Mais um artigo publicado hoje no blog DoLaDoDeLá, que traz novas dúvidas sobre o comportamento da Globo com relação aos tucanos
Posted: 09 Aug 2013 04:35 AM PDT
Ou
alguém falou para eles que o "fim do mundo" é o pior dos mundos para
todo mundo? Faltam peças neste quebra-cabeças, com certeza.
A
notícia dentro da notícia. O Jornal Nacional da última quinta-feira
levar ao ar uma reportagem com quase oito minutos de duração tratando de
escândalos envolvendo o PSDB de São Paulo foi mais importante do que o
conteúdo da matéria, do qual quem se interessa por política já soubera
pelos jornais impressos, pelo rádio e pela internet durante o dia.
Abaixo,
a matéria lida por Willian Bonner e Patrícia Poeta durante longos
minutos, possivelmente um recorde de veiculação de notícia incômoda para
o PSDB desde que o partido chegou ao poder federal, em 1995. É longa,
mas quem não assistiu deveria ao menos lê-la, pois é surpreendente tanto
pela duração quanto pelo conteúdo.
Prossigo depois do texto reproduzido a seguir.
—–
Jornal Nacional
Edição de 8 de agosto de 2013
Empresa francesa é suspeita de pagar propina a servidores de governos do PSDB
Uma empresa francesa é suspeita de pagar propina para servidores do Governo de São Paulo em troca de benefícios em contratos.
O caso foi em 1998. Foram indiciadas 11 pessoas, inclusive secretários de estado na época.
O
pagamento de propina teria ocorrido para viabilizar um contrato entre
empresa francesa Alstom e a então estatal de energia do estado de São
Paulo, a EPTE.
De
acordo com o inquérito da Polícia Federal, a companhia de energia
obteve um crédito no exterior, junto ao banco francês Societe Generale,
de R$ 72,7 milhões para adquirir equipamentos do grupo Alstom.
A
Polícia Federal ressalta que a contratação do crédito milionário foi
feita sem licitação. E só foi possível porque a Alstom idealizou um
esquema de pagamento de suborno para funcionários públicos paulistas
para recompensá-los pela aprovação do contrato.
De
acordo com o documento da Polícia Federal, o esquema de pagamento usava
pessoas com empresas no exterior que recebiam recursos do grupo Alstom
“para depois repassá-los aos beneficiários finais, servidores públicos
do governo do estado de São Paulo, no primeiro semestre de 1998″.
Nessa
época, o estado era governado por Mário Covas do PSDB. Uma das contas,
segundo o inquérito, era de Jorge Fagali Neto. A Polícia Federal diz que
naquela época, embora fosse diretor financeiro dos Correios, há
evidencias de que ele tinha livre trânsito por todas as secretarias de
Estado.
A
Polícia Federal afirma ainda que Jorge Fagali Neto integrou na
distribuição de valores para agentes públicos paulistas que ele mantinha
conta não declarada no exterior e que ocultou a origem de valores
recebidos em virtude de pagamento de propinas, também no exterior. Por
isso, ele foi um dos indiciados.
Outra empresa no exterior utilizada para lavar o dinheiro da propina foi a MCA Uruguay.
De
acordo com reportagem publicada nesta quinta-feira (8) pelo jornal O
Estado de São Paulo, “o dono da MCA, Romeu Pinto Junior, confessou a PF
ter servido de intermediário do pagamento de propinas a funcionários
públicos paulistas a mando da Alstom e por meio da MCA”.
A
Polícia Federal afirma que Andrea Matarazzo, na qualidade de secretário
de energia e presidente do conselho administrativo da EPTE tinha o
pleno conhecimento de tudo.
A
investigação cita o depoimento do então presidente da EPTE, Henrique
Fingermann. Henrique declarou que o secretário Andrea Matarazzo tinha
conhecimento de todos os procedimentos que levaram á assinatura do
contrato de crédito com o banco Societe Generale.
A
Polícia Federal afirma que há indícios de que Matarazzo tenha se
beneficiado juntamente com o partido político, o PSDB, das vantagens
indevidas arquitetadas pelo grupo Alstom.
E
usa isso como argumento para indiciá-lo por corrupção passiva. A
Polícia Federal indiciou os dois ex-secretários e mais onze pessoas em
agosto do ano passado.
O
inquérito foi encaminhado para o Ministério Público Federal, mas a
denúncia ficou parada porque o MP considerou que era necessário obter
mais informações sobre o caso.
