domingo, 25 de fevereiro de 2018

A era dos oceanos mortos

Estudo abrangente dos mares revela: em 60 anos, zonas costeiras sem oxigênio multiplicaram-se por dez. Além da vida marinha, fenômeno ameaça meio bilhão de pessoas. Há soluções — bloqueadas pelo poder econômico
Por Damian Carrington | Tradução: Inês Castilho
As zonas mortas no oceano, com zero oxigênio, quadruplicaram em tamanho desde 1950, enquanto o número de locais com muito pouco oxigênio perto das costas cresceram dez vezes, alertou um novo estudo científico publicado no início de fevereiro. A maioria das espécies marítimas não consegue sobreviver nessas zonas e a tendência atual levaria à extinção em massa no longo prazo, arriscando causar consequências terríveis para centenas de milhões de pessoas que dependem dos mares para viver.
As mudanças climáticas causadas pela queima de combustível fóssil são a causa da desoxigenação em larga escala, pois águas mais quentes retêm menos oxigênio. As zonas mortas costeiras são consequência de fertilizantes e esgoto que correm da terra para o mar.
estudo, publicado na revista Science, é a primeira análise abrangente dessas áreas e afirma: “Grandes eventos de extinção na história da Terra foram associados a climas quentes e oceanos deficientes em oxigênio.” Denise Breitburg, do Centro de Pesquisa Ambiental Smithsonian (Smithsonian Environmental Research Center), nos Estados Unidos, responsável pela análise, disse: “Na trajetória atual, é para esta situação que  nos dirigimos. Mas as consequências, para os seres humanos, de manter essa trajetória são tão medonhas que é difícil imaginar que possamos ir tão longe.”
“Esse problema pode ser resolvido”, disse Breitburg. “Deter as mudanças climáticas requer um esforço global, mas mesmo ações locais podem ajudar a evitar a redução de oxigênio.” Ela apontou a recuperação da Baia Chesapeake, nos EUA, e do rio Tâmisa, no Reino Unido, onde melhores práticas agrícolas e de saneamento levaram ao desaparecimento de zonas mortas.
Contudo, o professor Robert Diaz, do Instituto Virginia de Ciência Marinha (Virginia Institute of Marine Science), revisor do novo estudo, disse: “Neste momento, a crescente expansão de zonas mortas costeiras e o declínio de oxigênio no mar aberto não são problemas prioritários para governos em todo o mundo. Infelizmente, será necessário ocorrer severa e persistente mortalidade de peixes para que tomem consciência da falta de oxigênio.”

ÁREAS OCEÂNICAS MORTAS (MENOS DE 2mg DE OXIGÊNIO POR LITRO
[Em laranja, as áreas costeiras mortas; em azul as áreas mortas em mar aberto]

Fonte: Global Ocean Oxigen Network, Science
Os oceanos alimentam mais de 500 milhões de pessoas, especialmente em países mais pobres, e proporcionam trabalho para 350 milhões. Mas no mínimo 500 zonas mortas foram localizadas até agora perto das costas, contra menos de 50 em 1950. A falta de monitoramento em várias regiões significa que o verdadeiro número pode ser muito maior.
O mar aberto tem naturalmente áreas de baixo oxigênio, em geral na costa oeste dos continentes devido à forma como a rotação da Terra afeta as correntes oceânicas. Mas essas zonas mortas expandiram-se dramaticamente, aumentando milhões de quilômetros quadrados desde 1950, em área praticamente equivalente à da União Europeia.
Além disso, está caindo o nível de oxigênio em todas as águas oceânicas, com 2% – 77 bilhões de toneladas – sendo perdidos desde 1950. Isso pode reduzir o crescimento, prejudicar a reprodução e aumentar as doenças, alertam cientistas. Ironicamente, águas mais quentes não apenas retêm menos oxigênio como também levam organismos marinhos a respirar mais rápido, usando mais oxigênio.
Há também perigosos mecanismos de feedback. Micróbios que proliferam em níveis muito baixos de oxigênio produzem muito óxido nítrico, um gás de efeito estufa que é 300 vezes mais potente que o dióxido de carbono.
Em regiões costeiras, a poluição por fertilizantes, excrementos animais e água de esgoto causa a floração de algas, e quando elas se decompõem o oxigênio é sugado para fora d’água. Em alguns lugares, contudo, as algas podem gerar mais alimento para os peixes e aumentar a captura perto das zonas mortas. Isso pode não ser sustentável, disse Breitburg: “Preocupa muito que estejamos mudando o modo como esses sistemas funcionam, o que pode levar à redução de sua resiliência global.”
O novo estudo foi produzido por um grupo de trabalho internacional criado em 2016 pela Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco. Kirsten Isensee, membro da comissão, disse: “A desoxigenação do oceano está acontecendo em todo o mundo como resultado da pegada humana; é necessário, portanto, que a enfrentemos globalmente.”
Lucia von Reusner, diretora de campanha do grupo Mighty Earth (Terra Forte, em tradução livre), que recentemente estabeleceu uma ligação entre a zona morta do Golfo do México e a produção de carne em larga escala, disse: “Essas zonas mortas continuarão a expandir-se, a menos que as grandes indústrias de carne que dominam o sistema agrícola global comecem a limpar sua cadeia de fornecedores, de modo a manter a poluição fora de nossas águas.”
Diaz observou que a velocidade da asfixia dos oceanos é de tirar o fôlego: “Nenhuma outra variável de tal importância ecológica para os ecossistemas costeiros mudou tão drasticamente, em período tão curto, pela ação humana, como a dissolução do oxigênio.”
A necessidade de ação urgente, disse, é bem resumida pelo lema da Associação Americana do Pulmão (American Lung Association): “Se você não consegue respirar, nada mais importa.”
(fonte: https://outraspalavras.net/destaques/a-era-dos-oceanos-mortos/)

Estudo revela a contribuição de produtos de limpeza, tintas, pesticidas e perfumes na poluição atmosférica urbana



