“A presente geração testemunhará o esquartejamento definitivo da maior
floresta tropical do mundo se não houver resposta forte e rápida da
sociedade aos que, no governo e no Congresso, só se movem em função de
interesses próprios e imediatos”, afirma Márcio Santilli,
sócio-fundador do Instituto Socioambiental (ISA), ex- presidente da
Funai e ex-deputado federal (PMDB-SP), em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 12-02-2017.
Eis o artigo.
As rodovias federais promovem a integração terrestre entre a Amazônia e o centro-sul do Brasil e se estendem a países vizinhos como Bolívia, Peru, Venezuela e Guiana Francesa.
Também são fundamentais para o trânsito de pessoas e o escoamento de
produtos regionais. Todavia, 80% dos casos de desmatamento na Amazônia ocorrem na faixa de 30 km ao longo das estradas pavimentadas.
Quando o governo federal anunciou, em 2003, a pavimentação da BR-163
(Cuiabá-Santarém), desencadeou-se um movimento chamado BR-163
Sustentável, que propôs a implantação, concomitantemente à pavimentação
da estrada, de um programa regional de desenvolvimento sustentável, para
evitar a repetição dos gigantescos processos de grilagem de terras e
desflorestamento.
Daí resultou, entre outras coisas, a criação de
um mosaico de áreas de conservação federais e estaduais, que interliga
blocos de terras indígenas nas bacias dos rios Xingu e Tapajós, visando assegurar a contiguidade da floresta.
Porém,
em vez de implementar e proteger essas áreas, os últimos governos vêm
reduzindo sua extensão na região, liberando áreas que ficam à mercê de
invasões, desmatamento e grilagem.
No governo passado, criou-se o
precedente de alterar limites de áreas protegidas por meio de medidas
provisórias (MPs) para reduzir áreas de unidades de conservação que
seriam inundadas com a pretendida implantação de um sistema de hidrelétricas na bacia do Tapajós. No governo atual, outras duas MPs tornaram a alterar limites de unidades de conservação nessa região.
Como se fosse pouco, deputados e senadores do Estado do Amazonas estiveram nesta semana com Eliseu Padilha,
ministro da Casa Civil, para acertar com o governo o envio de um
projeto de lei que subtrai mais de 1 milhão de hectares da extensão de
cinco unidades de conservação criadas no final do governo passado.
Eles
querem extinguir a Área de Proteção Ambiental de Campos de Manicoré,
diminuir o Parque Nacional de Acari, a Reserva Biológica de Manicoré, as
Florestas Nacionais de Urupadi e Aripuanã, no sul do Amazonas e ao
longo das BRs 230 e 319.
Essas unidades de conservação completam
uma barreira de áreas protegidas que vêm sendo construída há vários
governos para conter a expansão das frentes predatórias de desmatamento.
Protegem uma parte do eixo da BR-319, que liga Porto Velho a Manaus e
que os políticos do Amazonas querem ver pavimentada.
O que está em jogo é muito mais do que o desmatamento e a grilagem.
Estão se abrindo fendas transversais, contínuas e expansivas ao longo
da Amazônia, de sul para norte e de leste para oeste, projetando um
cenário de esquartejamento definitivo da floresta, com graves
implicações para os fluxos genéticos e de umidade. Ilhas de floresta não
conservam animais, plantas e paisagens como ambiente contínuo.
Outra
consequência drástica é o provável impacto nos padrões de distribuição
de umidade. Correntes atmosféricas amazônicas carregam vapor d´água,
como rios voadores, provendo boa parte das chuvas que suprem as
principais regiões agrícolas e metropolitanas do Brasil e dos países do Cone Sul.
A
presente geração testemunhará o esquartejamento definitivo da maior
floresta tropical do mundo se não houver resposta forte e rápida da
sociedade aos que, no governo e no Congresso, só se movem em função de
interesses próprios e imediatos.
(fonte: http://www.ihu.unisinos.br/564801-amazonia-esquartejada)
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