O
advogado que representa a estatal EPTE afirma que não conseguiu ter
acesso ao inquérito da Polícia Federal e que o crime prescreveu.
“A
prescrição conforme o Artid, já ocorreu e portanto caberia um pedido de
habeas corpus em favor dos meus clientes”, afirmou o advogado Pedro
Iokoi.
O Ministério Publico Federal considera que o crime de lavagem de dinheiro ainda não prescreveu.
O
ex-secretário de energia de São Paulo, Andréa Matarazzo, qualificou
como um disparate ter seu nome ligado a supostos favorecimentos. E disse
que no período em que foi secretário não teve conhecimento, não
discutiu nem assinou qualquer aditivo ou contrato que esteja sendo
investigado. Ele afirmou ainda que as atas das reuniões podem comprovar o
fato. Andrea Matarazzo acrescentou que é com muita indignação e repulsa
que vê seu nome envolvido nas denúncias.
Segundo
o ex-diretor dos Correios, Jorge Fagali Neto, o Ministério Público
nunca atribuiu a ele qualquer ato de violação à lei penal e que não
interferiu em nenhuma das empresas citadas, nem celebrou contratos com a
Alston ou a Siemens.
A empresa MCA Uruguay e o então presidente da EPTE, Henrique Fingermann, não foram localizados.
Em
nota, o PSDB declarou que repudia veementemente a tentativa de alguns
setores de envolver, sem provas, o partido e seus quadros em casos de
corrupção. O PSDB disse ainda que não compactua com a corrupção e espera
que os casos sejam investigados e, se houver, responsáveis que eles
sejam punidos.
José Serra é citado em mensagens de diretores de empresa investigada por cartel
O
jornal “Folha de São Paulo” publicou nesta quinta-feira (8) uma
reportagem, em que afirma que o ex-governador de São Paulo, José Serra,
do PSDB, foi citado em uma troca de e-mails entre executivos da Siemens –
uma das empresas investigadas por suposta prática de formação de
cartel. Segundo o jornal, uma mensagem sugere que, para evitar atrasos,
Serra teria se mostrado favorável a um acordo entre concorrentes, em uma
licitação para a venda de trens ao estado. O ex-governador nega ter
cometido irregularidade – e afirma que a empresa Siemens não recebeu
qualquer vantagem.
Em
reportagem publicada nesta quinta (8), o jornal Folha de S.Paulo
reproduz um email enviado em 28 de março de 2008 por Nelson Marchetti,
funcionário da Siemens, para outros colegas da empresa, entre eles o
então presidente da Siemens no Brasil Adilson Primo.
A
mensagem do executivo da Siemens relata uma conversa que ele diz ter
tido com o então governador de São Paulo, José Serra, e o secretário de
Transportes Metropolitanos, José Luiz Portella, durante um congresso, em
Amsterdã, na Holanda.
O
Jornal Nacional também teve acesso ao mesmo e-mail, que diz: “Gostaria
de confirmar que conversei com o senhor Serra (governador do estado de
São Paulo) e com o senhor Portella (secretário de Tranportes
Metropolitanos de São Paulo), em Amsterdã, na semana passada, quando o
senhor Serra confirmou que se a proposta da CAF não tiver condições de
ser qualificada a concorrência será cancelada”.
Segundo
a Folha de São Paulo, na época, a Siemens disputava com a espanhola CAF
uma licitação aberta pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
para compra de trens, e ameaçava questionar na Justiça o resultado da
concorrência se não saísse vitoriosa.
Na
mensagem, o executivo relata o motivo para um eventual cancelamento da
concorrência. “A razão básica para este posicionamento é a diferença de
preço entre a CAF e o nosso. Estamos pelo menos 15 % acima do preço
líquido da CAF. Poderia ser um risco para o governo do Sr. Serra”.
A
“Folha de São Paulo” diz que o ex-governador Serra sugeriu a Siemens um
acordo para evitar que uma disputa empresarial travasse a licitação da
CPTM. No email do executivo da Siemens, a proposta seria detalhada.
“Eles mencionaram que considerariam o fornecimento de algo em torno de
30% dos trens, por parte da Siemens. A “Folha de São Paulo” sugere que
“eles” seriam Serra e o ex-secretário Portella.
