sexta-feira, 17 de junho de 2016

Não se blinda Aécio Neves como antigamente

Texto escrito por José de Souza Castro:

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) está às voltas com delações premiadas há algum tempo. O destaque dado pela imprensa à citação de seu nome pelo ex-senador Delcídio do Amaral (PT-MS), em março deste ano, e agora pelo ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, indicado para o cargo pelo PMDB, não é proporcional à importância do ex-governador e senador de Minas, candidato tucano à presidência da República em 2014 e atual presidente do seu partido.
Por causa desse quase descaso, a imprensa tem sido acusada de blindar Aécio Neves. Se verdadeira a suspeita, está ficando cada vez mais difícil manter a blindagem.
Não era assim em 2010, quando chegou à Procuradoria Geral da República um inquérito contra Aécio Neves, acusado de ter conta no paraíso fiscal de Liechtenstein em nome de uma offshore. Passaram-se cinco anos e, em dezembro último, a denúncia dormia numa gaveta da PGR, sem que tão prolongado sono causasse estranheza a ninguém.
Dinheiro de político em offshore só começou a preocupar o atual Procurador Geral da República quando se viu obrigado a apresentar ao Supremo Tribunal Federal denúncia contra Eduardo Cunha. Nesse momento, Rodrigo Janot já admitia que o uso de offshores visa esconder a verdadeira identidade dos titulares da conta, mantida, possivelmente, por dinheiro de procedência duvidosa.

Não é justo dizer que a imprensa sempre blindou o neto de Tancredo Neves. O caso do aeroporto de Cláudio, construído em terras desapropriadas pelo governo de Minas que pagou generosamente a um tio de Aécio e cuja chave era mantida em mãos de parente, foi divulgado – e não só pelos blogs “sujos”, como são chamados os que não rezam pela mesma cartilha da grande imprensa empresarial brasileira que faz oposição ao PT, a Lula e a Dilma.
Uma imprensa que teve inegável sucesso ao promover o impeachment da presidente Dilma Rousseff, depois de impedir que Luiz Inácio Lula da Silva assumisse o Ministério da Casa Civil, ajudada por um providencial vazamento de telefonema entre os dois, autorizado – o vazamento, não a escuta telefônica da Polícia Federal, no momento em que ela foi realizada – pelo juiz Sérgio Moro, da Lava Jato.
Vazamento recebido com euforia pela imprensa e pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, que se apressou a conceder liminar suspendendo a posse de Lula no ministério. Alegava-se que a nomeação era uma tentativa de blindar Lula, retirando-o da alçada de Sérgio Moro.

Estávamos em meados de março deste ano. Aécio foi um dos muitos que se aproveitaram desse vazamento, para reforçar sua oposição à adversária vitoriosa no segundo turno das eleições de 2014. Nessa reportagem de um jornal do Grupo Globo, o que mais se destaca na imprensa como oposição a Dilma, o presidente nacional do PSDB declarou, no dia 15 de março, que a presidente Dilma Rousseff “abdicou” de forma definitiva ao seu mandato, ao nomear o ex-presidente Lula como ministro da Casa Civil. Em nota, Aécio classificou de “absolutamente condenável” a nomeação de Lula e disse que isso, na área econômica, pode levar ao “populismo e à irresponsabilidade fiscal”.
O que nunca deve ter passado pela cabeça de Aécio é que outro vazamento lhe traria tanto constrangimento – e aos seus muitos amigos jornalistas. Refiro-me ao vazamento do depoimento de Sérgio Machado à Lava Jato, em troca de redução da própria pena.
Agora, todos correm a dizer o correto: as declarações de investigados na operação Lava Jato (que ultrapassaram em muito o âmbito das roubalheiras praticadas por petistas) não se constituem em verdade por si só. Elas devem ser investigadas e confirmadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público antes que sejam usadas para a condenação dos suspeitos. Pela Justiça e pela opinião pública.

O uso do cachimbo, porém, faz a boca torta. E a divulgação do depoimento de Sérgio Machado, mesmo sem a tal investigação e confirmação, provocou ontem mais uma baixa no governo Temer: a do ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, acusado pelo ex-presidente da Transpetro, em delação premiada divulgada nesta quarta-feira, dia 15. Sérgio Machado afirmou que repassou ao ministro R$ 1,55 milhão em propina, entre 2008 e 2014.
Encerro transcrevendo trecho de um artigo de Glenn Greenwald, jornalista respeitado internacionalmente, em seu blog (Intercept):
“Mas os efeitos da notícia bombástica de ontem foram muito além de Temer, envolvendo inúmeros outros políticos que estiveram liderando a luta pelo impeachment contra Dilma. Talvez o mais significante seja Aécio Neves, o candidato de centro-direita do PSDB derrotado por Dilma em 2014 e quem, como Senador, é um dos líderes entre os defensores do impeachment. Machado alegou que Aécio – que também já havia estado envolvido em escândalos de corrupção – recebeu e controlou R$ 1 milhão em doações ilegais de campanha. Descrever Aécio como figura central para a visão política dos manifestantes é subestimar sua importância. Por cerca de um ano, eles popularizaram a frase “Não é minha culpa: eu votei no Aécio”; chegaram a fazer camisetas e adesivos que orgulhosamente proclamavam isso:

Evidências de corrupção generalizada entre a classe política brasileira – não só no PT mas muito além dele – continuam a surgir, agora envolvendo aqueles que antidemocraticamente tomaram o poder em nome do combate a ela. Mas desde o impeachment de Dilma, o movimento de protestos desapareceu. Por alguma razão, o pessoal do “Vem Pra Rua” não está mais nas ruas exigindo o impeachment de Temer, ou a remoção de Aécio, ou a prisão de Jucá. Porque será? Para onde eles foram?”
Pois é, para onde foram? Não sou só eu que me pergunto isso:
Charge do Duke
Charge do Duke

(fonte: https://kikacastro.com.br/2016/06/17/nao-se-blinda-aecio-neves/#more-12690)

Nenhum comentário:

Postar um comentário