Texto escrito por José de Souza Castro:
Doze dias depois do “Financial Times”, a “Folha de S. Paulo” publicou neste sábado artigo de Hugo Greenhalgh sobre o livro “Taxing the Rich” (Tributando os ricos), de Kenneth Scheve e David Stasavage, que mostra que a política fiscal, ao longo dos séculos, sempre beneficiou os ricos. Posso acrescentar que, no Brasil, a situação não mudou muito desde a revolução francesa, há mais de dois séculos, tantas as formas como os ricos aqui conseguem sonegar.
A sonegação assume formas diversas. Uma delas é a criação de incentivos fiscais a empresas selecionadas. Muitas vezes, por autoridades que delas recebem propinas.
Na última sexta-feira, o governador Fernando Pimentel, do PT mineiro, foi denunciado ao Superior Tribunal de Justiça pela vice-procuradora geral da República, Ela Wiecko, acusado de solicitar e receber vantagens indevidas para gerar benefício tributário de mais de R$ 600 milhões para a empresa Caoa Montadora de Veículos quando ele era ministro do Desenvolvimento. O leitor da “Folha de S.Paulo” pode ler na página A13 da editoria Poder.
Há outros denunciados em consequência da Operação Acrônimo da Polícia Federal, entre eles Mauro Borges Lemos, que sucedeu Pimentel no ministério, é presidente da Cemig, nomeado pelo governador, desde 23 de janeiro de 2015. Lemos que ele “teve bens como computadores, celulares e tablets apreendidos pela Polícia Federal em outubro e chegou a prestar depoimento, na condição de investigado”, conforme escreveu no dia 4 de janeiro Vera Magalhães, da Radar on-line da Veja, ao anunciar que ele havia pedido demissão – o que foi negado no mesmo dia.
No último sábado, a “Folha de S. Paulo” publicou também que, entre os que declaram imposto de renda no Brasil, os 10% mais ricos tinham 36% dos bens declarados em 2014.
Parece que é mais um indício do elevado grau de sonegação existente entre os mais ricos. É bom lembrar que em 2014 o economista francês Thomas Piketty, autor do livro “O Capital no Século 21”, descreveu a dificuldade para obter os dados no Brasil. Nesta segunda-feira, 9 de maio, a Receita Federal deve começar a divulgar informações do Imposto de Renda, prometendo ampliar os dados disponíveis sobre a distribuição de renda no Brasil.
O retrato não ficará nítido, se não se cuidar da sonegação. Uma das formas de sonegar, acessível aos realmente ricos, é a criação de empresas offshores. Se a imprensa não cuida disso, é porque tem suas razões.
No sábado, o jornalista Fernando Rodrigues, do UOL, revelou que 14 empresários brasileiros de mídia e jornalistas são citados nos Panama Papers, por terem recorrido ao escritório panamenho Mossack Fonseca para abrir offshores. Gente fina, como se vê neste trecho:
“Estão citados uma neta de Roberto Marinho
(fundador da Globo) e diretores e ex-diretores do Grupo Globo. Aparecem
também a dona da TV Verdes Mares, Yolanda Vidal Queiroz; o apresentador
Carlos Massa, o Ratinho, dono da Rede Massa de Televisão; um sócio do
grupo Bloch, antigo dono da TV Manchete, Pedro Jack Kapeller; o
ex-senador João Tenório, dono da TV Pajuçara, em Alagoas; e o sócio das
TVs Studio Vale do Paraíba e Jaú, Antonio Droghetti Neto. Do Grupo
Estado, que publica o jornal “O Estado de S.Paulo”, Ruy Mesquita Filho e
o presidente do Conselho de Administração do Grupo Estado, Walter
Fontana Filho, tiveram seus nomes ligados a offshores. Também consta nos
papéis da Mossack Fonseca o jornalista que trabalha em revistas da
Editora Abril José Roberto Guzzo.”
Fernando Rodrigues foi um dos escolhidos no Brasil pelo Consórcio
Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) para pesquisar um
acervo de cerca de 11,5 milhões de arquivos do escritório de advocacia
panamenho Mossack Fonseca obtidos pelo jornal alemão “Süddeutsche
Zeitung” e compartilhado com o ICIJ.A neta de Roberto Marinho é Paula Marinho, filha do atual presidente das Organizações Globo, Roberto Irineu Marinho. Um dos diretores citados é nada menos que o diretor-geral da Rede Globo, Carlos Schroder. A ex-diretora geral Marluce Dias da Silva, que ocupou o cargo de janeiro de 1999 a setembro de 2002, também comparece, bem como Rossana Berto, diretora da Globo Comunicação e Participação S.A., razão social do Grupo Globo.
Ninguém deve estranhar, se o assunto não entrar na pauta dos repórteres investigativos das empresas fundadas por Roberto Marinho, que teria declarado, há tempos, que elas valem mais pelo que deixam de publicar do que pelo que publicam.
(fonte: blog da Kika Castro)
Nenhum comentário:
Postar um comentário