde para Erdogan abrir a “rodovia da jihad”, a fim de abater o regime de Assad. Na realidade, tratava-se de uma guerra por procuração contra o Irã, arqui-inimigo dos árabes do Golfo e de Israel. Eles pensavam em manobrar os jihadistas que, agora, voltam atrás como uma sangrenta ressaca na Europa, como se viu também nestas horas na Grã-Bretanha.

Francisco e a oração em São Pedro

Embora não sendo um admirador de Assad, o Papa Bergoglio, em 2013, promoveu uma vigília de oração em São Pedro, da qual participou também a então ministra do Exterior italiana, Emma Bonino, que, depois, foi removida por Renzi: assim como o seu antecessor Ratzinger, o Papa Bergoglio tinha compreendido as graves consequências que estavam se adensando sobre os cristãos na Síria se vencesse a ala mais radical do Islã sunita. Os cristãos da Síria foram salvos pelo Hezbollah libanês xiita que libertaram os povoados das formações al-qaedistas.

Se esses são os antecedentes, pode-se imaginar o que o papa disse para Trump, ou seja, toda a sua discordância a uma operação militar no Oriente Médio destinada a atingir o Irã e o Hezbollah. Uma operação que, dentre outras coisas, envolve os ingleses e a Jordânia, com riscos nada pequenos para o reino hachemita. Mas este presidente estadunidense, como muitos outros que o precederam, também finge querer fazer a luta contra o terrorismo, mas, na realidade, ele o alimenta e tende a fazer favores aos seus patrocinadores sauditas e às monarquias do Golfo. Com os devastadores resultados que conhecemos.

(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/568013-o-saudita-trump-nao-agrada-o-papa-francisco)

Chacina no Pará escancara escalada da barbárie em conflitos agrários no Brasil

Nove homens e uma mulher, trabalhadores rurais sem terra, foram mortos nesta quarta-feira durante uma ação policial numa fazenda do município de Pau d’Arco, no Pará, a 860 quilômetros ao sul da capital Belém. Policiais militares e civis foram até o local para cumprir 16 mandados judiciais, entre eles de prisão preventiva, temporária e buscas e apreensões, numa ação que investiga a morte, no dia 30 de abril, de um segurança da fazenda, que é alvo de disputa agrária. Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Pará, os agentes foram recebidos a tiros e reagiram. No local foram recolhidas onze armas, entre elas um fuzil, mas não houve policiais feridos.

A reportagem é de María Martín e publicada por El País, 25-05-2017.

Os corpos das dez vítimas foram levados pela própria polícia ao necrotério da região, em Redenção, segundo informou a Folha. A fazenda Santa Lúcia, cenário do massacre, era motivo de disputa entre seu proprietário e trabalhadores sem terra. Desde maio de 2015, havia 150 famílias acampadas no local, conforme informações da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
As famílias desejavam que o imóvel fosse destinado à reforma agrária. Em junho de 2015, seu proprietário, Honorato Barbinski Filho, ofertou a fazenda para esse fim por cerca de 32 milhões de reais, quase 10 milhões a mais que a avaliação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que não pode pagar mais do que os técnicos determinarem. Houve uma contraproposta de Barbinski, mas ainda acima da avaliação. A negociação acabou entrando num impasse e o propriétario desistiu da venda em 2016 para posteriormente entrar na Justiça com um pedido de reintegração de posse. Desde outubro do ano passado, o Incra procurava alternativas para reassentar as famílias pois como a propriedade é considerada produtiva a lei não permite a desapropriação.
Este é considerado o pior massacre por conflito agrário desde a chacina de Eldorado do Carajás, em 1996, na mesma região, quando tropas da PM mataram 19 pessoas que participavam de uma marcha pacífica do Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra. 21 anos depois, nenhum dos responsáveis foi punido.
A violência no campo pela disputa de terras massacra dezenas de trabalhadores ano após ano. “O Brasil tem uma das estruturas fundiárias mais concentradas do mundo, herança do sistema colonial. Cerca de 1% dos proprietários detém 60% das terras”, explica Bernardo Mançano, professor da Unesp e coordenador do Dataluta, banco de dados da luta pela terra.
Só em 2017, contando as últimas vítimas, foram mortas 36 pessoas, segundo cálculos da CPT, um terço delas no Pará. Em abril, nove trabalhadores rurais foram assassinados por pistoleiros encapuzados num acampamento em Mato Grosso, acendendo, mais uma vez, o alerta de conflitos por terra no Brasil. A região, no meio da floresta Amazônica, estava ocupada por cerca de 100 famílias desde os anos 2000 e é alvo de madeireiros e disputada por fazendeiros, que buscam áreas para a criação de gado.
“Os latifundiários estão cada vez mais querendo ampliar essa concentração de propriedades porque o agronegócio e as corporações multinacionais estão muito interessados em arrendar essas terras, com o beneplácito do Governo. A fronteira amazônica que pega Mato Grosso, Rondônia e Pará é a fronteira agrícola do Brasil, para onde os latifundiários querem se expandir, e onde mais assassinatos de posseiros, camponeses e indígenas estamos vendo. Se eles resistem são eliminados”, lamenta Mançano.
O relatório de violência de 2016 da CPT revelou uma média de cinco assassinatos por mês com 61 mortes de quilombolas, indígenas, líderes e integrantes dos movimentos sem terra. É um aumento de 22% das mortes em comparação com 2015. O informe também denuncia a criminalização dos movimentos do campo. Houve um aumento de 86% nas ameaças de morte, de 68% nas tentativas de assassinato e de 185% das prisões. Entre 1985 e 2016 1.834 pessoas perderam a vida em conflitos no campo, mas, segundo a organização, apenas 31 mandantes desses assassinatos foram condenados.

(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/568058-chacina-no-para-escancara-escalada-da-barbarie-em-conflitos-agrarios-no-brasil)

sábado, 20 de maio de 2017

O que mais mata os jovens no Brasil e no mundo, segundo a OMS


A violência interpessoal é a principal razão pela qual jovens de 10 a 19 anos perdem a vida precocemente no Brasil, revelou a Organização Mundial da Saúde (OMS) à BBC Brasil.
A informação vem de um estudo global sobre óbito de adolescentes, publicado nesta terça-feira. A OMS estima que 1,2 milhão de adolescentes morrem por ano no mundo - três mil por dia.
A reportagem é de Marina Wentzel, publicada por BBC Brasil, 16-05-2017.

De acordo com a entidade, as principais causas de mortes entre adolescentes brasileiros de 10 a 15 anos são, nesta ordem: violência interpessoal, acidentes de trânsito, afogamento, leucemia e infecções respiratórias.
Já jovens na faixa de 15 a 19 anos morrem em decorrência de violência interpessoal, acidentes de trânsito, suicídio, afogamento e infecções respiratórias.

A OMS repassou esse ranking estimado com exclusividade à BBC Brasil, mas não ofereceu números absolutos para ilustrar a lista, pois o estudo foi organizado por regiões.
O Global Acceleration Action for the Health of Adolescents (Ação Global Acelerada para a Saúde de Adolescentes, em tradução livre) não avalia países individualmente, mas áreas econômicas do planeta. O Brasil está inserido na categoria "países de renda baixa-média das Américas".
A tendência observada dentro desse grupo também aponta a violência interpessoal como principal causa da morte, representando 43% dos óbitos.
"O Brasil se insere exatamente no perfil da região", disse à BBC Brasil, por email, Kate Strong, especialista da OMS para o monitoramento de crianças e jovens.

Violência interpessoal

O conceito de violência interpessoal explorado no documento é bastante amplo, pois engloba desde a preponderante agressão relacionada às gangues e ao narcotráfico até o feminicídio.
"Inclui assassinatos, agressão, brigas, bullying, violência entre parceiros sexuais e abuso emocional", descreve o documento.
De acordo com números da edição de 2016 do relatório, publicado pela iniciativa Mapadaviolência.org.br, a situação é preocupante. "A principal vítima da violência homicida no Brasil é a juventude", afirma o documento nacional.
Nesse levantamento, que compilou dados de 2014, foi observado que jovens de 15 a 29 anos de idade representavam aproximadamente 26% da população do país, mas a participação deles no total de homicídios por armas de fogo era desproporcionalmente superior. O peso demográfico dos jovens nos casos de mortes com armas correspondem a quase 60% dos crimes.
No resto do mundo, as cinco principais causas de morte entre jovens de ambos os sexos, de 10 e 19 anos são: acidentes de trânsito, infecções respiratórias (pneumonia), suicídio, infecções intestinais (diarreia) e afogamentos.
Mais de dois terços dessas mortes ocorrem em países em desenvolvimento, revelam os dados de 2015 da OMS.
Dividindo por sexo, a estimativa aponta que, no mundo todo, meninos de 10 a 19 anos morrem principalmente por acidentes de trânsito, violência interpessoal, afogamento, infecção do sistema respiratório e suicídio.
As meninas da mesma faixa-etária têm mortes atribuídas a infecções do sistema respiratório, suicídio, infecções intestinais, problemas relacionados à maternidade e acidentes de trânsito.
Essas tragédias poderiam ser evitadas se os países investissem mais em educação, serviços de saúde e apoio social, diz a OMS.
"O período da adolescência é um momento particularmente importante para a saúde, porque definirá hábitos que terão impacto na qualidade de vida pelas próximas décadas. É nessa época que a inatividade física, a má dieta e o comportamento sexual de risco têm início", disse a OMS.
A organização critica a falta de atenção dada a essa faixa-etária da população nas políticas públicas. "Adolescentes estiveram completamente ausentes dos planejamentos de saúde nacional por décadas", lamentou Flávia Bustreo, Diretora-Geral assistente da OMS.

