“A frase de Hamlet, na peça teatral do
inglês William Shakespeare de mesmo título, “há algo podre no Reino da
Dinamarca”, pode ser mais uma vez repetida para os momentos de hoje no
Brasil: há algo de podre neste país. O mais recente escândalo da “carne
fraca”, ou seja, carne podre que pobre come, adiciona mais um capítulo à
novela de podridão e corrupções que vivemos no país. A cada momento
aparece um escândalo, os políticos de todos os partidos ficam mais
enlameados, e as condenações cada vez mais longe. Ninguém sabe onde isso
vai parar e quando vai parar. E a razão é simples: a podridão é de tal
tamanho que o país precisa de um renascimento, surgir das cinzas como
Fênix para recomeçar. É uma transição dolorosa na qual a parte mais
triste é que, mesmo com um processo como a Lava Jato, em curso há três
anos, parece que ninguém se assusta e que não mudam os hábitos, sejam
nas empresas, na administração pública ou entre políticos. Se para um
respeitado deputado que vira ministro, um simples superintendente do
Ministério da Agricultura no seu Estado é chamado de Grande Chefe, então
a escala de valores está de cabeça para baixo e quem manda mesmo e vale
alguma coisa na hierarquia do poder é o Grande chefe e não o tal do
deputado.
A operação da Carne Fraca traz muitas lições. Que
há fiscais em todos os níveis honestos, não há dúvida alguma. E que há
desonestos contra os quais os empresários não têm força para lutar ou
preferem não lutar, não há dúvida também. Não tem um empresário neste
país que não foi uma vez na vida, ou mais, ameaçado por um fiscal de
qualquer natureza. E quantos os puseram aos tapas para fora,
denunciaram, e quais entidades de classe denunciaram essas situações? E
quantos que fizeram isso não foram ameaçados, inclusive com suas
famílias, suas vidas e suas empresas destruídas?
Em
2010, o então presidente do sindicato de indústria de carnes de Minas,
Cassio Braga, denunciou essas situações. E o mesmo fez na Câmara de
Indústria de Alimentação da Fiemg, defendeu posições a favor da
indústria e contra esses desmandos que agora apareceram. Mas as
entidades empresariais deveriam se posicionar mais firmemente contra
esses e outros casos, como o do desastre de Mariana e o escândalo de
carne podre em Minas, que está na justiça de Juiz de Fora há dois anos,
sem solução.
A passividade ou acomodação vai nos custar
caro. A BRF tem como seu Presidente do Conselho Abílio Diniz, e seu
membro o ex-ministro Luiz Furlan. Nenhum dos dois veio explicar o que
aconteceu. Deixam que as pequenas malandragens prevaleçam ao invés de
assumirem perante o público e seus consumidores a responsabilidade.
Errar é humano, reconhecer erros e corrigir é a grandeza do homem. Eles a
tem? A balela do ministro da agricultura de que ele vai continuar
comendo carne brasileira é ridícula, porque o que ele e seus
antecessores, entre os quais há mineiros, não fizeram é organizar esse
setor e garantir, em primeiro lugar ao próprio brasileiro, e ao mundo,
que tudo está em ordem.
Este episódio da Carne Fraca vai custar
milhares de empregos, acabou com o mito de que o agronegócio era
maravilha, vai afetar todo o setor agrícola e sua posição no mundo. Vai
afetar nossas exportações de forma inimaginável. Perdemos a
credibilidade, como há quase 90 anos, quando acharam pedras nas sacas de
café que exportávamos. Culpar os que mostraram o cancro pelo que
aconteceu e está acontecendo ainda em muitos setores é não resolver o
problema maior: entre nós ainda os desonestos, com seus métodos de
trabalho obscuros, e de conhecimento muitas vezes de todos, prevalecem. E
estão acabando com o país, com a passividade e silenciosa conveniência
de cada um, mas em especial do próprio empresariado, que aceita esses
métodos como facilitadores de negócios. Há algo de podre além da carne.”
(fonte: https://kikacastro.com.br/2017/03/21/salej-carne-fraca/#more-13717)
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