Honra ao mérito
O projeto
'Nossos Escritores' é desenvolvido nas aulas de História do 3º ano do Ensino
Médio, Colégio Imaculada Conceição de Belo Horizonte. Em cada etapa, discussões
são feitas em sala de aula a partir do conteúdo estudado e relações são
estabelecidas com o cenário nacional e internacional. Um rico material é
oferecido aos alunos para pesquisa, e o resultado é expresso através da
produção de textos que levantam reflexões, apresentam propostas e proporcionam
aos alunos a possibilidade de se expressarem diante de temas instigantes e
relevantes. Confira abaixo a produção do aluno Lucas Abreu Moura Pereira, (1998)
que se destacou na primeira etapa de 2016, com o texto abaixo.
Política, para não ser idiota
Lucas Abreu Moura Pereira
' 'A política é uma questão séria demais para ser deixada para os políticos'' - Charles de Gaulle,
Todo processo
histórico é marcado por continuidades e mudanças, ou seja, podemos identificar
transformações e permanências de um período para outro. Desse ponto de vista, a
análise dos fatos históricos exige critérios teóricos e metodológicos, para que
se possa ter uma melhor compreensão acerca do que aconteceu. O atual retrato
político-partidário brasileiro não foge a essa perspectiva.
Ao longo do
processo histórico de formação do Estado nacional brasileiro, do século XVI ao
XXI, o nosso sistema político, isto é, o conjunto de instituições políticas por
meio das quais um Estado se organiza a fim de exercer o seu poder sobre a
sociedade, sofreu profundas mudanças até se transformar na República Federativa
Presidencialista que se constitui hoje, o que foi obtido através da Proclamação
da República, ocorrida em 15 de novembro de 1889.
É importante
salientar que a proclamação da república não representou uma ruptura no
processo histórico brasileiro, haja vista que foi uma realização essencialmente
elitista, marcada pela ausência de participação popular. O artigo de Aristides
Lobo, no Diário Popular de São Paulo, em 18 de novembro, no qual dizia: "O
povo assistiu àquilo tudo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que
significava." corroborou a frase do jornalista e escritor pré-modernista
Lima Barreto "O Brasil não tem povo, tem público." sobre o movimento
de 15 de novembro que não logrou mudanças significativas na vida do povo
brasileiro. Destarte, a Proclamação da República foi um projeto feito pelas
elites e para as elites e deu, assim, início ao atual retrato
político-partidário brasileiro, marcado principalmente pela grande autonomia
das elites em relação ao poder central devido ao amplo domínio das mesmas sobre
os Estados, o que foi garantido através de uma política federalista.
Desse modo, os
partidos políticos foram idealizados como um arranjo temporário para as
oligarquias manipularem o Estado, o que foi fundamental para a consolidação do
atual retrato político partidário do país, o qual é respaldado no jogo de
interesses dessas elites dominantes. Assim sendo, não possuíam grandes
divergências ideológicas, desejavam apenas o exercício do poder.
Até hoje, as elites
governamentais perpetuam no poder através desses partidos políticos que
recrutam candidatos e fazem campanhas para os elegerem a cargos públicos,
mobilizando as pessoas para participarem na escolha dos governantes, tendo como
objetivo ligá-las a seu governo. Segundo o ex-ministro do Supremo Tribunal de
Justiça, Joaquim Barbosa, o que temos hoje são "partidos de
mentirinha", uma vez que não possuem grande divergências ideológicas,
querem o poder pelo poder. Daí aplica-se a velha frase utilizada durante o
Segundo Reinado, quando liberais e conservadores se alternavam no poder: ?não
há nada mais conservador do que um liberal no poder, não há nada mais liberal
do que um conservador na oposição?.
É comum ouvirmos as
pessoas dizerem que o que vivemos hoje no Brasil é uma democracia. Entretanto,
uma democracia pressupõe não apenas o sufrágio universal, mas também uma
igualdade jurídica e social, o que nitidamente não existe em nosso país hoje.