O
ex-governador José Serra divulgou uma nota dizendo que resultado da
licitação quebrou a hegemonia de algumas empresas no mercado. Serra
afirmou que a Siemens não foi subcontratada pela CAF, a empresa
vencedora da concorrência. Ou seja, segundo Serra, a Siemens não obteve
nenhuma recompensa. Ele afirmou que chegou a dizer publicamente que se a
concorrência fosse anulada não contrataria a que estava em segundo
lugar, pois a diferença de preços era grande. E que faria nova
concorrência. José Serra disse ainda que o estado de São Paulo atuou
contra a Siemens na Justiça, para garantir a licitação vencida pela
empresa espanhola. A nota também é assinada pelo ex-secretário José Luiz
Portella.
A
empresa Siemens voltou a declarar que tem cooperado com as autoridades,
mas que não pode se manifestar sobre investigações em andamento no
Conselho Administrativo de Defesa Econômica.
—–
Ufa!
Tudo bem que não foi uma reportagem como aquela de cerca de vinte
minutos que uma única edição do mesmo Jornal Nacional apresentou contra o
PT durante o julgamento do mensalão após meses de longas matérias como
essa acima – ou maiores – sendo apresentadas todos os dias, de segunda a
sábado. Mas pode-se dizer que, à diferença do de costume, todos os
elementos que vão se avolumando contra os tucanos de São Paulo foram
apresentados corretamente. Ou quase…
É
claro que o que pesa contra Serra não é ele ter interferido numa
concorrência em favor de um dos concorrentes a fim de “evitar atrasos”. O
que parece é que ele interferiu no processo instruindo concorrentes a
“se acertarem”, chegando a avisar a um deles de que seu preço estava 15%
mais alto que o do outro e isso é uma ilegalidade que macula o próprio
princípio da concorrência, que deveria justamente evitar acertos como
esse em busca dos menores preços para o erário público.
Todavia,
como ainda não há provas de que isso ocorreu, vá lá que o Jornal
Nacional divulgue a explicação de Serra sem deixar muito claro que essa é
só a versão dele, diferente do que as investigações sugerem.
Enfim,
a matéria não foi má. Até se pode admitir a cautela usada em nome da
presunção da inocência a que qualquer um – inclusive os políticos – tem
direito.
Porém,
algo ficou de fora. Parte desses fatos são conhecidos há muito tempo. O
escândalo da Alstom ganhou as manchetes do mundo inteiro em 2008 e até a
última quinta-feira jamais tinha aparecido na Globo dessa maneira.
Aliás, mesmo nos grandes jornais da época não ganhou tanto destaque
quanto tem recebido em toda a grande mídia nos últimos dias.
Dizer
que um fenômeno dessa magnitude ocorreu devido à gravidade do caso não
chega a ser apropriado, apesar de ser parte da verdade. Há outras
causas.
Um
escândalo dentro do escândalo é 45 inquéritos referentes às denúncias
contra o PSDB paulista terem sido arquivados pelo aparelhado Ministério
Público de São Paulo, que teve que desarquivá-los por pressão
internacional, pois as multinacionais europeias corromperam políticos em
outros países além dos que corromperam no Brasil e as notícias só
estavam sepultadas aqui, no único dos países envolvidos no caso Alstom
em que ninguém foi punido.
Paralelamente
aos tucanos, portanto, a grande imprensa brasileira e o MP-SP têm
responsabilidade pela impunidade de políticos que não estão sendo
acusados de comprar votos no Congresso para aprovar projetos como os
petistas envolvidos no mensalão, mas de roubar em benefício próprio,
para enriquecerem.
Fiquemos, porém, no caso da imprensa – por enquanto.
A
eterna blindagem de corruptos amigos pela Globo e companhia limitada
vem despertando uma irritação crescente na sociedade que vem se voltando
contra a grande imprensa em geral e que tem, inclusive, desencadeado
violência, com depredação de unidades móveis de vários veículos e
expulsão de repórteres da Globo das manifestações, além de depredação de
imóveis da emissora.
Dessa
maneira, a recente “imparcialidade” que a emissora abraçou pode derivar
de medo de ter ultrapassado os limites após constatar a progressiva
degradação de sua imagem, até por conta das denúncias de ter cometido
crimes contra a ordem tributária que podem colocá-la, cedo ou tarde, no
lugar em que o PSDB está hoje.
Recentemente, escrevi que a Ocultação dos escândalos Globo e PSDB-Siemens foi longe demais.
Como se vê, a conversão global ao bom jornalismo das matérias acima –
que talvez não seja tão bom, mas que é bem melhor do que a artilharia
histérica que a emissora dispara todo dia contra o PT desde 1989 –, está longe de ser produto de mera crise de consciência.
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