domingo, 2 de março de 2014

Ética e política



Ética e política

         Sobre as relações entre a ética e a política, muito se discute a respeito da forma como interagem, uma vez que no âmbito da ética (moral) estaria o julgamento do bom e do ruim, enquanto na política, o que balizaria o jogo seria apenas, o poder e as relações daí decorrentes. Para Bobbio (2002) não há como julgar, em termos de boas ou ruins, as ações políticas por parte daqueles que sofrem seus reflexos. A democracia, que é o melhor sistema político para que haja aproximação do ideal de ética na política, não dá conta de tal meta. Isso porque cada partido e cada classe social só tomam como “bom” o que lhes interessa. Para o partido não existe bem comum e o interesse do grupo é que prevalece.
         Quem achou graça, isto é quem aceitou o chavão “vote em Tiririca, porque pior não fica”, agiu de “má-fé” porque segundo Sartre “má-fé” consiste em simular que alguma coisa é necessária, quando na verdade é voluntária. Assim, a “má-fé” constitui uma fuga da liberdade, uma desonesta evasão à “agonia da opção”. Fuga do peso de refletir; fuga do peso da responsabilidade de pensar e de se opor ao mundo aprovado. Nessa ótica o “deixe como está para ver como é que fica”, é também uma atitude de “má-fé”.
         O estado, com seus três poderes constituídos, não pode impedir que os cidadãos ajam de má fé. Empresários, políticos, pastores, padres e maus profissionais continuarão, por muito tempo ainda, agindo de má fé sem que ninguém os julguem corruptos. O primado da ética só irá prevalecer quando o conjunto da sociedade se dispuser a exigi-lo.
         A incúria e a insensibilidade pública das autoridades diante das tragédias das intempéries é uma questão de ética. Os governantes do passado e do presente se esquivam de agir e a ética tem servido aos conservadores para impor a velha ordem. Se há protestos, cobra-se a atitude ética de obediência à ordem; se há desigualdade, a ética é convocada para aguçar as diferenças. Com a ética o mundo é mais obediente, ordeiro e conservador. A chacina do Carandiru foi justificada pelos policiais pelo fato de os prisioneiros terem-se rebelado; a chacina da Candelária ocorreu porque os garotos eram pobres e usuários de droga. Invertendo a função da ética, isto é, ela não deve servir para arrumar a casa, mas atiçar o fogo da revolta diante das injustiças. Os privilegiados da sorte, os afortunados, burgueses, conservadores, reacionários, paladinos da ética reclamam da decadência de valores, perda de respeito e falta de decoro, mas não querem falar de justiça. Faz parte da ética, denunciar e revoltar-se contra tudo que desumaniza o homem e acreditar na rehumanização do mundo.
Belo Horizonte, março de 2014

Antônio de Paiva Moura



Nenhum comentário:

Postar um comentário