Soluções

O documento aponta ainda soluções que podem ajudar a evitar essas mortes precoces. São sugestões de políticas públicas que podem ter grande impacto nas estatísticas.
Um exemplo é a recomendações da implementação de leis e campanhas de conscientização pelo uso do cinto de segurança. Em 2015, acidentes de trânsito mataram 115 mil jovens de 10 a 19 anos no mundo todo.
O Brasil é citado no documento como caso bem sucedido no combate a mortes no trânsito. "Entre 1991 e 1997 o Ministério da Saúde do Brasil registrou aumento dramático na mortalidade de jovens em acidentes de trânsito", afirma o documento.
"Em resposta, legisladores introduziram um novo código de trânsito em 1998 que tornava mais severa as punições aos infratores". O novo código de trânsito teria ajudado a salvar 5 mil vidas no período entre 1998 e 2001 segundo a OMS.
Direito de imagem iStock Image caption Autoimolação e suicídios também preocupam autoridades
Apesar de o trânsito ser um problema universal, há marcantes diferenças entre as regiões quanto às causas de óbito. Nos países de renda baixa-média da África, doenças transmissíveis como HIV-AIDS, infecções do sistema respiratório, meningite e diarréia são os principais vilões.
A anemia, doença causada pela deficiência de ferro no sangue, também é um mal muito comum, que atinge milhares de jovens no mundo todo em países pobres e ricos.
O suicídio, ou a morte acidental causada por atitudes auto-destrutivas, foi a terceira causa de mortalidade de adolescentes em 2015, totalizando 67 mil mortes. Em sua maioria, as vítimas são adolescentes mais velhos.
Em regiões com boas condições econômicas como a Europa, o suicídio também aparece entre as principais causas. Cortar a si mesmo é o tipo de auto-violência mais comum observado no continente.
A estimativa global da OMS é de que até 10% da população adolescente mundial cometa algum ato de violência contra si.
O documento recomenda fazer mais investimentos e dar atenção especial às pessoas nessa fase da vida, onde grandes frustrações e incertezas despontam: "jovens normalmente tomam responsabilidades de adultos como cuidar de irmãos menores, trabalhar, ter de abandonar os estudos, casar cedo, praticar sexo por dinheiro, simplesmente porque precisam dar conta das necessidades básicas de sobrevivência.
Como resultado, eles sofrem de desnutrição, acidentes, gravidez indesejada, violência sexual, doenças sexualmente transmissíveis e transtornos mentais", resume o documento.
"Melhorar a forma como o sistema de saúde atende aos adolescentes é apenas uma parte da melhora da saúde deles", diz Anthony Costello, médico da OMS.
"Uma família e uma comunidade que apoia os seus jovens são extremamente importantes", completa.
Entre as políticas básicas que os países devem tentar implementar para diminuir o risco de mortes precoces estão: programas de orientação sexual na escola, aumento da idade mínima para consumo de álcool, obrigatoriedade do uso do cinto de segurança nos automóveis e de capacetes para ciclistas e motociclistas; redução do acesso a armas de fogo, aumento da qualidade da água e melhoria da infra-estrutura sanitária.

(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/567738-o-que-mais-mata-os-jovens-no-brasil-e-no-mundo-segundo-a-oms)

Aleppo-Amsterdã-Rio de Janeiro

MARCELO GRUMAN*

Recentemente, o jornal O Globo publicou uma reportagem a respeito do impacto da guerra civil, que já dura seis anos, na saúde mental das crianças sírias. De acordo com a ONG Save the Children, grande parte delas sofre de estresse tóxico (ocorre quando a criança passa por adversidades frequentes ou prolongadas), estresse pós-traumático e situações extremas, como autoflagelação, tentativas de suicídio e até a perda da fala. Dois terços das crianças ouvidas perderam um ente querido, tiveram a casa bombardeada ou se feriram. O pai de um menino de três anos diz que o filho “acorda assustado no meio da noite, acorda gritando”. Escolas viraram escombros, abrigam refugiados ou foram transformadas em bases militares e/ou de tortura. Um professor afirmou que as crianças “esperam morrer para ir ao paraíso e estar, assim, em um lugar quente, comer e brincar”.
(Bana al-Alabed)
Uma dessas crianças, até pouco tempo, resistia com a família na parte leste da cidade de Aleppo, arrasada pela artilharia do exército sírio e dos rebeldes. Seu nome, Bana al-Alabed. Sua idade, sete anos. Nestes tempos modernos, de informação em tempo real, Bana relatava numa conta do Twitter, administrada por sua mãe, através de um celular carregado com energia solar (energia elétrica é raridade em Aleppo) o dia-a-dia de terror vivido por sua família e vizinhos. Ela dividia seu medo dos bombardeios e publicava fotos de edifícios destruídos. No dia 4 de outubro de 2016, publicou a foto de um jardim em escombros, era o jardim de sua casa. Em outra postagem, ao lado dos dois irmãos menores, sentados no chão, apareciam escrevendo “para esquecer a guerra”. Bana foi evacuada de Aleppo no final de 2016, junto com sua família. Ela ficou conhecida como a “Anne Frank de Aleppo”, por relatar os horrores da guerra.
(Anne Frank)
A Anne Frank “original” foi uma judia alemã cuja família abastada morava na cidade de Frankfurt, obrigada a refugiar-se na Holanda após a subida de Hitler ao poder em 1933. Ela tinha apenas quatro anos quando emigrou. Quando os alemães invadiram a Holanda, em 1940, a situação dos judeus holandeses se deteriorou rapidamente, e em 1942 a família Frank decidiu esconder-se no Anexo de uma fábrica em Amsterdã. Por dois anos – de 20 de junho de 1942 a 21 de julho de 1944 – Anne Frank expressou seus medos, angústias, decepções, raivas, alegrias e esperanças nas páginas de um diário, carinhosamente chamado de Kitty. Kitty era sua amiga, sua confidente.
Os relatos de Bana e o diário de Anne Frank são exemplos do processo de desumanização, animalização ou coisificação do “outro”, alvo da intolerância, do ressentimento, da ignorância, da arrogância dos que se incumbem de espalhar a verdade, doa a quem doer. Retirando-se qualquer traço de humanidade do “outro”, impossibilitando qualquer tipo de identificação, de compartilhamento de valores e visões de mundo, o homicídio transforma-se num simples dano colateral ou dever a cumprir.
A saúde mental de Anne Frank e dos demais moradores do Anexo também foi afetada pela guerra e pelo medo de serem descobertos a qualquer momento pelas tropas alemãs, conforme as descrições dos dias 10 de março e 1º de maio de 1943:
Ainda não superei meu medo de aviões e tiros, e me arrasto até a cama de papai quase todas as noites, em busca de conforto. (…) De repente, ouvimos uma rajada de metralhadora, e isso é de vez pior do que os canhões antiaéreos.
Hoje à noite, os canhões atiraram tanto que tive de juntar meus pertences quatro vezes. Hoje enchi uma mala com as coisas de que vou precisar caso tenha de fugir, mas, como mamãe observou corretamente: “para onde você iria?”.
Qualquer semelhança com a dor e o sofrimento das crianças sírias, que acordam gritando no meio da noite, não é mera coincidência.
No dia 6 de junho de 1944, o famoso “Dia D”, dia da invasão da Normandia pelas tropas aliadas, foi noticiado pela rádio BBC. Anne escreveu que, talvez, pudesse voltar a estudar em setembro ou outubro. Um mês e meio depois, no dia 21 de julho, transbordava de otimismo:
Finalmente estou ficando otimista. Até que enfim, as coisas vão bem agora! De verdade! Ótimas notícias! Tentaram assassinar Hitler e, pela primeira vez, não foram comunistas judeus ou capitalistas ingleses, mas um general alemão que não somente é um conde, mas também é jovem. (…) Não posso evitar, a perspectiva de voltar à escola em outubro está me deixando feliz demais para ser lógica!
Na manhã do dia 4 de agosto, delatados, os moradores do Anexo foram descobertos e seu destino, selado. Anne Frank e sua irmã, Margot, foram transportadas de Auschwitz para o campo de concentração de Bergen-Belsen, na Alemanha, onde morreram possivelmente em consequência de uma epidemia de tifo que se espraiou no inverno de 1944.
Corta para a cidade do Rio de Janeiro, século XXI, 2017. O número de Anne Franks se multiplica exponencialmente. Munidos de celulares, moradores das periferias, jovens e adultos, especialmente das áreas da cidade dominadas pelo tráfico de drogas e pelas milícias e que vivem em constante estado de sítio, impedidos de sair de casa, de trabalhar, de levar e trazer os filhos à escola, escolas estas encravadas no meio do fogo cruzado entre policiais e bandidos, bandidos da facção X e bandidos da facção Y, gravam seu cotidiano de terror, desespero e impotência, compartilhando-o em tempo real nas redes sociais.
Há pouco mais de um mês, Maria Eduarda, uma adolescente de treze anos morreu dentro de uma escola municipal, atingida por disparo de arma de fogo. Professores e alunos relatam cotidianamente o estado de tensão permanente sob o qual são obrigados a trabalhar e estudar, as aulas improvisadas nos corredores das escolas, teoricamente protegidos de “balas perdidas” que, eventualmente, perfuram as janelas, o desespero dos alunos, obrigados a se jogarem no chão, em busca de proteção dos tiros que vêm de todos os lados.
As estórias das crianças sírias, Anne Frank e Maria Eduarda se cruzam num ponto: a escola. E não é esta tal de Escola sem Partido, não, pretensamente neutra, inodora, asséptica, com nojinho da realidade. É a escola ideológica, sim. Educar para libertar de preconceitos, de estigmas, incorporar valores caros à cidadania, o respeito ao diferente ainda que dele discordemos até a última raiz dos cabelos. Educar para a paz.
Viva a escola. Viva a escola pública.
Educação ou barbárie.
* MARCELO GRUMAN é Doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (MN/UFRJ). Atualmente é administrador cultural da Fundação Nacional de Arte (Funarte). Blog: https://desconstruindomarcelo.blogspot.com.br/
Links:
  1. https://oglobo.globo.com/mundo/na-siria-80-das-criancas-sofrem-de-estresse-pos-traumatico-21020906 (Crianças sírias)
  2. http://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,conheca-bana-alabed-menina-siria-de-7-anos-caracterizada-como-a-nova-anne-frank,10000093069 (a “Anne Frank de Aleppo”)