Produtos químicos que contêm compostos refinados de petróleo, como produtos de limpeza domésticos, pesticidas, tintas e perfumes, agora são as principais emissões relacionadas com veículos motorizados como a principal fonte de poluição atmosférica urbana, de acordo com um surpreendente estudo liderado pela NOAA.
A reportagem foi publicada por CIRES e reproduzida por EcoDebate, 19-02-2018. A tradução e a edição é de Henrique Cortez.
As pessoas usam muito mais combustível do que com compostos à base de petróleo em produtos químicos – cerca de 15 vezes mais por peso, de acordo com a nova avaliação. Mesmo assim, loções, tintas e outros produtos contribuem tanto quanto à poluição do arcomo o setor de transporte, disse o autor principal Brian McDonald, cientista do CIRES que trabalha na Divisão de Ciências Químicas da NOAA.
No caso de um tipo de poluição – pequenas partículas que podem danificar os pulmões das pessoas – as emissões formadoras de partículas de produtos químicos são cerca de duas vezes mais elevadas que as do setor de transporte, descobriu sua equipe. McDonald e colegas da NOAA e várias outras instituições relataram seus resultados hoje na revista Science .
“À medida que o transporte fica mais limpo, essas outras fontes tornam-se cada vez mais importantes”, disse McDonald. “O material que usamos em nossas vidas cotidianas pode afetar a poluição do ar”.
Para a nova avaliação, os cientistas se concentraram em compostos orgânicos voláteis ou COVs. Os COVs podem entrar na atmosfera e reagem para produzir tanto ozônio como partículas, ambos dos quais estão regulamentados nos Estados Unidos e em muitos outros países por causa de impactos na saúde, incluindo danos nos pulmões.
Aqueles de nós que vivemos em cidades e subúrbios assumem que grande parte da poluição que respiramos vem de emissões de carros e caminhões ou bombas de gás vazadas. Isso é por uma boa razão: era claramente verdade nas últimas décadas. Mas os reguladores e os fabricantes de automóveis fizeram mudanças limitativas de poluição para motores, combustíveis e sistemas de controle de poluição. Assim, McDonald e seus colegas reavaliaram as fontes de poluição atmosférica, classificando as recentes estatísticas de produção química compiladas por indústrias e agências reguladoras, fazendo medidas detalhadas da química atmosférica no ar de Los Angeles e avaliando as medidas de qualidade do ar interno feitas por outros.
Os cientistas concluíram que, nos Estados Unidos, a quantidade de COVs emitidos por produtos industriais e de consumo é, na verdade, duas ou três vezes maior que a estimada pelos atuais estoques de poluição do ar, que também superestimam as fontes de veículos. Por exemplo, a Agência de Proteção Ambiental estima que cerca de 75% das emissões de COVs fósseis (em peso) provêm de fontes relacionadas com combustível e cerca de 25% de produtos químicos. O novo estudo, com sua avaliação detalhada de estatísticas de uso químico atualizadas e dados atmosféricos anteriormente não disponíveis, coloca a divisão em 50-50.
O impacto desproporcional da qualidade do ar das emissões de produtos químicos deve-se, em parte, a uma diferença fundamental entre esses produtos e combustíveis, afirmou a cientista atmosférica da NOAA, Jessica Gilman, co-autora do novo artigo. “A gasolina é armazenada em recipientes fechados, esperançosamente estanques, e os COV na gasolina são queimados por energia”, disse ela. “Mas os produtos químicos voláteis utilizados em solventes comuns e produtos de cuidados pessoais são literalmente concebidos para evaporar. Você usa perfume ou usa produtos perfumados para que você ou seu vizinho possam desfrutar o aroma. Você não faz isso com gasolina “, disse Gilman.
A equipe estava particularmente interessada em como esses COVs acabam contribuindo para a poluição por partículas. Uma avaliação abrangente publicada na revista médica britânica Lancet no ano passado colocou a poluição do ar na lista dos cinco principais ameaças de mortalidade global, com a “poluição atmosférica em partículas” como o maior risco de poluição do ar.
O novo estudo descobre que, à medida que os carros ficaram mais limpos, os COVformando essas partículas de poluição estão cada vez mais vindo de produtos de consumo.
“Já chegamos a esse ponto de transição em Los Angeles”, disse McDonald.
Ele e seus colegas descobriram que simplesmente não conseguiam reproduzir os níveis de partículas ou ozônio medidos na atmosfera, a menos que incluíssem emissões de produtos químicos voláteis. No decorrer desse trabalho, eles também determinaram que as pessoas estão expostas a concentrações muito elevadas de compostos voláteis em ambientes fechados, que estão mais concentrados no interior do que fora, disse o co-autor Allen Goldstein, da Universidade da Califórnia em Berkeley.
“As concentrações internas são muitas vezes 10 vezes maiores no interior do que no exterior, e isso é consistente com um cenário em que os produtos à base de petróleo utilizados em ambientes internos fornecem uma fonte significativa para o ar exterior em ambientes urbanos”.
A nova avaliação conclui que o foco de regulamentação dos EUA em emissões de carros tem sido muito efetivo, disse o co-autor Joost de Gouw, um químico da CIRES.
“Funcionou tão bem que, para avançar ainda mais na qualidade do ar, os esforços regulatórios deveriam se tornar mais diversos”, afirmou Gouw. “Não são apenas veículos mais”. 

Referência:
Volatile chemical products emerging as largest petrochemical source of urban organic emissions BY BRIAN C. MCDONALD, JOOST A. DE GOUW, JESSICA B. GILMAN, SHANTANU H. JATHAR, ALI AKHERATI, CHRISTOPHER D. CAPPA, JOSE L. JIMENEZ, JULIA LEE-TAYLOR, PATRICK L. HAYES, STUART A. MCKEEN, YU YAN CUI, SI-WAN KIM, DREW R. GENTNER, GABRIEL ISAACMAN-VANWERTZ, ALLEN H. GOLDSTEIN, ROBERT A. HARLEY, GREGORY J. FROST, JAMES M. ROBERTS, THOMAS B. RYERSON, MICHAEL TRAINER Science 16 Feb 2018: Vol. 359, Issue 6377, pp. 760-764 DOI: 10.1126/science.aaq0524
(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/576227-estudo-revela-a-contribuicao-de-produtos-de-limpeza-tintas-pesticidas-e-perfumes-na-poluicao-atmosferica-urbana)

Exportação de animais vivos para abate dispara e vira alvo de batalhas na Justiça no Brasil


