Antônio
de Paiva Moura
No início da década de 1980 o
sociólogo americano Christopher Lasch (1985) explicita a cultura do narcisismo
que veio em oposição ao modo tradicional de viver. Leva ao extremo de uma
guerra de todos contra todos. A busca da felicidade se constitui em um beco sem
saída O incentivo ao prazer contínuo, sem intervalos, e cada vez mais intenso,
acabou aumentando a ansiedade e a insatisfação. Daí o ódio e a intolerância ao
outro. Aboliu o passado e não crê ou não almeja o futuro. A personalidade
narcisista tem horror à velhice e à morte e nutre uma grande paixão pela
frivolidade; cultiva a hipocondria e usa a religião como terapia; renega a
política, mas sua esperança está na reforma da vida política; permanente busca
do prazer através de drogas, pansexualismo, alimentos e os desvios de
acomodação diante dos problemas sociais. Ambicioso pelo ter, pela possibilidade
de consumir e para impressionar, o indivíduo caracterizado pelo narcisismo,
torna-se desdenhoso daqueles que também almejam impressionar. A luta por status
e a ambição de vencer em altos postos, se faz com a impetuosidade e com a falta
de escrúpulos.
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ilustração de Luis Condo |
Segundo Bergamo (1998) a moda não é
somente a renovação das roupas, mas também a renovação dos traços distintivos
entre os indivíduos; das relações estabelecidas, dos juízos de valor e da visão
que temos de nós mesmos.
A moda funciona como um instrumento
de distinção de classes sociais. Desta forma, nas sociedades tribais não existe
moda. Nas vilas e povoados rurais onde prevalece certa isonomia na
estratificação social, também não há moda. Ai, as pessoas se vestem com a costura
que esteve em moda há muito tempo. Nos grandes centros uranos as classes
inferiores se esforçam para imitar a moda apresentada pelas elites. Quando as
classes subalternas absorvem o modo de vestir das elites, estas o abandonam e
buscam a renovação do guarda-roupa. Além disso, renova as jóias, calçados e
objetos de uso e cosméticos. O objetivo da moda é conferir distinção. O
filme “Eles não usam Black-tie”, distingue a elite do poder político e
econômico do operariado urbano, na forma de viver e na forma de trajar-se.
Segundo a primeira premissas da
teoria do valor marginal, o preço dos bens de uso e de consumo varia não só de
acordo com a procura, mas também de acordo com a satisfação que proporciona.
Desta forma, quanto mais supérfluo, maior é o valor do objeto. Por isso, um
anel de brilhante é mil vezes mais valioso que um quilo pão. Conforme Heloisa
Negrão (2018), os brasileiros são os melhores clientes da firma francesa
América Sisley, fabricante de cosméticos de luxo. Em setembro ela lançou no
Brasil o xampu “Hair Rituel” o qual um frasco de 220 ml custa nada menos que R$
330,00.
O esforço por diferenciação de
classe inclui também a estética corporal. As forças políticas, há tempos,
disputam os valores associados ao exercício físico. A ascensão das academias de
luxo sugere uma retomada do entusiasmo pelo corpo. As performances e boa saúde
justificam o status social. No início da década de 1980, nos EUA, na Europa e
nas grandes cidades brasileiras, o movimento aeróbico inaugurou a
mercantilização da boa forma. As praticas de exercícios físicos transferiram-se
para as academias privadas e levaram com elas o comércio de roupa, calçado e
acessórios da moda.
Segundo Gisele Flora (2009), na
Alemanha nazista o discurso estético-corporal tinha a função de exaltar o
indivíduo que se adequava aos modelos arianos e menosprezava os que não se
enquadravam. Esse fato pode ser
observado ainda hoje em nossa sociedade, pois a estética corporal serve como
divisor social, na medida em que exclui os que não estão de acordo com os
modelos difundidos pelos meios de comunicação de massa. Portanto, o corpo
constitui uma conduta resultante de coerções sociais. Basta lembrar as
situações de desprezo e desprestígio experimentadas pelos obesos e pelas
pessoas consideradas feias em nossa sociedade. Essa discriminação se estende em
todo o âmbito social, seja para encontrar um emprego, um namorado, ou nos
comentários maldosos feitos por outros indivíduos nas ruas e na própria mídia,
que ajuda a reforçar os estereótipos de “imperfeição”. Lembrar que Clodovil e Ronaldo
Ésper debochavam sarcasticamente de pessoas obesas ou vestidas fora da moda,
quando se apresentavam na televisão ou em eventos de luxo.
Andando por Belo Horizonte pode-se,
pelo tratamento da pele, penteado, vestimenta e forma física, identificar os
indivíduos de baixa renda; os de classe média e os de classes altas. Entre os
garis varredores de rua, embora exerçam trabalhos braçais, muitos são obesos. Em
um supermercado, os uniformes diferenciados de acordo com as funções dos
trabalhadores, não conseguem tamponar as diferenciações de status.
Referências
BERGRAMO,
Alexandre. O campo da moda. Revista
de Antropologia. São Paulo, n.41, 1998.
FLOR,
Gisele. Corpo, mídia e status social. Revista
de Estudos da Comunicação, Curitiba, n. 23, 2009.
LASCH, Christopher. A cultura do narcisismo: a
cultura americana numa era de esperanças em declínio. Rio
de Janeiro: Imago, 1985.
NEGRÃO, Heloisa. Marca de luxo francês lança xampu de R$ 330,00. Folha de São Paulo,
São Paulo, 2 de setembro de 2018.
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