(fonte: https://espacoacademico.wordpress.com/2017/05/13/aleppo-amsterda-rio-de-janeiro/)

Boletim 13 do Café Historia

Acesse aqui: http://www.cafehistoria.com.br/newsletter/boletim-cafe-historia-edicao-13/


Yvonne Jean, Brasília e a UnB (1962-1965)
As expectativas e as desilusões do projeto modernista de Brasília nas colunas de uma jornalista de origem belga que abraçou o Brasil. Leia aqui

Precisamos falar sobre o currículo de História
Periodização e eurocentrismo nas grades curriculares brasileiras de História. Leia aqui.

Boaventura: procuram-se horizontes, urgente.

A barbárie pós-moderna alastra-se. Como alternativa, proporemos apenas a diversidade? Talvez as epistemologias do Sul — outras maneiras de pensar, sentir e conhecer — nos sugiram uma saída
Por Boaventura de Sousa Santos |



As oito pessoas mais ricas do mundo têm tanta riqueza quanto a metade mais pobre da população mundial (3,5 bilhões de pessoas). Destroem-se países (do Iraque ao Afeganistão, da Líbia à Síria, e as próximas vítimas tanto podem ser o Irã como a Coreia do Norte) em nome dos valores que deviam preservá-los e fazê-los prosperar, sejam eles os direitos humanos, a democracia ou o primado do direito internacional. Nunca se falou tanto da possibilidade de uma guerra nuclear. Os contribuintes norte-americanos pagaram milhões de dólares pela bomba não nuclear mais potente desde sempre, lançada contra túneis no Afeganistão construídos nos anos de 1980 com o próprio dinheiro deles, gerido pela CIA, para promover os radicais islâmicos em sua luta contra os ocupantes soviéticos do país, os mesmos radicais que agora são combatidos como terroristas. Enquanto isso, os norte-americanos perdem o acesso a cuidados de saúde e são levados a pensar que os seus males são causados por imigrantes latinos mais pobres que eles. Tal como os europeus são levados a pensar que o seu bem-estar está ameaçado por refugiados e não pelos interesses imperialistas que estão a forçar ao exílio tanta gente. Tal como os sul-africanos negros, empobrecidos por um mal negociado fim do apartheid, assumem atitudes xenófobas e racistas contra imigrantes negros do Zimbábue, Nigéria ou Moçambique, tão pobres quanto eles, por considerá-los causadores dos seus males. Entretanto, correm mundo as imagens ternurentas de Silvio Berlusconi a dar mamadeira a cordeirinhos para defendê-los do sacrifício da Páscoa, sem que a ninguém ocorra que naqueles minutos televisivos milhares de crianças morreram por falta de leite. Tal como não são notícia as fossas clandestinas de corpos esquartejados que não cessam de ser descobertas no México enquanto as fronteiras entre o Estado e o narcotráfico se desvanecem. Tal como temos medo de pensar que a democracia brasileira morrerá no dia em que um Congresso de políticos desvairados, na maioria corruptos, conseguir destruir os direitos dos trabalhadores conquistados ao longo de cinquenta anos, um propósito que, por agora, parecem lograr com inaudita facilidade. Há de haver um momento em que as sociedades (e não apenas alguns “iluminados”) concluam que isto não pode continuar assim.

Para isso, a negatividade do presente nunca será suficiente. A negatividade só existe na medida em que for visível ou imaginável aquilo que nega. Um beco sem saída converte-se facilmente numa saída se a parede em que termina tiver a transparência falsa do infinito ou do inelutável. Essa transparência, por ser falsa, é tão compacta quanto a opacidade da selva escura com que antes a natureza e os deuses vedavam os caminhos da humanidade. Donde vem essa opacidade se a natureza é hoje um livro aberto e os deuses, um livro de aeroporto? Donde vem a transparência se a natureza quanto mais se revela mais se expõe à destruição, se os deuses tanto servem para banalizar a crença inconsequente como para banalizar o horror do ódio e da guerra?

Há algo de terminal na condição do nosso tempo que se revela como uma terminalidade sem fim. É como se a anormalidade tivesse uma energia inusitada para se transformar em nova normalidade e nos sentíssemos terminalmente sãos em vez de terminalmente doentes. Esta condição deriva do paroxismo a que chegou o instrumentalismo radical da modernidade ocidental, tanto em termos sociais como culturais e políticos. A instrumentalidade moderna consiste no predomínio total dos fins sobre os meios e na ocultação dos interesses que subjazem à seleção dos fins sob a forma de imperativos falsamente universais ou de inevitabilidades falsamente naturais. No plano ético, esta instrumentalidade permite a quem tem poder econômico, político ou cultural apresentar-se socialmente como defensor de causas quando, de fato, é defensor de coisas.

Esta instrumentalidade assumiu duas formas distintas, ainda que gêmeas, de extremismo: o extremismo racionalista e o extremismo dogmatista. São duas formas de pensar que não permitem contra-argumentação, duas formas de agir que não admitem resistência. São ambas extremamente seletivas e compartimentadas, de tal modo que as contradições nem sequer aparecem como ambiguidades. As caricaturas revelam bem o que está para além delas. Heinrich Himmler, um dos máximos chefes nazistas , que transformou a tortura e o extermínio de judeus, ciganos e homossexuais numa ciência, quando regressava à noite a casa entrava pela porta traseira para não despertar o seu canário favorito. É possível culpar o canário pelo fato de o carinho que Himmler tinha por ele não ser partilhado pelos judeus? Por sua vez, é conhecida a anedota daquele comunista argentino tão ortodoxo que mesmo nos dias de sol em Buenos Aires usava chapéu de chuva só porque estava a chover em Moscou. É possível negar que por detrás de tão acéfalo comportamento não estaria um sentimento nobre de lealdade e de solidariedade?

As perversidades do extremismo racionalista e dogmatista vêm sendo combatidas por modos de pensar e agir que se apresentam como alternativas mas que, no fundo, são becos sem saída porque os caminhos que apontam são ilusórios, quer por excesso de pessimismo, quer por excesso de otimismo. A versão pessimista é o projeto reacionário que tem hoje uma vitalidade renovada. Trata-se de detestar em bloco o presente como expressão de uma traição ou degradação de um tempo passado, dourado, um tempo em que a humanidade era menos ampla e mais consistente. O projeto reacionário partilha com o extremismo racionalista e dogmatista a ideia de que a modernidade ocidental criou demasiados seres humanos e que é necessário distinguir entre humanos e sub-humanos, mas não pensa que tal deva decorrer de engenharias de intervenção técnica, sejam elas de morte ou de melhoria de raça. Basta que os inferiores sejam tratados como inferiores, sejam eles mulheres, negros, indígenas, muçulmanos. O projeto reacionário nunca põe em causa quem tem o privilégio e o dever de decidir quem é superior e quem é inferior. Os humanos têm direito a ter direitos; os sub-humanos devem ser objeto de filantropia que os impeça de serem perigosos e os defenda de si mesmos. Se tiverem alguns direitos, têm sempre de ter mais deveres que direitos.