Uma guerra por um mercado de mais de R$ 800 milhões pode ter sua primeira batalha encerrada nesta quarta-feira, quando 27 mil bois vivos oriundos do Brasil desembarcam na Turquia depois de 15 dias de viagem pelo mar.
O navio saiu do Porto de Santos no dia 5 de fevereiro sob forte pressão de grupos de defesa dos animais - eles afirmam que os bovinos sofreram maus-tratos. Após protestos e processos, a Justiça chegou a proibir a exportação de carga viva em todo o país, mas suspendeu a decisão após o governo do presidente Michel Temer (PMDB) recorrer.
A reportagem é de Leandro Machado, publicada por BBC Brasil. 21-02-2018.
No entanto, a guerra deve continuar nos próximos meses: a expectativa é de que as exportações de animais vivos cresçam 30% neste ano ao mesmo tempo em que diversas ações judiciais tentam impedi-las.
Brasil é um dos maiores exportadores de carne bovina do mundo, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) - um mercado de R$ 5,3 bilhões ao ano apenas no Brasil. A maior parte desse montante é de carne processada e congelada, ou seja, os animais são abatidos no Brasil e depois levados aos países compradores.
Há cerca de 20 anos, porém, o Brasil passou a vender também os animais vivos. Eles são transportados de caminhão das fazendas ao porto, colocados em grandes embarcações, viajam milhares de quilômetros pelo mar e, depois, são abatidos no país comprador.

Esse tipo de exportação vem crescendo ano a ano. Segundo Associação Brasileira dos Exportadores de Animais Vivos (Abreav), o Brasil vendeu 460 mil cabeças de gado em pé - nome técnico para a modalidade - em 2017, movimento de R$ 800 milhões e crescimento de 42% em relação a 2016.
"Nós estamos crescendo todos os anos e, em 2018, vamos aumentar as vendas em 30%", diz Ricardo Pereira Barbosa, presidente da Abreav.
A maior parte dos animais vai para países muçulmanos por uma questão religiosa. A carne consumida pelos religiosos deve ser cortada pela técnica halal.
Nesse tipo de corte, os animais devem saudáveis no momento do abate, segundo explica Michel Alaby, secretário geral da Câmara de Comércio Árabe Brasileira. "O animal é morto de cabeça para baixo e todo o sangue deve ser drenado", diz.
O nicho deve ser abatido por um muçulmano que tenha atingido a puberdade. Ele deve pronunciar o nome de Alá ou recitar uma oração que contenha o nome de Alá durante o processo, com a face do animal voltada para Meca.
Segundo a Câmara Brasil Árabe, as exportações de gados vivos para cinco países árabes, como Iraque e Egito, cresceram 75% nos últimos dois anos - de R$ 273 milhões em 2015 para R$ 412 milhões no ano passado.
Alaby diz que a indústria brasileira já é a maior exportadora de carne halal no mundo - a maior parte dos animais é abatida ainda no Brasil, por mulçumanos contratados exclusivamente para a técnica. Porém, segundo ele, governo árabes querem aumentar o número de empregos na pecuária e, por isso, preferem fazer o abate nos próprios países.
Em meio a esse rápido e acentuado crescimento, grupos e ONGs de defesa dos animais têm feito denúncias de maus-tratos sofridos pelos animais transportados. Hoje, existem ao menos dois processos em São Paulo e outro na esfera federal contra as exportações.

Houve maus-tratos aos animais no navio?

O navio com 27 mil bois que desembarca hoje à Turquia chegou a ser impedido de sair do Brasil pela Justiça - a carga foi avaliada em R$ 64 milhões. A embarcação Nada, de bandeira panamenha, estava carregada de animais da Minerva Foods, uma das maiores produtoras de carne no Brasil.
O caso começou a chamar a atenção depois que moradores de Santos reclamaram do mau cheiro e de excrementos deixados pelos caminhões que passavam pela cidade. Depois, a ONG Fórum Nacional de Proteção e Defesa de Animal entrou na Justiça para impedir que o navio deixasse o país, alegando que os animais estavam sofrendo maus tratos.
O processo chegou ao juiz federal Djalma Moreira Gomes, da 25ª Vara Civil de São Paulo, que nomeou a veterinária Magda Regina, funcionária da Prefeitura de Santos, para realizar um laudo técnico sobre a situação dos animais dentro do navio.
O magistrado perguntou: "De que maneira são acondicionados em caminhões ou embarcações os animais transportados para o exterior?". No documento, a veterinária respondeu que havia entre 27 e 38 bois em cada veículo e que fitas adesivas foram coladas nos orifícios laterais, "visando dificultar inspeção externa de terceiros".
Ela escreveu: "Os animais, uma vez aprisionados dentro dos caminhões enfrentaram viagens entre 8 a 14 horas de trajeto. Muitos caminhões e suas caçambas dispunham de varetas com pontas metálicas conectadas ao sistema elétrico do veículo, cujo objetivo é impedir mediante descargas elétricas que os animais se deitem no assoalho do veículo".
Regina apontou que, durante o embarque que durou uma semana, as baias do navio não foram lavadas. "A imensa quantidade de urina e excrementos produzida e acumulada nesse período propiciou impressionante deposição no assoalho de uma camada de dejetos lamacenta."
Ela afirmou ainda que funcionários do navio lhe disseram que, após a lavagem, os dejetos são jogados no mar - cada boi produz cerca de 30 quilos de fezes por dia.
"Os dejetos acumulados pelo processo de limpeza têm então seu conteúdo descartado, sem qualquer tratamento, ao mar. Esse descarte ocorre periodicamente, dependendo da velocidade do navio em curso."
Segundo o laudo, o navio tinha três veterinários para cuidar dos 27 mil animais - um para cada 9 mil cabeças. Também apontou:
"Em setor específico do navio, vulgarmente denominado Graxaria, foi constatada a presença de um equipamento destinado a triturar os animais mortos, cujo resultado do trituramento é também lançado ao mar", escreveu a veterinária.
Outra vistoria foi feita no navio ao mesmo tempo que Magda Regina realizava a sua. Os resultados, no entanto, são totalmente divergentes.
Os auditores fiscais do Ministério da AgriculturaPaulo Roberto de Carvalho Filho e Felipe Ávila Alcover, afirmaram que não houve maus-tratos e que o navio seguia todas as regras da Organização Mundial da Saúde Animal.
"Os animais apresentavam expressão de tranquilidade, ausência de dor, ansiedade ou estresse térmico. Se aproximavam com curiosidade do toque humano, sinal de que não são tratados com rudeza e acostumados ao arraçoamento por tratador", escreveram.
Disseram também que os bovinos estavam bem alimentados e que os decks da embarcação tinham piso adequado - a lavagem era feita normalmente, a cada cinco dias.

