segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Mídia e metrô tucano: como servir a Deus sem trair o Diabo?

O artigo de Saul Leblon, publicado no site da Carta Maior, traz também a reportagem que a Folha publicou em 2010, dando conta de que, seis meses antes, já se sabia quem iria ganhar a licitação para a linha Lilás do metrô de São Paulo. Se quiser ler, acesse http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=6&post_id=1298

Mídia e metrô tucano: como servir a Deus sem trair o Diabo?

Nunca a sorte política do PSDB – seus caciques e derivados— dependeu tanto da indulgência da mídia conservadora como agora.

E nunca como agora esse centurião de todas as horas esteve tão frágil para ajudá-los.

A sobrevivência mesmo esfarrapada do PSDB depende dramaticamente da decisão em torno da qual orbitam há dias os proprietários, editorialistas, colunistas, pauteiros e mancheteiros do dispositivo midiático conservador.

Aliviar ou não para um PSDB mergulhado até o nariz no conluio com oligopólios e corrupção no caso das licitações para compra de vagões do metrô, em São Paulo?

A hesitação no ar é tão densa que dá para cortar com uma faca.

Jorros de ambiguidade escorrem dos veículos impressos no café da manhã.

Num dia, como na 4ª feira passada, a Folha escondeu o escândalo retirando-o da 1ª página.

Mas encontrou espaço para estampar ali outra ‘grave denúncia’: a reforma de calçadas no centro de São Paulo não tem plano equivalente para as periferias.

Na edição seguinte, porém, o jornal dos Frias precipitou a publicação de um indício de envolvimento direto de José Serra com o cartel, em 2008.

Como?

Jogou a informação no papel. Sem investigar a fundo, como deveria, e fez, quando o alvo eram lideranças progressistas.

Não ouviu outros executivos de empresas participantes da mesma licitação, não biografou o braço direito do governador na operação denunciada pela Siemens. Não foi até Amsterdã ouvir testemunhas, checar informações, refazer o roteiro de Serra, conferir reuniões no hotel etc etc.

O secretário de transportes metropolitanos de Serra, então, e segundo a denúncia da multinacional alemã, parceiro do governador nas tratativas, era o engenheiro José Luiz Portella.

Por que o perfil de figura chave não foi esmiuçado?

Colunista da Folha atualmente, Portella é um quadro clássico: perfil público rebaixado, versatilidade operacional elevada dentro do PSDB.

Ela inclui serviços prestados ao governo FHC, no ministério da Educação, dirigido por Paulo Renato de Souza, já falecido.

Por acaso, Paulo Renato seria seu companheiro também no governo Serra, quando a secretaria da Educação de SP adquiriu, sem licitação, cerca de R$ 8 milhões em assinaturas de jornais , revistas e outras publicações dos grupos Estadão, Globo e Abril. (Em 2010 Serra deixaria o governo de SP para, com apoio da mídia, ser derrotado outra vez em uma disputa presidencial, agora por Dilma Rousseff.)

A pressa da Folha em veicular uma denúncia séria sem investigação anterior –e tampouco posterior, sintetiza um certo desespero que perpassa todo o dispositivo midiático conservador nesse momento.

A angústia deriva da difícil missão que os acontecimentos impõem ao jornalismo ‘isento’ nos dias que correm.

Como servir a Deus sem trair o Diabo?

Foi o que tentou a Folha nesse caso.

De um lado, mitigar a cumplicidade pública entre ela e Serra.

De outro, ao comprometer o tucano, faze-lo de forma tão frívola, que levou o jornal a omitir até mesmo reportagens anteriores de sua própria lavra, que endossariam a denúncia da Siemens.

Em 26 de outubro de 2010, a Folha revelou que seis meses antes da licitação dos lotes 3 e 8 da linha 5 (Lilás) do metrô, sua reportagem já tivera acesso aos nomes dos vencedores das obras.

A Folha registrou então as empresas vencedores em vídeo e em cartório nos dias 20 e 23 de abril de 2010.

Se isso não é uma corroboração forte de práticas sistêmicas de conluio, corrupção e cartel no governo Serra, o que mais seria então?

Por que a Folha menosprezou esses antecedentes?

Por que, se eles enfraquecem sobremaneira as alegações de Serra, Alckmin e assemelhados de espanto com práticas idênticas relatadas pela Siemens, agora também na etapa de aquisição de equipamentos?

A frouxidão moral dos colunistas savonarolas, o laxismo ético dos editoriais tem motivo de força maior.

A mídia está envolvida até o pescoço nesse escândalo, sugestivamente só revelado por iniciativa da pata empresarial do negócio e da ação do Cade.

Seu envolvimento tem um nome: omissão.
E sobrenome: cumplicidade.

Como explicar que o diligente jornalismo bandeirante, sempre tão atento à malversação da coisa pública na esfera federal, nunca investigou a fundo aquilo que esteve o tempo todo diante do seu nariz?

E não só diante do nariz, mas, como se vê pela reportagem de 2010, em suas próprias páginas, em escândalos, todavia, rebaixados como episódicos e pontuais?

A mídia conservadora hesita, se retorce e se remói.

A dimensão sistêmica do que aflora no metrô de SP coloca-a diante de um duplo abraço de afogados.

Se não investigar a fundo esse episódio, veiculado a fórceps, naufragará como parceira carnal do tucanato.

Se investigar, com rigor e isenção, uma prática de 16 anos de governos que sempre contaram com seu esférico apoio, em algum momento, de certa forma, terá que investigar a si própria.

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