A versão otimista da luta contra o extremismo racionalista e dogmatista consiste em pensar que as lutas do passado lograram vencer de modo irreversível os excessos e perversidades do extremismo e que somos hoje demasiado humanos para admitir a existência de sub-humanos. Trata-se de um pensamento anacrônico inverso que consiste em imaginar o presente como tendo superado definitivamente o passado. Enquanto o pensamento reacionário pretende fazer o presente regressar ao passado, o pensamento anacrônico inverso opera como se o passado não fosse ainda presente. Devido ao pensamento anacrônico inverso, vivemos em tempo colonial com imaginários pós-coloniais; vivemos em tempo de ditadura informal com imaginários de democracia formal; vivemos em tempo de corpos racializados, sexualizados, assassinados, esquartejados com imaginários de direitos humanos; vivemos em tempo de muros, fronteiras como trincheiras, exílios forçados, deslocamentos internos com imaginários de globalização; vivemos em tempo de silenciamentos e de sociologias das ausências com imaginários de orgia comunicacional digital; vivemos em tempo de grandes maiorias só terem liberdade para serem miseráveis com imaginários de autonomia e empreendedorismo; vivemos em tempo de vítimas a virarem-se contra vítimas e de oprimidos a elegerem os seus opressores com imaginários de libertação e de justiça social.

O totalitarismo do nosso tempo apresenta-se como o fim do totalitarismo e é, por isso, mais insidioso que os totalitarismos anteriores. Somos demasiados e demasiado humanos para cabermos num caminho só; mas, por outro lado, se os caminhos forem muitos e em todas as direções facilmente se transformam num labirinto ou num novelo, em todo o caso, num campo dinâmico de paralisia. É esta a condição do nosso tempo. Para sair dela é preciso combinar a pluralidade de caminhos com a coerência de um horizonte que ordene as circunstâncias e lhes dê sentido. Para pensar tal combinação e, aliás, até para pensar que ela é necessária, são necessárias outras maneiras de pensar, sentir e conhecer. Ou seja, é necessária uma ruptura epistemológica a que venho chamando as epistemologias do sul.

(fonte:  http://outraspalavras.net/destaques/boaventura-procuram-se-horizontes-com-urgencia-maxima/)

sexta-feira, 19 de maio de 2017

Estamos destruindo as bases que sustentam nosso planeta, e isso não aparece nos jornais


Em evento organizado pela 350.org Argentina, Leonardo Boff e Adolfo Perez Esquivel debateram alternativas para a problemática da crise climática e social na América Latina.
A reportagem é publicada por naofrackingbrasil, 13-05-2017.

O teólogo e intelectual brasileiro Leonardo Boff, que já vem há alguns anos espalhando o trabalho levantado pelo Papa Francisco na sua Encíclica Laudato Si, chamou a atenção nesta quinta-feira (11) para um dos piores problemas enfrentados pela humanidade hoje: a crise ambiental e as suas consequências sociais. A Aula Magna organizada pela 350.org Argentina e pela Cátedra Livre de Saúde e Direitos Humanos da Faculdade de Medicina de Buenos Aires, também contou com a participação do Prêmio Nobel da Paz, Adolfo Perez Esquivel.
No evento foi discutido o cuidado dos recursos naturais estratégicos, e mais especificamente os casos do Aquífero Guarani, da Antártida e da Amazônia.“O diagnóstico dos principais cientistas do mundo indica que estamos vivendo uma era muito preocupante para o planeta, e esses são dados que não aparecem nos jornais, porque vão contra o sistema, evitam o acúmulo e impedem que as empresas sigam sua lógica de desrespeito à Terra. Na verdade, vivemos em uma época de grandes contradições”, disse Leonardo Boff durante o encontro. “Devemos respeitar não só os aspectos físico-químicos dos ecossistemas de cada região, mas também o aspecto humano das populações que os habitam. Suas culturas, costumes, religiões, organizações sociais, toda essa realidade complexa que forma os biomas”, completou o intelectual.
Mudanças climáticas produzem secas, inundações, insegurança alimentar e aumento da incidência de doenças tropicais, afetando mais intensamente as pessoas e regiões que contribuíram menos para agravar a situação que enfrentam hoje. A crise climática é o resultado da queima de combustíveis fósseis e a exploração irracional dos recursos naturais, realizada principalmente pelos países mais ricos do Norte.
Na América Latina os efeitos mais evidentes das mudanças climáticas podem ser visto em inundações devastadoras e sem precedentes em sua magnitude, o que demonstra a necessidade urgente de uma mudança de modelo econômico. Atualmente, as regiões mais afetadas pelas cheias na Argentina são Comodoro Rivadavia (Chubut), La Pampa, Tucumán, Catamarca, Província de Buenos Aires, San Luis e Córdoba.
“A humanidade precisa de uma grande mudança de consciência. Estamos em um momento que representa um dilema planetário: ou mudamos nossos ritmos e modos de produção e consumo, nosso modo de habitar o planeta, ou vamos ao encontro do pior”, frisou Leonardo Boff. O intelectual sintetizou todas estas questões em seu novo livro Sustentabilidade: a urgência ante o grito da Terra lançado na quarta-feira (10) na Feira do Livro de Buenos Aires.“As contribuições de Boff para o pensamento latino-americano têm profundo valor e ficamos honrados de acompanhá-lo em sua dissertação. Sua grande figura e visão representam um norte para os movimentos sociais e ambientais nos países latino-americanos, seguindo as mensagens do Papa Francisco”, afirmou Juan Pablo Olsson, Coordenador de Campanhas Climáticas da 350.org Argentina.
Por sua vez, Adolfo Perez Esquivel declarou recentemente o seu apoio à campanha global para o desinvestimento em combustíveis fósseis. Para ele, a questão da crise climática está fortemente ligada com a justiça social, uma vez que centenas de pessoas ao redor do mundo são forçadas a deixar suas casas todos os dias por causa de eventos climáticos extremos.
A Mobilização Global pelo Desinvestimento está sendo realizada em seis continentes e visa retirar da indústria fóssil a licença para poluir, reafirmando a necessidade de uma transição para as energias renováveis.

(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/567669-estamos-destruindo-as-bases-que-sustentam-nosso-planeta-e-isso-nao-aparece-nos-jornais)

Liberdade acadêmica está em risco no Brasil, afirmam antropólogos

Associações nacionais e internacionais de antropologia alertam para criminalização da pesquisa básica sobre populações tradicionais, indígenas e quilombolas no Brasil.
A reportagem é publicada por Instituto Socioambiental - Isa, 12-05-2017.

Associações científicas antropológicas, nacionais e internacionais, receberam com profunda preocupação e alarme os resultados, divulgados este mês, dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e Incra instaurada em 2015 na Câmara dos Deputados, encerrada sem conclusões e reaberta em 2016, sob a liderança dos deputados ruralistas Alceu Moreira (PMDB/RS), Luiz Carlos Heinze (PP/RS) e Nilson Leitão (PSDB/MT). Com mais de 3000 páginas, o relatório final pede o indiciamento de 88 pessoas em cinco estados (Bahia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Santa Catarina) entre indígenas, quilombolas, assentados da reforma agrária, ativistas, procuradores, políticos, além de antropólogos e outros pesquisadores que atuaram em processos de reconhecimento de direitos territoriais.

A direção executiva da Associação Americana de Antropologia (AAA) enviou nesta terça (9/5) uma carta a autoridades brasileiras pedindo esclarecimentos e expressando “profunda preocupação” com os resultados apresentados. “Estamos alarmados que a pesquisa antropológica básica no Brasil, especificamente a pesquisa documentando povos indígenas e quilombolas, seja vista como ‘criminosa’ pela Comissão”. Em tom diplomático, o documento sugere haver, no mínimo, “um mal-entendido sobre a natureza da pesquisa antropológica” e destaca que “a comunidade antropológica brasileira é internacionalmente respeitada pela sua pesquisa científica e sua defesa dos direitos humanos”. A associação norte-americana – maior organização de antropologia profissional do mundo fundada em 1902 – lembra ainda que a “a liberdade, a liberdade acadêmica, o respeito à diversidade e ao pluralismo, assim como os direitos culturais e o direito à terra, são valores protegidos pela constituição brasileira”.

A carta da AAA reforça o conteúdo de uma manifestação semelhante também enviada a autoridades, dias antes (5/5), pela Salsa (Society for the Anthropology of Lowland South America) – a maior associação internacional de especialistas em antropologia das terras baixas sul-americanas do mundo. Para a Salsa, a decisão da CPI de criminalizar o trabalho que antropólogos e outros profissionais desenvolvem entre comunidades tradicionais, “só pode ser interpretada como uma estratégia para intimidar e interromper o trabalho de profissionais altamente respeitados”. O documento destaca a preocupação da entidade com a independência acadêmica e a liberdade de pesquisa no Brasil, além de reiterar a qualidade dos trabalhos desenvolvidos pela comunidade antropológica brasileira: “estudiosos de todo o mundo são sabedores da alta qualidade da pesquisa científica produzida pelos antropólogos brasileiros”.