'Inferno na terra'

Enquanto o navio recebia os bois, manifestantes protestavam em frente ao Porto de Santos - reuniram até 500 pessoas.
O biológo Frank Alarcón, ativista da defesa dos animais, também conseguiu entrar na embarcação.
"Posso resumir o que vi em uma frase: um inferno na terra", diz. "Cada animal tinha 1 m² de espaço, e você sabe que um boi tem mais do que isso. Eles estavam mergulhados nas fezes, no vômito, na urina. Alguns se deitavam em cima de outros", afirma.
Para Ricardo Pereira Barbosa, presidente da associação das empresas exportadoras, não houve maus-tratos no navio. "Todos os barcos estrangeiros seguem a norma da Organização Mundial da Saúde Animal. Da nossa perspectiva, não houve maus-tratos", disse.
Minerva Foods, dona da carga, afirmou que o manejo dos animais segue todos os procedimentos adequados para preservar o bem-estar dos animais durante o transporte, embarque e no decorrer da viagem.
Não é a primeira vez que a empresa se envolve em uma polêmica sobre essa modalidade de comércio. Em outubro de 2015, um navio com 5 mil animais dela naufragou em Barcarena, no Pará. Milhares deles morreram afogados - a companhia foi processada.

O que a Justiça decidiu

Depois do laudo técnico da veterinária, o juiz federal Djalma Moreira Gomes decidiu, em liminar, suspender a exportação de animais vivos em todo território nacional, até que os países de destino "se comprometam, mediante acordo inter partes, a adotar práticas de abate compatíveis com o preconizado pelo ordenamento jurídico brasileiro".
Na decisão do dia 2 de fevereiro, o magistrado afirmou que as condições de higiene no navio Nada "eram muito precárias". Para ele, o transporte deveria assegurar o bem-estar dos animais.
Gomes escreveu ainda: "É dizer, alguém sendo dono de uma cadeira e de um cão, poderia, sem qualquer recriminação de ordem jurídica, despedaçar a cadeira e atirar seus cacos na caçamba de lixo. Porém, seria inconcebível que mesmo sendo dono do cão, pretendesse fazer com o animal o mesmo o mesmo que fizera com a cadeira".
A proibição do transporte dos animais foi comemorada por ativistas e ambientalistas, mas acendeu um sinal amarelo no setor agropecuário e também no governo federal.
O ministro da AgriculturaBlairo Maggi, encontrou-se com o presidente Michel Temer para falar do caso. "Este assunto é bastante complicado. Os bois já estão embarcados, sendo alimentados por ração vinda de outros países. Descarregar estes animais conforme a Justiça determinou traz um problema sanitário. Além de já ser um problema diplomático", afirmou à Agência Brasil no dia 4 de fevereiro.
Maggi é ligado ao setor agropecuário brasileiro - a empresa de sua família, a Amaggi, é um das maiores exportadoras de soja do país. Boa parte de sua campanha para o Senado pelo PR em 2010 foi financiada por frigoríficos e por empresas de alimentos.
No mesmo dia, a AGU (Advocacia-Geral da União) pediu à Justiça a suspensão da liminar. Argumentou que a proibição "implicaria em grave lesão à ordem administrativa, à saúde pública e à economia pública, podendo submeter o setor agropecuário brasileiro a risco".
AGU também afirmou que o navio tinha condições adequadas e que cabe apenas ao Ministério da Agricultura calcular o risco sanitário do transporte internacional de animais.
Às 19h50 do domingo, O Tribunal Federal Regional da 3ª Região acatou o pedido do governo Temer e liberou as exportações. O navio Nada saiu do país horas depois.
Na semana passada, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) multou em R$ 450 mil o Ecoporto Santos, onde o navio atracou. Segundo a Cetesb, o local não tinha licença ambiental para fazer embarque de carga viva.
Ecoporto Santos afirma que vai recorrer e que foi surpreendido pela multa, "pois entende que a operação foi realizada em estrita observância às legislações que regulamentam está modalidade de operação".

A guerra continua

Outros três processos devem continuar nos próximos meses, colocando as exportações de animais vivos sob o crivo da Justiça.
"Nosso objetivo é barrar essas grandes exportações de animais. Elas se tornaram vultuosas. Não queremos destruir a economia, nós queremos só um pouco de respeito com os animais", explica a advogada Letícia Filpim, vice-presidente da Abra(Associação Brasileira dos Advogadas Animalistas).
Para o biólogo Frank Alarcón, as exportações em grande quantidade ferem os direitos dos animais. "Sem contar as questões ambientais, pois dejetos são jogados no mar, há pontos éticos: você submete animais de cognição complexa a enclausuramentos em locais minúsculos, sujos, e faz viagens marítimas por semanas", diz ele, que faz parte do Partido Animal. "Os animais são expostos a tempestades e calor intenso. Não há nada que amenize esse sofrimento."
Michel Alaby, da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, afirma que dados dos países compradores apontam que 3% dos animais chegam mortos ao destino.
A guerra jurídica não assusta Ricardo Pereira Barbosa, da associação dos exportadores. "Fazemos isso há 20 anos. Por que agora, que o mercado cresceu 42%, houve todos esses protestos? Estamos em ano de eleição e existem pessoas querendo se aproveitar da repercussão", afirmou, citando deputados estaduais que compareceram às manifestações.
Ele completa: "Nós vamos conversar com o governo para aprimorar a legislação. Mas mesmo com protesto, com reclamação, as vendas vão continuar".
(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/576264-exportacao-de-animais-vivos-para-abate-dispara-e-vira-alvo-de-batalhas-na-justica-no-brasil)

