Texto escrito por José de Souza Castro
No dia 27 de março deste ano, a "Folha de S.Paulo" publicou notícia,
assinada pelo repórter mineiro Paulo Peixoto, informando que o caso do
mensalão tucano está parado na Justiça de Minas. Trecho:
"Um
ano depois de o Supremo Tribunal Federal determinar que o processo do
mensalão tucano contra o ex-governador Eduardo Azeredo (PSDB) deveria
ser julgado na primeira instância da Justiça em Minas Gerais, nada foi
feito para concluir o caso, que se arrasta há quase uma década.
Além
de o julgamento não ter acontecido, desde 7 de janeiro a 9ª Vara
Criminal de Belo Horizonte, onde tramita a ação, está sem juiz, porque a
titular se aposentou.
O
processo de Azeredo chegou a Minas já totalmente instruído pelo Supremo
e pronto para ser julgado. Nenhuma audiência mais é necessária, basta o
julgamento.
Parte
da demora também pode ser explicada pela lentidão do Judiciário. O STF
decidiu devolver o caso para Minas no dia 27 de março do ano passado.
Depois disso, foram necessários cinco meses para que a ação chegasse à
9ª Vara. O processo só chegou no dia 22 de agosto de 2014.
Quanto
maior a demora, maior é o risco de que os crimes apontados pela
Procuradoria-Geral da República prescrevam e fiquem impunes."
A
notícia despertou imediatamente o interesse de blogs, mas, até onde
sei, não o da imprensa empresarial mineira. O jornal paulista, o mais
lido do país, não deixou a peteca cair. Nesta segunda-feira (30), seu
principal editorial tem como título "Justiça tarda e falha", com o
seguinte destaque: "Prescrição, atrasos, incúria e engavetamento
beneficiam políticos do PSDB acusados de irregularidades, inclusive no
dito mensalão tucano". Pode ser lido AQUI. Principais pontos do texto:
"A
liberdade, como ensina o lema dos inconfidentes, será sempre desejável,
mesmo que tardia. Nem sempre se pode dizer o mesmo, contudo, da
Justiça. Uma decisão tardia pode bem ser o equivalente da iniquidade
completa, e um processo que se arrasta sem condenados nem absolvidos só
pode resultar no opróbrio de todos –inocentes e culpados, juízes e réus,
advogados e acusadores.
Ex-presidente
de seu partido, Azeredo é acusado de ter abastecido sua campanha ao
governo de Minas, em 1998, com verbas desviadas de estatais, valendo-se
de empréstimos fictícios. Não são mera coincidência as semelhanças desse
episódio com o que viria a ser revelado no escândalo do mensalão
petista, alguns anos depois. Um de seus principais personagens, o
empresário Marcos Valério, havia sido também responsável pelo esquema
tucano.
A
decisão do STF, remetendo o caso a Minas Gerais, foi tomada em março de
2014. O trajeto de Brasília a Belo Horizonte consumiu cinco meses. Em
22 de agosto, o processo chega à 9ª vara criminal. Era só proceder ao
julgamento; nenhuma instrução, nenhuma audiência, nada mais se requeria.
Que o juiz examinasse os autos. Juiz? Que juiz? A titular da vara
aposentou-se em janeiro; não se nomeou ninguém em seu lugar. Havia – e
ainda há – pressa: alguns réus, dentre eles Azeredo, podem beneficiar-se
da prescrição; outros envolvidos já escaparam por esse motivo.
Não
se trata, claro está, da "liberdade ainda que tardia" ostentada na
bandeira de Minas Gerais. Entre essas figuras do PSDB, "impunidade na
última hora" há de ser lema bem mais adequado."
Entre
os blogs que se interessaram pela notícia, vê-se o do ex-ministro e
ex-presidente nacional do PT José Dirceu, um dos condenados pelo
mensalão petista. Ele republicou a notícia,
com a seguinte introdução: “A mídia em geral, de forma conveniente para
ela já que procura blindar os tucanos de todo o noticiário negativo, e
os grandes jornais em particular, exceção da Folha de S.Paulo hoje,
passam ao largo do tema.”
