Texto escrito por José de Souza Castro:
Manchetes
dos principais portais jornalísticos na manhã de sexta-feira, 19 de
junho: os presidentes das construtoras Odebrecht (Marcelo Odebrecht) e
Andrade Gutierrez (Otávio Marques de Azevedo) foram presos na nova fase
da Operação Lava Jato que investiga corrupção na maior estatal
brasileira. As duas construtoras estão entre as maiores do país.
Os investigadores da Polícia Federal, segundo o UOL,
controlado pelos donos da “Folha de S. Paulo”, afirmam que os dois
executivos tinham "domínio de tudo o que acontecia" no esquema de
pagamento de propinas na Petrobras.
Mais
à frente, informa o UOL: “Uma das provas contra a Andrade Gutierrez, de
acordo com o juiz Moro, é um depósito de US$ 1 milhão feito em dezembro
de 2008 por uma empresa de Angola chamada Zagope para uma firma do
lobista Mário Goes na Suíça. Goes é acusado de repassar suborno no
esquema da Petrobras.” Ainda:
“O
lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, é apontado
pela força-tarefa da Operação Lava Jato como o repassador de propina
para a Andrade Gutierrez. Segundo o juiz, há provas de que a empreiteira
transferiu R$ 1,19 milhão para uma empresa de Baiano. A operação teria
servido, diz o juiz, "apenas de veículo para propiciar o repasse de
valores de propina da empreiteira para o intermediador e deste para
dirigentes da Petrobras".
Por
fim, essa informação: “Os valores dos contratos investigados com a
Petrobras somam R$ 26 bilhões – sendo R$ 17 bilhões da Odebrecht e R$ 9
bilhões da Andrade Gutierrez.” Com o acréscimo de que não se sabia ainda
quanto foi desviado, “mas, considerando o percentual de 3% que era
normalmente destinado a propinas, segundo as investigações, esse valor
chegaria a R$ 780 milhões”. O cálculo é sobre os R$ 26 bilhões.
A
prisão de importantes executivos e acionistas de grandes empresas
brasileiras já não surpreende no Brasil, depois do início da Lava Jato.
Pode surpreender que, em contratos que somam R$ 26 bilhões, o percentual
da propina seja de apenas 3%. Sobretudo para os mineiros que, na década
de 90, sabiam de influente secretário de Estado no segundo governo
Hélio Garcia que tinha o apelido de “Quinzinho”. De 15%.
Há
forte receio de que o objetivo dessa operação comandada por um juiz
federal do Paraná seja atingir a presidente Dilma Rousseff e,
principalmente, o ex-presidente Lula, possível candidato do PT em 2018. O
receio se respalda principalmente nos vazamentos seletivos dessa
operação. Muitos já escreveram a respeito, o que me dispensa de fazê-lo
aqui.
Outra
preocupação é que tal ação, antes de fazer justiça, sirva para destruir
algumas das mais importantes empresas brasileiras com forte atuação em
países da América Latina e da África, o que seria muito prejudicial aos
brasileiros.
É
impossível, reconheça-se, negar que as empreiteiras mais poderosas, no
Brasil e no mundo, não se tornaram o que são sem antes terem meios para
influenciar fortemente agentes públicos, a começar pelas contribuições
eleitorais.
A
título de exemplo, podemos examinar o caso Andrade Gutierrez. A empresa
foi fundada em 1948 por Flávio Gutierrez e Gabriel Andrade, no ano em
que se formaram engenheiros pela Universidade de Minas Gerais, atual
UFMG. Convidaram para sócio o irmão de Gabriel, Roberto Andrade, formado
dez anos antes na mesma Escola de Engenharia. Ele aceitou o convite,
desde que continuasse morando no Rio, a capital federal. Sede do DNER e
de outros órgãos federais responsáveis pelas maiores obras públicas no
Brasil.
A
empresa começou em Belo Horizonte fazendo obras modestas. A chance de
crescer surgiu com Juscelino Kubitschek, governador de Minas e depois
presidente da República. JK planejava construir 2 mil quilômetros de
estradas. Um irmão de Gabriel Andrade era deputado estadual e líder do
governo JK na Assembleia Legislativa. Por meio dele, a Andrade Gutierrez
conseguiu parceria com a Construtora Rabello para construir o trecho
montanhoso da BR-3 que vai da Lagoa dos Ingleses a Itabirito.
Os
sócios descobriram o caminho das pedras e a Andrade Gutierrez não parou
de crescer. Quando concorreu para a construção da Binacional Itaipu – e
perdeu por influência política de alguém mais bem apadrinhado,
inclusive pelo presidente do Paraguai – decidiu que era preciso abrir um
escritório em Brasília, para fazer lobby. Desse modo, com bons ventos à
popa, “la nave vá”. Até agora.
As
relações da Andrade Gutierrez (AG) com estatais são antigas e talvez
vão além de sua indiscutível competência para tocar grandes obras. A
entrada de Otávio Marques de Azevedo exemplifica tais laços. Ele tinha
sido vice-presidente da Telebrás e foi convidado em 1992, por Sérgio
Lins Andrade, presidente da AG, para planejar a atuação da AG no setor
de telecomunicações. No ano seguinte, nasceu a Andrade Gutierrez
Telecomunicações (AG Telecom). Em 1998, no governo Fernando Henrique
Cardoso, a empresa liderou o consórcio Telemar que venceu a licitação
para privatizar a Tele Norte Leste e ganhou a concessão para operar a
telefonia fixa em 16 estados. E que ficou mais conhecido como OI. Dez
anos depois, no governo Lula, houve a fusão da OI e da Brasil Telecom,
para oferecer telefonia fixa, móvel e transmissão de dados em sua área
de concessão.
No
ano anterior, Otávio já havia assumido a presidência do Grupo. Ele
tinha 56 anos de idade. Nenhum dos filhos e netos dos fundadores podia
mais exercer cargos executivos na AG, por decisão dos acionistas. Sérgio
Andrade, filho de Roberto Andrade, deixara a presidência do grupo,
continuando, porém, como presidente do Conselho de Administração.
Entre
muitos outros negócios, a AG é dona de 12,4% do capital da Hidrelétrica
Santo Antônio, que caminha para se tornar a terceira maior hidrelétrica
brasileira, atrás de Itaipu e Tucuruí. Desde junho de 2010, a AG
controla 33% do capital votante da Cemig. Comprou do consórcio Southern
Electric Brasil (SEB), controlado pela norte-americana AES.
Dá
para entender, não é mesmo, Operação Lava Jato: não se pode jogar fora o
bebê com a água do banho. A construtora, o bebê, deve continuar
crescendo. De preferência, longe de corruptos e corruptores.
(fonte: blog da KikaCastro)
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