Ética e política
Sobre as relações entre a ética e a política, muito se
discute a respeito da forma como interagem, uma vez que no âmbito da ética
(moral) estaria o julgamento do bom e do ruim, enquanto na política, o que balizaria
o jogo seria apenas, o poder e as relações daí decorrentes. Para Bobbio (2002)
não há como julgar, em termos de boas ou ruins, as ações políticas por parte
daqueles que sofrem seus reflexos. A democracia, que é o melhor sistema
político para que haja aproximação do ideal de ética na política, não dá conta
de tal meta. Isso porque cada partido e cada classe social só tomam como “bom”
o que lhes interessa. Para o partido não existe bem comum e o interesse do
grupo é que prevalece.
Quem achou graça, isto é quem aceitou o chavão “vote em
Tiririca, porque pior não fica”, agiu de “má-fé” porque segundo Sartre “má-fé”
consiste em simular que alguma coisa é necessária, quando na verdade é
voluntária. Assim, a “má-fé” constitui uma fuga da liberdade, uma desonesta
evasão à “agonia da opção”. Fuga do peso de refletir; fuga do peso da
responsabilidade de pensar e de se opor ao mundo aprovado. Nessa ótica o “deixe
como está para ver como é que fica”, é também uma atitude de “má-fé”.
O estado, com seus três
poderes constituídos, não pode impedir que os cidadãos ajam de má fé.
Empresários, políticos, pastores, padres e maus profissionais continuarão, por
muito tempo ainda, agindo de má fé sem que ninguém os julguem corruptos. O
primado da ética só irá prevalecer quando o conjunto da sociedade se dispuser a
exigi-lo.
A incúria e a insensibilidade pública das autoridades diante
das tragédias das intempéries é uma questão de ética. Os governantes do passado
e do presente se esquivam de agir e a ética tem servido aos conservadores para
impor a velha ordem. Se há protestos, cobra-se a atitude ética de obediência à
ordem; se há desigualdade, a ética é convocada para aguçar as diferenças. Com a
ética o mundo é mais obediente, ordeiro e conservador. A chacina do Carandiru
foi justificada pelos policiais pelo fato de os prisioneiros terem-se rebelado;
a chacina da Candelária ocorreu porque os garotos eram pobres e usuários de
droga. Invertendo a função da ética, isto é, ela não deve servir para arrumar a
casa, mas atiçar o fogo da revolta diante das injustiças. Os privilegiados da
sorte, os afortunados, burgueses, conservadores, reacionários, paladinos da
ética reclamam da decadência de valores, perda de respeito e falta de decoro,
mas não querem falar de justiça. Faz parte da ética, denunciar e revoltar-se
contra tudo que desumaniza o homem e acreditar na rehumanização do mundo.
Belo Horizonte, março
de 2014
Antônio de Paiva Moura
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