Texto escrito por José de Souza Castro:
Só
assisto ao “Bom Dia Brasil” da TV Globo enquanto tomo o café da manhã.
Nesta terça-feira, surpresa!, a Miriam Leitão saiu-se com uma crítica
aos altos juros cobrados pelos bancos, algo impensável quando Roberto
Marinho era o dono do Banco Roma nos maus dias da ditadura. E bem depois
disso, é verdade. Não sei se me senti bem ou mal acompanhado. Durante
anos, desde os tempo em que dirigi o jornalismo da Rádio Alvorada em
Belo Horizonte, sentia-me isolado ao criticar bancos.
Naquele
tempo, cheguei a ser proibido de dar notícias ou fazer comentários
sobre bancos brasileiros. Afinal, o dono da rádio era o proprietário do
Banco Bandeirantes. Se Gilberto Faria houvesse me escutado, talvez seu
banco não precisasse ter sido vendido quase às vésperas da bancarrota
(ainda existe essa palavra que aprendi na adolescência lendo “O Homem da
Máscara de Ferro” de Alexandre Dumas?). Hoje banco em dificuldade não
vai à bancarrota, pois recebe uma mãozinha do governo e é comprado por
outro banco na bacia das almas. O Bandeirantes, comprado por um banco
português em 1998, acabou no ano 2000 caindo nas mãos do Unibanco e, em
seguida, do Itaú.
Só
não tive impedimentos aqui, no blog, e no “Hoje em Dia”, quando eu
escrevia os editoriais do então jornal do bispo Edir Macedo que, tenho
certeza, não precisava pagar juros a bancos, dono de uma igreja talvez
mais rendosa do que muitos deles.
Eu
me pergunto: o que terá levado Miriam Leitão a cair na real? Será que
clientes de sua carteira de bem remuneradas palestras já não aguentam
mais os juros? Mas, e os bancos que, se não me engano, também contratam
seus serviços? Com extrema boa vontade, diria que se deve à real
preocupação dela com o estado atual da economia brasileira, que se
encontra num caos, como bem descreveu, domingo passado, em editorial, o
novo “Jornal do Brasil”, que pode ser lido aqui e que chegou a propor a estatização do sistema bancário, “Porque somente sem eles nossa economia poderá voltar a crescer”.
Trabalhei
no JB por 16 anos e, por um tempo bem mais curto, a Miriam Leitão foi
sua editora de economia e o Paulo Henrique Amorim, o chefe da redação.
Agora, diz o novo "Jornal do Brasil", a taxa Selic caiu para 6,5%, a
mais baixa de toda a história, mas o “oligopólio que forma o sistema
bancário brasileiro, composto por quatro famílias que administram 60% da
base monetária, não se sensibiliza diante do caos instalado na
economia, cujo principal motivo são as taxas de juros que cobram, não só
de quem cria riquezas e gera empregos, mas também de 62 milhões de
trabalhadores que se encontram inadimplentes junto aos bancos e
financeiras”.
Os
bancos fazem isso sob o “olhar complacente da Justiça, pois, na maioria
das ações contra as empresas e trabalhadores, dá-se ganho de causa aos
bancos, jogando o devedor no precipício da desesperança, diante dessa
injustiça ‘legalizada’", diz o JB, acrescentando que ocorre o mesmo
quando os bancos são perdoados de dívidas, “como foi o caso do Itaú, que
teve perdoada, no CARF, dívida fiscal de R$ 25 bilhões.”
O
jornal aponta os quatro bancos privados que fazem o oligopólio do
sistema financeiro no Brasil: Itaú, Santander, Bradesco e Safra. Os três
últimos também estão sendo processados por suposta compra de votos no
CARF para anular multas bilionárias.
O
JB mencionou ainda que “a causa do endividamento público nos últimos 20
anos deveu-se, sobretudo, às taxas de juros que o Estado brasileiro
pagou aos bancos e, na última linha, aos rentistas que, sem nada
produzir, vivem do suor alheio”.
Renascido
em papel, o jornal carioca demonstra aqui a velha têmpera do JB no qual
trabalhei. Por exemplo, não vê justificativa “para que as quatro
famílias continuem cobrando, das empresas e dos trabalhadores deste
país, juros acima do que cobra qualquer agiota que atua na
clandestinidade. E ainda gozam do privilégio de não pagar imposto sobre
os generosos dividendos. Não é possível – e já provamos neste jornal –
que à revelia de qualquer fundamento macroeconômico e/ou político, as
taxas praticadas possam continuar sendo de 400% ao ano!”
Pois
é, eu dizia algo assim, sem a mesma contundência, nos artigos que tenho
escrito. Em 10 editoriais do “Hoje em Dia”, em 2014, tratei do problema
trazido à economia pelos bancos. Naquele ano, Dilma Rousseff disputaria
a reeleição e não conseguira segurar a Taxa Selic. Ela começou com
7,25% em janeiro de 2013 e chegou a 10% ao fim desse ano. No dia 31 de
janeiro, escrevi: “Se a política econômica do governo tem sido boa para
os trabalhadores, que vêm obtendo salários melhores e enfrentando menos
dificuldade para pagar suas dívidas, ela tem sido ótima para os bancos,
que lucram com maiores taxas de juros e inadimplência menor”.
Não
vale a pena transcrever outros trechos, pois, como eu previa, já que
não sou de todo tapado, os editoriais não mudaram em nada a política
econômica. Até mesmo porque, como observa o JB, os presidentes do Banco
Central “são sempre funcionários dos bancos que formam o oligopólio”. Um
escárnio.
Tão grande a aberração, que até a "Folha de S.Paulo" descobriu, em reportagem de Mariana Carneiro,
na última segunda-feira, que “um ano e quatro meses depois do início
do corte dos juros pelo governo, a taxa cobrada pelos bancos no cheque
especial praticamente não saiu do lugar”.
Só
lembrando que a formação do oligopólio começou na década de 1990, no
governo Fernando Henrique Cardoso, o feliz comprador do apartamento de
450 m² no rico bairro paulistano de Higienópolis, logo depois de deixar a
presidência da República. O apartamento pertencia a Edmundo Safdié,
dono do Banco Cidade, vendido no último ano de seu governo (2002) ao
Bradesco.
Bradesco,
Itaú e o espanhol Santander foram grandes beneficiários do programa de
privatização dos bancos estaduais levada a efeito pelo governo FHC.
Foram parar nas mãos do Itaú: Banerj, Bemge, BEG e Banestado. Com o
lucro do primeiro ano de funcionamento do Bemge privatizado, o Itaú
recuperou os R$ 583 milhões que pagara ao governo de Minas, governado
por Eduardo Azeredo, do PSDB. Que, não por isso, foi condenado em
segunda e terceira instância, mas continua em casa.
Foi
depois de Azeredo que seu amigo Aécio Neves se tornou presidente
nacional do PSDB. E que ontem se tornou réu, por decisão do Supremo
Tribunal Federal. Quando e se será condenado, Deus sabe.
(fonte: https://kikacastro.com.br/2018/04/18/juros-bancos/)
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