Além disso, a existência de um grande número desses "partidos de
mentirinha" faz com que as condições necessárias para o exercício da
verdadeira democracia se tornem cada vez mais difícil, tendo em vista que não
existe nenhuma base de sustentação popular dentro deles, o que permitiu que, ao
transcorrer do tempo, a política - antes conhecida como a arte de servir ao
povo - se transformasse na arte de se servir do povo.
O melhor exemplo
dessa transformação é a corrupção, a qual pode ser comparada a um parasita que
tem no povo o seu hospedeiro. Todos os dias somos bombardeados com inúmeros
escândalos de todas as espécies pela mídia; como uma ligação indecente entre
homens públicos e grandes empresas do setor privado, para dilapidar o
patrimônio público trocando privilégios políticos por enriquecimento ilícito.
Isso não só contribui para aprofundar o descrédito da população na classe
política, como também mostra que a corrupção é um problema das democracias,
pois revela a fragilidade de um sistema em que o soberano, a população, é
colocado facilmente no lugar de subalterno. Daí a importância do povo na hora
de eleger seus representantes, pois como disse uma vez Abraham Lincoln "O
voto é mais forte que a bala."
Logo, a política de
desvalorização do voto, iniciada durante a República Velha no Brasil e que
perdura até hoje através de práticas semelhantes ao coronelismo e ao voto de
cabresto - as quais tem por objetivo controlar as eleições distribuindo favores
à população em troca de votos - mostram-se como um empecilho ao exercício da
cidadania no Brasil, o que é passado de geração em geração, suscitando uma
cultura ignorante onde o voto não é tratado com a seriedade que merece.
Atualmente, o
Brasil passa pelo momento mais duro desde a sua redemocratização. A crise
política e econômica faz com que lamentemos e choremos as práticas
estabelecidas pela maioria. Isso porque a maioria de nosso país é representada
pelos políticos. Deputados, senadores, governadores e a Presidência da
República foram e são eleitos a partir da representação popular. Cada um destes
supostamente mereceu a confiança de cada voto, inclusive a nossa presidente
Dilma Rousseff que passa pelo processo de impedimento da continuidade de seu
mandato, o chamado impeachment.
O processo de
impeachment da presidente Dilma Rousseff revela a polarização de uma sociedade
alheada da realidade, a qual não consegue enxergar um palmo adiante do nariz.
Segundo Ernesto Che Guevara, "um povo que não conhece sua história está
condenado a repeti-la". A crise do sistema político brasileiro não é de
hoje. Ela é uma construção que permeia todo o regime republicano brasileiro até
os dias atuais. Portanto, o afastamento do PT do governo não seria a solução, e
sim um paliativo, isto é, um procrastinador que adia uma crise sem, de fato,
resolvê-la.
Você, caro leitor,
deve estar se perguntando agora: existe, então, uma solução definitiva para a
crise política no Brasil.
Há dois mil e
quinhentos anos, os gregos davam um nome apropriado a aquele que cuidasse da
vida pública, da comunidade e que acreditasse que a mais nobre regra era
"um por todos e todos por um": este era chamado de político. Por
outro lado, esses mesmos gregos utilizavam o termo "idiótes" para
designar aquele que só vivia a vida privada, que recusava a política, que dizia
não à política. Em outras palavras, os gregos antigos denominavam idiota aquele
que achava que a regra da vida era "cada um por si e Deus por todos."
No cotidiano, o que se fez foi um sequestro semântico, uma inversão do que
seria o sentido original de idiota e de político.
A palavra
''política'' provém do grego antigo ''politéia'' que, por sua vez, era usada
para se referir a tudo relacionado à pólis (cidade-estado) e à vida em
coletividade. Na Grécia Antiga, entendia-se que todos e todas éramos e
deveríamos ser políticos, a partir da noção de que pólis é a sociedade,
comunidade, coletividade, e é nela, com ela e por ela que vivemos. Como diz o
ditado, "nem tudo que é novo é necessariamente bom, e nem tudo que é velho
deve ser descartado."
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