Por Jaime Pinsky: Historiador, professor titular da Unicamp, coordenador do livro Brasil: o futuro que queremos, diretor editorial da Editora Contexto.
Não
tenho prazer em reconhecer, mas me conformei com a ideia de que nós,
brasileiros, somos maníaco-depressivos: passamos com facilidade da
alegria máxima, da euforia até, para a tristeza, o desânimo total.
Estabilidade, moderação e equilíbrio soam para nós como defeitos de
caráter, não como virtudes oriundas de uma percepção madura de mundo.
Esse bipolarismo nacional pode ser até medido em pesquisas sobre
otimismo e pessimismo, satisfação e insatisfação com relação a
diferentes assuntos.
Agora
mesmo, nesse período pós Copa do Mundo da Rússia, enquanto alguns
apenas revelam sintomas compreensíveis de Síndrome de abstinência (é
duro trocar o encanto de uma Copa pelo Campeonato Brasileiro), outros se
ocupam em ridicularizar e odiar um único jogador, Neymar. Agora ele é o
inimigo número um, o fingidor, o enganador, o cai-cai, o falso, o
blefe. Esse mesmo Neymar, que apenas um mês atrás era visto por muitos
como o melhor do mundo, o salvador da Pátria, superior e mais criativo
do que Cristiano Ronaldo e Messi juntos. Levianamente, o comparavam a
Maradona e até a Pelé... Confesso que me causa certo asco ouvir
comentaristas esportivos lembrarem só agora de seus defeitos, eles que
ainda há pouco se davam conta apenas das virtudes do jogador. Pois esses
oportunistas (e/ou bipolares) têm grande parte da responsabilidade pelo
fracasso de Neymar na Copa. Mas não só eles. Também temos nossa parcela
de culpa.
Somos
muito condescendentes para com nossos iguais. Rígidos somos para com os
diferentes. Separamos, facilmente, os bons dos maus (estes devem ser
caçados, apodrecer na cadeia, trucidados... tem gente que é a favor de
liberdade de porte de armas “para os bons”. Quem define? Sacerdotes? O
Papa? Deus, em pessoa? Quem sabe essa será mais uma atribuição do nosso
Supremo Tribunal Federal). Em compensação, passamos a mão na cabeça de
nossos filhos, mesmo quando eles cometem deslizes sociais sérios (beber e
dirigir? “É da idade”. Experimentar drogas? “Faz parte da educação
sentimental”. Abusar de alguma menina indefesa? “Todo garoto tem que
passar por isso, mas que seja com camisinha”. Atropelar alguém? “Coitado
do rapaz, experiência horrível”.). Fracassos escolares são vistos como
algo natural. Ficar até os 30 anos morando na casa dos pais e ter suas
cuecas lavadas pela mamãe nos parece perfeitamente razoável.
O
resultado é óbvio. Agora mesmo, nossos mimados jovens heróis foram
fazer o exame do Pisa, uma avaliação mundial realizada para comparar o
grau de conhecimento das disciplinas, assim como sua competência
socioemocional. Notas? Desastrosas. Em Ciências, por exemplo, os
brasileiros chegaram em 65º lugar, num total de 70 países. Mas o pior,
enquanto apenas 6% dos finlandeses e 18% dos colombianos deixaram de
responder todas as questões (ou seja, desistiram de fazê-lo, ou não
souberam distribuir adequadamente o tempo), 61% dos brasileiros
desistiram do exame antes de terminá-lo. “Estava difícil, mamãe”.
“Cansei, papai”. “Não brinco mais, técnico Tite, tem gente querendo me
pegar”. “Tudo bem, querido, seus dois cabeleireiros resolvem seu
problema”.
Estudiosos da educação usam a palavra da moda, resiliência,
para definir o que falta aos nossos jovens que nós mimamos e
estragamos. O fato é que estamos correndo rapidamente para o abismo se
não conseguimos sequer preparar adequadamente as novas gerações para o
mundo competitivo que está aí, queiramos ou não, e que se tornará cada
vez mais competitivo. Preparar os jovens para o mundo real não é
educá-los sem amor. Pelo contrário. Amá-los implica em dotá-los de
instrumentos adequados para viver a vida, para que não fujam do embate
fingindo que foram agredidos e derrubados. Os juízes do mundo real
possuem numerosas câmeras de vídeo que acabam mostrando a verdade, como
no futebol de hoje. Ao não concluírem suas provas, seis em cada dez
jovens brasileiros demonstraram não estarem preparados não apenas para
vencer, mas para competir.
Nenhuma
nação alcançou sucesso sem ter feito uma revolução educacional. Países
de diferentes regimes políticos, em diferentes épocas da História,
superaram seus limites aparentes a partir de um investimento maciço em
educação. Coreia, Japão, Israel, por exemplo, países com território
pequeno, sem grandes recursos naturais, tornaram-se polos tecnológicos
de primeira grandeza.
Até quando nos jogaremos no chão esperando que os juízes roubem a nosso favor?
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