Numa pesquisa no Google, encontrei outra exceção: a revista "Época".
Paulo
Peixoto, em sua reportagem, lembra que o caso começou a ser investigado
em 2005, quando foi descoberto em meio ao escândalo do mensalão
petista. A Procuradoria apresentou denúncia à Justiça em 2007. O
repórter aponta o risco de novas prescrições, pois não se sabe quando o
Tribunal de Justiça de Minas nomeará um juiz substituto para a 9ª Vara.
“Isso deveria ter acontecido nesta quarta (25), quando o tribunal
prometia indicar juízes para 12 varas na capital mineira e no interior”,
acrescenta. “A sessão foi adiada porque uma juíza candidata recorreu ao
CNJ (Conselho Nacional de Justiça) questionando a lista. Como o
processo terá de ser refeito, o tribunal diz que não há previsão de
quando a nomeação dos juízes ocorrerá.”
Pois é: uma justiça que tarda e falha.
Veja que há sete meses
– ou seja, seis meses depois da renúncia do deputado Eduardo Azeredo e
da decisão do Supremo Tribunal Federal de remeter o processo à primeira
instância – a responsável pela tramitação do mensalão tucano, a juíza
Neide da Silva Martins, da 9ª Vara Criminal de Belo Horizonte, ainda
aguardava a publicação do acórdão para iniciar o julgamento, sabendo que
o caso já estava instruído e pronto para ser julgado. “Vou analisar
quando chegar, disse a juíza, em conversa informal com jornalistas.”
Mas não julgou. Deve ter analisado – e preferiu se aposentar, em janeiro deste ano, a proferir a sentença.
Quanto
ao desinteresse da imprensa mineira, uma ressalva: pode ser que seus
dirigentes tenham preferido apurar o caso, antes de publicar. É
razoável. A lamentar-se apenas que não tomem o mesmo cuidado em outros
casos nos quais têm motivos nem sempre confessáveis para divulgar
amplamente.
Um problema não só da imprensa mineira, diga-se. No último sábado, o “Estado de S. Paulo” publicou
que “os bancos Bradesco, Santander, Safra, Pactual e Bank Boston, as
montadoras Ford e Mitsubishi, além da gigante da alimentação BR Foods
são investigados por suspeita de negociar ou pagar propina para apagar
débitos com a Receita Federal no Conselho Administrativo de Receitas
Fiscais (Carf). Na relação das empresas constam Petrobras, Camargo
Corrêa e a Light”.
Só
no quarto parágrafo, informa: “O grupo de comunicação RBS é suspeito de
pagar R$ 15 milhões para obter redução de débito fiscal de cerca de R$
150 milhões”. A notícia ainda não teve maior repercussão na imprensa,
mas fez furor nos blogs que, ao contrário do “Estadão”, destacaram o
caso da RBS, pois ela é a principal filiada da Rede Globo no Sul do
país.
É
possível que a maior rede de televisão do Brasil, que tanto destaque
tem dado à corrupção, dê a devida importância a essa relação de
corruptores sonegadores. Na “Folha de S. Paulo”, o colunista Ricardo Melo foi uma voz isolada, nesta segunda-feira. Quase no final de seu artigo, dedicou ao assunto dois parágrafos:
“Só
na Zelotes, calcula-se um prejuízo de quase 6 bilhões de reais para o
Tesouro -- valor três vezes maior que o indicado pelo Ministério Público
na Operação Lava Jato. Repita-se: três vezes maior.
Os
jornalistas Fábio Fabrini e Andreza Matais, de "O Estado de S. Paulo",
deram a lista de alguns acusados: Santander, Bradesco, Ford, Gerdau,
Safra, RBS, Camargo Corrêa e outros nomes de calibre parecido. Onde
estão o governo do PT e o ministro da Fazenda que ele nomeou? Em vez de
atacar os peixes graúdos, os emissários do Planalto mendigam votos no
Congresso para encolher pensões de viúvas, cortar bolsas de
universitários e onerar desempregados.”
A história tem demonstrado que, quando a imprensa não se interessa por um caso, a Justiça tarda mais que o comum. E falha!
(fonte: blog da KikaCastro)
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