Julgamento do Código Florestal no STF: os riscos para o Cerrado e o abastecimento de água


capital federal continua vivendo sua mais grave crise hídrica. No ano passado, os dois principais reservatórios do DF, do Descoberto e de Santa Maria, chegaram a cerca de 5% e 21% de sua capacidade total, respectivamente. O racionamento de água completa mais de um ano. Os candangos ficaram, em média, 2 meses sem água nas torneiras – 24 horas a cada seis dias. Apesar das duas represas terem se recuperado, 2017 terminou com o volume de precipitações 15% abaixo do esperado. Ainda não se sabe quando o racionamento vai terminar.
A situação em Brasília é só o caso mais recente de um problema sério ainda enfrentado por vários Estados do Nordeste e pelo qual passaram São Paulo e Rio de Janeiro. E isso num cenário de agravamento de eventos climáticos extremos. Em geral, são eles a causa dessas crises, mas os especialistas já comprovaram que o desmatamentodesenfreado está agravando o desabastecimento de água.
crise hídrica acrescenta dramaticidade ao julgamento das ações contra a Lei de Proteção da Vegetação Nativa (12.651/2012), que revogou o Código Florestal de 1965. O caso será retomado no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta (21/2).
Nurit Bensusan, assessora do ISA, bióloga e pesquisadora associada da Universidade de Brasília (UnB), que comenta os riscos para o Cerrado e o abastecimento de água da manutenção da lei atual a partir de estudos recentes sobre as consequências do desmatamento.
A entrevista é publicada por Instituto Socioambiental - Isa, 21-02-2018. 


Eis a entrevista.

Água e floresta são dois lados da mesma moeda?
Água e floresta estão, sim, umbilicalmente ligadas. Ou melhor dizendo, água e vegetação natural, pois há muitas paisagens naturais que não são florestas, mas que também devem ser conservadas. Tanto, que, às vezes, nos perguntamos sobre uma área onde há água: ali tem água por causa da vegetação ou tem vegetação por causa da água?
Veja, por exemplo, o caso dos oásis do norte da África: por muito tempo se acreditou que eram remanescentes de uma paisagem com vegetação que foi suprimida ao longo dos anos e transformada em deserto. Hoje, se sabe que esses oásis são fruto do plantio coordenado de plantas pelos povos daquela região, ao longo de centenas de anos, que transformaram aquele local trazendo água para a superfície.
Muitos ambientes da Terra sofrem hoje com escassez de água por causa do desmatamento e da ocupação desordenada das paisagens. As savanas africanas, degradadas devido ao sobrepastoreio e ao consumo de lenha, são um exemplo disso. Ao longo dos séculos, a diminuição da vegetação levou a uma maior falta d’água.
Então, quer dizer que desmatamento e a supressão da vegetação do Cerrado tem relação com a crise hídrica do Distrito Federal, por exemplo?
Com certeza! E é interessante que essa relação acontece em pelo menos duas dimensões, uma química e outra física. A química é aquela que mostra que as árvores e a vegetação em geral têm um papel muito relevante na volta da água para atmosfera: por meio do processo de evapotranspiração as plantas bombeiam água de volta na atmosfera. Por exemplo, um estudo recente, publicado em 2016, na revista científica Global Chance Biology, mostra que a evapotranspiração da vegetação natural do Cerrado chega a ser mais de 50% maior do que a das culturas agrícolas que em geral a substituem. Evidentemente, isso impacta o regime das chuvas da região.
A outra dimensão é a física que pode ser vista nas profundas raízes que as plantas do Cerrado possuem. Dizem que o Cerrado é uma floresta ao contrário exatamente por conta dessas raízes grandes e profundas. Elas penetram fundo no solo, criam caminhos por onde a água passa e abastecem o lençol freático e os aquíferos subterrâneos. Pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB), como o professor José Eloi, especialista em hidrogeologia, vem chamando atenção para a redução significativa de recarga dos aquíferos causada pela supressão da vegetação. O efeito disso sobre a disponibilidade de água é enorme, pois a água subterrânea é responsável por maior parte da vazão dos rios do Cerrado.
bioma está sobre três dos principais aquíferos do nosso continente: o Guarani, bastante famoso, o Bambuí e o Urucuia. A chuva no Cerrado penetra no solo e fica armazenada nas rochas do subsolo e essa água abastece mais de dois terços das regiões hidrográficas do país. Toda a bacia do Rio Paraná é alimentada pelo aquífero Guarani, ou seja, a maior parte dos rios de São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e grande parte dos rios de Goiás. A vazão desses rios diminui ano a ano, pois a recarga do aquífero está comprometida.
Nos últimos 50 anos, metade da vegetação do Cerrado se perdeu e uma boa parte do que sobrou não preservou sua integridade ecológica, o que também compromete sua função para manter o regime hídrico.
Como o professor Altair Sales Barbosa, da PUC-GO, sempre ressalta, a vegetação do Cerrado é de crescimento muito lento. Muitos buritis que vemos hoje estavam nascendo quando Pedro Álvares de Cabral chegou ao Brasil. Assim, a recuperação do Cerradoé complexa e muito demorada. Um estudo dos pesquisadores da UNESP, que saiu agora no Journal of Applied Ecology, mostra que, mesmo quando o extrato arbóreo do Cerrado se recupera, a parte herbácea (de plantas menores, capins e outras gramíneas) não se regenera e isso acaba por influenciar a integridade da paisagem e coloca em xeque seu papel no regime de chuvas.
Isso tudo é agravado pela situação específica do Distrito Federal, onde poucas áreas naturais foram mantidas e a ocupação urbana tem sido descontrolada. Um resumo de tudo isso é que sem a vegetação natural do Cerrado, o regime de chuvas fica comprometido e, com o aumento do desmatamento, a crise tende a se agravar.
Mantendo tudo isso em mente, o que se perde se o STF não acolher as ADIs ligadas ao Código Florestal?
Estamos falando, entre outros dispositivos, da possibilidade de uma área maior do que o território de toda Alemanha deixar de ser recuperada – a nova lei anistiou os produtores rurais de recuperar 41 milhões de hectares desmatados ilegalmente. Além disso, estão na pauta formas diferentes de calcular as Áreas de Preservação Permanente (APPs), ou seja, não é apenas muita área que deixará de ser recuperada e onde a vegetação poderá ser suprimida, mas são áreas localizadas perto dos cursos d´água e as consequências para o regime de chuvas serão drásticas.
É vastamente documentado o papel das APPs na beira dos cursos d'água como filtro de sedimentos, reduzindo a quantidade de fertilizantes e pesticidas que chegam ao meio aquático, para a promoção da infiltração de água e recarga dos aquíferos, a proteção do solo, evitando erosão e assoreamento. A eficiência e a extensão desses benefícios, porém, dependem da manutenção da integridade da vegetação e dos processos ecológicos ali existentes.
A mais evidente consequência desses dispositivos na lei é o colapso do abastecimento humano e as recentes crises hídricas que oferecem um vislumbre do que pode acontecer. Mas, há consequências também para a produção de energia, para as atividades industriais e para a agricultura, atividade altamente dependente de água.
A proteção e a função ambiental das APPs ficaram também largamente ameaçadas pela exclusão dos entornos das nascentes intermitentes e temporárias O artigo 4, inciso IV, questionado por uma das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs), qualifica como APP uma área de raio mínimo de 50 metros somente no entorno das nascentes e olhos d'água perenes, enquanto o antigo Código Florestal definia as áreas de entorno de todas as nascentes como de preservação permanente. Felizmente, o relator do caso no STF, ministro Luiz Fux, considerou esse ponto inconstitucional. Vamos aguardar com vão se posicionar os outros ministros.
Essas nascentes, intermitentes ou temporárias, excluídas da proteção das APPs são até mais vulneráveis que as perenes e possuem um papel fundamental na preservação da disponibilidade de água. É sabido que em ambientes do semi-árido brasileiro, onde vivem 20 milhões de pessoas, a grande maioria das bacias hidrográficas é composta de nascentes e cursos d’água intermitentes. Nesse ambiente e em muitos outros, haverá uma significativa diminuição das áreas de preservação permanente.
Se os artigos 61-A, 61-B, 61-C e 63, também questionados no STF, forem mantidos não será possível evitar as cada vez mais frequentes inundações e enchentes. Vale lembrar que a dispensa de recuperação de APPs também se aplica às áreas de encostas com declividade superior a 45 graus, às bordas de tabuleiro ou chapadas e aos topos de morro. Quem se lembra dos desastres da região serrana do Rio de Janeiro que ocorreram em janeiro de 2011 não vai ter dificuldade de entender a importância das APPs para o controle das inundações e quais são as consequências desastrosas de sua remoção, alteração e redução.
Enfim, o já-não-tão-novo Código Florestal protege menos a vegetação nativa brasileira. Esse julgamento é uma possibilidade de resgatar alguns dispositivos que conferem um pouco mais de proteção e isso, certamente, impacta além dos recursos hídricos, a quantidade de polinizadores, o controle de pragas e doenças e até mesmo da febre amarela e da dengue. Os dados científicos se acumulam mostrando que o futuro será muito mais difícil, se não impossível, sem as áreas naturais.
(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/576293-julgamento-do-codigo-florestal-no-stf-os-riscos-para-o-cerrado-e-o-abastecimento-de-agua)