Reforçando o coro, o Diário de Notícias Lusa, de Lisboa, divulgou também nesta terça (9/5) uma entrevista com a antropóloga portuguesa Suzana de Matos Viegas, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, indiciada por sua atuação nos estudos de identificação e delimitação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença na Bahia, aprovados pela Funai em 2009. Para Viegas, as acusações não só são falsas, como evidenciam que seus proponentes estão “contra a existência da lei e não (preocupados) com o rigor da sua aplicação”. “Eles (CPI) começam a acusar a própria Associação Brasileira de Antropologia (ABA) de ser uma associação sem fins lucrativos para fins ideológicos”. Para ela, o relatório final da CPI é “um documento contra os direitos humanos, contra a legislação que o Brasil adotou desde que é uma nação democrática, com muitas afirmações racistas, contra a legislação internacional”.

Estas manifestações da comunidade internacional se somam também a uma nota divulgada em 8/5 nas redes sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional (UFRJ). Além de prestar solidariedade às dezenas de indiciados – dentre os quais alunos e ex-alunos do programa – o documento repudia a “tentativa de criminalização da prática da perícia antropológica” e reitera que “toda a ação dos pesquisadores e pesquisadoras acusado/as tem se feito à luz da legislação vigente”.

A nota relembra ainda que a “perícia antropológica [é] apenas uma pequena parte de cunho técnico-científico de processos jurídico-administrativos em que o amplo direito do contraditório está assegurado”. Argumentam os antropólogos do Museu Nacional que “as acusações revelam-se inteiramente infundadas e mesmo fraudulentas” e tem por objetivo “inviabilizar o exercício da atividade de pesquisa daqueles e daquelas que estão sendo injustamente acusados”.

Na mesma onda de repúdio ao relatório da CPI Funai/Incra, uma petição foi divulgada (9/5) pela Salsa em conjunto com a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e o Groupe International de Travail pour les Peoples Autochtones (GITPA). No documento, “professores, intelectuais e membros do mundo acadêmico” manifestam seu “repúdio veemente à política anti-indígena do Estado brasileiro” e sua “preocupação em relação a uma política que já tem consequências genocidas em estados como o Mato Grosso do Sul, Bahia e Maranhão”.

(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/567616-liberdade-academica-esta-em-risco-no-brasil-afirmam-antropologos)

Aécio Neves e o que não se lia na imprensa mineira até recentemente sobre ele


Texto escrito por José de Souza Castro:
Em 2010 resolvi ajuntar num livro os artigos que eu vinha escrevendo no blog Tamos com Raiva, precursor deste, e no blog do Massote, sobre o governo Aécio Neves.
O livro nunca foi publicado, nem na biblioteca do blog.
Acho que chegou a hora de fazê-lo, neste momento em que muitos mineiros, que ao longo dos anos em que Aécio governou Minas nada leram contra ele e seu governo na imprensa mineira, devem estar surpresos com as denúncias que surgem com as delações da Lava Jato, sobretudo as da JBF.
Finalmente, parece que se rompeu o impenetrável manto de proteção que a imprensa brasileira vinha dando ao neto de Tancredo Neves e à irmã dele, Andréa Neves, que teve papel importantíssimo no governo Aécio Neves. E que foi presa hoje.
Os blogs independentes, em Minas, não têm condições de suprir o papel da imprensa, sobretudo nas televisões e rádios, dado o seu pouco alcance. Mesmo sabendo disso, Cris e eu decidimos fazer a nossa parte, como jornalistas e cidadãos que prezam a democracia e o Estado de Direito, ambos muito sofridos neste grande e bobo país.
Na introdução do livro, explico melhor minhas motivações ao escrever os artigos e juntá-los num livro.

CLIQUE AQUI para fazer o download gratuito do livro com 165 páginas. E boa leitura!

 

(fonte:  https://kikacastro.com.br/2017/05/18/livro-denuncias-aecio/

Mitos da Ditadura: “Naquele tempo não tinha corrupção…”



“Naquele tempo não tinha corrupção…”. Foi o que ouvi de um senhor, com uns 50 anos, em uma conversa informal, enquanto aguardava ser atendido em uma casa lotérica. Ele faz parte da geração que nasceu na época do golpe de 1964 e viveu a juventude nas décadas de 1970 e 1980. Para ele, na ditadura não havia corrupção, como não havia bandidos pelas ruas, se amava a pátria e os professores eram mais respeitados. Em um momento, resumiu: “não era essa baderna”. Essas memórias, construídas a posteriori e repletas de impressões tão pessoais quanto parciais, deixou meu interlocutor nostálgico e o fez tirar conclusões apocalípticas sobre o tempo presente. “Na política só tem ladrão”, “Precisa começar tudo do zero”, afirmou.

Essas percepções não são somente individuais. Elas se replicam em grupos, redes sociais e habitam um repertório comum entre as direitas. Não raramente se manifestam também em políticos que se apresentam como inovadores e bastiões da moralidade. Ou entre eleitores céticos, que simplesmente anulam o voto, pois creem que todo o sistema político está corrompido. Os recordes de abstenção e voto nulo nas últimas eleições municipais, bem como o crescimento eleitoral das direitas, fenômenos que são, ao mesmo tempo, locais e mundiais, parecem atestar que meu companheiro ocasional de fila de loteria não está sozinho.

A escuta do “naquele tempo não tinha corrupção…” me fez escrever este texto. Sou historiador e, em virtude de minha tese de doutoramento, pesquiso a forma como a ditadura disse combater a corrupção. Estou convencido de que esse é apenas mais um dos mitos que se construiu sobre aquele período. Meus colegas historiadores talvez me advirtam que a palavra “mito” teve muitos sentidos ao longo da história e que ainda é polêmica. Raoul Girardet, historiador francês recentemente falecido e autor do livro “Mitos e mitologias políticas” admitiu diversos significados para os mitos. Entre eles, talvez o mais conhecido seja o de que o mito pode ser um “falseamento da realidade”. Em duas palavras: uma mentira. É justamente nesse sentido que afirmo que a ideia de que não houve corrupção na ditadura é um mito. Porque é falsa e não se comprova diante da pesquisa histórica. Pelo contrário, as evidências apontam o fato de que, nos anos de autoritarismo, o problema apenas piorou.

1- Muitos não se lembram de corrupção na ditadura porque havia censura. – A censura de imprensa, estabelecida no país desde o golpe, não deixava chegar ao grande público as principais denúncias de corrupção. A menos que isso fosse de interesse do regime. Ainda em 1964, foram vários os acusados de corrupção. Anos mais tarde, a Comissão Geral de Investigações (CGI), órgão criado após o AI-5 sob o pretexto de combater a corrupção, estabeleceu como norma plantar notas nos jornais sobre as principais denúncias. Era parte da suposta “obra moralizadora” da ditadura, que gerou, estima-se, cerca de 3000 processos com mais de 10000 envolvidos. Após feita a investigação, a CGI poderia sugerir ao presidente da República o confisco de bens dos acusados. Durante quase vinte anos, a ação conjunta do controle dos grandes meios de comunicação e da propaganda pela “moralização dos costumes políticos” gerou, em muitos, a sensação de que não havia corrupção.

2- As ações de combate à corrupção na ditadura tinham cunho arbitrário e de perseguição política. – Ao contrário da transparência e do controle externo dos poderes, princípios atualmente reconhecidos como basilares no combate à corrupção, os processos da CGI, que mencionei anteriormente, eram completamente secretos. Quando acionados, as vítimas da acusação tinham apenas oito dias para elaborar uma defesa com a justificativa de seus bens, com total desconhecimento da acusação. Os depoimentos ocorriam geralmente em quartéis, enquanto os suspeitos eram expostos na grande imprensa. Os principais alvos eram políticos do regime anterior e a intenção era a de abalar destruir suas reputações. Dúvidas disso? O primeiro investigado da CGI foi João Goulart, embora nada tenha sido comprovado sobre ele. Juscelino Kubitschek, outro ex-presidente, teve um dos mais longos processos da comissão.

3 – Os casos de corrupção que envolviam militares e aliados da ditadura tinham tratamento diferenciado. – As suspeitas de corrupção que envolviam militares não implicavam o risco da perda de bens, como ocorria com os investigados pela CGI. No lugar disso, os casos eram encaminhados a comissões de investigação sumária que existiam nas três armas. Sobre esses documentos, nada sabemos até hoje. Nem mesmo se ainda existem. Já as denúncias de corrupção de aliados civis do regime, embora existissem em razoável número, raramente eram enfrentadas pela cúpula do Planalto, como sugere Elio Gaspari no livro A ditadura acabada. Outro especialista no assunto, o historiador Pedro Campos, fez um estudo aprofundado sobre as transações de empreiteiras com a ditadura, demonstrando que as relações ilícitas entre o Estado e esses empresários não nasceram na Nova República, como parecem sugerir algumas das delações de empreiteiros que se tornaram célebres recentemente.

