domingo, 27 de agosto de 2017

Privatização da Eletrobrás: a hora do espanto

Texto escrito por José de Souza Castro:

Ao pesquisar para escrever este artigo no dia em que brasileiros lembram que há 63 anos Getúlio Vargas se suicidou esperando que, com esse gesto, poderia ajudar o Brasil a cair na real e tornar-se finalmente um país independe, encontrei uma reportagem informando que o senador Aécio Neves se encontrou com o presidente Temer, no dia 15 de agosto, para salvar a Cemig de perder metade de seu parque gerador.
“Nós sabemos que, em razão de uma iniciativa desastrada e irresponsável da presidente Dilma em 2012, a Cemig vê hoje a possibilidade de perder 50% de seu parque gerador de energia porque as hidrelétricas de Jaguara, de São Simão, e Miranda estão com leilão marcado para o mês que vem”, disse. “O que nós estamos buscando é uma alternativa, que permita ao governo receber — mesmo que não integralmente — uma parcela daquilo que seria previsto num eventual leilão”, completou o ex-governador de Minas, pelo que li.
A Cemig está quebrada, conforme seu presidente, Bernardo Alvarenga, em entrevista feita no final de junho à Rádio Itatiaia. Quer vender a Light e outras subsidiárias para pagar uma dívida de R$ 16 bilhões. O presidente estima que, entre este ano e o ano que vem, a empresa tenha que pagar R$ 9 bilhões.
Culpa da Dilma? Ou culpa de Aécio e seu substituto no governo de Minas, Antonio Anastasia, que resolveu, em dezembro de 2012, não renovar antecipadamente os contratos de concessão das hidrelétricas de São Simão, Salto Grande e Volta Grande, porque faziam oposição à presidente da República?


Aécio era governador e Anastasia seu vice, quando o governo de Minas decidiu vender, sem licitação, parcela importante do capital da Cemig à Andrade Gutierrez e, com esse grupo, embarcar na construção da Hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira. E comprar a Light…
Uma história que veio a propósito do anúncio da venda da Eletrobrás. E que remete ao Brasil pobre do início do século 20 e que tentou, com Getúlio Vargas, sair da pobreza via exploração do petróleo e da eletricidade. Um sonho que vai se desfazendo com Michel Temer – aquele com quem Aécio se encontrou, num abraço de afogados nas águas da Lava Jato.
Li AQUI que o segundo governo Vargas (década de 1950) “buscou estabelecer novas bases financeiras e institucionais para o desenvolvimento do setor elétrico, apresentando ao Congresso Nacional os projetos do Fundo Federal de Eletrificação (FFE), do Imposto Único sobre Energia Elétrica (IUEE) e da Eletrobrás. Os projetos do FFE e do IUEE foram convertidos em lei em agosto de 1954, uma semana depois do suicídio do presidente. O projeto da Eletrobrás seria aprovado apenas em 1961, com diversas modificações de seu texto original, considerado excessivamente centralizador. Antes da constituição da empresa holding federal, o Fundo Federal de Eletrificação foi administrado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), fundado em 1952. O projeto do Plano Nacional de Eletrificação, também proposto por Vargas, não teve a mesma sorte dos anteriores, sendo arquivado pelo Congresso. O plano previa a duplicação da capacidade instalada de energia elétrica do país até 1965, contemplando diversas obras iniciadas ou programadas por concessionárias privadas e públicas, como a Cemig.”
A Cemig foi fundada em maio de 1952 pelo governador Juscelino Kubitschek. Cresceu muito desde então, passou a ter suas ações negociadas nas bolsas de Nova York e Madri, foi sendo privatizada aos pedaços e agora, revela seu presidente, está quebrada.
A Eletrobrás, nascida quase dez anos depois, teve uma trajetória parecida. Tem hoje 37 hidrelétricas, 114 termoelétricas, duas usinas nucleares, 69 eólicas e uma solar próprias ou em sociedade, que respondem por 31% da geração de energia elétrica do Brasil.
Li muito a respeito desse projeto de Temer nos últimos dias. Poderia citar vários autores, mas fico com Arnaldo Mourthé, em artigo publicado aqui. A privatização da Eletrobrás, diz Mourthé, pode nos esclarecer sobre os desmandos e a traição do governo, que “age de forma desavergonhada contra o Brasil e seu povo”. Prossegue:
“Comecemos pelos valores financeiros em jogo. A venda da Eletrobrás produziria uma arrecadação de R$ 20 bilhões. Comparemos esse valor com o que os governos brasileiros gastaram nos últimos anos em despesas questionáveis.
A Copa do Mundo, em 2014, custou R$ 26 bilhões aos cofres públicos. A Olimpíada, de 2016, custou ao todo R$ 38,26 bilhões, dos quais R$ 14 bilhões públicos. Em 2013 houve subsídios do governo federal à indústria automobilística de R$ 19,31 bilhões, o dobro do que foi investido no transporte público. Nem vamos falar nas vendas de licenças de exploração de petróleo, que todos conhecem, nem do fatiamento da Petrobras, para enfraquecê-la e depois privatizá-la totalmente.”

Vou parar por aqui, para não chorar. Não sem antes, porém, indicar a leitura dessa entrevista na Carta Capital em que um professor da USP, Ildo Sauer, especialista em energia, diz que recebe “sem espanto e sem alegria” os planos do governo Temer para a venda da estatal.
Sem espanto, talvez, porque Sauer conhece bem a história da dominação do Brasil e o caráter de Michel Temer e seus aliados, como Aécio Neves. Como, porém, não se espantar?

(fonte: https://kikacastro.com.br/2017/08/25/privatizacao-eletrobras/)

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