Os estadunidenses e sua louca paixão por armas


Quatro dias após o massacre num colégio em Parkland, Florida, quando um jovem de 19 anos matou 17 pessoas, a maioria estudantes, aconteceu uma Megafeira de Armas no estado, em que a principal atração foi o rifle AR-15, usado pelo jovem no ataque.

Foi um sucesso de venda. Todo mundo queria o seu AR-15, com medo de que sua comercialização viesse a ser proibida ou sofresse maiores restrições. O que não ocorreu até hoje. Nem parece que vá ocorrer. Pelo contrário.

O AR-15 é um velho conhecido do público americano.
Foi com uma arma desse tipo que Adam Lanza matou 20 crianças em 2012 na escola Sandy Hook, em Connecticut, e que, no mesmo ano, James Holmes deixou 12 mortos e dezenas de feridos em um cinema do Colorado durante uma exibição de um dos filmes da série Batman.

O mais recente foi Nikolas Cruz, responsável pelo ataque do colégio de Parkland. O próximo poderia estar ali na feira comprando a sua e preparando seu show.

Fonte: BBC Brasil.  e https://blogdomello.blogspot.com.br/2018/02/4-dias-apos-massacre-de-17-colegio-parkland-ar-15.html

domingo, 18 de fevereiro de 2018

Novos dados de satélite confirmam o aumento acelerado do nível do mar


Vinte e cinco anos de dados de satélites provam que os modelos climáticos estão corretos na previsão de que o nível do mar aumentará a uma taxa crescente.
A reportagem é de Tina Meketa, publicada por University of South Florida, e reproduzida por EcoDebate, 14-02-2018. A tradução e edição são de Henrique Cortez.
Em um novo estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, os pesquisadores descobriram que, desde 1993, as águas oceânicas subiram a costa em quase 1 milímetro por década. Isso está em cima do aumento anual constante de 3 milímetros. Essa aceleração significa que ganhamos um milímetro adicional por ano para cada uma das próximas décadas, potencialmente dobrando o que aconteceria ao nível do mar até 2100 se a taxa de aumento fosse constante.
“A aceleração prevista pelos modelos já foi detectada diretamente das observações. Eu acho que isso é um trocador de jogo até a discussão sobre mudanças climáticas “, disse o co-autor Gary Mitchum, doutorado , decano e professor da University of South Florida College of Marine Science. “Por exemplo, a área de Tampa Bay foi identificada como uma das 10 áreas mais vulneráveis do mundo ao aumento do nível do mar e a crescente taxa de aumento é uma grande preocupação”.
Dr. Mitchum é parte de uma equipe liderada pelo professor de Boulder da Universidade do Colorado Steve Nerem, PhD, que usou análises estatísticas para aprimorar estudos anteriores com base em dados de marés, o que também sugeriu aceleração ao longo do século passado. No entanto, os satélites dão uma visão melhor do aumento do nível do mar, porque as amostras são coletadas ao longo do oceano aberto, ao invés de apenas ao longo do litoral.
Como continua, a próxima geração experimentará uma paisagem muito diferente do que hoje.
(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/576040-novos-dados-de-satelite-confirmam-o-aumento-acelerado-do-nivel-do-mar)