4 – Concepção limitada do problema da corrupção – Nos relatórios e nas atas de reuniões da CGI é facilmente perceptível a ideia de que corrupção era roubo e que só havia ladrões na política pois não havia punição. Achavam que a simples existência e o medo da punição inibiriam práticas corruptas, o que chamavam de “ação catalítica”, em referência ao efeito de aceleração, catálise, que algumas substâncias químicas produzem em reações. No entanto, o combate à corrupção produzido pelos militares no poder, como admitiu o próprio ex-presidente Ernesto Geisel, foi inócuo. Isso ocorreu porque a ditadura perpetuou uma noção simplória de corrupção. Cientistas sociais de diversas vertentes teóricas apontam para leituras bem mais complexas sobre o tema. Leonardo Avritzer, cientista político da UFMG, por exemplo, refuta a ideia de que a corrupção seja algo cultural ou inerente aos brasileiros, mas, antes, um fenômeno relacionado à incapacidade das instituições de coibi-la, em uma “inter-relação entre política e cultura”. Nesse sentido, combater a corrupção passaria por entender melhor essa relação e criar mecanismos institucionais para evitá-la.

Certamente já ouvimos o famoso dito de que uma mentira contada muitas vezes pode ser aceita como verdade. Hoje se fala em pós-verdade, expressão oriunda da guerra de versões e informações falsas, ou extremamente parciais, que, por exemplo, são compartilhadas nas redes sociais. Algo de que se utilizam, inclusive, figuras públicas que veem nessa característica do século XXI uma porta de entrada para oportunismo e a realização de seus objetivos políticos. Talvez as redes sociais tenham contribuído para uma espécie de primazia da opinião. (como esta, que arrisquei agora). Esse pequeno artigo mesmo, quantos poderão desqualificá-lo sem sequer debater os aspectos que apresentei?
Todos, inclusive minha companhia de fila, têm o direito de expressar seus sentimentos e impressões políticas. Vivemos, afinal, em uma democracia. Mas quando os juízos que emitimos sobre política e história afastam-se muito dos fatos, o debate cai de nível e nos tornamos vulneráveis a aventureiros que se apresentam como salvadores da pátria e dos tempos. Uma avaliação mais acurada faria perceber que fizemos avanços importantes no combate à corrupção no Brasil nos últimos anos, tais como a criação da Controladoria Geral da União (CGU) e a atuação da Polícia Federal na inibição de novos crimes. O risco, parece, é outro: o da aposta insistente em medidas autoritárias para extirpar a corrupção. A pregação moralista e a cegueira diante da história da ditadura apresentam a contrapartida da total descrença na política e, consequentemente, na democracia. Se essa perspectiva se mantiver, haverá o perigo de sucumbirmos a novos anos de chumbo.

Diego Knack é historiador e professor de História.


Para saber mais:

Leonardo Avritzer. Impasses da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.
Pedro Henrique Pedreira Campos. Estranhas Catedrais: as empreiteiras brasileiras e a ditadura civil-militar (1964-1988). Niterói: Eduff, 2015.
Celso Castro; Maria Celina D’Araújo. Ernesto Geisel. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1997.
Carlos Fico. Como eles agiam – os subterrâneos da ditadura militar: espionagem e polícia política. Rio de Janeiro: Record, 2001.
Fernando Filgueiras. Corrupção, democracia e legitimidade. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.
Elio Gaspari. A ditadura acabada. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2016.
Raoul Girardet. Mitos e mitologias políticas. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

(fonte: http://historiadaditadura.com.br/destaque/mitos-da-ditadura-naquele-tempo-nao-tinha-corrupcao/)

sábado, 13 de maio de 2017

Morreu Antônio Cândido. Suas ideias vivem.

Entrevista concedida em agosto de 2011 à repórter Joana Tavares, do Brasil de Fato. Vale a pena ler.

“O socialismo é uma doutrina triunfante”
Aos 93 anos, Antonio Candido explica a sua concepção de socialismo, fala sobre literatura e revela não se interessar por novas obras
por Joana Tavares, Brasil de Fato, 08/08/2017

Crítico literário, professor, sociólogo, militante. Um adjetivo sozinho não consegue definir a importância de Antonio Candido para o Brasil.
Considerado um dos principais intelectuais do país, ele mantém a postura socialista, a cordialidade, a elegância, o senso de humor, o otimismo.
Antes de começar nossa entrevista, ele diz que viveu praticamente todo o conturbado século 20. E participou ativamente dele, escrevendo, debatendo, indo a manifestações, ajudando a dar lucidez, clareza e humanidade a toda uma geração de alunos, militantes sociais, leitores e escritores.
Tão bom de prosa como de escrita, ele fala sobre seu método de análise literária, dos livros de que gosta, da sua infância, do começo da sua militância, da televisão, do MST, da sua crença profunda no socialismo como uma doutrina triunfante. “O que se pensa que é a face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele”, afirma.

Brasil de Fato – Nos seus textos é perceptível a intenção de ser entendido. Apesar de muito erudito, sua escrita é simples. Por que esse esforço de ser sempre claro?
Antonio Candido – Acho que a clareza é um respeito pelo próximo, um respeito pelo leitor. Sempre achei, eu e alguns colegas, que, quando se trata de ciências humanas, apesar de serem chamadas de ciências, são ligadas à nossa humanidade, de maneira que não deve haver jargão científico.
Posso dizer o que tenho para dizer nas humanidades com a linguagem comum. Já no estudo das ciências humanas eu preconizava isso. Qualquer atividade que não seja estritamente técnica, acho que a clareza é necessária inclusive para pode divulgar a mensagem, a mensagem deixar de ser um privilégio e se tornar um bem comum.

O seu método de análise da literatura parte da cultura para a realidade social e volta para a cultura e para o texto. Como o senhor explicaria esse método?
Uma coisa que sempre me preocupou muito é que os teóricos da literatura dizem: é preciso fazer isso, mas não fazem. Tenho muita influência marxista – não me considero marxista – mas tenho muita influência marxista na minha formação e também muita influência da chamada escola sociológica francesa, que geralmente era formada por socialistas.
Parti do seguinte princípio: quero aproveitar meu conhecimento sociológico para ver como isso poderia contribuir para conhecer o íntimo de uma obra literária.
No começo eu era um pouco sectário, politizava um pouco demais minha atividade. Depois entrei em contato com um movimento literário norte-americano, a nova crítica, conhecido como new criticism. E aí foi um ovo de colombo: a obra de arte pode depender do que for, da personalidade do autor, da classe social dele, da situação econômica, do momento histórico, mas quando ela é realizada, ela é ela. Ela tem sua própria individualidade.
Então a primeira coisa que é preciso fazer é estudar a própria obra. Isso ficou na minha cabeça. Mas eu também não queria abrir mão, dada a minha formação, do social.
Importante então é o seguinte: reconhecer que a obra é autônoma, mas que foi formada por coisas que vieram de fora dela, por influências da sociedade, da ideologia do tempo, do autor. Não é dizer: a sociedade é assim, portanto a obra é assim. O importante é: quais são os elementos da realidade social que se transformaram em estrutura estética.
Me dediquei muito a isso, tenho um livro chamado “Literatura e sociedade” que analisa isso. Fiz um esforço grande para respeitar a realidade estética da obra e sua ligação com a realidade. Há certas obras em que não faz sentido pesquisar o vínculo social porque ela é pura estrutura verbal. Há outras em que o social é tão presente – como “O cortiço” [de Aluísio Azevedo] – que é impossível analisar a obra sem a carga social.
Depois de mais maduro minha conclusão foi muito óbvia: o crítico tem que proceder conforme a natureza de cada obra que ele analisa. Há obras que pedem um método psicológico, eu uso; outras pedem estudo do vocabulário, a classe social do autor; uso. Talvez eu seja aquilo que os marxistas xingam muito que é ser eclético. Talvez eu seja um pouco eclético, confesso. Isso me permite tratar de um número muito variado de obras.

Teria um tipo de abordagem estética que seria melhor?
Não privilegio. Já privilegiei. Primeiro o social, cheguei a privilegiar mesmo o político. Quando eu era um jovem crítico eu queria que meus artigos demonstrassem que era um socialista escrevendo com posição crítica frente à sociedade. Depois vi que havia poemas, por exemplo, em que não podia fazer isso. Então passei a outra fase em que passei a priorizar a autonomia da obra, os valores estéticos. Depois vi que depende da obra.
Mas tenho muito interesse pelo estudo das obras que permitem uma abordagem ao mesmo tempo interna e externa. A minha fórmula é a seguinte: estou interessado em saber como o externo se transformou em interno, como aquilo que é carne de vaca vira croquete. O croquete não é vaca, mas sem a vaca o croquete não existe. Mas o croquete não tem nada a ver com a vaca, só a carne. Mas o externo se transformou em algo que é interno. Aí tenho que estudar o croquete, dizer de onde ele veio.

