terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Projeto Minas-Rio: sem eco e sem lógica





Antônio de Paiva Moura
                                                      
            Em 2007 foi dado início à execução do projeto Minas-Rio, cujo objeto é construir o mineroduto de Conceição do Mato Dentro ao porto Açu, município de São João da Barra, estado do Rio de Janeiro, para exportar minério de ferro bruto, sem nenhum tipo de beneficiamento. Para impulsionar o minério nos dutos, o processo vai levar de Conceição do Mato Dentro cerca dois mil e quinhentos metros cúbicos de água por hora, privando o município de uma de suas vitais riquezas. 

            Para que o projeto fosse autorizado sem resistências locais e no âmbito do estado de Minas Gerais, a mineradora do empresário Eike Batista instalou no município uma empresa de falso caráter pecuário para facilitar as desapropriações. A Borba Gato  Pastoril SA chegou em Conceição, em 2007 procurando comprar terras para criação de cavalos. Esse subterfúgio acabou evitando que o verdadeiro objeto da mineradora causasse resistência à venda das propriedades. (ZHOURI, 2014) Até então, a base da economia de Conceição do Mato Dentro era a agricultura familiar e o ecoturismo. Segundo Zhouri, esse processo foi interrompido quando o governo de Minas, juntamente com algumas empresas, decidiu que sua “vocação” era ser cidade mineradora. 

            Após o início das atividades da empresa, córregos e rios passaram a apresentar qualidades impróprias para uso. Produtores rurais tiveram inviabilizado o plantio de alimentos, fabricação de queijos e doces e viram seus animais adoecerem e morrerem. Em 2014, abaixo da barragem de rejeitos da empresa, no córrego Passa Sete, ocorreu uma grande mortandade de peixes. O projeto Minas-Rio defendido como desenvolvimento pela empresa e pelo governo de Minas, reforça a subordinação do Brasil ao Mercado internacional, como mero fornecedor de matéria prima bruta. 

            Em 2008 o projeto foi vendido para a Anglo American, que tem sede em Londres e que, no ano de 2012, teve um faturamento de U$ 28,7 bilhões de dólares. Essa empresa tem uma longa história de conflitos com a classe trabalhadora nos países em que atua. Em Conceição do Mato Dentro não é diferente. Em audiência pública na Assembléia Legislativa de Minas Gerais, em 2013, o promotor público estadual, Marcelo Mata Machado listou os conflitos na região que incluem: violação de direitos trabalhistas; grilagem de terras; assoreamento de córregos e rios; coação da população no sentido de não transitar nas estradas; destruição do meio ambiente; poluição dos mananciais; invasão de terras pela empresa; destruição de casas de moradias; agravamento do problema de moradia, saúde, escola e segurança. Em 2013, um incêndio oportunizou o aumento dos protestos de oitocentos trabalhadores da Anglo American, em face das más condições de trabalho e não pagamento de horas extras. Uma subsidiária da Anglo foi denunciada por manter trabalhadores em condições análogas à escravidão, incluindo cerca de cem haitianos. 

            A questão fundiária passa por uma esperteza e demonstração de força da Anglo American. A empresa negocia a posse da terra com alguns membros da família. Sem concordância de todos os herdeiros. A partir daí proíbe a entrada dos moradores e herdeiros nos terrenos e o acesso a caminhos tradicionais. 

            Do ponto de vista ambiental, a Anglo conseguiu todas as licenças requeridas, inclusiva algumas não previstas na legislação, como, por exemplo, a divisão do licenciamento em fases. Com a aquiescência do governo mineiro, foi inventada a fórmula: “vamos por etapas”. Na análise de Zhouri, isso indica que houve forte interesse de pessoas dentro dos órgãos ambientais de Minas, para que o projeto fosse aprovado. Estranha-se o fato de Daniel Medeiros de Souza, superintendente de regulamentação da Secretaria de Estado do Meio Ambiente ter-se demitido para assumir alto cargo de licenciamento na Anglo American. Apesar de condições nada favoráveis e divergências nos órgãos de licenciamento ambiental, em outubro de 2014, o projeto foi aprovado.

            A proposta de Minas Gerais e do município de Conceição do Mato Dentro de construção de ferrovia para transportar minério de ferro, foi preterida. Minas Gerais foi derrotada em sua perspectiva de desenvolvimento e não consegue evitar o desastroso ato de economia insustentável.


Referência
ZHOURI, Andréa (e outros). O projeto Minas-Rio: negociando os direitos... dos outros!. Le Monde diplomatique Brasil. São Paulo, n. 88, novembro de 2014. 
           

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