Do O Globo
Uma das principais preocupações dos pais modernos, e dos avôs, é o uso que a geração de Alice, minha neta, está fazendo do iPad
Zuenir Ventura
Na coluna anterior, tratei do tema
abordado pelo livro “Foco — A atenção e seu papel fundamental para o
sucesso”, do psicólogo americano Daniel Goleman. O meu “foco” agora são
as crianças e os jovens, ou melhor, o que as ferramentas digitais estão
fazendo com sua atenção. Uma das principais preocupações dos pais
modernos — e dos avôs — é o uso que a geração de Alice, minha neta, está
fazendo do iPad. Ela tem pouco mais de 4 anos e domina os segredos
dessa máquina que, para mim, é inexpugnável. Não entende que possa
existir gente que não entende o que ela entende tão bem. É capaz de
permanecer horas seguidas diante de uma dessas telinhas, sem se levantar
do sofá. Quando cansa, muda de posição, deita e até de cabeça pra baixo
fica. O remédio foi conscientizá-la de que era preciso restringir o
uso. Não deve ser a única de sua tribo.
Mas e Eric? Com um ano e cinco meses,
sem ainda falar e mal começando a andar, já sabe qual botão apertar com
seu dedinho indicador para ligar e que comando acionar para obter esse
ou aquele joguinho. Aí para de chorar, de pedir colo, de incomodar. Se
deixar, fica como a irmã — fascinado, hipnotizado, anestesiado. Para os
pais em geral, nada mais cômodo. Ou confortável, para usar a palavra que
Alice acaba de descobrir e que serve para tudo (“pode entrar na piscina
que a água tá confortável”). Não existe o mundo aqui fora. Toda atenção
se concentra ali. Aquele é o único foco — exagerado, prejudicial.
“As crianças de hoje”, informa Goleman,
“estão mais conectadas a máquinas e menos a pessoas como jamais
aconteceu na história da humanidade. Já vi um garoto escrevendo uma
mensagem enquanto andava de bicicleta”. De acordo com uma pesquisa, o
jovem médio americano recebe e envia mais de cem mensagens de texto por
dia, cerca de dez a cada hora acordado. E, no entanto, a interação
pessoal é indispensável. “O circuito social e emocional do cérebro de
uma criança aprende através do contato e das conversas com os que
encontra durante o dia.” Ou seja, horas passadas com gente são mais
úteis do que diante de uma tela digitalizada.
Por um lado, é admirável a capacidade
que os adolescentes têm de receber diversos estímulos e processá-los ao
mesmo tempo. Enquanto ouvem música nos fones, mantêm a TV ligada, postam
mensagens, enviam torpedos, acionam o Instagram. Por outro lado, a
prática tem um custo: a dispersão e a preguiça mental retardam o
raciocínio, privilegiando o reflexo em vez da reflexão. A principal
vítima é o hábito da leitura. Uma professora contou sua experiência, que
talvez não seja única. Um livro que há cinco anos fazia sucesso numa
turma é hoje considerado difícil. Os alunos alegam que gastam muito
tempo para ler uma página. Segundo ela, a atenção deles agora só suporta
textos “curtos e picotados”. Livros, nem pensar.
Fonte: http://jornalggn.com.br/noticia/as-preocupacoes-com-o-uso-da-tecnologia-pelas-criancas
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