O que é mais importante ler na literatura brasileira?
Machado de Assis. Ele é um escritor completo.

É o que senhor mais gosta?
Não, mas acho que é o que mais se aproveita.

E de qual o senhor mais gosta?
Gosto muito do Eça de Queiroz, muitos estrangeiros.
De brasileiros, gosto muito de Graciliano Ramos… Acho que já li “São Bernardo” umas 20 vezes, com mentira e tudo. Leio o Graciliano muito, sempre. Mas Machado de Assis é um autor extraordinário. Comecei a ler com 9 anos livros de adulto. E ninguém sabia quem era Machado de Assis, só o Brasil e, mesmo assim, nem todo mundo.
Mas hoje ele está ficando um autor universal. Ele tinha a prova do grande escritor. Quando se escreve um livro, ele é traduzido, e uma crítica fala que a tradução estragou a obra, é porque não era uma grande obra. Machado de Assis, mesmo mal traduzido, continua grande. A prova de um bom escritor é que mesmo mal traduzido ele é grande. Se dizem: “a tradução matou a obra”, então a obra era boa, mas não era grande.

Como levar a grande literatura para quem não está habituado com a leitura?
É perfeitamente possível, sobretudo Machado de Assis. A Maria Vitória Benevides me contou de uma pesquisa que foi feita na Itália há uns 30 anos. Aqueles magnatas italianos, com uma visão já avançada do capitalismo, decidiram diminuir as horas de trabalho para que os trabalhadores pudessem ter cursos, se dedicar à cultura.
Então perguntaram: cursos de que vocês querem? Pensaram que iam pedir cursos técnicos, e eles pediram curso de italiano para poder ler bem os clássicos. “A divina comédia” é um livro com 100 cantos, cada canto com dezenas de estrofes. Na Itália, não sou capaz de repetir direito, mas algo como 200 mil pessoas sabem a primeira parte inteira, 50 mil sabem a segunda, e de 3 a 4 mil pessoas sabem o livro inteiro de cor.
Quer dizer, o povo tem direito à literatura e entende a literatura. O doutor Agostinho da Silva, um escritor português anarquista que ficou muito tempo no Brasil, explicava para os operários os diálogos de Platão, e eles adoravam. Tem que saber explicar, usar a linguagem normal.

O senhor acha que o brasileiro gosta de ler?
Não sei. O Brasil pra mim é um mistério. Tem editora para toda parte, tem livro para todo lado. Vi uma reportagem que dizia que a cidade de Buenos Aires tem mais livrarias que em todo o Brasil. Lê-se muito pouco no Brasil. Parece que o povo que lê mais é o finlandês, que lê 30 volumes por ano. Agora dizem que o livro vai acabar, né?

O senhor acha que vai?
Não sei. Eu não tenho nem computador… as pessoas me perguntam: qual é o seu… como chama?

E-mail?

Isso! Olha, eu parei no telefone e máquina de escrever. Não entendo dessas coisas… Estou afastado de todas as novidades há cerca de 30 anos. Não me interesso por literatura atual. Sou um velho caturra. Já doei quase toda minha biblioteca, 14 ou 15 mil volumes. O que tem aqui é livro para visita ver. Mas pretendo dar tudo. Não vendo livro, eu dou. Sempre fiz escola pública, inclusive universidade pública, então é o que posso dar para devolver um pouco.
Tenho impressão que a literatura brasileira está fraca, mas isso todo velho acha. Meus antigos alunos que me visitam muito dizem que está fraca no Brasil, na Inglaterra, na França, na Rússia, nos Estados Unidos… que a literatura está por baixo hoje em dia. Mas eu não me interesso por novidades.

E o que o senhor lê hoje em dia?
Eu releio. História, um pouco de política… mesmo meus livros de socialismo eu dei tudo. Agora estou querendo reler alguns mestres socialistas, sobretudo Eduard Bernstein, aquele que os comunistas tinham ódio. Ele era marxista, mas dizia que o marxismo tem um defeito, achar que a gente pode chegar no paraíso terrestre.
Então ele partiu da ideia do filósofo Immanuel Kant da finalidade sem fim. O socialismo é uma finalidade sem fim. Você tem que agir todos os dias como se fosse possível chegar no paraíso, mas você não chegará. Mas se não fizer essa luta, você cai no inferno.

O senhor é socialista?
Ah, claro, inteiramente. Aliás, eu acho que o socialismo é uma doutrina totalmente triunfante no mundo. E não é paradoxo. O que é o socialismo? É o irmão-gêmeo do capitalismo, nasceram juntos, na revolução industrial. É indescritível o que era a indústria no começo. Os operários ingleses dormiam debaixo da máquina e eram acordados de madrugada com o chicote do contramestre. Isso era a indústria. Aí começou a aparecer o socialismo.
Chamo de socialismo todas as tendências que dizem que o homem tem que caminhar para a igualdade e ele é o criador de riquezas e não pode ser explorado.
Comunismo, socialismo democrático, anarquismo, solidarismo, cristianismo social, cooperativismo… tudo isso. Esse pessoal começou a lutar, para o operário não ser mais chicoteado, depois para não trabalhar mais que doze horas, depois para não trabalhar mais que dez, oito; para a mulher grávida não ter que trabalhar, para os trabalhadores terem férias, para ter escola para as crianças. Coisas que hoje são banais.
Conversando com um antigo aluno meu, que é um rapaz rico, industrial, ele disse: “o senhor não pode negar que o capitalismo tem uma face humana”.
O capitalismo não tem face humana nenhuma. O capitalismo é baseado na mais-valia e no exército de reserva, como Marx definiu. É preciso ter sempre miseráveis para tirar o excesso que o capital precisar. E a mais-valia não tem limite.
Marx diz na “Ideologia Alemã”: as necessidades humanas são cumulativas e irreversíveis. Quando você anda descalço, você anda descalço. Quando você descobre a sandália, não quer mais andar descalço. Quando descobre o sapato, não quer mais a sandália. Quando descobre a meia, quer sapato com meia e por aí não tem mais fim. E o capitalismo está baseado nisso. O que se pensa que é face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele com suor, lágrimas e sangue.
Hoje é normal o operário trabalhar oito horas, ter férias… tudo é conquista do socialismo. O socialismo só não deu certo na Rússia.

Por quê?
Virou capitalismo. A revolução russa serviu para formar o capitalismo. O socialismo deu certo onde não foi ao poder. O socialismo hoje está infiltrado em todo lugar.

O socialismo como luta dos trabalhadores?
O socialismo como caminho para a igualdade. Não é a luta, é por causa da luta. O grau de igualdade de hoje foi obtido pelas lutas do socialismo. Portanto ele é uma doutrina triunfante. Os países que passaram pela etapa das revoluções burguesas têm o nível de vida do trabalhador que o socialismo lutou para ter, o que quer. Não vou dizer que países como França e Alemanha são socialistas, mas têm um nível de vida melhor para o trabalhador.

Para o senhor é possível o socialismo existir triunfando sobre o capitalismo?
Estou pensando mais na técnica de esponja. Se daqui a 50 anos no Brasil não houver diferença maior que dez do maior ao menor salário, se todos tiverem escola… não importa que seja com a monarquia, pode ser o regime com o nome que for, não precisa ser o socialismo!
Digo que o socialismo é uma doutrina triunfante porque suas reivindicações estão sendo cada vez mais adotadas. Não tenho cabeça teórica, não sei como resolver essa questão: o socialismo foi extraordinário para pensar a distribuição econômica, mas não foi tão eficiente para efetivamente fazer a produção. O capitalismo foi mais eficiente, porque tem o lucro.
Quando se suprime o lucro, a coisa fica mais complicada. É preciso conciliar a ambição econômica – que o homem civilizado tem, assim como tem ambição de sexo, de alimentação, tem ambição de possuir bens materiais – com a igualdade. Quem pode resolver melhor essa equação é o socialismo, disso não tenho a menor dúvida.
Acho que o mundo marcha para o socialismo. Não o socialismo acadêmico típico, a gente não sabe o que vai ser… o que é o socialismo? É o máximo de igualdade econômica.
Por exemplo, sou um professor aposentado da Universidade de São Paulo e ganho muito bem, ganho provavelmente 50, 100 vezes mais que um trabalhador rural. Isso não pode. No dia em que, no Brasil, o trabalhador de enxada ganhar apenas 10 ou 15 vezes menos que o banqueiro, está bom, é o socialismo.

