Recebi de minha amiga Ana Cláudia. Achei bem legal a comparação. Espero que gostem!
A
maioria das pessoas que conheço que vêm a Berlin pela primeira vez
ficam encantadas com 3 coisas: a espantosa quantidade de área verde; o
excelente transporte público; e a segurança.
E quase automaticamente, vem a pergunta: dá para ganhar bem trabalhando aqui?
Aparentemente,
uma coisa não tem nada a ver com outra, mas penso que a conexão é mais
profunda do que parece à primeira vista; eu explico.
Berlin
não é um parâmetro muito válido porque é considerada uma cidade pobre
para os padrões alemães, uma vez que aqui é a sede administrativa do
país e não possui muitas indústrias. Mesmo assim, dá para dizer uma
coisa que vale para o país todo e que talvez deixe muita gente aí no
Brasil chocado: a diferença entre o salário de um operário (ou caixa de
supermercado) e de um diretor de empresa é, no máximo, 5 vezes. Isso
inclui funcionários públicos de alto escalão, professores universitários
doutores, juízes e médicos.
Um
amigo comentou que o mesmo acontece na Suécia; um professor
universitário, com doutorado, ganha, no máximo 2 mil Euros líquidos.
Para se ter uma idéia, um almoço no restaurante universitário lá custa 8
Euros. Não é fácil, né? No entanto, esses países são os que se
considera como tendo a melhor qualidade de vida.
Então,
imagine: é como se no Brasil, o rendimento máximo bruto de qualquer
pessoa que vive de salário fosse R$ 5 ou 6 mil reais. Disso, quase 40%
ficam retidos para os impostos, aposentadoria e plano de saúde
obrigatório. Pois é, não sobra muito.
Por
isso é que aqui a gente não vê um funcionário público, seja ele quem
for, se achando o Sr. Rei da Cocada Preta (no Brasil, nosso apartamento
ficava perto do ministério público; era de dar nojo a empáfia de algumas
pessoas que trabalham lá). Os alemães não têm muita sobra no orçamento,
como se pode ver; mas adoram viajar e ler. Então, lavam e passam a
própria roupa, fazem a própria comida e limpam a própria casa.
Aqui
não tem pet shop para dar banho em cachorros; os próprios donos se
encarregam disso. A maior parte das pessoas compra seus móveis na IKEA e
aluga um carro ou reboque para levar a encomenda para casa. Para montar
uma cozinha inteira, por exemplo, é só ler o manual de instruções; tem
que botar a mão na massa mesmo.
Os
professores da minha escola são altamente qualificados (a escola é uma
das que melhor paga); pois todos levam marmita e ninguém acha feio.
Andam o máximo que podem de bicicleta e, no inverno, de transporte
público. Os que têm carro usam modelos menores (aquelas horrosidades
gigantes com vidro fumê e ar condicionado ligado no máximo quase não tem
aqui, para minha felicidade). Outro efeito colateral é que o trânsito é
excelente; a velocidade máxima permitida nos bairros é 30 km/h e eu
nunca vi engarrafamentos na hora do rush.
Os
prédios não têm porteiro e uma vez por semana vem uma empresa
terceirizada varrer as escadas. Quando chega uma encomenda e não estou
em casa, sempre tem um bilhetinho na caixa do correio avisando com qual
vizinho está o pacote; é só ir lá pegar (e aproveitar para fazer um
social). Às vezes a gente também fica com correspondência de vizinhos.
É
claro que tem gente rica também (geralmente donos de grandes negócios).
Mas eles jamais destratam serviçais, simplesmente porque aqui não há
subcategorias menores, como no Brasil. As pessoas ricas também metem a
mão na massa, por uma questão de filosofia mesmo.
No
Brasil, ainda trazemos indícios da cultura escravagista; todo mundo
quer ter alguém para mandar (e, de preferência, humilhar e maltratar,
para mostrar quem é que manda). O que puder ser terceirizado, será. As
pessoas contratam outras para fazer as coisas mais básicas, de levar
cachorro para passear até levar o lixo para a rua; e isso é em todos os
níveis. A moça que trabalha de empregada e mora na favela paga alguém
para fazer faxina na casa dela; certeza.
Uma
amiga brasileira que mora aqui me contou das chateações que uma alemã
que morou no Brasil passou porque gostava de cuidar do próprio jardim
(realmente, eles adoram). A questão é que a moça morava no Alphaville,
condomínio de alto padrão em São Paulo; frequentemente era motivo de
chacota porque uma pessoa do nível dela (adoro isso de “nível de
pessoa”; só que não) podia muito bem pagar um jardineiro. É a cultura da
sinhazinha moça e do senhor de engenho levada às últimas consequências.
Fico
triste quando vejo a vida girar em torno na ostentação no nosso país;
como as pessoas não têm vergonha de ganhar 30, 40, até 50 vezes mais que
outras (sendo que boa parte é funcionária pública) e ainda acham isso o
máximo; ficam esnobando o sucesso como se fosse mérito próprio, e não
uma distorção do sistema. É um tal de quem consegue ganhar mais para
comprar um carro maior, mandar o máximo que puder com uma prepotência
totalmente alheia à realidade das coisas, que chega a doer. Seria apenas
ridículo, se não fosse tão dramático.
A mordomia é irresistível (quem não gosta), mas qual é o preço disso tudo?
Só
para terminar fazendo a conexão com o assunto lá do começo: se a
diferença de salários não é grande (e olha que a Alemanha é a maior
economia capitalista da Europa), não tem porque haver essa violência
toda que a gente experimenta no Brasil.
Aqui
tem gente pobre, mas não tem favela. O transporte público funciona bem
porque ele é essencial; até os funcionários públicos mais graduados
dependem dele para se locomover. As áreas verdes são muitas e bem
cuidadas porque não são privilégio de bairros chiques; tem na cidade
toda, para todo mundo.
Fico
vendo as notícias do Brasil e fico pensando: não seria a hora das
pessoas acordarem e passarem a viver como ricos de verdade?
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