Como destruição do Cerrado ameaça ‘floresta de cabeça para baixo’ e abastecimento de aquíferos


Segundo maior bioma da América do Sul, o Cerrado tem papel central na distribuição das águas que abastecem boa parte do Brasil. É nele que nascem vários dos rios que integram seis das principais bacias hidrográficas brasileiras - ParnaíbaParanáParaguaiTocantins-AraguaiaSão Francisco e Amazônica -, e mais de cem espécies diferentes de frutas, das quais apenas 40 são exploradas comercialmente.
A informação é publicada por BBC Brasil, 08-02-2018.
O equilíbrio desse ecossistema, contudo, está ameaçado pelo avanço da agricultura em larga escala.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, cerca de 20% das espécies de plantas e animais exclusivas ao bioma já foram extintas, e ao menos 137 espécies de animais da região correm o risco de desaparecer.
"A gente não tem mais aquele habitat natural, porque esse tipo de vegetação deu lugar às lavouras: à soja, ao milho, ao feijão, ao arroz - e eles não têm a mesma função ecológica do Cerrado", alerta Mauro Alves de Araujo, técnico agrícola especializado na identificação de espécies vegetais.
Boa parte das últimas áreas de Cerrado se encontra na região conhecida como Matopiba (que engloba trechos do MaranhãoTocantinsPiauí e Bahia) - considerada uma das últimas fronteiras agrícolas do país.
"A gente está trocando árvore por herbácea, e isso na matemática (da ecologia) é cruel", acrescenta Araujo.
Cerrado é um dos biomas mais antigos e biodiversos do mundo. Começou a se formar há pelo menos 40 milhões de anos e abriga centenas de espécies de animais e plantas que só existem lá.
Para sobreviver às longas secas que ocorrem na região, muitas árvores locais desenvolveram sistemas de raízes extremamente profundas e ramificadas.
Graças a essas raízes, várias espécies do bioma jamais perdem as folhas, nem mesmo no auge da estiagem.
As raízes podem ser muito mais extensas que as copas das árvores, o que faz com que o Cerrado seja conhecido como "floresta de cabeça para baixo".
Árvores presentes no bioma - entre as quais buriti, pequi, jatobá e baru - garantem ainda uma dieta rica para os habitantes da região.
(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/576093-como-destruicao-do-cerrado-ameaca-floresta-de-cabeca-para-baixo-e-abastecimento-de-aquiferos)

Juízes são uma casta especial no Brasil e na Argentina

Texto escrito por José de Souza Castro:

“Além do teto, tem cobertura, puxadinho e sei mais lá o quê”, diz o jornal na abertura da reportagem publicada neste fim de semana. A frase é da presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, que nada fez ainda para acabar com essa desmoralização do poder que dirige desde o dia 12 de setembro de 2016.Um apanhado feito pelo “El País”, maior jornal espanhol, sobre a situação salarial dos juízes no Brasil, Argentina, Itália, França e Alemanha, mostra que os brasileiros são os mais bem remunerados. O teto salarial da magistratura brasileira é mais de 15 vezes o rendimento médio mensal da população (de apenas R$ 2.139 reais, conforme o IBGE), enquanto os juízes europeus ganham cerca de quatro vezes a mais que a média salarial de seus países.
A jornalista Helena Chagas, que foi ministra-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República durante todo o primeiro mandato de Dilma Rousseff, mostra que nem sempre um presidente do Supremo foi conivente com essa situação. Lembra que em 2005 o presidente do STF, Nélson Jobim, convenceu o presidente Lula a enviar ao Congresso Nacional um plano de reestruturação de carreira para os magistrados, “justamente para acabar com o auxílio-moradia”.
Quando foi conversar com Lula no Planalto, naqueles idos de 2005, escreve Helena Chagas, na época colunista de “O Globo”, Jobim abriu o jogo: o auxílio-moradia, um “abacaxi”, era de fato uma gambiarra que servia como complementação salarial para os juízes, que ganhavam em torno de R$ 12 mil. “O justo era acabar com isso, reestruturando a carreira, aumentando o salário e preservando o auxílio apenas nos casos de transferência de magistrados para lugares distantes,” defendeu Jobim. Lula concordou, o Congresso aprovou a proposta “e a República achou que tinha ficado livre do auxílio-moradia dos juízes – até que ele voltou a ser universalizado, por decisão do ministro Luiz Fux, do STF, em 2014”, conclui Helena Chagas.
Por acaso, a desembargadora Marianna Fux, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, filha do ministro, recebeu auxílio-moradia de R$ 4,3 mil mesmo tendo dois apartamentos no Leblon, bairro nobre, que valem por baixo R$ 2 milhões.
Mais grave parece ser o caso do juiz Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Lava Jato no Rio (foi ele quem condenou a 43 anos de prisão o presidente da Eletrobrás, almirante Othon Pinheiro, principal responsável pelo programa nuclear brasileiro). Diz “El País”:
“O juiz federal foi à Justiça pedir para que ele e a mulher, também juíza federal, recebessem dois auxílio-moradia. Uma resolução do CNJ proíbe o pagamento do benefício a casais que morem sob o mesmo teto, mas o juiz ganhou sua causa. Ele se explicou no Twitter com sarcasmo: “Pois é, tenho esse ‘estranho’ hábito. Sempre que penso ter o direito a algo vou à Justiça e peço”, afirmou o juiz. “Talvez devesse ficar chorando num canto, ou pegar escondido ou à força. Mas como tenho medo de merecer algum castigo, peço na Justiça o meu direito”.
Bretas é evangélico e diz se inspirar na Bíblia ao proferir suas sentenças. É dele as penas mais altas aplicadas até agora nos processos da Lava Jato – uma que condenou o governador Sérgio Cabral a 45 anos e  outra que levou à prisão o almirante Othon Luiz Pinheiro, acusado de irregularidades na construção da usina nuclear de Angra 3.
Se o almirante cometeu irregularidades, o que dizer desse trecho da reportagem do “El País” sobre os próprios juízes brasileiros?:
“Com esses complementos, o teto constitucional de 33.763 reais, criado em 1998 e aplicado aos ministros do Supremo Tribunal Federal para limitar os salários de todos os funcionários públicos, é apenas uma formalidade. Na prática, 71,4% dos magistrados dos Tribunais de Justiça dos 26 Estados e do Distrito Federal somam rendimentos superiores acima do teto graças a auxílios e benefícios. Conforme o levantamento do diário O Globo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dos mais de 16.000 juízes e desembargadores, 11.600 ultrapassaram o teto. A remuneração média, segundo a pesquisa, chega a 42.500 reais. Benefícios, auxílios, gratificações e pagamentos retroativos chegam a representar um terço do rendimento mensal.” (…) “O colega de Bretas em Curitiba, Sergio Moro, também recebe auxílio-moradia apesar de ser proprietário de um apartamento de 256 metros quadrados na cidade, revelou a Folha nesta sexta. O jornal também destacou que 26 ministros de tribunais superiores em Brasília recebem auxílio-moradia mesmo tendo imóvel próprio na capital”.
Não passaram despercebidos ao “El País” outros benefícios recebidos pelos juízes que ficam de fora do teto remuneratório estabelecido pela Constituição da República, “sem contar os 60 dias de férias aos quais os magistrados têm direito: auxílio-moradia, auxílio-alimentação, gratificações por acúmulo de varas, auxílio-saúde, desembolsos por produtividade, por aulas em escolas da magistratura, auxílio pré-escolar e auxílio-educação para os filhos. Há também gratificação por cargos de direção, por integrarem comissão especial, por serem juízes auxiliares, licenças especiais, gratificações relacionadas ao magistério, Bolsa Pesquisa, ajuda de custo para se instalarem em outra cidade…”
Definitivamente, considerando-se a realidade salarial média no Brasil, os juízes são uma espécie de marqueses de nossa República. Como se sabe, no Império, marqueses tinham muitos privilégios de toda ordem. Um dos novos marqueses é o desembargador José Antonio de Paula Santos Neto, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Ele tem salário de R$ 30.471,11 e recebe auxílio-moradia apesar de possuir 60 imóveis em seu nome, que afirma ter recebido em herança dos pais. À “Folha de S.Paulo”, ele disse que recebe o auxílio-moradia por falta de “um salário digno, proporcional à responsabilidade do magistrado”.
Vamos agora à comparação que “El País”faz com a situação dos juízes em outros países:
Na Argentina um juiz de primeira instância com 15 anos de carreira recebe cerca de 25.800 reais brutos e 21.700 reais líquidos. Um juiz com 20 anos de carreira, num cargo comparável ao dos ministros do Tribunal Superior de Justiça, ganha aproximadamente 32.300 reais brutos. Os ministros da Corte Suprema chegam a quase 48.500 reais. Já o salário do presidente argentino, Mauricio Macri, foi de 33.600 reais brutos por mês no  ano passado ou 21.000 reais líquidos. Os salários dos governadores não superam os 16.000 reais.
“Na Argentina”, esclarece o jornal, “os juízes não têm auxílio-moradia. Por outro lado, não pagam o equivalente ao Imposto de Renda no Brasil. É o próprio Poder Judiciário que decide seus salários, sem que o Governo possa intervir. Os magistrados têm um mês e meio de férias — um mês inteiro em janeiro e 15 dias em julho –, enquanto a maioria dos trabalhadores comuns começa com 15 dias de férias e somam mais sete dias a cada cinco anos trabalhados na empresa”.
Na Itália, o salário médio de um magistrado com ao menos 15 anos de carreira chega a R$ 41.116 por mês. São os mais bem remunerados do serviço público italiano. É o Conselho Superior da Magistratura que determina os salários dos juízes, sem a intervenção do Governo. Nos últimos anos, a parte fixa do salário se manteve congelada e inclusive vem sofrendo cortes, o que não tem impedido que o montante médio anual venha aumentando graças à parte variável. A média salarial dos magistrados passou de 120 mil euros em 2007 para 142 mil em 2014. “O dado escancara, como no Brasil, o peso da parte variável”, diz “El País”. Desde 2015, as férias dos magistrados foram reduzidas de 45 dias por ano para 30 dias.
Na França, os salários dos juízes estão regulados como servidores públicos e não existe nenhum grande debate em torno de seus privilégios. Os juízes que mais recebem, que são poucos, têm um salário base de cerca de R$ 27.500. O primeiro presidente da Corte de Cassação (uma espécie de STF) ganha R$ 34.600, já incluídos todos os benefícios que lhe correspondem como juiz de máxima categoria. O salário médio de um juiz, no entanto, beira os R$ 17 mil. Alguns médicos e professores universitários ganham mais que um juiz no serviço público. Os magistrados franceses contam com alguns complementos que dependem do lugar onde residam. Para os destinados em Paris, por exemplo, que é uma cidade cara, há um complemento de apenas 3% do salário.
Na Alemanha, para garantir sua independência, os juízes não são funcionários públicos, mas têm direito ao sistema de pensões que ampara os funcionários. Um servidor público recebe quando se aposenta aproximadamente 70% do último salário. O salário dos juízes na Alemanha está regulado por uma escala autorizada pelos governos regionais, enquanto a remuneração dos juízes federais é fixada pelo Governo federal. O rendimento mínimo de um juiz alemão é de cerca 3.700 euros brutos (14.600 reais) e pode quase dobrar, na escala mais alta. O salário médio alemão é de 1.500 euros.
Os juízes federais recebem cerca de R$ 47.365 brutos por mês, enquanto os juízes do Tribunal Constitucional superam os R$ 55.200. O Presidente do Tribunal Constitucional recebe o mesmo salário que um ministro federal, pouco mais de R$ 59.000 por mês. “A modo de comparação, a chanceler Angela Merkel, a chefe de governo que melhor ganha da Europa, recebe cerca de 71.000 reais mensais”, diz o jornal espanhol. “Os magistrados do Tribunal Constitucional também têm direito a viajar de graça na primeira classe da rede ferroviária da Deutsche Bahn, mas as viagens privadas devem ser declaradas à Fazenda”, conclui.
(fonte: https://kikacastro.com.br/2018/02/05/juizes-casta-especial/)