domingo, 10 de agosto de 2014

Nada admirável mundo novo (ou: como até o FMI se preocupa com a desigualdade)

Texto escrito por José de Souza Castro:
Artigo do prêmio Nobel de Economia de 2008, Paul Krugman, devia ser lido com atenção pelos estrategistas das campanhas de Aécio Neves e Eduardo Campos. Para que os candidatos passem a dar mais atenção ao tema, se eles querem mesmo se eleger presidente da República de um país em que a riqueza está extremamente mal distribuída, em prejuízo da maioria dos eleitores.
A revelação de que “a desigualdade atrapalha” o crescimento econômico de um país serve também à presidente Dilma Rousseff, para reforçar suas crenças dos tempos de estudante de economia na Universidade Federal de Minas Gerais que a levaram a participar de uma luta que, na época, estava fadada ao insucesso e à prisão e à tortura. E que agora, se não foram esquecidas, têm enfrentado grandes dificuldades para, por iniciativa presidencial, se firmarem nesse nosso injusto sistema político.
Tanto que, em São Paulo, como vimos recentemente, aquele 1% da população com maior renda na capital se tornou ainda mais rica desde o começo do governo Lula.
Ao contrário do que se pensava nos meios frequentados por Aécio Neves – e agora também por Eduardo Campos –, tributar os ricos para ajudar os pobres pode elevar, e não reduzir, o ritmo de crescimento da economia. É o que afirma Krugman, respaldado em provas levantadas por ninguém menos que o Fundo Monetário Internacional (FMI). Uma desigualdade elevada prejudica o crescimento, constatou o FMI, e a redistribuição pode ser boa para a economia.
Conforme Krugman, no começo desta semana, a nova visão sobre desigualdade e crescimento “ganhou o apoio de um novo relatório da agência de classificação de crédito Standard & Poor's, que sustenta a posição de que uma desigualdade muito forte prejudica o crescimento”.
É algo para se pensar, num mundo cada vez mais desigual. E que, se nada for feito, tende a piorar.
Até agora, quando se fala em desigualdade, o que vem à mente é um reduzido grupo de bilionários cercado por centenas de milhões de miseráveis em todo o mundo. E o cerco tende a aumentar.
Em outro artigo na "Folha de S. Paulo", Ruy Castro comentou na última sexta-feira a chegada ao mercado do Fire Phone, da Amazon. O aplicativo Firefly permitirá ao usuário escanear um produto e comprá-lo on-line, sem interferência humana e sem ter nem sequer de digitar. Basta fotografar um produto com o Firefly. A foto em 3D é disparada automaticamente para o site da Amazon, capaz de reconhecer 100 milhões de produtos. Se aquele for reconhecido, a compra estará feita. O comprador recebe em casa e paga em seu cartão de crédito.
No futuro, o comprador nem precisará ir a uma loja para fotografar o que lhe interessa. “Mesmo porque, em pouco tempo, esses lugares, reduzidos a reles showrooms, deixarão de existir. Os showrooms do futuro serão só virtuais”, dizem as reportagens lidas por Ruy Castro. A Amazon tem como meta ser “uma loja de tudo”, de forma a dispensar a existência de todas as outras. Conclui o colunista:
“Não vi nos textos nenhuma preocupação com o fato de que o Firefly pode representar a morte do comércio de rua – e, agora, também o de shopping –, o fim do varejo, o desemprego, a falência das cidades e o fim de uma relação entre os seres humanos que começou quando, um dia, um deles trocou um machado de pedra por uma pele de mamute com seu vizinho – e, com isso, os dois inauguraram a civilização.”
Em 1932, no intermédio das duas grandes guerras mundiais, o escritor inglês Aldous Huxley publicou o livro “Admirável Mundo Novo”. Caminhamos agora para outro mundo novo e, se os atuais donos do mundo e os políticos em geral não criarem juízo, será um mundo cheio de ruído e fúria e sem significado algum.
Não teremos, a nos proteger, sequer uma pele de mamute. Mas não faltarão machados.
(fonte: blog da KikaCastro)

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