O que o socialismo conseguiu no mundo de avanços?
O socialismo é o cavalo de Troia dentro do capitalismo. Se você tira os rótulos e vê as realidades, vê como o socialismo humanizou o mundo.
Em Cuba eu vi o socialismo mais próximo do socialismo. Cuba é uma coisa formidável, o mais próximo da justiça social. Não a Rússia, a China, o Camboja. No comunismo tem muito fanatismo, enquanto o socialismo democrático é moderado, é humano.
E não há verdade final fora da moderação, isso Aristóteles já dizia, a verdade está no meio. Quando eu era militante do PT – deixei de ser militante em 2002, quando o Lula foi eleito – era da ala do Lula, da Articulação, mas só votava nos candidatos da extrema esquerda, para cutucar o centro.
É preciso ter esquerda e direita para formar a média. Estou convencido disso: o socialismo é a grande visão do homem, que não foi ainda superada, de tratar o homem realmente como ser humano.
Podem dizer: a religião faz isso. Mas faz isso para o que são adeptos dela, o socialismo faz isso para todos. O socialismo funciona como esponja: hoje o capitalismo está embebido de socialismo. No tempo que meu irmão Roberto – que era católico de esquerda – começou a trabalhar, eu era moço, ele era tido como comunista, por dizer que no Brasil tinha miséria. Dizer isso era ser comunista, não estou falando em metáforas.
Hoje, a Federação das Indústrias, Paulo Maluf, eles dizem que a miséria é intolerável. O socialismo está andando… não com o nome, mas aquilo que o socialismo quer, a igualdade, está andando. Não aquela igualdade que alguns socialistas e os anarquistas pregavam, igualdade absoluta é impossível. Os homens são muito diferentes, há uma certa justiça em remunerar mais aquele que serve mais à comunidade. Mas a desigualdade tem que ser mínima, não máxima. Sou muito otimista. (pausa).
O Brasil é um país pobre, mas há uma certa tendência igualitária no brasileiro – apesar da escravidão – e isso é bom. Tive uma sorte muito grande, fui criado numa cidade pequena, em Minas Gerais, não tinha nem 5 mil habitantes quando eu morava lá.
Numa cidade assim, todo mundo é parente. Meu bisavô era proprietário de terras, mas a terra foi sendo dividida entre os filhos… então na minha cidade o barbeiro era meu parente, o chofer de praça era meu parente, até uma prostituta, que foi uma moça deflorada expulsa de casa, era minha prima. Então me acostumei a ser igual a todo mundo. Fui criado com os antigos escravos do meu avô. Quando eu tinha 10 anos de idade, toda pessoa com mais de 40 anos tinha sido escrava. Conheci inclusive uma escrava, tia Vitória, que liderou uma rebelião contra o senhor.
Não tenho senso de desigualdade social. Digo sempre, tenho temperamento conservador. Tenho temperamento conservador, atitudes liberais e ideias socialistas. Minha grande sorte foi não ter nascido em família nem importante nem rica, senão ia ser um reacionário. (risos).

A Teresina, que inspirou um livro com seu nome, o senhor conheceu depois?
Conheci em Poços de Caldas… essa era uma mulher extraordinária, uma anarquista, maior amiga da minha mãe. Tenho um livrinho sobre ela. Uma mulher formidável. Mas eu me politizei muito tarde, com 23, 24 anos de idade com o Paulo Emílio. Ele dizia: “é melhor ser fascista do que não ter ideologia”. Ele que me levou para a militância. Ele dizia com razão: cada geração tem o seu dever. O nosso dever era político.

E o dever da atual geração?
Ter saudade. Vocês pegaram um rabo de foguete danado.

No seu livro “Os parceiros do Rio Bonito” o senhor diz que é importante defender a reforma agrária não apenas por motivos econômicos, mas culturalmente. O que o senhor acha disso hoje?
Isso é uma coisa muito bonita do MST. No movimento das Ligas Camponesas não havia essa preocupação cultural, era mais econômica.
Acho bonito isso que o MST faz: formar em curso superior quem trabalha na enxada. Essa preocupação cultural do MST já é um avanço extraordinário no caminho do socialismo. É preciso cultura. Não é só o livro, é conhecimento, informação, notícia…
Minha tese de doutorado em ciências sociais foi sobre o camponês pobre de São Paulo – aquele que precisa arrendar terra, o parceiro. Em 1948, estava fazendo minha pesquisa num bairro rural de Bofete e tinha um informante muito bom, Nhô Samuel Antônio de Camargos. Ele dizia que tinha mais de 90 anos, mas não sabia quantos.
Um dia ele me perguntou: “ô seu Antonio, o imperador vai indo bem? Não é mais aquele de barba branca, né?”. Eu disse pra ele: “não, agora é outro chamado Eurico Gaspar Dutra”
Quer dizer, ele está fora da cultura, para ele o imperador existe. Ele não sabe ler, não sabe escrever, não lê jornal. A humanização moderna depende da comunicação em grande parte. No dia em que o trabalhador tem o rádio em casa ele é outra pessoa. O problema é que os meios modernos de comunicação são muito venenosos.
A televisão é uma praga. Eu adoro, hein? Moro sozinho, sozinho, sou viúvo e assisto televisão. Mas é uma praga. A coisa mais pérfida do capitalismo – por causa da necessidade cumulativa irreversível – é a sociedade de consumo.
Marx não conheceu, não sei como ele veria. A televisão faz um inculcamento sublimar de dez em dez minutos, na cabeça de todos – na sua, na minha, do Sílvio Santos, do dono do Bradesco, do pobre diabo que não tem o que comer – imagens de whisky, automóvel, casa, roupa, viagem à Europa – cria necessidades. E claro que não dá condições para concretizá-las. A sociedade de consumo está criando necessidades artificiais e está levando os que não têm ao desespero, à droga, miséria…
Esse desejo da coisa nova é uma coisa poderosa. O capitalismo descobriu isso graças ao Henry Ford. O Ford tirou o automóvel da granfinagem e fez carro popular, vendia a 500 dólares. Estados Unidos inteiro começou a comprar automóvel, e o Ford foi ficando milionário. De repente o carro não vendia mais. Ele ficou desesperado, chamou os economistas, que estudaram e disseram: “mas é claro que não vende, o carro não acaba”.
O produto industrial não pode ser eterno. O produto artesanal é feito para durar, mas o industrial não, ele tem que ser feito para acabar, essa é coisa mais diabólica do capitalismo. E o Ford entendeu isso, passou a mudar o modelo do carro a cada ano. Em um regime que fosse mais socialista seria preciso encontrar uma maneira de não falir as empresas, mas tornar os produtos duráveis, acabar com essa loucura da renovação. Hoje um automóvel é feito para acabar, a moda é feita para mudar. Essa ideia tem como miragem o lucro infinito. Enquanto a verdadeira miragem não é a do lucro infinito, é do bem-estar infinito.

(fonte: http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/aos-98-anos-morre-antonio-candido-leia-uma-de-ultimas-entrevistas-do-critico-socialista-amigo-do-mst.html)

sexta-feira, 12 de maio de 2017

Novos olhares sobre a Política Externa Brasileira


Quais as prioridades de política externa do Brasil para os próximos anos? Como o país pretende afirmar sua inserção na nova ordem global? Que papel pretende assumir? Qual imagem deve passar? Quais serão os maiores desafios a superar?
Esta obra apresenta respostas a essas e a outras perguntas, envolvendo uma nova geração de diplomatas, jornalistas, professores e representantes do setor privado nos debates sobre os rumos da agenda internacional do país. O livro aprofunda a discussão sobre a inserção do Brasil na ordem global e os principais obstáculos que deverão ser enfrentados
nos próximos anos, com análises modernas e pragmáticas, baseadas em experiências concretas, propositivas e desvinculadas de ideias preestabelecidas.
Democratizando o debate sobre a política externa brasileira, este livro traz um convite à reflexão.

 O organizador:
Gustavo Westmann, diplomata desde 2007, bacharel em Direito (USP) e em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Mestre em Diplomacia (IRBr) e em Política Internacional (Luiss). Especialista em Direito Internacional Público pela UC Berkeley e pela The Hague Academy of International Law. Atuou como consultor jurídico na área de Direito Ambiental e nas áreas cultural, ambiental e comercial do Itamaraty. Foi chefe do setor comercial da embaixada do Brasil na Itália. Atualmente é chefe do setor econômico e comercial da embaixada do Brasil na Indonésia.

Publicação da Editora  Contexto. Preço: 45,00

Boletim 12 do Café História

http://www.cafehistoria.com.br/newsletter/boletim-cafe-historia-edicao-12/

História Intelectual - uma bibliografia comentada
Ampla e interdisciplinar, a História Intelectual se consolidou nos últimos anos no Brasil e no mundo. Confira uma bibliografia comentada sobre este importante domínio historiográfico. Leia aqui

 


 

Pesquisa mostra como parte das realizações científicas da União Soviética veio das prisões

Livro de pesquisador britânico examina a ciência durante o regime de Stalin. Período registrou verdadeiros marcos no avanço científico. Muitos desses avanços, contudo, foram frutos do trabalho de cientistas aprisionados.

Enciclopédia de guetos e campos de concentração nazistas para download gratuito

Obra apresenta dados detalhados, fontes, referências, imagens e mapas. São anos de pesquisa reunidos em mais de 4 mil páginas. Os interessados podem baixar os dois volumes do site do Memorial Museu do Holocausto dos EUA.