Texto escrito por José de Souza Castro:
O dia 4 de agosto não deve ser esquecido. Foi o dia em que a Comissão Especial do Impeachment aprovou o relatório do senador Antonio Anastasia, do PSDB mineiro, para afastar Dilma Rousseff da Presidência da República, passados 648 dias de sua reeleição por 54,5 milhões de votos.
É um golpe contra a democracia desferido por 14 senadores, entre eles, três mulheres: Ana Amélia (PP-RS), Simone Tebet (PMDB-MS) e Lúcia Vânia (PSB-GO). Cinco senadores votaram contra: dois homens (Lindergh Farias, do PT fluminense, e Telmário Mota, do PDT de Rondônia) e três mulheres (Gleisi Hoffmann do PT paranaense, Kátia Abreu, do PMDB de Tocantins, e Vanessa Grazziotin, do PCdoB amazonense).
Três mulheres a favor de demitir a primeira mulher a assumir a Presidência da República no Brasil, e três contra.
Destas, quero destacar Kátia Abreu. Por pertencer ao partido de Michel Temer – o grande beneficiário desse golpe, juntamente com seu partido, o PMDB – e por ser presidente licenciada da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), uma das entidades que apoiou o golpe militar de 1964 e que tem uma triste história de reacionarismo.
O presidente em exercício da CNA, João Martins da Silva Júnior, em entrevista após o voto de Kátia Abreu,
disse que a senadora traiu a classe e que ela não reassumirá seu lugar
na Confederação. Alguma surpresa? Quem tiver estômago, que ouça a
entrevista do usurpador. Ele era o primeiro vice-presidente da CNA desde
2012 e não quer largar o osso, a exemplo de Michel Temer.
É mais gratificante para os ouvidos democráticos ouvir o que disse Kátia Abreu, ao votar:
Interessantes estes destaques selecionados pelo "Diário do Centro do Mundo":
"Se Temer achava que o governo estava muito ruim, podia ter recusado ser vice novamente. Mas não, ele continuou na chapa e foi eleito, até com a ajuda do meu voto.""O presidente Temer, que é meu presidente também, lutou como um louco para ser vice de novo. Quem é aqui que pode falar de corrupção, de ética? Faça-me o favor!""Mensalão e Petrolão não são de um partido só. O sistema político está podre e a presidente é uma mulher honesta, digna. Já nos partidos políticos, é difícil salvar um."
Kátia
Abreu foi a primeira mulher eleita para presidir a CNA. Isso aconteceu
no final de 2008. Eram 27 eleitores – os presidentes das federações
estaduais de agricultura – e ela teve o voto de 26. Já era senadora e
primeira a presidir a bancada ruralista no Senado.
Tinha sido também a primeira a ser eleita para um sindicato rural e a
primeira para uma federação da agricultura no Brasil. Foi reeleita daí a
três anos e, em 2014, por mais três.
Mulher
de valor, na opinião de seus pares (pelo menos, até ela passar a
defender Dilma na Comissão do Impeachment). Em 2008, Kátia foi agraciada
com a Grande Medalha da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado
de Minas Gerais (Faemg), entidade que completou 60 anos
em 2011, ano em que já havia oito mulheres presidindo sindicatos rurais
no Estado. Entre elas, Denise Cássia Garcia, de Campo Belo, que em 2008 fora a primeira mulher eleita (como segunda suplente) para a diretoria da Faemg.
Quando escrevia o livro sobre os 60 anos da Faemg, entrevistei Gilman Viana,
que havia presidido a federação, e ele justificou a quase completa
ausência de mulheres na entidade: "O espaço da mulher no Brasil não
começou pelo meio rural, começou pelo urbano e depois pelo meio
político. A velocidade da feminilização da liderança rural é mais baixa
do que a ocorrida no meio urbano, não só porque a cidade concentra
maior quantidade de mulheres, como ainda há uma cultura remanescente de
que quem dirige a fazenda é o homem, não a mulher."
Tudo
bem. Mas no Brasil há mais mulheres do que homens, e as primeiras a
assumirem a presidência da República e da CNA estão sendo afastadas pela
minoria masculina...
(fonte: blog da Kika Castro)
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